sexta-feira, 3 de junho de 2011

Se essa rua fosse minha

Em São Paulo, algumas ruas têm uma atividade tão característica que acabam se tornando referência, como se fossem "ruas temáticas", como a Santa Ifigênia, a 25 de Março, a Teodoro Sampaio.
Ainda não aconteceu, mas eu imagino como seria uma "rua temática" cuja característica fosse a religião. Na praça central, uma imensa igreja católica, com centenas de membros, a maioria católico nominal. Ao longo da rua, de um lado e de outro da calçada, se espalhariam as demais denominações do Cristianismo. Nas partes com moradores com nível de instrução maior e melhor situação financeira estariam as chamadas "religiões alternativas".
Ainda não está tão escancarado, mas tal como as demais "ruas temáticas", aqui religião e comércio seriam a mesma coisa. Cada qual tentando chamar mais clientela. Isso seria uma boa forma de entender como é possível que "religiosos" tenham defendido na Argentina a legalização do aborto. Ou então que igrejas tenham assinado um documento na Holanda contra a homofobia.
Daqui de minha lojinha, enquanto disputo clientes com os primos e os brimos, eu tento entender a polêmica que a famigerada IBWB causou na comunidade pagã brasileira ao criticarem a Globo por esta não ter dado espaço para a "religião da bruxaria" no programa "Sagrado". Opa, para tudo. Primeiro, a Bruxaria está mais para uma prática do que para uma religião. Segundo, a IBWB não é, nem de perto, a representante mais adequada da comunidade pagã brasileira. Terceiro, o programa é da Globo e cabe à empresa definir o conteúdo de seus programas. Na seqüência, vem a União Wicca [outra organização pagã] pedindo "explicações" por essa exclusão da religião Wicca do programa e a resposta não poderia ter sido mais clara. Até aí, nada de mais, certo? Errado. Pagãos, bruxos e wiccanos não passaram procuração alguma nem à IBWB, nem à União Wicca, nem ao Conselho de Bruxaria Tradicional para serem os representantes ou porta-vozes da comunidade pagã brasileira. Além da questão que, por princípio, condenamos o proselitismo. Temos diversos grupos, organizações e pessoas que estão divulgando e esclarecendo à opinião pública, então não cabe a nenhum grupo, organização ou pessoa em especial chamar a si a incumbência de nos representar.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

O berço da religião

Nós costumávamos pensar que a agricultura deu origem às cidades e depois à escrita, arte e religião. Agora o templo mais antigo sugere a importância de elogiarmos o surgimento da civilização.

Por Charles C. Mann.
Fotografia de Vincent J. Musi.

Desde antes e agora o surgimento da civilização é reencenada em uma colina remota no sul da Turquia.

Diante dos turistas estão dúzias de pilares de pedra arranjados em um formato de anel, um apertado contra o outro. Conhecido como Göbekli Tepe, o sítio é uma vaga lembrança de Stonehenge, exceto que Göbekli Tepe foi construído muito antes e não foi feito de blocos de pedra rústicos, mas de pilares de pedra esculpidos com baixos-relevo de animais. Verdadeiramente, Göbekli Tepe é o exemplo de arquitetura monumental mais velha conhecida. Quando estes pilares foram erigidos, pelo que sabemos, nada nessa escala existia no mundo.

No tempo da construção de Göbekli Tepe a raça humana vivia em pequenos bandos nômades que sobreviviam de coleta de frutos e da caça de animais. A construção do local teria requerido mais pessoas juntas em um lugar do que havia antes. Surpreendentemente, os contrutores do templo foram capazes de cortar, formar e transportar pedras de 16 toneladas por centenas de pés [medida de distância usada nos EUA e Grâ-Bretanha-NT] a despeito de não terem rodas ou animais de carga. Os peregrinos que vieram a Göbekli Tepe viviam em um mundo sem escrita, metal ou cerâmica; aos que se aproximavam do templo de baixo, seus pilares deveriam parecer como rígidos gigantes, os animais nas pedras brilhando pelas fogueiras - emissários de um mundo espiritual que a mente humana pode ter começado a presenciar.

Arqueologistas ainda estão escavando Göbekli Tepe e debatendo seu significado. O que eles sabem é que este sítio é o mais significante em uma torrente de achados inesperados que sobreporam idéias anteriores sobre o passado oculto de nossa espécie. Há não menos de 20 anos atrás a maior parte dos pesquisadores achavam que conheciam o tempo, espaço e a sequência rústica da Revolução Neolítica - a transição crítica que resultou no nascimento da agricultura e dali para sociedades tecnologicamente sofisticadas. Mas em anos recentes múltiplas descobertas novas, Göbekli Tepe entre elas, começaram a forçar os arqueologistas a reconsiderar.

A nova descoberta sugere que a revolução foi na verdade desenvolvida por muitas mãos ao longo de uma enorme área e por milhares de anos. E pode ter sido desenvolvida não pelo ambiente mas por absolutamente outra coisa.

Göbekli Tepe pode ser o primeiro centro espiritual, o início de um padrão. O que sugere, ao menos aos arqueologistas, é que o senso humano do sagrado - e o amor humano a um bom espetáculo - pode ter dado início à civilização em si mesma.

A construção de um templo masssivo por um grupo de coletores é evidência que a religião organizada pode ter vindo antes do aparecimento da agricultura e outros aspectos da civilização. Há a sugestão que o impulso humano de se reunir para rituais sagrados apareceu quando os humanos deixaram de se verem como parte do mundo natural para se verem como senhores dele.
Fonte: National Geo    graphic [com uma pequena edição]

As Maias e os Maios

Ernesto Veiga de Oliveira descreve com rigor esse costume do povo português que tem algumas nuances regionais.

Segundo ele, o 1º de Maio é o Dia das Maias e comemora-se em Portugal, de um modo geral, pela oposição das «Maias», ou seja, de giestas ou flores, sob diversas formas, em portas e janelas e noutros locais. Ao contrário de outras regiões, em Trás-os-Montes surge ao lado de outras práticas, que são independentes mas de significações convergentes.

Na faixa ocidental atlântica do País, não existe qualquer prática alimentar associada. Mas em Trás-os-Montes e nas Beiras as «Maias» estão associadas às castanhas, que muita gente guarda de propósito para esta data. Segundo Jorge Lage, no 1º de Maio devem-se comer castanhas. Caso contrário, ao passar-se por um burro, este atira-se à pessoa e morde-a Diz o ditado «quem não come castanhas no 1º de Maio, monta-o o burro». Isto porque Maio é o mês dos burros, como afirma o povo. O uso de comer castanhas secas em Maio, terá a ver com a tradição muito antiga de no 1º dia o chefe de família ir à fonte e esconjurar ou afastar com favas pretas os espíritos (o «Maio») da sua família. Daí a expressão «Vai à feira e traz-me as maias (as castanhas piladas)».

De um modo geral, o cenário das várias celebrações cíclicas compreende cerimónias de véspera. A colocação de giestas faz-se no dia 30 de Abril para que as casas estejam floridas no momento em que começa o dia, para o «Maio», o «Carrapato» ou o «Burro» não entrarem. O «Maio» ou o «Burro» são entidades nocivas, cujo malefício se pretende conjurar com ma oposição de flores ou a manducação de certas espécies.

Em Trás-os-Montes, além de se enfeitarem as portas das casas com flores de giestas, as raparigas adornam um menino que dizem repre­sentar o "Maio-Moço" e passeiam-no pelas ruas com grande ruído alegre, cantando e bailando em volta dele.

A origem da tradição das Maias perde-se no tempo e pode ter várias explicações. Segundo alguns, a Maia era uma boneca de palha de centeio, em torno do qual havia danças toda a noite do primeiro dia de Maio. Por vezes, podia ser também uma menina de vestido branco coroada com flores, sentada num trono florido e venerada, todo o dia, com danças e cantares. Esta festa, de reminiscências pagãs, foi proibida várias vezes, como aconteceu em Lisboa no ano de 1402, por Carta Régia de 14 de Agosto, onde se determinava aos Juízes e à Câmara "que impusessem as maiores penalidades a quem cantasse Maias ou Janeiras e outras coisas contra a lei de Deus...". Ainda segundo outros, o nome do mês de Maio terá tido origem em Maia, mãe de Mercúrio, e a ele está ligado o costume de enfeitar as janelas com flores amarelas.

Seja como for, todos estes rituais pagãos estavam ligados ao rito da fertilidade para com o novo ciclo da natureza, à celebração da Primavera ou ao início de um novo ano agrícola. Mais tarde, houve necessidade de lhe incutir algum sentido religioso, promovendo a sua ligação à Festa da Santa Cruz ou ao Corpo de Deus. Esse facto pode justificar a lenda do Alto Minho, segundo a qual Herodes soube que a Sagrada Família, na sua fuga para o Egipto, pernoitaria numa certa aldeia. Para garantir que conseguiria eliminar o Menino Jesus, Herodes dispunha-se a mandar matar todas as crianças. Perante a possibilidade de um tão significativo morticínio, foi informado, por um outro "Judas", que tal poderia ser evitado, bastando para isso, que ele próprio colocasse um ramo de giesta florida na casa onde se encontrava a Sagrada Família, constituindo um sinal para que os soldados a procurassem e consumassem o crime... A proposta do "Judas" foi aceite e Herodes tratou de mandar os seus soldados à procura da tal casa. Qual não foi o espanto dos soldados quando, na manhã seguinte, encontraram todas as casas da aldeia com ramos de giesta florida à porta, gorando-se, assim, a possibilidade do Menino Jesus, ser morto.

Talvez resultado desta lenda, hoje em dia ainda é possível observar em algumas zonas do nosso país, a colocação de ramos de giestas em flor, ou até mesmo coroas feitas de ramos de giestas, conjuntamente com outras flores e enfeites coloridos, nas portas e janelas das casas ou nos automóveis, na noite de 30 de Abril para 1 de Maio.

Nos variados aspectos, por vezes tão distintos, das celebrações do 1º de Maio, ter-se-ia pois operado um sincretismo de práticas e crenças, talvez de origens diferentes mas todas convergentes, recobrindo a obscura ideia, que subsiste no espírito do Homem, da necessidade de desencadear formas efectivas de protecção e de esconjuro a opor à insegurança da vida e à omnipresente ameaça do mal.

domingo, 29 de maio de 2011

A Deusa das Bruxas

Eu encomendei e li da Amazon o livro do casal Farrar entitulado "The Witches' Goddess". Traduzindo para o português: A Deusa das Bruxas. Este livro pode ser entendido como uma continuação do livro "O Deus dos Magos", livro que eu comentei no tópico "Faces do Deus".
Este livro segue a mesma linha de muitos outros livros do casal Farrar e de tantos outros autores de e sobre Paganismo/Bruxaria/Wicca. Contém pensamentos e reflexões interessantes, aos que souberem ler. Eu pessoalmente discordo dessa idéia que haja uma Deusa, única, multiforme e multiadorada. Nem todas as bruxas tinham um culto a um Deus ou Deusa. Eu não concordo com as teorias de Marija Gimbutas e as visões de Dion Fortune.
Mas como no livro anterior, eu aproveitarei a lista das faces da Deusa, conforme descrito em sumário, a partir do livro da casal Farrar.
A Deusa Terra.
Os autores usam a "Hipótese Gaia" para abordar este aspecto da Deusa. Em outro texto eu contestei as famosas "Vênus de Willendorf" então, em resumo, estas estátuas são uma representação da fertilidade e a mulher é a manifestação humanizada mais clara dessa fertilidade, não que ali esteja representada uma Deusa nem que isto necessáriamente servia a algum tipo de culto. Os autores, felizmente, citam o hiero gamos, algo que faz parte dos cultos antigos e que exige a presença de um Deus/sacerdote. Os autores lembram que a Deusa, embora seja mãe, também é justa e vai agir com rigor, algo bem diferente da concepção da "mãe amorosa e compassiva" tão propagada.
A Mãe Branca e Negra.
Os autores abordam a face da Deusa como o ventre e a tumba de todos nós. Explicam a importância da polaridade, um conceito sagrado que é parte fundamental de nossa crença. Eles desenvolvem um painel contendo um desenvolvimento desse aspecto da Deusa, em quatro manifestações: mistérios da inspiração, mistérios da vegetação, mistérios da intoxicação e mistérios da regeneração.
A Deusa Menstrual.
Os autores abordam um aspecto pouco falado da Deusa: assim como a mulher, ela menstrua. Não é um mero acaso que Ela é simbolizada pela lua e segue um ciclo lunar. Os Assírios observavam esse ciclo com cerimônias semanais [dias 7,14, 21] chamados de sabbatu [de onde vem o nome sabbath].
A Deusa Tripla.
Certamente o aspecto mais falado e discutido na nossa comunidade. A Deusa se manifesta em três aspectos: dama, mãe e anciã. Os autores explicam estas manifestações.
A Deusa Lunar.
Esta manifestação da Deusa está ligado aos seus outros aspectos, sua face triforme, sua face negra, sua face menstrual. O dado a acrescentar é o fato de que muitos calendários sejam baseados nos ciclos lunares, como os Judeus e Muçulmanos fazem.
A Deusa Mãe.
Este é, definitivamente, o aspecto da Deusa mais explorado nos discursos de sacerdotes locais, muitas vezes omitindo os outros aspectos da Deusa, ou pior, omitindo a importância do Deus. Os autores dão uma margem para a interpretação de personagens míticos cristãos como sendo aspectos arquetípicos da Deusa. Eu discordo dessa interpretação e releitura.
A Deusa Arquétipa.
Os autores explicam de que forma a Deusa pode ser compreendida pelo uso das imagens arquétipas, tal como Carl Jung lançou este estudo na psicanálise. Os autores usam os termos "forma de pensamento" e "inconsciente coletivo" da mesma forma. Introduzem os conceitos "anima"/"animus", "Ying/Yiang" dentro dessa concepção. Além das contestações que eu escrevi anteriormente contra essa releitura arquetípica da Deusa [ou dos Deus], indico o texto que eu citei de Walter Otto, em "O Espírito da religião dos Gregos Antigos", em especial os ítens "interpretação equivocada" e "o equívoco do arquétipo".
A Mulher como Deusa. [E vice-versa]
O tema encerra os temas anteriores, pois a mulher é uma manifestação da Deusa. Ela é, por sua natureza, sua sacerdotisa e seu templo. Em suma, tudo aquilo que a mulher faz e gosta, a Deusa faz e gosta. Toda sua intuição, sensibilidade, sensualidade, feminilidade, sexualidade, são aspectos sagrados dela e da Deusa. Vivenciar diariamente isto é uma vivência sacerdotal, é um caminho espiritual, é uma celebração da divindade. Então, mulher, seja como deve ser, feminina, sensual, sexual, ame, transe, cure e salve a humanidade.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

O medo e o lobo

Há um ditado na web que diz que debater na Internet é como disputar as paraolimpíadas, mesmo se você vencer, ainda é retardado. Considerando o nível dos comentários que recebo aos meus textos e críticas, especialmente de Cristãos, esta é uma triste realidade.
Mas a Internet está aí, como o melhor e o pior em comunicação de e das massas, (des)servindo para a informação do público. Ela forma um "especialista" em um assunto a cada dia. Mesmo o elitista conhecimento acadêmico está ao alcance de todos e todos dão seu pitaco sobre tudo, mesmo que ninguém lhes tenha perguntado.
Eu não estranhei nem me incomodei quando saiu um trecho da entrevista do astrofísico Stephen Hawking, onde ele afirma que "a crença de que o céu ou uma vida após a morte nos aguarda é um conto de fadas para as pessoas que têm medo da morte". Eu passei por isso, eu sei bem por que cientistas, sejam agnósticos [como no caso do sr Hawking] ou ateus, tem tanta necessidade de rejeitar, negar ou criticar as doutrinas religiosas.
Os Cristãos protestaram, dizendo que o sr Hawking não pode falar nada por não ser um estudioso ou especialista no assunto. Para ser justo, os Cristãos também não são estudiosos ou especialistas em ciência [história, antropologia, lei, justiça], mas não tem vergonha ou prurido algum em divulgar seus monólogos pseudocientíficos para sustentarem as suas crenças pessoais ou as doutrinas da Igreja.
Parece um caso invertido do menino que grita "lobo" sem que houvesse algum. Nega-se o além para se negar o medo. Mas se não há o "lobo", não há medo para ser negado. Nega-se o além talvez por medo de se ter que responder por atos ou omissões ou talvez com receio de ter que passar por mais sofrimentos.
O sr Hawking, sendo astrofísico, deve saber que inúmeras estrelas nascem e morrem incessantemente no universo e o processo não se esgota por que o material, o elemento que compõe as estrelas não se desgasta nem se extingue. O mesmo acontece com as almas, muitas nascem e morrem incessantemente, sem que o processo se esgote, por que o material, o elemento que as compõe não se desgasta nem se extingue.
Todos os dias, depois do trabalho, tudo que as pessoas querem é dormir, ninguém fica criando ansiedade e expectativa se vai haver o dia seguinte por que se sabe que haverá um dia seguinte.
Para nós, isso é bem mais simples, "natural", sem depender de obra, de crença, de caridade.
Para um pagão, bruxo e wiccano, não se crê, se sabe que há a reencarnação. A vida continua, o que morre é o corpo. Nós vemos as evidências bem debaixo do nosso nariz, no mundo, na natureza.
Algo para nós refletirmos: a "vida no além" é aqui e agora. Nós podemos viver no Paraíso, nós podemos viver no Inferno. Cabe a nós escolhermos.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

A Lei Natural de Eros

Debates constantes a respeito do natural e do pervertido estão aparecendo. Homossexualidade e práticas sexuais "incomuns" de qualquer variedade são frequentemente trazidos à atenção porque aqui, no mundo do sexo, todo homem e toda mulher encontram suas inclinações mais puras e suas trevas mais brutas. A escala nestes debates estão entre a inclinação carnal pessoal enquanto são mediadas sobre uma moral universalista, insistindo que todos nós temos as mesmas inclinações carnais – e aqueles que fogem à regra são pervertidos - ou pior. Estes discursos morais são quase sempre ditados por motivos religiosos propagando uma curiosa escala entre liberdade do pecado e vergonha da inclinação de uma pessoa. Nesse clima de que "uma moral serve para todos" naturalmente surge a resistência.
Os debates que vimos hoje em dia estão baseados no século 11 [EC] e o debate eclesiástico sobre a Lei Natural [ou a "Lei de Deus" - NT] – aqui encontramos [São] Tomás de Aquimo, que nos contou para olhar para a natureza para vermos o que é natural, pois ele não considerava que o sexo fosse sagrado – mas algo que humanos compartilhavam com outros animais.
No Livro Dois de sua Suma, Tomás discute o assunto da Lei. Dada a orientação platônica e a influência muçulmana, Tomás escreveu pelo que nós podemos assumir que ele, ao escrever da Lei Divina, não estava falando da sharia, mas da essência do Islã em si mesmo – submeter-se à Lei Divina, como Abdullah, um servo de Deus. Esta idéia certamente abrange a doutrina do destino e como nós todos nascemos com uma condição única que permite um caminho [lei] único para obter a bondade em nossas vidas. Ser um servo de Deus compreende que nós descobrimos a lei única que nos conduz para a abundância como uma extensão da Lei Divina. Como espelhos de Deus nós, como humanos, também refletimos todas as Suas possibilidades em seus belos 99 nomes. Então há, portanto, uma distinção entre a Lei escrita e a Lei natural.
A distinção entre a Lei escrita e a Lei natural é também encarnada na Cristandade, nos Evangelhos, falando da missão de Cristo. O que está claro é que Cristo viu-se como profeta da lei eterna escrita no coração de cada um e de todos. Nós encontramos aqui a divisão da Lei como uma série de regras de condutas sem razão. A mensagem parece ser que seguindo a lei escrita não se pode errar, a Lei transformada em uma série de regras não necessita de razão para trazer a salvação. A lei eterna escrita em nossos corações segue um dinamismo que precisa de nós sermos conscientes quanto nossas ações e motivações. Infelizmente a consciência está sendo gradualmente substituída por interpretações temporárias e morais governando o momento socio-espacial.
Tomás de Aquino discutiu em sua Suma a lei escrita no coração dos homens. Esta é Lei que, acima do tempo, tem sido reinterpretada em uma luz moral e dado apoio à doutrina eclesiástica a respeito do pecado e sexualidade como conheçemos hoje no ocidente moderno. Tomás, por outro lado, foi acusado de ser ingênuo por teólogos posteriores. Bem, sua ingenuidade é a mesma que encontramos na tasawwuf (Sufismo), Advaita Vedanta e diversas fontes de conhecimento místico.
No artigo 3 do segundo livro, Tomás discute a lei como uma forma de medida racional e vê a Lei eterna como algo onde nós temos uma participação única. Imediatamente ele sugere que a capacidade de tentação é uma consequência da natureza da Lei em si mesma, portanto natural.
Estes comentários são similares aos que encontramos no Bhagavad Gita quando o texto discute a lei, isto é, dharma e karma. A Lei é o tema ao que se quer fazer – se o trabalho mudar, muda as regras da conduta. A Lei dá uma interpretação diferente do que é legal e bom. Falando simplesmente, um soldado tem a obrigação de matar – a lei pela qual ele vive enquanto um mercador vive de acordo com outras regras que valorizam outros atos como bons. Tudo é relativo - e falamos de papéis sociais. A nuance fica evidentemente mais rica quando nós medimos a Lei como a medida da natureza de uma substância como a encontramos em uma pessoa. O que Tomás tentou dizer é que existem algumas regras de conduta que são universalmente boas enquanto elas refletirem nossa divindade. Estas são todas qualidades que marcam uma pessoa como tendo um bom caráter, brotando do próprio Amor.
O que faz a diferença entre o animal humano e outros animais é a presença da consciência. Mas isto é algo que é desenvolvido e não automaticamente adquirido. Com o advento da razão vem uma habilidade maior de discernimento. Até que a razão esteja desenvolvida, o homem é uma fera dominada pelos impulsos carnais, como animal humano ele é governado pela lei natural que qualquer outro animal que age por suas inclinações e necessidades. Com a razão, as inclinações tomam forma e tornam-se expressões profundas de nosso dharma tal como este é. Aqueles que exercitam as inclinações naturais do prazer são verdadeiros para si mesmos – enquanto os que condenam com a tocha da reprovação revelam que são vítimas da propaganda da culpa. Através disto, eles se negam a si mesmos.
Esta distinção que Tomás faz entre os impulsos carnais e a extensão da Lei divina quando esta toma forma na razão é interessante. Pode ser interpretado que as inclinações carnais não são algo submetidas à Lei divina – mas pelo envolvimento natural da natureza do indivíduo, quando agimos por nossa natureza, como uma besta, desprovido de razão – podemos dizer que a Lei divina tem precedência de alguma forma exceto em dar uma forma às inclinações carnais mediadas por um coração?
A razão pode nos ajudar em entender nossas inclinaçoes carnais; pode ser um rei sereno que dá sentido às nossas inclinações naturais e através disto abrir as rotas para o eterno. Esta possibilidade está aberta, não por negar as inclinações – mas permitindo-lhes serem mediadas pela razão e uma sensibilidade pela harmonia natural.
Nós podemos resumir que nossas inclinações carnais, em toda suas ricas variações, enquanto trazem bondade – é simplesmente – uma coisa natural que conjurada com a razão pode trazer bondade e abundância. O assunto não deve confundir os planos como muitos críticos da moral fazem quando dizem que toda criação de Deus é uniforme e singular - uma criatura das massas.
Nisto, a sabedoria de Eros pode brotar e revelar a grandeza criativa do Criador!
Autor: Nicholaj Frisvold
Tradução: Tio Beto
Fonte: The Starry Cave [Speculum Celestae]

terça-feira, 3 de maio de 2011

Eslováquia mantêm tradições pagãs

Vinte anos após o fim do comunismo, a Páscoa na Eslováquia é celebrada entre as tradições do cristianismo, incluindo tradicionais receitas culinárias, e os costumes pagãos alusivos à fertilidade. Alimentos como ovos cozidos, presunto cozido com sal, bolo com requeijão, pãezinhos com aipo, pasta de batata com queijo de ovelha, purê de arroz com manteiga e sorgo fazem parte do receituário tradicional das celebrações da Páscoa eslovaca.
Alguns são consumidos durante os dias de abstinência, já que com exceção da Quinta-Feira Santa, muitos católicos do país centro-europeu cumprem esse preceito religioso e não comem carne até o Domingo da Ressurreição.
Também se destacam as decorações das casas, que dão entrada a elementos da natureza - galhos e brotos de videira verdes e ovos ornamentais pintados à mão - quando esta recupera vigor com a chegada da primavera, que também fala da vida e é considerada símbolo da ressurreição. "Espero ansiosamente pelo presunto com sal, feito em casa da forma tradicional", disse Cyril Hamrak, capelão da Igreja de Santa Catarina de Alexandria, em Dolny Kubin, no norte do país.
O clérigo lembrou que é forte o costume de apresentar estes alimentos caseiros para serem benzidos no final da vigília de Páscoa ou durante a missa do Domingo da Ressurreição.
Entre os costumes pagãs mais difundidos, e que são festejados principalmente durante a segunda-feira de Páscoa, destaca-se o de jogar água fria - em pequena quantidade - sobre mulheres jovens. "Esse costume é para desejar que sejam bonitas e sadias. Os antigos eslavos o faziam para adorar divindades da floresta", afirmou o pastor evangélico Rastislav Stancek.
Além da água, em alguns lugares as moças recebiam leves golpes com varas de salgueiro como forma de desejar sorte, e em troca deveriam entregar um presente, como um pedaço de bolo. "Depois que os homens derramavam água sobre as meninas solteiras, elas os presenteavam com um ovo cozido, que é um símbolo pagão da fertilidade", explicou Stancek.
Também era costume enterrar nos campos as cascas dos ovos de Páscoa, para que fossem mais férteis. "Isso estava ligado à tradição que existia nas zonas agrícolas, onde antes de arar se rezava", lembrou também o pastor.