O que a tese da invasão ariana sustenta é que tribos nômades bárbaras, provindas da estepe eurasiana, teriam penetrado por volta de 1500 a.C. pelo noroeste da Índia, arrasando a civilização que aí estava, escravizando os aborígenes e fazendo a cultura local regredir a formas larvais durante mais de mil anos.
A partir do final do século XIX, Max Müller, estudioso alemão, fundador da mitologia comparada e um dos primeiros especialistas em literatura sânscrita, começou a estabelecer uma associação entre comunidades lingüísticas e grupos étnicos. Ele discursava com um certo tom romântico sobre a grande família ariana, falante do proto-indo-europeu, matriz de todas as línguas vivas e mortas desde Oriente Médio até a Escandinávia e Portugal, que teria ocupado o território da Europa e da Ásia, impondo sua tecnologia e modus vivendi superior aos outros povos.
Como outros estudiosos da sua geração, passou anos tentando reconstruir essa proto-linguagem (Ursprache, em alemão), debruçado nos mapas e especulando sobre onde ficaria o lar original (Urheimat) deste povo. A idéia de hordas bárbaras cavalgando pela estepe, ocupando o continente, submetendo e arrasando a ferro e fogo todas as culturas que encontravam no caminho fascinou os estudiosos do século XIX.
Vejamos sua própria opinião: "eles [os arianos] foram os protagonistas no grande drama da História, e elevaram até o mais alto grau todos os elementos da vida ativa de que a nossa natureza é dotada. (...) Em constante conflito entre si e com outras raças semíticas e turânias, estas nações arianas transformaram-se nas senhoras da História, e parece ser sua missão unir todas as partes do mundo pelas correntes da civilização, do comércio e da religião." Infelizmente, esta teoria acabaria por desdobrar-se na funesta explosão racista a partir da qual deflagrou-se a II Guerra Mundial. No final da sua vida percebeu o potencial explosivo e a temível distorção que haviam sofrido suas palavras e tentou retratar-se, mas já era tarde. Infelizamente, podemos considerá-lo um dos responsáveis morais pelo surgimento da onda racista na Europa.
É necessário separar a questão de linguagem, cultura e raça, das especulações que se possam fazer sobre elas, ou ainda do seu uso político ou filosófico, que deve ser totalmente descartado. O grande perigo é acreditar que uma raça possa ser genética ou culturalmente superior às demais. Aliás, a própria palavra raça precisaria ser revista, já que raça só existe uma: a humana. Biologicamente, essa raça humana divide-se em diversos grupos étnicos. Os áryas ou arianos são o povo resultante da somatória de diversos grupos étnicos: o indo-europeu, o drávida, o proto-australóide e, em menor grau, o mongolóide, todos eles falantes de sânscrito arcaico. Quando dizemos ário, não estamos referindo-nos a um grupo étnico, muito menos àquela infaustamente célebre "raça" dita "superior".
A noção racista da palavra ário constitui a mais abjeta perversão do significado original deste termo. Por árya ou ariano entende-se o grupo falante do sânscrito antigo, detentor do conhecimento dos Vedas. Significa nesta língua cultivado, e refere-se, em verdade, não a um grupo racial, nem mesmo à cultura falante desta língua, senão a uma qualidade ou disposição ética: a da nobreza.
Fonte: Dharmabindu
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