domingo, 28 de julho de 2024

A rede incel e neonazi

Nos últimos anos temos acompanhado o crescimento de células neonazistas na internet que funcionam de forma diferente dos tradicionais grupos defensores de semelhantes ideias. São verdadeiras redes de ódio que contam com perfis de alto alcance nas redes sociais, fóruns de discussão abertos e fechados, além de uma miríade de perfis médios e pequenos que protagonizam os ataques, ameaças e apologias logo que os grandes soltam os chamados “apitos de cachorro”.

Ao contrário da antiga intelectualidade integralista ou dos bombadões tatuados oriundos de gangues, esses novos neonazistas são aparentemente mais frágeis. É comum que muitos desses perfis se identifiquem como jovens e adolescentes autointitulados “incels”, ou “celibatários involuntários” – o que demonstra suas dificuldades em relação ao sexo oposto que se transformam em misoginia.

Uma dessas redes de incels neonazistas tem coordenado ataques nas últimas semanas a uma série de perfis e influenciadores de esquerda no X, antigo Twitter. A Fórum entrevistou os responsáveis por dois desses perfis atacados, que detalharam os ataques e deram pistas de como funciona a dinâmica do grupo – ambos identificaram as mesmas práticas e procedimentos.

“Essa bolha de incels nazistas atua contra comunicadores de esquerda de uma forma geral e mudam de alvo conforme as coisas vão acontecendo nas redes. Ou seja, se uma pessoa faz algo que os incomode, passam a atacar. Já fui atacado, o Thiago Reis e o Lázaro Rosa também, e dezenas de outros comunicadores. Os ataques são coordenados, eles escolhem o alvo e então vem uma enxurrada de mensagens como forma de intimidar”, conta Vinícios Betiol, dono de um perfil pessoal no X, com seu nome verdadeiro, e mais de 150 mil seguidores.

Betiol diz que é comum, como no seu caso, a prática de ‘doxxing’. Em outras palavras, pesquisam dados pessoais do alvo, como endereços, vazam esses dados e passam a fazer ameaças de morte, estupro e violência de modo geral.

Por fim, Betiol relata que também utilizam fotos dos alvos para criar vídeos com técnicas de deep fake em que apareçam adornados com símbolos nazistas e proferindo discursos supremacistas. O interlocutor compartilhou alguns desses vídeos com a reportagem, e chama a atenção para uma peça em que manipulam a imagem de Marielle Franco deixando-a branca, loira, repleta de simbologias neonazistas e fazendo um discurso dessa natureza.

Antes de abordar os “procedimentos” para os ataques, é importante pontuar que o grupo utiliza uma espécie de código para evitar bloqueios nas plataformas e até mesmo eventuais processos judiciais. Tocando em miúdos, substituem os verbos problemáticos. “Matar” ou “executar”, nesse contexto, torna-se “resenhar”; já o verbo “estuprar” é trocado por “estudar”.

Betiol conta à reportagem que os ataques sempre começam quando um dos perfis grandes do grupo dispara uma mensagem tida como apito de cachorro, dando o sinal aos demais membros do ecossistema digital sobre quem é o alvo da vez.

A jovem responsável pelo perfil @maconhilda gravou um ‘spaces’ [espaço de chat por áudio na plataforma X] com a presença de diversos perfis dessa bolha e o compartilhou com a reportagem. Nele, um perfil identificado como “Felipe” (@Leme12) se mostra como uma espécie de liderança e aponta a existência de um grupo seleto e fechado por onde as atividades dessa rede de ódio seriam orquestradas.

Esse perfil é o mesmo que soltou um dos apitos de cachorro contra Betiol. Fazendo uma devassa nas suas postagens, é possível concluir que o operador do perfil se chame Felipe Leme. A identidade ainda não foi confirmada, mas encontramos algumas pistas.

A primeira delas são alguns artigos publicados pelo jornal A Razão, de Tijucas, Santa Catarina. É o mesmo veículo que em dezembro passado recebeu R$ 5 mil da deputada Júlia Zanatta (PL-SC) para publicar matérias elogiosas à parlamentar. O artigo fazia a ‘denúncia’ de que Leonel Radde (PT-RS) estaria “perseguindo cristãos” após os ditos “cristãos” atacarem a Arquidiocese de Porto Alegre por ter organizado um ato ecumênico e inter-religioso à época. Assinado por “Felipe Leme”, o artigo foi compartilhado nas redes tanto pelo jornal como pelo perfil @Leme12.

Fonte, citado parcialmente: https://revistaforum.com.br/brasil/sudeste/2024/7/25/exclusivo-como-atua-bolha-incel-neonazista-que-coordena-ataques-ameaas-perfis-de-esquerda-162733.html

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