domingo, 14 de agosto de 2022

Fascistas entre nós

Autor: Chris Hedeges.

A Suprema Corte [dos EUA] está financiando e empoderando implacavelmente o fascismo cristão.

Eu não uso a palavra 'fascista' de maneira leviana. Meu pai era um ministro [pastor] presbiteriano. Minha mãe, que era professora, se formou num seminário [religioso]. Eu recebi o meu mestrado em Divindade na Escola de Divindade de Harvard. Eu sou um ministro presbiteriano ordenado. O mais importante é que eu passei dois anos reportando de mega-igrejas, seminários criacionistas, retiros de direito-à-vida, redes cristãs de radiodifusão e realizei centenas de horas de entrevistas com membros e líderes da direita cristã para o meu livro que é proibido na maioria das escolas e universidades “cristãs”.

O livro foi uma advertência de que um fascismo estadunidense, envolto na bandeira e agarrando a cruz cristã, estava se organizando para extinguir a nossa anêmica democracia.

Os fascistas conquistam o poder criando instituições paralelas – escolas, universidades, plataformas de mídia e forças paramilitares – e capturando os órgãos de segurança interna e o judiciário. Eles deformam as leis, incluindo a lei eleitoral, para servir aos seus fins. Eles raramente fazem parte da maioria.

O que a ideologia exige é a lei. Aquilo à que a ideologia se opõe é um crime. Uma vez que o sistema legal é subserviente ao dogma, uma sociedade aberta se torna impossível.

Golpe a golpe, o poder autocrático esta sendo solidificado por este monstruoso fascismo cristão que é financiado pelas forças mais retrógradas do capitalismo corporativo – que parece prestes a assumir o controle do Congresso dos EUA nas eleições da metade do mandato presidencial [em novembro de 2022].

Estes fascistas cristãos deixam claro sobre qual é a sociedade que eles intencionam criar.

No seu ideal de Estados Unidos, a nossa sociedade “secular humanista” baseada na ciência e na razão será destruída. Os Dez Mandamentos [da Bíblia] conformarão a base do sistema legal. O Criacionismo, ou o “Projeto Inteligente” será ensinado nas escolas públicas – muitas das quais serão abertamente “cristãs”. Aqueles que são rotulados como desviantes sociais – incluindo a comunidade LGBTQ+, os imigrantes, os humanistas seculares, as feministas, os judeus, os muçulmanos, os criminosos e aqueles descartados como sendo “cristãos nominais”, i.e., os cristãos que não assumem esta interpretação peculiar da Bíblia – serão silenciados, presos ou mortos. O papel do governo federal será reduzido à proteção dos direitos de propriedade, a segurança da “pátria” e a realização de guerras. A maior parte dos programas e departamentos federais de assistência – incluindo a educação – serão extintos. As organizações de igrejas serão financiadas em empoderadas e operar agências de bem-estar social e as escolas. Aos pobres, condenados por preguiça, indolência e pecaminosidade, será recusada ajuda. A pena de morte será expandida para incluir “crimes morais” - incluindo a apostasia, a blasfêmia, a sodomia e a bruxaria, bem como o aborto, que será tratado como assassinato. Às mulheres será negada a contracepção, o acesso ao aborto e à igualdade perante a lei, serão subordinadas aos homens. Aqueles que praticam outras fés, na melhor das hipóteses, serão tratados como cidadãos de segunda classe. As guerras executadas pelo império estadunidense serão definidas como cruzadas religiosas. As vítimas da violência policial e aqueles que estão nas prisões não terão reparação. Não haverá a separação entre igreja e estado. As únicas vozes legítimas no discurso público e nas mídias serão “cristãs”. Os EUA serão sacralizados como agentes de Deus. Aqueles que desafiarem as autoridades “cristãs”, no país e no exterior, serão condenados como agentes de Satã.

Por que os líderes da igreja não trovejaram em denúncias contra a grotesca perversão do Evangelho feita pelos fascistas cristãos, à medida que eles sacralizaram os esquemas de fique-rico-com-Jesus do evangelho da prosperidade, do imperialismo, do militarismo, do capitalismo, do patriarcado, da supremacia branca e outras formas de intolerância? Por que os repórteres não viram as brilhantes luzes vermelhas que se acenderam há décadas?

A maioria daqueles que têm como função reportar e interpretar a história, os movimentos sociais e as crenças religiosas falharam para nós. Eles falaram sobre o passado, jurando “nunca mais” [ao nazismo], mas se recusando a usar as lições do passado para explicar o presente. Não foi por ignorância. Foi por covardice. Confrontar os fascistas cristãos, até mesmo nas universidades, significava receber acusações de fanatismo e intolerância que acabam cancelando carreiras.

Como fizeram muitos acadêmicos da Alemanha de Weimar, era mais fácil acreditar que os fascistas não fariam o que diziam, que eles eram distorções dentro do movimento com as quais se podia argumentar racionalmente, que a abertura de canais de diálogo e comunicação poderia domesticar os fascistas, que os fascistas não agiriam de acordo com a sua retórica extremista e violenta se estivessem no poder.

Os fascistas prometem a renovação moral, um retorno à uma idade de ouro perdida. Eles usam campanhas de pureza moral para justificar a repressão do estado. Alguns dias após tomar o poder em 1933, Adolph Hitler impôs um banimento de todas as organizações de homossexuais.

Esta “limpeza moral” foi ovacionada pelo público alemão, incluindo as igrejas alemãs. Porém as táticas ilegais legitimaram rapidamente aquilo que logo seria feito à outros.

A classe bilionária, conquanto algumas vezes seja liberal, despossuiu os homens e mulheres trabalhadores através da desindustrialização, da austeridade, do boicote de impostos legalizado, da pilhagem do Tesouro dos EUA e da desregulamentação. Ela detonou a generalização do desespero e da ira que levaram muitos dos traídos aos braços daqueles vigaristas e demagogos. Ela está muito disposta a acomodar os fascistas cristãos, mesmo que isto signifique abandonar o verniz liberal de inclusividade. Ela não tem a intenção de apoiar a igualdade social, razão pela qual ela se contrapôs à candidatura de Bernie Sanders [à presidência dos EUA].

Ao final de contas, até mesmo a classe liberal escolherá o fascismo ao empoderamento dos trabalhadores de esquerda e organizados. A única coisa que importa mesmo à oligarquia dominante é a exploração irrestrita e o lucro. Ela, como os industriais na Alemanha nazista, ficará felizes em fazer uma aliança com os fascistas cristãos, não importando quão bizarros e bufões eles sejam, e assumirão os sacrifícios de sangue dos condenados.

Fonte (citado parcialmente): https://www.brasil247.com/blog/fascistas-em-meio-a-nos

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