domingo, 23 de junho de 2013

Identidade espiritual

Tem algum tempo que eu tenho acompanhado a luta LGBT para ter seus direitos reconhecidos e garantidos. Toda essa questão sobre identidade de gênero e preferência sexual é um assunto complicado porque rompe com muitos preconceitos e desafia as rígidas doutrinas  ditadas por instituições religiosas.
Uma pessoa nasce com um corpo que não combina, não condiz com sua condição. Aparentemente isso contraria todas as convenções sociais, mas a pessoa, ao buscar uma imagem, um copro, que reflita sua condição interna, acaba confirmando e reiterando essas mesmas convenções.
Sabe-se que essas convenções são culturais e próprias do ser humano. Esse conjunto de imagens e símbolos são muito fortes e arraigados para serem suprimidos ou reformulados. Um homem não precisa ser ou parecer mulher para gostar de homem. Uma mulher não precisa ser ou parecer homem para gostar de mulher. O que não impede o transgênero de buscar sua felicidade, nos termos e necessidades que ele/ela tenha.
Essa questão entremeia não apenas convicções sociais, mas educação, que se recebe desde nosso berço. O mesmo pode-se falar da questão da identidade espiritual e da opção religiosa. na antiguidade, toda religião e espiritualidade tinha sua base, sua essência, na família, no lar, no patriarca/na matriarca. Quem quer que estivesse na liderança da casa era quem detinha o sacerdócio e transmitia a seus filhos o legado que recebeu de seus ancestrais.
Foi pelo próprio desenvolvimento humano e expansão da humanidade que apareceram cidades, reinos, impérios. Muito comumente os chefes, reis, imperadores eram sagrados e coroados por sacerdotes; a religião do Estado estava estruturada e organizada a partir da religião familiar e, pelas relações sociais, as famílias mais abastadas constituíam tanto a nobreza quanto o clero. A despeito disso, havia mais tolerância e liberdade religiosa na antiguidade do que há em nosso tempo.
Quando a estrutura e organização das instituições religiosas adquiriram mais poder e influência, atribuindo-se uma infalibilidade, uma independência, ao tornar-se um Estado soberano instituído na autoridade dada por Deus, perdeu-se todo o vínculo com as origens, legados e heranças antigas. A identidade religiosa do individuo passou a ser monopólio e privilégio desse Estado Teocrático, a sociedade passou a ser dominada pelo dogmatismo e a idéia de Deus tornou-se algo vazio e sem sentido, a religião passou a ser uma grande multinacional.
Por séculos a humanidade ficou debaixo dessa Ditadura Clerical, aceitou crer e adorar um Deus que cumpre mais o papel de garoto propaganda dessa multinacional. Fomos condicionados a ter medo, nojo e aversão ao mundo, ao corpo, ao desejo, ao prazer. Perdemos nossa identidade espiritual e fomos alienados de nossa opção religiosa.
Os resultados dessa incompatibilidade foram a neurose, a paranóia, o recalque, a frustração e diversas formas de violência e desvios sexuais. Diversos crimes e guerras foram cometidos "em nome de Deus". Por muitos séculos o desenvolvimento humano foi restringido. Somente quando nós recomeçamos a desvendar nosso passado, os feitos daqueles que nos antecederam, suas mitologias, é que começamos a nos dar conta do que perdemos e do que pagamos ao ter delegado tanto poder e o monopólio a uma única instituição religiosa.
Demorou algum tempo, pois achávamos que os mitos eram meras lendas, nada senão velhas superstições. Mas ao percebermos que haviam verdades mais profundas, nos deparamos com verdades divinas e, com elas, começamos a recuperar nossa essência humana e redescobrimos os inúmeros caminhos pelos quais conseguiríamos desenvolver todo nosso potencial e acordar o espírito divino que reside em nós.

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Beltaine em junho

No Brasil em junho temos fogueiras, como tem na Europa em maio. Nós não temos maypole, mas temos pau de sebo.
Maio passou a 200 km/h. Durante esse tornado, nós iniciamos o processo de mudança de domicílio e os preparativos para a cirurgia da ortognática.
Foram vários meses privado da boa companhia dos meus progenitores espirituais e do consolo de estar no santuário no sítio.
O rescaldo de abril e maio não é favorável. Eu não consegui realizar o trabalho voluntário, o psicodrama foi uma arapuca e o exercício de vocalização eu vou fazendo no serviço.
Houve um breve intervalo, eu pude rever minha senhora e meu senhor. Eu tive a chance de ouvir o oráculo e Ifá e a oportunidade para ofertar as entidades que governam meu destino. Findo maio, findou o linimento. Oh bem, eu passei 48 anos quebrando pedras e comendo carvão, dificilmente coisas boas acontecem e raramente duram. Mesmo atravessando esse caminho espinhoso eu aprendi algumas coisas. Do jeito mais dificil, claro.
Eu consegui controlar meu temperamento. Eu mantive os problemas e dificuldades fora do ambiente de trabalho. Eu aprendi a parar de criar expectativas, positivas ou negativas. Eu apredi que é inútil ficar com pessimismo. Eu aprendi que ficar ensaiando ou roteirizando coisas, eventos ou fatos futuros é um desperdício.
Quando eu fizer a cirurgia eu passarei 15 dias me recuperando, uma quinzena. Falar quinzena tem menos impacto que falar quarentena, embora tenham o mesmo sufixo e tenham o mesmo intuito de marcar um período de tempo.
No fim das contas, crer e confiar a vida, o destino, aos Deuses, requer coragem, confiança e paciência. O chato faz pouco das crenças, religiões e espiritualidades. Como náufragos que passaram muito tempo ilhados, esqueceram que há algo além do oceano, duvidam que todos hão de voltar para suas origens. Tudo que o náufrago acha que sabe é baseado naquilo que é convencionado por realidade. Por mais fatos e evidências, a realidade do náufrago continua sendo uma ilha, não é nada racional atentar à ilha e esquecer o oceano, bem como o que nos trouxe a existir neste mundo.
Um caminho espiritual é baseado na intuição e na prática. mesmo o caminho científico necessita de alguma crença. Quando Cristóvão Colombo saiu para descobrir o "Novo Mundo", mesmo possuindo os mapas náuticos dos chineses, ele teria que crer, confiar que aquele traçado era exato. Um caminho espiritual é como um mapa e requer que se passe pela experiência.
Na jornada haveremos de encontrar pessoas com quem compartilhar o pão, vinho, catre, música e amor. No entanto a caminhada sempre será individual, solitária. Vínculos de sangue e linhagem nos dão a força para seguir adiante. Mas nos momentos dificeis, desafiadores, não haverá nada no mapa, no raciocínio, na lógica, na evidência, que poderá nos auxiliar.
Nós somos Cristóvão Colombo, navegando a nau de nosso corpo, através do mar da vida. Pobre dos náufragos, esqueceram o porto, esqueceram o destino, esqueceram a jornada.
Problemas, sofrimento, dor, fazem parte da existência. Triste é saber que muitos nós mesmos nos causamos e, feito crianças mimadas, só sabemos reclamar e culpar outras coisas, pessoas e mesmo os Deuses.
Nesse instante, sem bússola, sem vento, sem estrela, ao sabor das correntes da maré, eu não vou tentar adivinhar ou fazer uma cena do que virá. O que será, será.