quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Culto à personalidade

Eu estou me preparando com paciência extra para agüentar o próximo ano, época de eleições no Brasil. Desde meus 18 anos que eu vejo as mesmas figuras aparecendo nesse jogo de cartas marcadas chamado processo eleitoral. Passam os anos, passam os mandatos, muda a legenda, mas não houve mudanças positivas, apenas medidas paliativas para remendar os buracos.
A finalidade aqui é falar de Paganismo, Witchcraft e Wica, então eu não irei entrar no tema da Política, ainda que eventualmente eu tenha de usar termos e conceitos políticos para analisar e criticar um péssimo hábito que eu tenho observado entre pagãos, bruxos e wiccanos: o culto à personalidade.
O culto à personalidade é um fenômeno que ocorre em pessoas inseguras consigo mesmas, seja de suas opiniões ou de suas convicções e por isso recorrem, com freqüência, em embasar estas opiniões e convicções com a assimilação, agregação ou imitação das opiniões e convicções provindas de alguma personalidade respeitável em um campo.
Ninguém nasce uma personalidade, nem ganha respeito em um campo por acaso. Uma pessoa pode se tornar uma celebridade graças ou à sua capacidade, competência, experiência ou conhecimento.
Uma vez que cada um de nós tem sua própria habilidade, capacidade e competência, não é isto que torna uma personalidade melhor do que nós.
Uma vez que o conhecimento pode ser adquirido e não pertence à pessoa que o acumulou, não é isto que torna uma personalidade melhor que nós.
O que nos distingue são as diferentes experiências que temos, mas nem isso torna pessoa alguma melhor que a outra, pois a boa experiência é a que pode ser compartilhada.
Dessa forma, essas personalidades devem ser uma referência de algo que todos nós podemos alcançar, mas independentemente da autoridade, posição ou experiência que essa personalidade pareça ter, ele ou ela continua sendo tão humano como você, sujeito a erros e enganos como qualquer mortal.
Então não ceda ao discurso da autoridade nem se ajoelhe diante da ostentação da experiência, ouse questionar o discurso de um sacerdote ou de uma sacerdotisa, duvide da análise do especialista. Aqueles que nos antecederam no caminho entre os bosques sagrados merecem nosso respeito, não nossa reverência.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Limpeza de primavera

Uma vez ao ano, na primavera, eu faço uma limpeza total na minha casa, eu reservo este dia para curtir o meu lar e caprichar na limpeza, não só da sujeira material, mas também da espiritual.
Uma casa acumula muita coisa em um ano e como é um espaço amplo, nós conseguimos reparar no que precisa ser jogado fora. Nós também acumulamos muita coisa em um ano, mas não é tão fácil perceber e muito menos escolher o que jogar fora.
Imagina você tendo que se desfazer de algo que você estima muito, que você ganhou em um momento especial, de uma pessoa especial. Para quem não te conhece, nem conhece a história do objeto, será apenas mais uma coisa, não conterá nenhuma carga emocional, será visto apenas o valor de mercado.
Imagine então como deve ser difícil reavaliar coisas menos tangentes como memórias, sentimentos, preconceitos e sonhos! Passamos a metade de nossas vidas construindo a nossa personalidade e identidade, precisaríamos de mais outra metade da vida para tentar renovar ou substituir idéias, opiniões e pensamentos.
Assim como objetos se tornam, depois de algum tempo, um transtorno para nós e não vemos mais lugar para aquilo em nossa vida presente e futura, muito mais tais idéias, opiniões e pensamentos são pesados para nosso desenvolvimento atual e futuro.
Não se trata de discriminar essas coisas dentro de um pensamento maniqueísta, mesmo essa divisão de valores entre bem e mal se demonstrou suficientemente pernicioso para a nossa espécie. O problema é que essas idéias, opiniões e pensamentos se tornam obsoletos e limitam nossa percepção, por causa disto deixamos de aproveitar todas as nossas potencialidades.
O processo é demorado, mas vale a pena. Começando por mudar pequenos hábitos ou pensamentos simples, essas pequenas alterações produzem efeitos sensíveis e nos dão coragem e estimulo para continuar. Hábitos mais arraigados e pensamentos mais complexos costumam ser grandes conglomerados de idéias fossilizadas, mas como estão ligados ou associados a pequenos hábitos e pensamentos simples, resolvendo uns fica melhor para solucionar outros.
Como a limpeza de uma casa necessita de atenção e trabalho, a limpeza interna também é resultado de muita atenção e trabalho. Como a limpeza da primavera é uma cerimônia simples e eficiente, uma cerimônia semelhante para a limpeza interna é bem vinda. Como curtimos nossa casa, devemos curtir aquilo que somos, valorizar nossas fundações, agregar novos valores e sempre deixar uma janela aberta para ventilar.

terça-feira, 13 de novembro de 2007

O poder da palavra

Historiadores e antropólogos estão incertos de quando, onde e porque nossa espécie desenvolveu esse sistema complexo de comunicação conhecido por linguagem. O que se pode afirmar é que foi o resultado de um processo e que a habilidade foi passada e aperfeiçoada através das gerações.
No tempo de nossos ancestrais, o conhecimento era transmitido via oral, ou pelos mais velhos, ou pelos xamãns. A palavra falada ganhava entonações que lhe conferia densidade, textura e intensidade que tornavam a narrativa mais dramática e assustadora.
Posteriormente, o som das palavras foi sendo codificado em seqüências de símbolos coerentes, até formarem os primeiros alfabetos silábicos, que depois se desenvolveram e resultaram nos sistemas de letras, mas fáceis de memorizar. Com isso, o conhecimento passou a ser registrada e transmitida via literal, por textos escritos.
Entretanto, o conhecimento da escrita ainda pertencia a poucos, as pessoas que exerciam a profissão de escriba eram tão sagradas quanto os sacerdotes e o ofício era passado de pai para filho. Por causa dessa condição, era muito comum o escriba ser empregado nos templos e ser muito solicitado para a construção dos mesmos.
Não foi por acaso que a primeira religião monoteísta, o Zoroastrismo, procurou registrar por escrito os pensamentos e as doutrinas instituídas por Zaratustra como sendo a verdadeira religião de Deus, chamado então de Ormuz. Mas antes, uma breve explicação sobre mecanismos psicológicos.
Para nós, muitos objetos são mais do que coisas, eles tem um significado emocional ou simbolizam algo mais. Esse significado dado a objetos se chama fetichismo e é um princípio muito usado na magia. Em certo sentido, a palavra escrita também é um objeto, ainda que expresse uma idéia. Assim, enquanto objeto, a palavra também carrega sua dose de fetichismo exatamente quando quem a lê reproduz e recria, como na magia, o momento sagrado quando Deus se revelou aos homens.
Com isso, fica fácil entender o motivo pelo qual as religiões monoteístas são caracterizadas por serem fundamentadas por um livro sagrado. O Zend Avesta, a Torah, os Evangelhos, o Corão não são apenas obras humanas que registram uma experiência espiritual dentro de um contexto histórico e social, mas são efetivamente as palavras de Deus que exprimem e determina de forma universal o jeito correto de se relacionar com Deus.
Na Wica existe o Livro das Sombras, mas este é usado para consulta e orientação prática, nós não temos livros sagrados, a revelação dos Deuses vem pela experiência direta com a natureza e a magia; nós usamos palavras de poder, mas este vem de nós, não das palavras. Para o pagão é muito difícil aceitar uma religião revelada por escrituras, pois uma religião assim não adora a um Deus, mas ao poder da palavra.

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

A ladeira da juventude

Um dos sinais que nossa sociedade está doente e precisa de mudanças urgentemente é o aumento progressivo da presença de crianças e adolescentes na prática de crimes. Com muita facilidade se cai na generalização, explicações e soluções simplistas surgem com os velhos clichês de sempre.
Mas será que é somente falta de educação e disciplina? Será que é apenas a influência dos amigos? Será que tem gente que nasce ruim? Existe algum plano mundial secreto para aliciar a juventude? E o desfile de insanidades vindas da paranóia e da neurose não tem fim, nem mesmo autoridades e especialistas estão imunes de escorregar na ladeira da juventude.
O caso mais recente que envolveu vários menores, jogos de RPG, Vampirismo, Bruxaria e Wica, como se tudo fosse um pacotão das seitas satânicas, é o caso do suspeito Vandeir Máximo da Silva, em Presidente Prudente.
Eu sou tachado de chato e radical, mas livros de bruxaria não devem ser vendidos para menores de 18 anos, bem como toda e qualquer revista que use ou fale do nome da Wica. Vandeir e seus seguidores são um bom exemplo disso, esses jovens leram textos muito fortes e complexos em uma idade em que a personalidade ainda está em formação, a mente é muito influenciável, o pouco ou nenhum conhecimento dá margem a muitas contestações e dúvidas.
Deixando meu lado científico falar, eu lembro que nos termos da psicologia, nós passamos por uma fase de mudança a partir da pré-adolescência. O nosso ponto de referência deixa de ser a unidade familiar, nossos pais, para buscar outras referências em nossos núcleos grupais, nossos amigos.
Nós buscamos avidamente em formar e firmar nossa própria identidade pessoal, muitas vezes nos rebelando contra os padrões ensinados. Se essa nova referência puder assustar ou chocar nossos pais, tanto melhor, é o mecanismo infantil para mostrar uma suposta independência e maturidade.
Nós queremos porque queremos andar com nossas próprias pernas, berramos por uma liberdade que sempre existiu, construímos com os escombros da juventude anterior o novo castelo da juventude atual, nos entregamos ao turbilhão dos hormônios e das ilusões juvenis, seguimos altivos e orgulhosos na passarela da juventude, sem nos dar conta de que é muito fácil cair ladeira abaixo.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

As manifestações do Deus

Na parede da caverna, uma pintura rupestre mostra um sacerdote em estado de êxtase, incorporando o Deus Antigo, o mesmo Deus cultuado pelas bruxas modernas, mas que vem sendo diminuído ou negado por algumas vertentes que tentam transformar a Wica em um monoteísmo matrifocal, como se não bastasse termos que combater o monoteísmo patriarcal, cujas religiões vivem difamando o Paganismo, a Bruxaria e a Wica.
Isso acontece por causa da falta de informação ou da excessiva exposição da visão diânica ou da visão eclética. Por causa dos traumas causados pela Igreja, as pessoas se tornaram refratárias às estruturas religiosas, elas procuram por qualquer coisa que alimente a ilusão da liberdade e, ao mesmo tempo, forneça soluções fáceis, simples e imediatas.
A tradição vem dos ciclos da natureza, da fertilidade do solo, do crescimento das plantações, sem o que nós morreríamos. O mito do Deus reflete esse ciclo em oito sabás, no qual celebramos o nascimento, maturidade, morte e renascimento do Deus. Partindo desse ponto, eu descreverei as formas que o Deus se manifesta.

O Deus como o Senhor dos Mortos
Na época do Sanhaim, o Deus está no Submundo como Osíris, Hades e Plutão. Ele abre a porta entre os mundos, permitindo que os que desencarnaram possam seguir sua jornada, tal como Anúbis, Janus e Caronte. Sem essa ajuda, as sementes não dão lugar ao broto, nessa época se celebra tudo aquilo que abriu a mão de sua existência para que a vida continue.

O Deus como o Senhor do Inverno
Na época do Yule, novas sementes e almas vão se maturando para nascerem, mas a terra está fria e estéril. Nesse momento, aprendemos o quanto a vida é preciosa e frágil, do quanto precisamos usar com sabedoria para preservar, da importância da vida comunitária e do compartilhar alimento. Com o Deus no Submundo, a Deusa deve descer, reverenciá-lo, amá-lo. O Deus escolhe renascer através da Deusa, após fertilizá-la, para ensinar aos deuses e aos homens o mistério da existência.

O Deus como o Senhor da Fertilidade
Na época de Ostara, o campo está propício para as sementes eclodirem e para os animais acasalarem. Assim como os brotos, o Deus ressurge renovado da Deusa e ele nos convida a nos juntarmos à festa, fazendo música e amor. Ele também traz a chuva que irá garantir o vigor e a produção dos novos brotos. Ele se manifesta como a Criança da Promessa, para nos ensinar a cuidar de nossos descendentes.

O Deus como Senhor da Fartura
Em Beltane, a plantação está crescida e surgem as flores, indicando os frutos que serão colhidos. Ele se manifesta como o sol e é representado pelo Rei Carvalho, vencendo seu gêmeo, o Rei Azevinho, na competição pela Deusa no mito poético. Este é um momento para agradecer pela abundância que os Deuses nos dão, nos preparando para a colheita e a estocagem.

O Deus como o Senhor do Ágape
Em Litha, celebra-se a colheita, onde o Deus se manifesta como o Homem Verde, o Senhor da Ceifa, nos lembrando que morte e vida estão interligadas. Ele é também o Senhor das Feras, o Senhor da Caça e se manifestando como o corço sagrado para nos lembrar do sacrifício que deve ser feito anualmente.

O Deus como o Senhor da Providência
Em Lammas, começa-se a estocar os alimentos e a limpar o terreno de raízes e troncos. O sol fica mais distante, chega o outono e a terra se cobre de folhas mortas. Aqui e ali, o Deus fornece raízes, sementes, ervas e cogumelos para manter seu povo durante a estiagem.

O Deus como o Senhor da Severidade
Em Mabon, não há quase mais caça, todas as plantações secaram. O pouco que é colhido ou caçado é preservado em compotas ou salgado. As carnes mais gordurosas são defumadas para usar a banha como calefação e combustível para as casas.
A natureza é a base dos mitos e os mitos são a base da religião, transmitidos pela tradição oral. Mantenha a Wica tradicional.