segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Atualizada, bruxaria está na moda

Quem viveu os anos 1990 certamente se lembra do modismo dos anjos e gnomos que aconteceu no início da década. Na época, a loja esotérica Alemdalenda fazia o maior sucesso com o comércio de imagens, baralhos, livros de oráculos e até adesivos – o mais conhecido era um que trazia a frase “Consulte sempre uma bruxa”. Pois o esoterismo continua em alta. Desta vez, porém, o que está em voga é a bruxaria. Para se ter uma ideia, nos dias 13, 14 e 15 de agosto a cidade de Paranapiacaba (SP) sedia a 7ª edição da Convenção de Bruxas e Magos, evento que tem por objetivo divulgar conhecimentos diversos sobre bruxaria, magia, terapias holísticas, ocultismo, umbanda, mitologia, xamanismo, reiki, numerologia e astrologia, entre outros temas semelhantes, com peças teatrais, shows musicais, palestras e consultas. Em outubro, nos dias 9 e 10, a unidade Anália Franco da Universidade Cruzeiro do Sul, na capital paulista, será cenário da primeira edição brasileira da Mystic Fair. A feira é inspirada na Magic International que acontece anualmente em Barcelona, Espanha, há mais de 25 anos, com a proposta de divulgar conhecimentos espirituais alternativos ao grande público.
Mas quem são as pessoas que, atualmente, não só se interessam por temas místicos como se autointitulam bruxos? E quais são as razões que as motivam a buscar conhecimentos sobre magia? Uma das razões possíveis é a disseminação na Wicca, sistema religioso pagão de culto à Grande Deusa (sim, uma crença a uma figura feminina), divulgado pelo britânico Gerald Garnder (1884-1964), a partir da década de 1930. O tema tem ganhado força desde o fim dos anos 1990. Tanto que, em 1998, foi fundada a Associação Brasileira da Arte e Filosofia da Religião Wicca (Abrawicca), presidida pela bruxa e sacerdotisa Márcia Maria Bianchi Prates, cujo nome pagão é Mavesper Cy Ceridwen (a tradição prega que seus seguidores escolham um).
Bruxas modernas
Esqueça a tradicional imagem de uma velhinha com verruga no nariz, chapéu e vassoura voadora preparando poções mágicas em seu caldeirão para prejudicar alguém. Márcia explica que os preceitos principais das bruxas modernas são preservar e amar a natureza, abominar todo e qualquer tipo de discriminação e se colocarem como irmãs de todos os seres viventes e de toda matéria. “Além disso, nós vivemos cada momento do dia buscando o equilíbrio, seja pessoal, seja social, seja do meio ambiente, seja coletivo”, conta Mavesper, que mora com sua família desde 2006 na Chácara Templo da Deusa, em Brasília (DF). “Além de sediar a Abrawicca atualmente, o espaço foi concebido para ser um centro de treinamento e vivências sacerdotais. É um lugar de retiro, busca de contato com os deuses antigos que cultuamos e um local de culto aberto. Já tivemos mais de 30 bruxos residentes por períodos diversos para treinamento, e fazemos três ou quatro eventos anuais que reúnem entre 50 e 200 pessoas em fins de semana. Também realizamos atendimentos de tarô e cura xamânica, entre outros; uma média de 100, por mês”, afirma.
Em São Paulo, na região do Grande ABC, faz sucesso a Universidade Livre Holística Casa de Bruxa, em Santo André. Idealizado pela bruxa e teóloga Tânia Gori, o local oferece cursos sobre bruxaria natural, realiza atendimentos e conta com uma loja e uma biblioteca. “Gosto de dizer que a Casa de Bruxa é uma escola que ensina, sobretudo, como a energia do universo atua em cada ser humano”, salienta Tânia Gori, que é fundadora da filosofia da bruxaria natural no Brasil e membro da federação de Celtic Reiki, na Irlanda. “A iniciativa de fundar a Casa da Bruxa surgiu da necessidade de passar esses conhecimentos para as pessoas. Hoje formamos turmas de terapeutas holísticos com 25 alunos em média e atualmente oferecemos programações – cursos rápidos, palestras – sobre cerca de 150 temas relacionados à área. E temos por mês a visitação de 5 mil pessoas, sendo que desse perfil 90% são mulheres”, destaca.
Motivos
O sexto sentido, a vontade de se conhecer melhor e o altruísmo são alguns dos motivos de as mulheres constituírem o maior contingente de pessoas entre os novos admiradores da magia e do ocultismo. Um bom exemplo é a auxiliar contábil Raquel Morello, 32 anos, de São Paulo. “Desde a minha infância tenho crenças um pouco diferentes dos demais. Minha família é católica, então fiz primeira comunhão e crisma, tudo que uma boa católica deve fazer. Mas nem assim meu interesse pela igreja, então aos poucos fui parando de freqüenta-la. A ideia de ser uma bruxa sempre me fascinou, e quando descobri que ser bruxa era acreditar em tudo em que eu ja acreditava, além de ver as coisas do mesmo modo em que eu já via, é que me fez ter certeza que este é o meu caminho”, explica. Para Raquel, ser bruxa é ter alma e o coração bondosos, ser honesta e sensível e fazer magia para o bem, ou seja, para purificar energias. Ela procura trocar conhecimentos sobre magia pela internet – mais precisamente pelo Orkut, onde existem inúmeras comunidades dedicadas à Wicca e temas afins. Usar a rede para trocar experiências, aliás, é outra característica dos bruxos modernos.
Apesar de as mulheres serem maioria, os homens também têm aderido ao tema. É o caso do publicitário Newton Souza, 30 anos, de São Paulo, que se formou em terapia holística pela Casa de Bruxa. “Hoje em dia sou um psicoterapeuta holístico e pesquisador das antigas tradições e os efeitos psicológicos que a religião exerce sobre as pessoas em seu dia a dia, pesquisador de Celtic Reiki (variação do Reiki tradicional Usui Tibetano), massoterapeuta, palestrante, consultor de runas e tarô e professor de assuntos holísticos”, diz. “Comecei a me interessar por este assunto quando eu tinha por volta de 10 a 11 anos de idade por meio dos cristais. Na bruxaria natural me encontrei por se tratar de uma filosofia e não uma religião, pois é aberto ao questionamento e você tira as provas por si só”, ressalta. Newton afirma que as práticas diárias de harmonização com os quatro elementos (fogo, ar, terra e água), por exemplo, lhe trouxeram muito mais equilíbrio, tranquilidade em perceber a vida e não apenas deixá-la passar despercebida, evitando “descontroles emocionais tão comuns nos dias de hoje”.
Banalização
Para Márcia Frazão, bruxa “das antigas” e autora de vários livros, a denominação “bruxa” ultimamente a tem incomodado. “De repente a palavra se tornou tão banalizada que acabou perdendo o seu real significado. Para mim (e para muitas mulheres mundo afora) ser bruxa significa estar em pleno equilíbrio com a sua condição feminina e com a natureza, coisa que nem sempre é fácil. Afinal, estar em equilíbrio com o feminino, liberta das milhões de exigências que são feitas para a mulher, é um caminho que envolve renúncia, ativismo, posicionamento sócio-político etc. E estar em equilíbrio com a natureza também envolve as mesmas coisas, como renunciar ao uso de microondas, celulares”, acredita. “Não tenho nada a ver com a Wicca e desde pequena fui criada, e me criei, para ser uma bruxa, ou seja, uma mulher em busca do equilíbrio com o seu feminino. Digo ‘em busca’ porque o equilíbrio não é estático, ele está sempre em movimento”, diz.
A grande procura por Wicca por parte dos adolescentes, segundo Márcia Frazão, se deve ao que chama “efeito Harry Potter”. Entre os praticantes de bruxaria há muita controvérsia – uns dizem seguir os preceitos antigos, antes de Gerald Gardner e sua Wicca; outros dizem que há banalização do assunto e que existem pessoas que acendem uma vela e fazem uma simpatia e já se dizem feiticeiras. Outros, no entanto, preferem se manter à margem de polêmicas e brigas, como Tânia Gori. “Acho que todos que trabalham com energia deveriam ser mais unidos. Cada um tem sua verdade e nenhuma verdade é totalmente verdade. Acredito que todas as formas de amor são válidas, assim com somos pessoas diferentes em nossas semelhanças, nossa fé, crença, política, religião e filosofia devem ser respeitadas. Não existe nenhum lugar com a verdade total, pois nem sabemos se a verdade total existe. Por isso sempre gosto de citar Sócrates: a cada dia, sei que nada sei”, conclui.
Fonte: UOL Estilo
Nota da casa: Nós, pagãos, bruxos e wiccanos detestamos essa tendência da Imprensa local em confundir e generalizar a Bruxaria como se fosse esoterismo ou qualquer outra bobagem comercializada.

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