sexta-feira, 18 de abril de 2008

A comunhão pela carne

O corpo é a base, o instrumento de toda a realização.
O método do tantra desenvolve e utiliza as possibilidades físicas, sutis e espirituais do ser humano, tendo em conta a interdependência dos aspectos do ser vivo e sua correspondência com os aspectos do ser cósmico. Esse método tem por objetivo despertar, utilizar, controlar, partindo da energia enrolada no centro e na base, as energias potenciais que estão ligadas a todas as funções do corpo que são a própria base da vida, mas também aos poderes latentes, percepções sutis não condicionadas pelo tempo e espaço, poderes mágicos supra intelectuais, espirituais, que não estão diretamente sob o controle do pensamento e da vontade.
Toda tentativa de experiência que não leve em conta a natureza do ser vivo em sua totalidade é uma ilusão. O desenvolvimento aparente de certas faculdades mentais correspondem a uma diminuição global das percepções intuitivas, da força vital e é uma decadência que anuncia a morte da espécie.
O tantra, antes de considerar uma libertação além do mundo, tem como efeito principal a realização da liberdade no mundo, pelo retorno aos instintos vitais elementares, à sua natureza mais profunda e mais recalcada, a natureza que ainda está mais próxima do divino. A promiscuidade, o desaparecimento momentâneo de qualquer limite, a evocação e a reativação do Caos primordial favorece o êxtase, o retorno à origem da vida e o principio gerador divino. A sagração e a ritualização da vida eram características de todas as civilizações tradicionais.
Toda beleza, toda alegria do mundo manifestam-se por uma explosão erótica. Tudo está organizado nos seres vivos em função dessa expressão de prazer, de alegria, de beleza, de felicidade, que é a natureza divina de tudo o que existe. O Eros é o laço de atração que une dois polos opostos e complementares. O ato sexual pode ser um procedimento de identificação mística do mesmo modo que outros meios provocam o êxtase, seu emprego é normal desde que grupo social deseje aliar-se com as forças naturais, representadas por protagonistas sagrados. A identificação com o ser divino no prazer se realiza através dos ritos sexuais, todo ato sexual pode se tornar um sacramento.
No rito, o homem se identifica com o primeiro princípio e a mulher com o outro. Essa união reproduz o Hiero Gamos, o Casal Divino, o Andrógino, bem como o mistério da natureza desse mundo, um mundo que é manifestado e condicionado, em que a humanidade aparece como separados em uma dualidade, vão se unir por um instante. No orgasmo sexual, a lei da dualidade é suspensa, o êxtase ocorre e, no arrebatamento, conduz os celebrantes à iluminação absoluta.
Texto composto a partir do livro "Shiva e Dioniso", Alain Danielou, pg 131-134, 139-141.
Nota: Na década de 60, no século XX, a Revolução Cultural não conseguiu vencer o enorme puritanismo e a repressão sexual porque na ideologia do "Amor Livre" faltaram a sacralidade e a ritualização nessa nova forma de relacionamento humano. Ainda no século XXI formas de sexualidade diferentes das convenções sociais são perseguidas, ainda há um enorme tabu quando o assunto é sexo, propiciando o aparecimento de doenças, violências e desvios sexuais.

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