Os antigos assírios acreditavam que aquele era um lugar onde o mundo físico e o espiritual se encontram. Três mil anos atrás, seus exércitos viajavam rio acima para oferecer sacrifícios.
Um relevo de Tiglate-Pileser – rei da Assíria entre 1114 e 1076 a.C. – permanece na entrada do túnel. O tempo corroeu suas extremidades, mas ele segue de pé e majestoso, apontando para o seu império.
A nascente do rio Tigre fica no território que hoje pertence à Turquia. De lá, ele flui para o sudeste dos montes Taurus.
Ele toca um pequeno canto do nordeste da Síria e entra no Iraque, atravessando as cidades de Mossul, Tikrit e Samarra, a caminho da capital iraquiana, Bagdá.
No sul do Iraque, os extensos Pântanos da Mesopotâmia absorvem o Tigre perto da confluência com seu irmão, o rio Eufrates, e ambos fluem juntos para desaguar no Golfo Pérsico.
Cerca de 8 mil anos atrás, nossos ancestrais caçadores-coletores ocuparam a grande planície entre os dois rios. Lá, eles desenvolveram a agropecuária, levando muitas pessoas a chamar a área de “Berço da Civilização”.
Foi nessas primeiras cidades-Estado, como Eridu, Ur e Uruk, que surgiu a invenção da roda e da escrita. Seguiram-se os sistemas legais codificados, navios, a fermentação de cerveja e canções de amor, entre outras invenções.
Atualmente, Diyarbakır é a capital de facto da grande população curda da Turquia. Nas suas alamedas curvas, pudemos repousar em um pátio de basalto à sombra de uma amoreira, fascinados pelos assombrosos ruídos que ecoam pelas paredes.
Ali, uma mulher em uma jaqueta acolchoada bege sentou-se em um banco com a mão direita em cone sobre uma das orelhas. Seu nome era Feleknaz Aslan. E sua voz pujante nos manteve atentos por 30 minutos.
Aslan é uma dengbêj, uma cantora e contadora de histórias curda. Seus ancestrais transmitiram histórias e contos folclóricos por gerações. A canção de Aslan contava um caso de amor fracassado nas margens do Tigre.
Ela afirma que, agora, a maioria dos dengbêj é de homens, mas que a prática foi inventada pelas mulheres. Era uma forma de preservar sua cultura e identidade.
Aslan explica que o rio Tigre costuma ser o cenário dessas canções, por ser reconhecido como um elemento central da vida dos curdos naquela região, em épocas remotas e nos tempos atuais.
Historicamente, o rio pode ter sido uma força de conexão, mas pudemos observar como ele também se tornou um ponto de conflito.
Passamos o domingo com os mandeus, o menor e talvez mais antigo grupo étnico-religioso do Iraque.
Os mandeus acreditam em batismos regulares como fonte de nutrição espiritual e forma de se livrar dos pecados. Os batismos devem ser realizados em água corrente e as margens do Tigre – um dos dois rios que permitiram àquela fé florescer inicialmente – são o lar de muitos membros da comunidade até hoje.
Pude observar um sacerdote levando oito mulheres até o Tigre, uma a uma. Ele as submergia suavemente, sussurrando orações em mandeu, um antigo dialeto do aramaico mantido vivo unicamente por eles.
“A água aqui é a mesma do próximo universo”, segundo o assistente do sacerdote.
Quando pergunto a Khairalla sobre o futuro do rio, sua resposta é simples: “os iraquianos devem manter sempre a esperança. Tudo o que as gerações anteriores fizeram, nós podemos mudar.”
Fonte, citado parcialmente: https://www.bbc.com/portuguese/articles/clwz5p5e2pxo
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