Baseado no texto "A criança agradecida", de Katrina Rasbold,
publicado no Patheos.
A relação entre seres humanos é complicada e tende a
complicar ainda mais quando há parentesco. A tensão é maior quando laços de
sangue, convivência e intimidade estão envolvidos.
Nós falamos de boca cheia da Deusa Mãe e do Deus Pai, construímos
comunidades baseadas no perfeito amor e confiança, estabelecemos pactos e
juramentos, criamos laços espirituais, nos tratamos como irmãos e irmãs e ainda
assim temos relações complicadas.
Como é seu relacionamento com seus Deuses? Como você os
serve? Que papel eles tem em sua vida? Nós conhecemos nossos Deuses ou os
tratamos como meros arquétipos, meras hipóstases de um Deus ou Deusa? Nós invocamos
em nossos rituais os Deuses que tem algum vínculo com nossos ancestrais ou
misturamos panteões? Como podemos adorar ao Deus Selvagem ou à Deusa Estrela,
se os confundimos com outros Deuses? Como podemos clamar por nosso Pai se
chamamos o Padrasto, o Tio ou o Avô?
Dizem que os Deuses criou o homem à sua imagem,
antropologistas tem uma teoria que o homem criou os Deuses à sua imagem. O que
muitos antropologistas parecem desconhecer é que nem sempre os Deuses receberam
representações em efígie, a iconografia surgiu no ocidente por influência do
oriente. A estátua é uma representação dos Deuses, um recurso humano em dar forma
ao que existe como energia. Energia não tem feições, então se torna crucial
recorrer a algo que seja familiar, reconhecível, imitando em forma humana estas
potências que se manifestam na natureza e no homem.
A imagem mental que criamos para os Deuses costuma revelar como
nos relacionamos com o divino. A postura que temos nos rituais revela como vemos
e interpretamos o divino, o sagrado. Se nós imaginamos Deus como sendo
ciumento, vingativo, violento, nossa relação será de medo, não de adoração. Se nos
ajoelhamos, nossa relação com o divino, o sagrado, será de submissão, não de
cumplicidade.
Se nossa relação com os Deuses é uma relação paternal, eles
se relacionam conosco da mesma forma como nos relacionamos com nossos filhos e como
nossos filhos se relacionam conosco?
Assim como nós, eles têm um filho preferido e um filho
problemático?
Assim como os nossos filhos, nós agradecemos aos Deuses até
por coisas banais ou sempre exigimos mais?
Assim como nossos filhos, nós comemos tudo que os Deuses nos
oferecem e lambemos os beiços até com os pratos mais simples ou nos recusamos a
comer ou experimentar certos pratos?
Assim como nossos filhos, nós saímos confiantes pelo mundo
ou nós nos acuamos e nos escondemos debaixo das túnicas dos Deuses?
Assim como nossos filhos, nós tentamos nos esforçar ao
máximo, ou nos recusamos a sequer tentar?
Assim como nossos filhos, nós dizemos obrigado ou perguntamos
se é só isso que os Deuses tem para nos dar?
Quantas vezes os Deuses nos ofereceram uma oportunidade,
algo diferente do que estamos acostumado, algo que não era o que esperávamos e
nós sequer pensamos na proposta, recusamos as bênçãos, rejeitamos suas ofertas,
nos mantendo na mesma vidinha medíocre?
Quantas vezes pedimos por ajuda aos Deuses para nos ajudar
em momentos de crise, sem que sequer nos esforcemos para resolver essas crises
que usualmente é resultado de nossas próprias ações?
Quantas vezes esperamos que as respostas venham até nós ao
invés de buscar por elas?
Por que tornamos tão difícil para que os Deuses possam nos
ajudar?
Como filhos dos Deuses, nós os estamos honrando e
reverenciando tanto quanto esperamos que nossos filhos nos honrem e nos
reverenciem?
Como filhos dos Deuses, nós devemos recuperar nossas
origens, nossas raízes. Somente quando retomarmos o domínio sobre nosso corpo,
sobre nosso sangue, é que podemos evocar nossos ancestrais. Somente quando
resgatarmos essa linhagem é que nossos ancestrais irão nos apresentar aos
Deuses de nosso povo. Somente poderemos conhecer ao Nosso Pai e à Nossa Mãe
quando voltarmos à nossa verdadeira Família.
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