“Essa não é a primeira vez que acontece, mas é a primeira que precisamos suspender nossas atividades. A gente recebe ataque de evangélico, de pessoas orando, repreendendo, tudo acontece. No último dia 14, antes de começar o nosso culto, apareceu um rapaz gritando no portão dizendo que era para acabar com tudo isso, que era coisas do inferno e que se não acabasse ia mandar fuzilar todo mundo que morasse lá”, conta Rubby.
Como a mãe de santo recebe muitas pessoas no local e até pessoas de fora do estado, ficou temorosa de que um ataque ferisse alguém.
“Moro nesse bairro há 27 anos e estou muito preocupada. O meu vizinho foi no meu portão, me ofendeu, falou que eu tinha feito muito barulho. E nesse dia nossa gira tinha ido mais tarde, porque atrasou um pouco, tanto que não tenho tambor, um amigo levou um tambor pra tocar e o tambor ficou até um pouco mais tarde. Mas, desde 2021, sempre foi assim”, relata.
O terreiro, inicialmente, era no bairro Ayrton Senna, mas ela decidiu fazer os encontros na própria casa dela, que fica no bairro Boa União. Foi nessa área que, segundo ela, os ataques ficaram mais frequentes e mais perigosos.
“Lá em casa, além de ser um terreiro, a gente acolhe pessoas LGBTQ que não têm para onde ir, que são expulsas de casa e acaba que isso incomoda, tanto por ser pessoas LGBTQs, como por religião. Tenho um vizinho que é evangélico, já fez culto ao lado do nosso terreiro repreendendo a macumba, a feitiçaria e nunca fomos na porta dele. Todos os vizinhos fazem barulho, festa, mas só foram reclamara da nossa gira. Sou uma mãe de santo trans e isso já gera repercussão e algumas pessoas não entendem. Acham que a religião é para fazer mal.”
No bairro, Rubby disse que há poucos terreiros e o dela qualquer pessoa que passa na rua consegue ver as atividades. Ela acredita que isso chama mais ainda atenção.
“Só tem dois ou três terreiros e o meu é bem aberto, o fundo dele é com a Avenida Sobral, então sempre que estamos fazendo nossas atividades, as pessoas veem. A gente não faz nada escondido, até porque não estamos fazendo nada de errado. Fora que já teve pais de filhos de santo que me ameaçaram porque não querem os filhos na religião, registrei um BO contra um pai de uma ex-filha de santo, que foi lá pra me ameaçar. Tô bem temorosa, mas a denúncia precisa ser feita, porque pode acontecer novamente. Já jogaram jogos de artifício dentro do terreiro e já chegaram a ameaçar meus filhos de santo”, revela.
A Federação das Religiões de Matrizes Africana do Estado do Acre (FEREMA-AC) lançou uma nota de repúdio após ter conhecimento do caso.
“Esperamos que os responsáveis por esse crime de intolerância religiosa sejam identificados e punidos no rigor da lei e que medidas sejam tomadas pelas autoridades estaduais e municipais, para garantir que as atividades do Terreiro de Umbanda Casa de Exú Dona Menina, continuem acontecendo sem mais intercorrências”, diz a nota.
A federação destacou ainda que no dia 21 de julho esteve no terreiro junto com representantes do Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial de Rio Branco (COMPIR) e do Centro de Estudos e Referência da Cultura Afro-Brasileira do Acre (Cernegro) fazendo uma visita no terreiro, “onde conhecemos in loco a realidade onde está inserido e pudemos ouvir as pessoas que fazem parte dessa comunidade.”
Rubby diz que agora pensa em se regularizar e se resguardar para que ataques como esses não voltem a ocorrer.
“Estamos sendo resistência. A gente transforma e cuida de pessoas, mas as pessoas não entendem, preferem ficar com o preconceito delas sem entender o que a gente faz. Suspendi por tempo indeterminado, mas pretendo regularizar o terreiro, com tudo que precisa ser formalizado, porque estando bem formalizada vou ter respaldos também”, finaliza.
No começo deste ano, o presidente Lula sancionou a lei que equiparou os crimes de injúria racial e racismo também aumentou a pena para quem praticar intolerância religiosa. O direito de crer ou de não crer é garantido pela nossa Constituição. Por anos, quem discriminava por motivo religioso, agredindo a liberdade de crença de cada um, poderia ser punido com um a três anos de prisão.
Agora, pela lei sancionada, a pena passa a ser de dois a cinco anos de prisão a quem obstar, impedir ou empregar violência contra quaisquer manifestações ou práticas religiosas. É a mesma pena prevista pelo crime de racismo, quando a ofensa discriminatória é contra um grupo ou coletividade, por causa da raça ou pela cor. E se isso for feito, por exemplo, de modo violento, com agressão física ou impedindo a realização de um culto, a pena se torna ainda maior.
Fonte: https://g1.globo.com/google/amp/ac/acre/noticia/2023/07/24/terreiro-de-umbanda-suspende-atividades-apos-registrar-casos-de-intolerancia-religiosa-no-ac.ghtml
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