sábado, 22 de março de 2014

O caminho tortuoso

Da leitura do livro de Lee Morgan, “Deed Without a Name”, eu farei uma reflexão em cima do conceito dado pelo autor a respeito do “crooked path”.
O inverso, o conceito do “straight path”, parece um conceito mais fácil de abordar. A maioria das religiões majoritárias pertence ao “straight path”. As características mais evidentes são que há uma “revelação”, uma “palavra”, um “profeta”, uma “doutrina”, uma “origem”, um “destino”. Enfim, um único caminho “reto” ao qual desvios não são tolerados. São religiões cujo sucesso se deve a necessidade humana de certeza. A certeza, parte da crença, torna o individuo conformado, reconfortado, acomodado. Diante da certeza, da crença de que se possui a verdade, faz com que o homem esqueça-se de suas inseguranças, o mundo se torna um lugar previsível, controlável.
A tradução não ajuda muito, “crooked” pode significar acidentado, sinuoso, traiçoeiro. Lee Morgan o exemplifica este caminho com a forma de uma cobra caminhar, o que combina com o conceito do Ofício, com a jornada do bruxo e do pagão. Nossa jornada é feita com os pés no chão, o contato e convivência com a natureza é a base de nossa busca.
Isso significa colocar nosso corpo, nossas entranhas, nessa busca e procurar por trilhas que serpenteiam em meio às florestas, em meio a inúmeros espíritos antigos, em meio às maravilhosas experiências que só podem ser compreendidas pela vivência. Eu utilizo em meus textos a ideia do caminho entre os bosques sagrados.
Muitos disseram que a jornada é solitária, onde essa expedição irá passar e nos levar depende do viajante. Há um largo, imenso e extenso mundo a ser explorado, sendo necessário apenas dois pés e a vontade. Não há uma rota definida, não há um destino definido, cada um é seu profeta e dono de sua revelação, não há um caminho plano, não há certezas absolutas. Nosso caminho é cheio de desafios, obstáculos, surpresas, becos, valas, morros, rios, árvores, espinhos. Muitas vezes acabamos voltando a um mesmo ponto. Para quem olha de fora, esse caminho não é muito atraente, mas o sábio conhece que as aparências enganam. No caminho reto, pela promessa de um paraíso perdemos nossa alma.
A despeito dos riscos e das dificuldades, muitos percorreram estes bosques sagrados e estas antigas trilhas são a herança sem nome, o tema do livro de Lee Morgan. Com alegria e tristeza, seguimos adiante, celebrando e cantando, as agruras e felicidades de seguir esse caminho sinuoso. Quando se fala no perigo de trilhar esse caminho traiçoeiro, não se trata apenas da perseguição por agentes da lei, do Estado ou da Igreja. Isso nós tiramos de letra, temos sobrevivido à margem da sociedade há séculos. Infelizmente, caro dileto e eventual leitor, estudante e praticante do Ofício, o maior perigo está em nosso meio. Volta e meia lemos histórias e experiências que não deram muito certo. Eu mesmo narrei a saga de Joãozinho. Nesse caminho haverá muito logro, muita decepção e muito delírio. Não poderia ser diferente, esse é um caminho feito nesse mundo e é um caminho natural e humano.
Não se desespere, não fique frustrado, não guarde rancor. Por onde quer que passe, por onde quer que perambule, por mais voltas e turnos que sejam, saiba que tudo tem um propósito que é o de nos dar o conhecimento necessário para resgatarmos nossa humanidade e realizarmos todo o nosso potencial divino.

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