A resposta é clara: preconceito religioso, racismo estrutural, intolerância disfarçada de opinião. E, como define a lei, isso é crime.
Apesar de sermos um país que tanto se orgulha da sua diversidade cultural, as religiões de matriz africana seguem sendo marginalizadas e criminalizadas — muitas vezes de forma silenciosa, cotidiana, cruel. No comércio, nas escolas, em hospitais, repartições públicas e ambientes de trabalho.
O caso recente da paciente Tainá Louriçal, internada no Hospital Universitário Gaffrée e Guinle, na Tijuca, escancarou essa ferida: seus fios de contas desapareceram misteriosamente enquanto ela estava no banho. Um fio de conta não é acessório — é identidade espiritual, proteção, pertencimento. O sumiço desse símbolo não é apenas um desrespeito: é violência espiritual e institucional.
E não para por aí. Os casos de terreiros depredados, casas de santo incendiadas e filhos e filhas de axé atacados verbal ou fisicamente continuam se multiplicando. Algumas figuras públicas, como a atriz Luana Xavier, neta de Chica Xavier, têm usado sua visibilidade para denunciar o racismo religioso e lutar por respeito. A cantora Vanessa da Mata, seguidora do Candomblé, também já foi alvo de preconceito por afirmar sua fé — e reconhece a importância de sua voz para combater a intolerância.
Mas não são apenas os famosos que sofrem. As maiores vítimas são os anônimos. Gente comum que perde empregos, é ridicularizada, excluída ou desacreditada por professar sua fé de origem africana.
E o mais grave: a intolerância contra o Candomblé e a Umbanda não é apenas desinformação — é reflexo direto de um sistema racista, enraizado desde os tempos da escravidão. Criminaliza-se o toque do atabaque, mas aplaude-se o batuque no Rock in Rio. Demoniza-se o banho de folhas sagradas, mas idolatra-se o sal grosso em rituais de estética esotérica, ou em campanha de igreja. Como bem disse o Babalawo e escritor Luiz Antonio Simas, “o problema do Brasil não é com a religião africana, é com o africano que cultua.”
O Candomblé e a Umbanda não são folclore, exotismo, ou seitas. São sistemas profundos de sabedoria ancestral. São ciências das folhas, dos ventos, da cura, da escuta e do cuidado. São resistência preta. São ética comunitária. São espiritualidade que sobreviveu ao tráfico transatlântico, às senzalas, à perseguição da polícia e à demonização dos templos. São práticas de fé viva.
A intolerância religiosa que atinge nossas tradições tem cor, tem classe e tem origem: o racismo. É o mesmo racismo que não aceita ver Exu como o mensageiro da vida, mas o confunde com o mal. O mesmo racismo que desqualifica nossas vestes brancas, nossos toques, nossos saberes.
É hora de dizer em voz alta: cultuar Orixá não é crime. Discriminar, sim.
O Candomblé e a Umbanda não precisam de aceitação — precisam de respeito. E respeito se constrói com educação, empatia e coragem. Coragem de quem não se cala mais.
Não agredir o outro por causa da fé que ele professa é ouvir o Deus de luz que você acredita. Porque se você torce o nariz, muda de assunto, ri debochado ou simplesmente ignora quando alguém diz “sou de axé”... talvez seja hora de olhar para dentro. O problema não é a fé do outro. O problema pode estar em você. E talvez você nem perceba — porque o racismo, muitas vezes, se veste de costume, de brincadeira, de “opinião”.
Mas não é opinião. É crime.
Axé para todos!
Fonte: https://extra.globo.com/blogs/pai-paulo-de-oxala/post/2025/04/por-que-existe-tanto-preconceito-contra-o-candomble-e-a-umbanda.ghtml
Nota: eu observo, satisfeito e com respeito, pessoas usando suas guias, apesar do preconceito.
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