Os reinos da Europa estavam devastados após as nove cruzadas
encampadas pelos Cristãos. Mas esse culto cultivado entre escravos e servos
ainda não estava saciado de sangue, nem se saciará, pois o Deus ao qual estes
servem se alimenta de sangue. A Igreja de Cristo ainda alimentaria esse Deus
com as vítimas da Inquisição e nas Guerras Religiosas entre Católicos e
Protestantes.
Confusos, perdidos e desorientados, os patriarcas da ciência
moderna flertavam com o ocultismo e o esoterismo. A alquimia, que deu os
fundamentos da química moderna, foi gerada dentro do Hermetismo e este foi
gerado pelo Gnosticismo, tendo o Neoplatonismo em seu DNA.
O Caibalion [1908] lista sete princípios herméticos:
1 – O todo é mente, o Universo é mental.
2 – O que está em cima é como o que está embaixo e o que
está embaixo é como está em cima.
3 – Nada está parado, tudo se movimenta, tudo vibra.
4 – Tudo é duplo; tudo tem polos; tudo tem o seu oposto; o
igual e o desigual são a mesma coisa; os opostos são idênticos por natureza,
mas diferentes em grau; extremos se tocam; todas as verdades são meias-verdades;
todos os paradoxos podem ser reconciliados.
5 - Tudo flui, para fora e para dentro; tudo tem suas marés;
todas as coisas se levantam e caem; a oscilação do pêndulo se manifesta em
tudo; a medida da oscilação à direita é a medida da oscilação à esquerda; o
ritmo compensa.
6 - Toda causa tem seu efeito, todo efeito tem sua causa;
tudo acontece de acordo com a lei; o acaso é simplesmente o nome dado a uma lei
desconhecida; há muitos planos de causalidade, porém nada escapa à lei.
7 - O gênero está em tudo; tudo tem seu princípio masculino
e o seu princípio feminino; o gênero se manifesta em todos os planos da
existência.
Por conta disso, um dos objetivos da Alquimia visava a união
entre o princípio masculino e o princípio feminino, que é expresso no conceito
do hermafrodita hermético.
Esse conceito, em algum momento, acabou sendo misturado,
sincretizado, com outras doutrinas orientais, tal como o tantra yoga, que deram
origem à tão malfadada magia sexual, resquícios de antigos rituais, como o hierogamos
e a prostituição sagrada.
Ah, sim, embora seja um assunto pouco comentado, omitido e
escondido do público geral, o Paganismo Moderno tenta reconsagrar o corpo, o
desejo, o prazer e o sexo. Mesmo na alvejada Bruxaria Moderna [a Wicca Americanizada]
existe certo tabu em lidar com esses aspectos considerados da Mão Esquerda. Tanto
que o Grande Rito se tornou uma mera encenação simbólica nas vertentes
americanizadas da Wicca.
Eu devo ter deixado evidente a minha posição sobre a
necessidade de realizar o hierogamos, bem como a minha sustentação da polaridade
sagrada.
Eu afirmo, com certo romantismo, senão erotismo, que, quando
dois se tornam um, se conecta com o divino. Nós somos seres humanos, distantes,
separados ou esquecidos de nossa verdadeira essência e natureza. Por sermos
humanos, nós somos imperfeitos e falhos. A união sagrada [pelo sexo] nos faz
retornar ao nosso estado original, como filhos e filhas dos Deuses, como “reflexos”
[cópias] do divino.
A mitologia sumeriana aponta que nós somos resultado de
algum tipo de engenharia genética, onde seres humanoides receberam o DNA dos
Annunaki no Edingir [Portal dos Deuses].
A mitologia grega aponta que nós somos resultado da obra de
Prometeu, que fez nossos corpos com as cinzas dos Titãs, nos dando a faísca
[fogo] divina.
A mitologia das religiões abraãmicas aponta para a Queda do
Homem e o Pecado Original. As constantes “reformulações” nos textos sagrados
dessas religiões parecem ecoar que o Homem Original foi dividido, ao dizer que
Adão passou por uma cisão [teve sua “costela” removida] para que Eva fosse
criada.
Mas ela não foi a primeira mulher. Na mística judaica,
quando Adão foi formado, este tinha sido formado à imagem e semelhança de
Elohim [nome coletivo, significando Filhos de El], portando o Homem Original
era hermafrodita, indicando que este mistério precede o Gnosticismo, o
Neoplatonismo e o Judaísmo. A outra “metade” desse Humano Original foi chamada de
Lilith.
Para o sucesso do Jardim do Éden [uma cópia fajuta do
Edingir sumeriano], Adão e Lilith foram separados para procriarem. Mas Lilith
se recusou a se submeter a Adão, então ela pronunciou o Santo Nome, o que lhe
deu poderes para fugir desse cativeiro.
Aquilo que Lilith pronunciou não foi o Nome do Deus de
Israel, foi outro Nome. Nisso há um belo e interessante mistério. Da mesma
forma como nós temos diversos nomes, alguns vinculados com o nosso serviço ou
posição social, espíritos, entidades e Deuses também possuem seus Nomes. A correta
pronúncia e entonação de um Nome, tal como os mantras hindus, causam alterações
profundas na formatação do mundo tal como o conhecemos.
De acordo com as lendas judaicas, Lilith foi habitar no Mar Morto
que, segundo essa espiritualidade, é um lugar habitado por demônios, o mesmo lugar
onde, curiosamente, Cristo esteve antes de iniciar seu ministério.
Mas tem a parte triste e cruel. Quando Lilith rebelou-se e
se recusou a viver conforme esse padrão, que nós reconhecemos como patriarcado,
o Deus de Israel enviou anjos para caça-la e massacrou seus filhos.
Este Deus repetiria o feito contra os primogênitos do Egito [uma
das dez pragas] e contra os recém-nascidos de Judá [os evangelistas colocaram a
culpa em Herodes].
As lendas judaicas dizem que, por isso, Lilith tenta se
vingar, se alimentando de recém-nascidos e do sêmen de homens.
Mas esta não é a única referência que cita Lilith. Na
mitologia sumeriana, Lilith aparece no épico de Gilgamesh, estando associada à
arvore huluppu e é descrita como uma criada de Inanna/Ishtar.
Isso indica que este mistério tem raízes mais antigas, o que
é esperado, afinal, o pouco que sabemos dos mitos antigos foi transcrito a
partir de tradições orais que se perderam nas areias do tempo.
Eu falo abertamente sobre os antigos cultos de Inanna,
Ishtar e Astarte, para o escândalo de muitos pagãos modernos ainda presos ao
recalque, à opressão/repressão sexual típica das religiões monoteístas. Sendo descrita
como criada, ela [Lilith] encaixa perfeitamente na função de sacerdotisa e prostituta
sagrada de Inanna, Ishtar e Astarte. Posteriormente, essas Deusas foram
adotadas pela civilização grega e romana, recebendo o nome de Afrodite e Vênus.
Ainda que possam ser a mesma Deusa, há a possibilidade de serem Deusas
distintas, que compartilham uma origem em comum com as Deusas Primordiais, como
Tiamat, o que se pode pressupor uma longa dinastia de Deusas descendentes da
Grande Deusa.
No grande mistério cósmico, o Universo, tal como conhecemos,
é resultado da união sagrada da Deusa com o Deus, por isso eu reafirmo a
necessidade de realizar o hierogamos, bem como a minha sustentação da polaridade
sagrada.
No mundo contemporâneo, o desafio das sacerdotisas da Deusa
consiste em aceitar seu corpo, seu sexo, sua sexualidade, seu corpo, seu
desejo, seu prazer como algo normal, natural e saudável. A sacerdotisa
incorpora Lilith, no mínimo e, em nudez ritual, celebra a união sagrada com
aquele que ela escolhe para ser o sacerdote. A sacerdotisa se empodera, se sacraliza,
através de seu corpo, do sexo, não cabendo, então, reprimir, mas sim
ressignificar, se apropriar, da pornografia e da prostituição como instrumentos
da libertação da humanidade.
Dentro do círculo sagrado, o escolhido é recebido, tendo os
olhos vendados e sendo conduzido por uma corda atada em seu pescoço. Diante do
altar, o escolhido tem pés e mãos atados, sente em seu peito a ponta fria de
uma espada [ou adaga] e ouve a pergunta secreta, cuja resposta provoca a morte e o renascimento.
Eis, então, o mistério, pois o escolhido torna-se um [pelo sexo] com a
sacerdotisa e a Deusa. Esse é o Triângulo Amoroso ou a Santíssima Trindade do
Caminho do Bosque Sagrado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário