Foi durante o século XII que se difundiu mais rapidamente a ideia do sabat, reunião nocturna das sextas-feiras, à qual compareciam as bruxas a voar nas suas vassouras, cavalgando nos seus bodes, ou mesmo transformadas sob a forma de pássaros.
A sexta-feira é 13. O seu nome sugere feitiçaria e, para muitos, a sua ocorrencia no calendário é prenúncio do azar. Toda a sexta-feira, entretanto, está associada à idéia do Sabat, como ficou conhecido na Idade Média o festim em que as bruxas reunidas se banqueteavam na presença do Demónio. Também às sextas, à luz da lua cheia, os amaldiçoados lobisomens se transformam, e os vampiros propalam-se em vôo sedento de sangue à procura das suas vítimas.
O 13 é o número da morte, do azar, do mau agouro, dizem alguns. Para outros, contradizendo, pode simbolizar a sorte por trazer em si as transformações, visto que o 13 representa o rompimento dos limites, a quebra dos padrões estatutários impostos pelo 12.
Expliquemos melhor. O 12 expressa as coisas inteiras, os sistemas fechados e completos. Observe-se que são 12 os meses do ano, as horas do dia e da noite; também o número de deuses do Olimpo e de constelações e signos do zodíaco; e 12 são as notas musicais, tons e semitons.
Já o 13 é aquele que ultrapassa a ordem conhecida das coisas.
Promove a revolução do novo, e intromete-se no nosso mundo de modo a perturbar a nossa aparente sensação de segurança, vinda da ordinária dimensão à qual estamos acostumados. Associado ao jogo, às vicissitudes da vida, igualmente à sorte e ao azar, o 13 ainda compõe o número de cartas de cada um dos 4 naipes dos baralhos comuns. E eram 12 os apóstolos presentes à última ceia de Cristo, de onde se criou a superstição medieval de que quando 13 se reúnem à mesa para comer, um em breve irá morrer.
Predicadas pelo estranho 13, as sextas-feiras, noites de sabat, impõem maior respeito ao imaginário popular ainda mais quando a noite for de lua cheia.
Na mitologia assírio-babilónica, data de mais de 8 mil anos a crença de que Isthar, a lua, se tornava indisposta a cada plenilúnio, quando então se observava o sabattu, período de recolhimento dos homens em respeito à Grande Deusa. Veja-se que provém da antiguidade mais remota o útil conselho dado aos maridos para que estes não provoquem as suas mulheres em fase pré-menstrual. Durante a indisposição de Isthar, guardava-se o sábado, que primitivamente era mensal, dia considerado nefasto, no qual não se autorizava qualquer tipo de trabalho, nem viajar ou cozinhar alimentos. Com a percepção de que Isthar apresentava fases cíclicas, crescente, cheia, minguante e nova, a cada 7 dias renovadas, a prática do sabattu estendeu-se a todas as semanas de modo a demarcar sempre o último dia da semana. Sábado, em português, vem do latim sabbatum, que, por sua vez foi emprestado do grego sábbaton. Este, seria proveniente do hebraico sahabbat, que, etimologicamente, deriva do verbo sabat (parar). Outras fontes extraem-no de seba (sete), ou tomam-no como derivando do termo sabi'at (sétimo dia). Tenhamos em conta ainda que o hebraico sabbat guarda enorme semelhança com sapatu, que em dialeto árcade primitivo significava "paragem, descanso", também "sono da lua". Nesse caso, o termo hebraico seria originário do grego, ao contrário da primeira hipótese.
Acredita-se que a Igreja, na sua obstinada caça às bruxas, tenha julgado conveniente escolher um nome da tradição judaica, especificamente aquele que denota o período de oração que se inicia ao pôr do sol das sextas-feiras, para nomear o conclave das feiticeiras. Agindo assim, transformaria judeus, bruxas e demais hereges, inimigos comuns da fé cristã, em gatos de um mesmo saco. Além disso, no início das perseguições, denominava-se "sinagoga" o local escondido nas florestas destinado à reunião das bruxas. Pesquisando mais profundamente encontramos o termo grego sabbathéos, literalmente "o sabá divino", relacionado com as sabátidas, festas dedicadas a Sabácio, divindade agrícola conhecida na Trácia e na Frígia, com atributos similares aos de Dionísio, ainda que não tão popularizada quanto este. As sabátidas já ocorriam anteriormente a Moisés e ao judaísmo; e ao seu deus eram consagrados o trigo e a cevada, da qual se fermentava uma bebida inebriante, servida aos presentes.
Foi durante o século XII que se difundiu mais rapidamente a ideia do sabat, reunião nocturna das sextas-feiras, à qual compareciam as bruxas voando nas suas vassouras, cavalgando nos seus bodes, ou mesmo transformadas em forma de pássaros. Para que pudessem voar, untavam os seus corpos com uma poção mágica por elas preparada; e na cerimônia, iniciada à meia-noite, entregavam-se a orgias e ao Demónio.
Qual a ligação desta festa com o sabat das feiticeiras? Entendamos a questão. A Igreja, já no ano de 360, no sínodo de Elvira, admitia a existência dos poderes mágicos, que seriam decorrentes de pactos com o demónio, e negava a comunhão, mesmo à hora da morte, para os que caíssem em tal tentação. Até ao século XI, a Santa Sé diferenciava os seres maléficos, devotados aos sortilégios, aos encantamentos por bonecos de cera, aos maus-olhados, das strigae, demónios femininos que sob a forma de pássaro se alimentavam de recém-nascidos. Strega, bruxa em italiano, deriva daí, e em português temos igualmente o termo estrige; ambos oriundos da raiz latina strix, a significar coruja, pássaro nocturno ou qualquer outra ave de rapina. Um século antes, o monge Regino de Prün dizia que voar à noite com a deusa Diana não podia ser algo real, senão mera ilusão provocada pelo Demónio. (...).
"O Sabat das Feiticeiras"
Por Paulo Urban
Publicado na Revista Planeta nº 346 / julho 2000
Divulgado: Mirabilis Magicus Miraculosus
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