quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Nacionalismo e Neopaganismo

O 2º milésimo aniversário do Cristianismo é desafiado por um fenômeno paradoxal - o renascimento do Paganismo. Significativamente, isto envolve majoritariamente pessoas letradas que perderam seus laços com a cultura tradicional camponesa, comumente considerada a ultima fortaleza das crenças pré-cristãs.
O movimento do Neopaganismo tem se desenvolvido no Ocidente por várias décadas e tem recentemente começado a conquistar os países pós-soviéticos. O tamanho do movimento nos faz pensar de suas forças diretoras.Obviamente não há respostas uniformes para essas questões. Entretanto, é possível distinguir entre os diferentes modelos de Paganismo Contemporâneo. Este texto foca no movimento Neopagão, suas ideologias e práticas. O desenvolvimento do Neopaganismo nos países está conectado com o crescimento de um nacionalismo étnico.
A idéia de uma religião nacional que deveria ser desenvolvida nas bases pagãs foi colocada à frente na Europa Central na época da Reforma. Por exemplo, Machiavelli elogiou a racionalidade no uso pagão da religião. Era seu sonho desenvolver uma religião que poderia servir perfeitamente ao Estado. Acadêmicos contemporâneos não crêem que possa haver tais ligações entre religião e nacionalismo. Outros que reconhecem que estas conexões não contemplam o Neopaganismo. No meio tempo, alguns ativistas dos movimentos nacionalistas persistentemente clamam pela restauração da religião popular (étnica).
Para os nacionalistas, a nação é um foco de toda a atividade humana e desejo e um indivíduo é capaz de se tornar uma pessoa apenas dentro de um genuíno contexto nacional. Este é o motivo pelo qual uma nação tem que ter os atributos que possam atender a todas as necessidades humanas - da economia e política até intelectual e espiritual. Sob a modernização que categoriza e homogeniza o ambiente material, o que é chamado de autenticidade étnica é cada vez mais restrita a esferas intelectuais e espirituais. Com a ajuda da esfera espiritual, o nacionalismo étnico procura legitimar suas idéias nas outras esferas da vida, majoritariamente na esfera política, social e cultura. O aspecto espiritual é usualmente identificado com uma religião. Como resultado, em busca por sua identidade autêntica, nacionalismo étnico, para ser consistente, tem que romper com as religiões mundiais cosmopolitanas e forjam sua própria religião genuína. Logicamente isto leva tanto a tentar nacionalizar a religião mundial ou em buscar pelas raízes pagãs e construir uma religião nacional pelos recursos pagãos. Em qualquer caso, tal construção ativa é carregada por intelectuais altamente urbanizados e secularizados que tratam a religião como um legado cultural.
Muitos pagãos identificam um grupo étnico com uma nação e, portanto, para alguns deles Paganismo significa nacionalismo ou, mais precisamente, nacionalismo étnico. Entretanto, para outros pagãos, o termo Neopaganismo soa como algo artificial e não autêntico e eles afirmam que estão restaurando uma religião genuinamente original. Ainda assim, seja o que pensem sobre eles mesmos, neopagãos estão fazendo o que podem para restaurar as crenças religiosas pré-cristãs.
Em regiões diferentes, o Neopaganismo ressurge de diferentes fontes e foi formado em diferentes climas intelectuais. Por um lado, as tradições pagãs estão seguras por práticas vivenciadas. Por outro lado, elas são tratadas com menos prestígio por intelectuais urbanos locais, pois as tradições em questão estão associadas com atraso rural.
Quase em todo lugar, um apelo ao legado pagão trouxe uma mensagem anticolonial e enfatizou a necessidade para mobilizar os recursos da cultural local para lutar contra as forças destrutivas externas que tentam, ou se acha que tentam, escravizar o povo e destruir sua cultura. Eles tratam o Cristianismo como um agente externo que não pode entrar em seus corações e permanece estrangeiro para eles. Este sentimento foi reforçado pelo nacionalismo étnico. Em verdade, habitantes locais vêem o Cristianismo como uma religião étnica que tem sido introduzida por força para escravizar e explorar os habitantes aborígines. Portanto, a única alternativa para o povo local é rejeitar o Cristianismo e retornar às suas próprias crenças e práticas pré-cristãs.
Os neopagãos estão profunda e insaciavelmente em amor com o passado pré-cristão, como se, nesse tempo, as pessoas vivessem em pureza virginal, não estivessem corrompidas por influências externas e que podiam, portanto, regozijar a melhor ideologia no mundo, travar guerras bem sucedidas e realizar grandes feitos heróicos. O retorno ao Paganismo estava aproximadamente ligado com o crescimento do nacionalismo étnico. Não é acidental que muitos dos partidos políticos radicais usem extensivamente o Neopaganismo como a essência de suas ideologias.
O declínio e o colapso das ideologias causaram uma busca por uma nova recompensa intelectual. O processo foi acompanhado por uma desintegração do falecido sistema político, uma infiltração de novas idéias e religiões, um crescimento de tensões e conflitos étnicos e uma crise de identidade. Em tal ambiente confuso e estressante, muitas pessoas tentaram se basear no que eles tomaram como valores tradicionais. Um crescente interesse na cultura popular, no passado remoto intocado pela influência externa, no que as pessoas recentemente interpretavam como cultura genuína desenvolvida pelos seus antepassados remotos. Essa atitude foi habilmente explorada por políticos locais que afirmaram que todos os danos foram resultado de uma intervenção estrangeira, embora eles não especificassem quem seriam os estrangeiros. O ressurgimento do Neopaganismo foi enraizado no crescimento da atitude nacionalista visando a proteção da cultura popular para atenuar os efeitos da rápida modernização. Neste contexto, a modernização é identificada com um tipo de Mal Mundial, como se estivesse encarnado em algum povo poderoso que deliberadamente oprimisse e engolisse as culturas locais.
Isso não quer dizer que os neopagãos se baseiam apenas em atitudes negativas. Uma cultura popular romantizada é outro enfoque de interesse. Eles dizem que isso contém tudo que um indivíduo precisa para uma vida material e intelectual próspera. Acima de tudo, eles apreciam a harmonia com a natureza como se esta tivesse sido perfeitamente domada e apreciada pelos seus ancestrais distantes.
Prova-se ser muito difícil ou mesmo impossível desenvolver uma versão uniforme bem integrada de Paganismo. Quase todos os lideres da comunidade neopagã tem sua própria visão do que a religião nacional deve ser. Portanto, tem muitas versões de mitos e rituais inconsistentes. O Neopaganismo, a despeito de todas as tentativas em promover uma consolidação nacional ou étnica, dificilmente é capaz de se tornar uma ideologia de movimento de massa.
A democratização trouxe um fenômeno inesperado, o Neopaganismo, o qual, em contraste com outras religiões, está procurando por valores étnicos genuínos. Pode ser qualificada como uma religião étnica por excelência, no sentido que ela provem sua ligação com valiosos símbolos de identidade étnica. Ainda assim, é mais freqüente que não englobe sequer um segmento menor de uma comunidade étnica e seus mitos e ritos não são, em sentido algum, originais e homogêneos como eles afirmam ser. Portanto, o Neopaganismo é tão controvertido quanto o ambiente social e político que nasceu no alvorecer do século 21.

Publicado: Jornal de Religiões Contemporâneas, vol 17, nº 2, 2002.
Autor: VICTOR A. SHNIRELMAN

Copiado: Universidade Wilfrid [link morto]
Nota: Texto traduzido parcialmente, mas sem alterar seu contexto. Um texto importante para se entender como é possível neopagãos serem nacionalistas cheios de discurso racista e xenófobo.

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