Buscando dar voz a essas narrativas historicamente oprimidas, a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP sediará, nos dias 26 e 27 de outubro, entre as 9 e as 22 horas, o evento Filosofias ocultas: bruxaria como cultura, ciência e política — manifestação contra a intolerância religiosa, que será presencial com transmissão simultânea pelo canal do Youtube da FFLCH. A programação inclui mesas com pesquisadores, exposições de arte e performances artísticas, e não exige inscrição prévia para participar.
Para Andréa Sechini, Gilmara Cruz e Oliver Tolle, membros da comissão organizadora, o evento busca trazer os temas relacionados à bruxaria para o cerne das discussões acadêmicas, para contemplar de forma plural as visões de mundo deixadas à margem da história e fomentar reconhecimento e respeito. “O Brasil é um país com enorme diversidade e, embora em teoria o Estado seja laico, a prática da tolerância e do respeito é ainda nos dias de hoje extremamente necessária”, acrescentam os organizadores.
Vítimas de machismo, racismo e capacitismo, as bruxas apresentam uma trajetória histórica de resistência e carregam saberes que abrangem diversas áreas do conhecimento.
A bruxaria é dotada de força religiosa e tem uma forte influência cultural — a figura das bruxas está presente em livros, filmes, esculturas, músicas, danças e vestimentas das mais diversas regiões do mundo —, além de ter uma participação relevante na história da ciência. Segundo a organização do evento, a magia foi uma das primeiras áreas a questionar o universo e tentar entendê-lo. “Ela também se esforçou para transformar positivamente a humanidade, pois a magia é justamente um ato intencional com a finalidade de causar mudanças a favor de quem a pratica”, complementam.
As filosofias ocultas, que foram historicamente compreendidas como doutrinas reprimíveis, também têm um caráter de união. “Como força religiosa, a bruxaria também tem o poder de reunir pessoas em torno de objetivos comuns com temas muitas vezes ligados ao futuro da humanidade, ao aperfeiçoamento da sociedade e à superação de injustiças”, complementa a comissão organizadora.
Enquanto as bruxas são frequentemente associadas à cultura e à história estadunidenses, as trajetórias das bruxas brasileiras seguem pouco noticiadas. Ludovina Ferreira foi uma dessas mulheres apagadas pela historiografia. Nascida em Belém, no Pará, Ludovina foi acusada de feitiçaria pela Inquisição, no século 18. Os seus poderes de cura, que eram conhecidos na província de Grão-Pará, e sua relação próxima com um indígena lhe custaram a liberdade.
A história de Ludovina será explorada no evento da FFLCH durante a mesa Ludovina Ferreira, uma “feiticeira” em Belém Colonial, que inaugura o evento no dia 26, às 9 horas. A representação das bruxas na literatura e no cinema — em obras como Fausto, livro célebre de Goethe, e na poesia de Horácio —, a história da perseguição à bruxaria em diversas regiões do mundo e as interligações com o anticapitalismo e o ecofeminismo também são contempladas na programação, que terá a participação de pesquisadores brasileiros e estrangeiros.
Em ambos os dias do evento, a programação será encerrada, às 21 horas, com uma apresentação audiovisual que dialoga com o tema da bruxaria. No dia 26, será apresentada a peça teatral Aberta a temporada de caça (das bruxas), organizada por Andréa Sechini, e no dia 27 haverá uma apresentação de dança com o título The Witches Sabbath, dirigido por Gilmara Cruz. Além disso, durante todo o evento ficarão expostas 27 artes visuais, como parte da coletânea Lemniscata das Bruxas, que buscam captar a jornada errática, solitária e transgressora do processo de tornar-se bruxa.
Fonte: https://jornal.usp.br/diversidade/evento-na-usp-traz-a-bruxaria-para-o-cerne-das-discussoes-academicas/
Nenhum comentário:
Postar um comentário