sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

Falando do Catar

Autora: Laura Menezes Feitosa.

Domingo (20) se deu início a Copa do Mundo sediada no Catar, país de monarquia absoluta constitucional dos emirados árabes. Quando se tornou público as proibições que o país decretou para os visitantes que fossem assistir aos jogos, as redes sociais se tornaram palco de incontáveis reclamações contra a governo, pessoas de todos os lugares do Brasil manifestando repúdio às leis que foram impostas e as que já eram efetivas no país, dentre elas, com grande foco, a criminalização da homoafetividade.

É curioso assistir ao show de empatia que foi feito pelos brasileiros e pensar em como isso se relaciona de maneira avessa às escolhas políticas do nosso próprio governo. O que se teve de informação sobre a forma de governo catarense, não se difere muito das ideologias e vontades que o presidente Bolsonaro tinha em seu plano de governo, sendo a religião quem como viés de controle do estado, não possui a existência de STF, as mulheres são inferiores aos homens, e os homossexuais são uma minoria esquecida e sufocada. Será que os bolsonaristas que criticaram o local de sede da Copa do Mundo se deram conta de que aquilo que estavam a falar mal era um espelho do possível futuro do Brasil de Bolsonaro que defendiam? Nesse sentido, não me refiro à extrema direita, em razão de que esse grupo nunca demonstrou desconforto com as violações dos direitos humanos nem mesmo no próprio país, pelo contrário, são o grupo de incentivo.

Na obra “A revolução dos bichos” de 1945 escrita pelo indiano George Orwell, vemos o cenário de insatisfação dos bichos de uma granja que desejam a construção de uma sociedade mais harmônica onde vivem, elaboram regras e organizam uma rebelião contra o dono da granja, o Senhor Jones. Entre conflitos com os porcos líderes da rebelião, os animais da granja acabam por cair na manipulação do porco Napoleão, que é extremamente autoritário e faz com que os animais trabalhem como escravos, em uma situação muito pior da que viviam com o Sr. Jones. Pode-se imaginar a situação do Brasil nesse mesmo cenário, o povo brasileiro em grande conjunto criticando um governo de outro país, enquanto em seu próprio território reverenciavam um governante com as mesmas ideais, construindo a ideia de um salvador inexistente que representaria o “mal menor”.

Nos dias seguintes ao resultado do segundo turno das eleições 2022, vimos as BRs serem fechadas por manifestantes de direita em protesto contra a reeleição do candidato Lula, pessoas se declarando contra a democracia, atentando ao direito de ir e vir, e pedindo por uma intervenção militar. Talvez tenham se esquecido (ou não sabem de forma alguma) que a liberdade de expressão foi reconquistada após a redemocratização brasileira com o fim da ditadura militar, e que o povo hoje é tão livre que pode expor a opinião da forma e onde quiserem, resultando em absurdos como o clamor por um golpe. Com esses fatos, nota-se que o Catar seja um dos países ideais para aqueles que não são de acordo com as ideais canhotas do presidente eleito, já que muitos apoiadores de Bolsonaro declararam que sairiam do Brasil caso o mesmo não fosse reeleito, como já discutido, países autoritários são os que mais se assemelham com as ideias de direita.

Mas é necessário ressaltar que assim como os bichos do romance de Orwell, em alguns casos só se é dado conta de que aquilo que se era tão almejado não é o que se esperava quando é sentido na pele, quando a teoria sai do campo abstrato e vira realidade. Talvez o bolsonarismo para os bolsonaristas só seja a “sociedade ideal” por que não é realidade, e ainda bem que não é, pois para reverter a consolidação de um governo autoritário, é necessário muito mais do que paralisação de estradas, e o trauma em todos os âmbitos na sociedade é definitivo, irreparável e alienador.

Como se sabe, a livre interpretação dos fatos pode distorcer e tornar bom o ruim, corremos (ou vivemos) o risco de aflorar a síndrome de vira-lata dos brasileiros de direita e que esses achem oportuno justificar de que vale a pena viver em uma sociedade como o Catar, que utiliza de uma máscara de país próspero e põe holofotes em cima da economia progressiva, enquanto na verdade constrói muros para separar a realidade pobre da bolha que é conveniente mostrar para o mundo. Claro, na Copa do Mundo é constantemente lembrado que “somos um só” e que todas as nações são iguais, mas assim como dito por Orwell, “Os animais são todos iguais, mas uns são mais iguais que outros”.

Fonte: https://www.brasil247.com/blog/as-criticas-a-sede-da-copa-do-mundo-de-2022-e-os-ideais-bolsonaristas-vistos-no-governo-do-catar

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