A concorrente Netflix tem a série Sandman que é baseado no livro do mesmo autor, Neil Gaiman. Eu fiquei decepcionado com essa versão, pois está carregada de referências cristãs, quando personifica Lúcifer como o Diabo.
O primeiro capítulo tem erro histórico e mítico. Os vikings chegaram no continente americano onde hoje é o Canadá e Odin (Wotan) não é um Deus da Guerra. Os vikings procuravam a guerra porque acreditavam que desta forma provavam o seu valor e iriam ao Valhalla.
A série é focada nas aventuras do protagonista (Shadow Moon) que encontra pessoas que, na verdade, são serem místicos e divindades.
Nada de novo sob o sol. Eu vivo dizendo que não existe coincidência. Fatos e pessoas que passam por nossa existência não são aquilo que nós achamos ser.
Uma das perguntas que muitos sábios fazem é sobre o propósito de nossa existência, seja individual ou coletiva. Cada um que nasce nesse mundo tem uma missão que ele/ela tem que cumprir e existem forças além de nossa compreensão que vão garantir que cumpramos com esse propósito.
Nós, convencidos e prepotentes, voltamos nossas costas aos Deuses. Nós ficamos apegados ao mundo material, decretamos a Era da Razão e fundamos uma nova crença.
Nós construímos um habitat artificial feito de vidro, cimento e ferro, vivemos como peixes em um aquário e negamos que exista o oceano.
Nós construímos esse mundo tecnológico achando que superamos a existência do divino (considerado inexistente), mas vemos as imagens de nossa chupeta eletrônica acreditando serem reais.
E ainda nos torturamos com perguntas existenciais que não podem ser solucionada apenas com a ciência.
Assim fundamos a Era Contemporânea, um mundo desumano e injusto, onde ter é mais importante do que ser. Entretanto nada aqui nos pertence. Nos rodeamos e nos cercamos de coisas, títulos e funções, mas continuamos irremediavelmente infelizes. Nós nos divorciamos do mundo espiritual e nos deparamos com o vazio dentro de nós que nunca será preenchido ou saciado.
Talvez para os mais lentos não perceberão que o parceiro do protagonista se apresenta como Wednesday, mas não é a Vandinha, mas sim Odin, no original, Wodan, de onde vem a palavra.
Enfim, o seriado coloca Odin com um humano para enfrentar os novos Deuses. Sim, porque não? Todas as mitologias antigas nos contam de Deuses guerreando com Deuses na virada novo aeon.
O interessante é que Shadow Moon parece ser descrente, mas testemunha a existência do mundo espiritual e necessariamente começa a acreditar. A descrença é apenas uma teimosia infantil cultivada pelo rancor.
Impagável a cena (spoiler!) de Laura, diante de Anubis e ouvindo que, como ela não acreditava em nada, para o nada ela iria.
Coisas terríveis foram feitas em nome de Deus, da religião, mas são atos feitos por humanos. Ainda que tenha violência nos textos sagrados, são os humanos que os tomam como verdade indiscutível e os transformam em armas. Quando há erro, este recai no ferramenteiro, não na ferramenta.
Eis um enorme mistério. Por que Deus, por qualquer nome que tenha, precisaria de um humano para realizar seus objetivos? A série mostra que pela interação com o mundo humano, seres místicos e divinos se encontram e tornam-se, igualmente, peças desse jogo cósmico.
Tal como Ésquilo escreveu em Prometeu Acorrentado, nem Zeus pode escapar do Destino.
Quem adaptou o livro para a televisão insere várias insinuações sarcásticas, até a da verdadeira origem da Páscoa (Easter) vir das celebrações pagãs da primavera para Ostara, apresentando uma cena (spoiler!) onde a própria faz uma festa recheada de diversos Jesus. Um erro, o roteirista não deve conhecer o que são formas de pensamento.
Talvez a grande sacada está em perguntar por que Deuses Americanos. Nem mesmo os Deuses Antigos pertencem a um país ou cultura. Eles pertencem ao seu próprio povo, divino. Ou então perceber quais são esses Deuses Americanos dos quais a série fala, que são globais e são representados por coisas que nós achamos ter criado e que dominamos, mas estamos tão viciados que nos tornamos escravos.
PS: impagável a declaração de Czernobog.
"we never care about skin like the Americans. Where we come from, everyone has the same color. So we must fight over shades."
Traduzido:
"nunca nos preocupamos com a pele como os americanos. De onde viemos, todos têm a mesma cor. Portanto, devemos lutar pelas sombras."
Ouch. Deve ter doído nos racistas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário