sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

A galinha que inventou o ovo

Claudete é uma galinha malandra e procurava várias formas de escapar de seu serviço e destino. Quando ela chamou suas companheiras para mais uma assembléia, ela teve o cuidado de deixar o bode Roth fora do galinheiro.
- Meninas, vejam o que eu inventei para nos libertar.
- Mas isso é um ovo!
- Não é um ovo qualquer. É um ovo no qual eu consegui clonar nosso antepassado jurássico, o T-Rex.
- Como isso vai nos libertar?
- Ao contrário de vocês, ignorantes, eu ouço os humanos. As fêmeas humanas estão entusiasmadas com um tal de 'resgate do sagrado feminino'. Pois então, com os filhotes desse ovo, nós poderemos resgatar de volta o direito que é nosso.
- Qual é esse direito que iremos resgatar?
- Ora, evidente! Nós iremos voltar ao nosso estado original onde vivíamos em uma sociedade Frangernal [frango+fraternal]. Como no tempo dos Celtas!

Fora do galinheiro, o bode Roth apenas balança a cabeça. Ele desistiu de por um pouco de juízo e bom senso nas galinhas. Apenas pensa como as galinhas pretendem controlar essa cria carnívora. Em seu canto, registra a farsa que é espalhada na fazenda que o Paganismo Moderno tem origem Celta. Ele sabe que dizer que o Paganismo Moderno tem origem Celta é como dizer que o Futebol (ou a bola) tem origem Corinthiana. Os românticos deslumbrados se esqueceram dos Gregos, dos Romanos, dos Etruscos, dos Persas, dos Assírios, dos Fenícios, dos Arianos, dos Egípcios, dos Acadianos, dos Sumérios.

A palavra Celta é derivada da ancestral Keltoi que os gregos ancestrais usaram para denominar as tribos européias ao norte deles. Para os gregos e estudiosos modernos, a palavra distingue diferentes culturas, do mesmo modo que foi usada no passado para denominar diferentes tribos, referindo-se a cultura e não a um povo geograficamente delimitado.
Culturas Celtas, ao contrário do que se fala, ainda existem. O termo Celta começou a ser usado a ser usado para culturas européias atuais (portanto vivas) a cerca de 300 anos atrás. Pra algo ser chamado de Celta significa, portanto que se desenvolveu e existe numa cultura que fala a língua Celta.
Inevitavelmente, na ausência de um sistema científico de classificação para construir um panorama cronológico do passado, os investigadores compactaram o material remanescente dos habitantes ancestrais da Europa, de modo tudo que era aparentemente pré-romano "pertencia" ao mesmo horizonte cultural. Assim os druidas, Stonehenge e os celtas se tornaram, segundo a Dra. Miranda Green, erroneamente intrincados e assim permanece até hoje.
Grupos que se denominam Celtas por motivos religiosos, políticos ou qualquer outro isoladamente da cultura não terão jamais compreensão de mundo das comunidades Celtas e por tanto o uso do termo torna-se dubitável. Infelizmente a maioria das informações presentes na "espiritualidade celta" de hoje não são referentes às culturas celtas e sim materiais modernos de mitos da idade média e romantismo.
Chamar algo de celta quando não é parte da cultura Celta é errôneo do mesmo modo que é selecionar um aspecto dessa e de qualquer outra cultura e divorciá-la do restante do contexto no qual ela é inserida. Aqueles que fazem isso aniquilam a cultura e o significado. A religião celta é completamente dependente da cultura celta e a única maneira de entender uma é entendendo a outra. Averigua-se facilmente nesse tipo de mal uso, uma desconexão histórica grosseira e completo desleixo com a realidade das comunidades celtas.
Os Celtas viviam em tribos. Cada tribo possuía seu deus particular, e deuses ‘maiores’ compartilhados por tribos vizinhas. Não é minha intenção aqui, descrever esse povo e seu modo de vida, mas sim fazer um breve apanhado geral sobre o quão distribuídos estavam os Celtas pela Europa, para que se possa compreender a variedade de Deuses, seres espirituais, valores, costumes e conceitos registrados em sua mitologia. Além da interpretação tribal que cada mito, que cada Deus e que cada aventura Celta sofria, devido às diferenças regionais, existe também o agravante dessa literatura ser exclusivamente oral, uma vez que esse povo não nos deixou nada por escrito, o que justifica suas complexidade e variação. Tendo esses conceitos previamente compreendidos, pode-se pensar então em conhecer os Deuses Celtas em sua real natureza e não em comparação com outros sistemas politeístas já conhecidos.

Autor: Lornnah Carmel
Fonte e tradução: Maria Elizabete F. Abreu

Não é possível afirmar que existiu uma religião celta unificada (pan-céltica). Se pensarmos nos celtas como um vasto agrupamento de povos que se estabeleceu na Europa continental, atlântica e em partes da balcânica, nós teremos dialetos diferentes, práticas cotidianas distintas, o que nos leva a crer que a religiosidade também tivesse as suas particularidades. Os pontos mais em comum eram certamente a língua e a estrutura social. Sendo assim é muito difícil atribuir aos celtas uma religião unificada que seria a mesma da Anatólia até a Irlanda (mesmo o druidismo era um fenômeno presente somente nas ilhas britânicas e Gália).
Todos os movimentos religiosos atuais que preconizam alguma ligação com as religiões da Europa pré-cristã são econstituições contemporâneas, sem vínculos diretos ou ancestrais com as mesmas. Enquanto manifestações de fé todos devem ser respeitados, mas do ponto de vista histórico alguns destes movimentos tem maior ou menor exatidão. A wicca desenvolvida por Gerald Gardner e depois por Alex Sanders, por exemplo, é uma religiosidade influenciada não somente pelos antigos celtas, mas também pelo ocultismo oitocentista e outros elementos esotéricos (uso do pentagrama, rituais iniciatórios com espadas, etc). Uma das correntes mais “utópicas” da wicca é a diânica, que mescla fantasias como o matriarcado e um suposto poder feminino, que nunca existiram, muito menos entre os indo-europeus. A tendência neo-paganista que mais se aproxima do que realmente os celtas praticavam é a que vem sendo chamada de reconstrucionismo, que se baseia essencialmente nas pesquisas acadêmicas, tentando despir-se de anacronismos e atitudes advindas do ocultismo pós-medieval.

Autora: Prof. Ma. Luciana de Campos

Repostado. Original perdido. Texto originalmente publicado em 06/06/2008, resgatado com o Wayback Machine.

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