domingo, 24 de outubro de 2010

A privatização dos direitos

Na reta final das eleições presidenciais, eu [e os brasileiros] tenho visto o pior exemplo da concorrência política, este ano eleitoral ganhou em baixaria do ano eleitoral quando houve a competição entre Collor e Lula.
Daquela época ainda se comenta do "tapetão" promovido pela Globo. Até aí, foi apenas a Globo e seus "associados".
Passamos ao ano eleitoral atual, onde vemos os costumeiros dossiês e quebras de sigilo ilegais. Mas isso foi café-com-leite com o "tapetão" que os setores radicais e fundamentalistas [da Igreja e dos Evangélicos] estão armando e ambos os candidatos estão engolindo a isca, com acordos para evitar a legalização da união homossexual, a garantia de liberdade religiosa [de toda forma de crença, sem monopólios ou privilégios] e propostas que visem um tratamento mais humanitário à questão [que deve ser médica e racional] do recurso clínico do aborto.
Quem está acompanhando esse BBB/novela eleitoral deve ter visto a recente polêmica resultante da apreensão de folhetos/panfletos/documentos, supostamente de autoria da Regional Sul, praticamente tentanto induzir na decisão dos brasileiros para o segundo turno.
Primeiro, lançou-se a suspeita de que a gráfica teria vínculos com o PSDB, porque um de seus sócios é membro do partido. Discutível, uma vez que a gráfica também imprimiu propaganda do PT.
Depois se suspeitou de que havia outros interesses escondidos, uma vez que um dos possiveis colaboradores da fatura da impressão desse folheto está ligado à instituição Theotokos, uma instituição ligada à Plinio Salgado [fundador do Integralismo] e à TFP [Tradição, Família e Propriedade]. Esse vínculo está mais evidenciado, considerando que o bispo que "assinou" o folheto, em contraste com a versão oficial [oficiosa?] da CNBB, é considerado ultraconservador. Ou seja, quem jogou o aborto [ou o feto] na campanha eleitoral foi o PSDB/Igreja, não o PT.
No Blas Fêmeas [extinto] eu detalhei melhor esse jogo sujo. Então vamos ao furdúncio que se seguiu:
De um lado a CNBB tratou de declarar que não patrocinava a impressão ou divulgação do folheto/panfleto/documento.
De outro lado, o bispo solicitou a devolução dos folhetos/panfletos/documentos, declarando que era um documento "legítimo" da Igreja.
Na terceira coluna, vem os Católicos [e outros acólitos da Igreja] clamando contra a "censura" e a "ditadura", em defesa do "direito de liberdade de expressão, de opinião e crença" da Igreja [e dos Católicos].
A questão não é garantir o "direito" da Igreja [ou dos Católicos], o "direito" inerente a esta instituição está condicionado ao respeito dos direitos garantidos a todos, não apenas à Igreja. Quando a Igreja, ou um bispo, abusa de seu "direito" de liberdade de expressão e de opinão para tentar influenciar a escolha dos brasileiros de escolher, isto é crime eleitoral. Quando a Igreja, ou um bispo, se vale de sua influência ou autoridade na sociedade brasileira para fazer proselitismo de suas doutrinas, isto é a verdadeira censura e ditadura, pois se está calando o direito de se ter uma visão e uma opinião diferente. Quando a Igreja, ou um bispo, se escondem debaixo da defesa dos "direitos", não reconhecendo estes mesmos direitos aos demais, isto é a privatização dos direitos, é a imposição de uma opinião, de uma doutrina, isto é totalitarismo, é autocracia, é ditadura clerical.
Aproveito um texto meu: O que se tenta ocultar do público nessa pretensa "defesa dos direitos" é que esta visão é religiosa e doutrinária, ofendendo e não reconhecendo [...] os mesmos direitos que dizem defender. O discurso [...] dos cristãos fundamentalistas sequer pode ser entitulado de "opinião", mas sim de sentença arbitrária, baseada em uma doutrina religiosa arrogante e prepotente, que se arroga uma verdade sagrada e/ou divina. Nem se trata de "garantir os direitos de expressão/opinião/crença", mas de garantir e resguardar o totalitarismo arbitrário dessa visão religiosa e doutrinária, tentando censurar ou denegrir as opiniões contrárias que contestem ou desafiem esse totalitarismo.
Aproveito também uma citação tirada do caso Ellwanger: [...]a garantia constitucional da liberdade de expressão não é absoluta, tem limites jurídicos e não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações que implicam ilicitude penal. No caso concreto, explicita o acórdão: "O preceito fundamental da liberdade de expressão não consagra o "direito à incitação ao racismo" [ou da incitação eleitoral, no caso-nb], dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica".
Reitero meu aviso e alerta: Não se enganem com estas estratégias desonestas, a Igreja não faz esta campanha em prol dos "direitos" desses "bebês inocentes" (um feto não é um bebê, nem é uma pessoa), mas para manter seu poder e influência na sociedade. A Igreja se coloca como defensora do casamento, da família, da vida e dos valores sociais, não porque esta é bondosa, mas por razões corporativas.

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