Um dos épico mitológicos mais conhecidos do norte da Europa é Beowulf, um herói que era meio homem e meio lobo. A ligação do homem com o lobo está presente em nosso mundo contemporâneo através de seu primo mais doméstico, o cachorro.
No entanto, outras lendas mostram que nem sempre a relação do lobo com o homem foi amigável. Um conto de Charles Perrault e dos Irmãos Grimm,“O Chapeuzinho Vermelho”, nos mostra uma analogia perturbadora. Um lobo que se veste, se comporta e fala como homem, um lobisomem, como Beowulf, tem um enredo diferente e nos remete a esse aspecto lendário de nossa própria natureza. O que torna o lobo perigoso não é seu lado animal, mas eu lado humano.
Outras lendas podem ter dado origem ao conto do Lobo Mau. Usando a enciclopédia virtual, Wikipedia, eu encontrei diversas lendas com lobisomens.
A Irlanda fala do Reino de Osraige, cujos reis eram tidos como descendentes de Laignech Fàelad, um guerreiro-lobo mítico, tal como os Berserkers, temidos guerreiros nórdicos.
A França conta da cidade de Gevaudan, que era constantemente atacada por um lobo. Segundo as descrições, sua pele tinha um tom avermelhado, e foi dito emitir um odor insuportável. Ele matava suas vítimas rasgando suas gargantas com os dentes. A Alemanha conta da cidade de Ansbach, mas desta vez o lobo era identificado como sendo a reencarnação do cruel burgomestre desta cidade. Em ambos os casos, as vitimas eram crianças e jovens. Mas nenhum destes homens-lobo tinham um nome. Existe, entretanto, lendas com os nomes de notórios e famigerados homens-lobo.
Na França, temos Gilles Garnier, o lobisomem de Dole, acusado também de praticar bruxaria. Na Estonia, temos simplesmente Hans, o lobisomem de Idavare, igualmente acusado de praticar bruxaria. Entre a Holanda e Alemanha, na cidade de Limburgo, temos Henry Gardin, acusado de ser lobisomem e praticar bruxaria. Na Suécia, em Livônia, temos Thiess de Kaltenbrun, que confessou ser lobisomem, mas curiosamente alegou que o fazia para combater as bruxas e garantir a colheita, como fazem curandeiros e benzedoras. Por fim, na cidade de Bedburg, Alemanha, o mais famigerado a ponto de ser transformado em canções, livros e teatro, é o lobisomem alemão chamado Peter Stump, condenado por ser lobisomem e praticar bruxaria.
Durante a Idade Média e o início da Idade Moderna, tanto a bruxaria quanto a licantropia foram consideradas meras susperstições pelos senhores do conhecimento. No entanto as lendas e mitos de ambos se misturam, como um aviso de que é necessário conhecermos nossa verdadeira natureza espiritual. Para o mundo contemporâneo, niilista e individualista, apontar para a existência de um mundo espiritual na natureza e no próprio homem tornou-se um absurdo.A Psicologia e a psiquiatria tratou de categorizar tais mitos como sendo meras manifestações de doenças mentais. Isto acabou se tornando uma desculpa e justificativa perfeita para muitos criminosos.
Quando algo ia mal em uma sociedade, antes a culpa recaía sobre o “outro”, a sociedade alegremente acusava e condenava um inocente por suas próprias culpas. Nossa cultura de entretenimento trata de reforçar esse comportamento na figura do vilão, um estereótipo daquilo que condenamos mas está vivo dentro de nossas almas. Sem a existência do adversário, do inimigo, nós acabaríamos vendo o quanto de nós mesmos nós projetamos no antagonista.
O ódio, a violência, a necessidade de matar estão bem visíveis em textos, páginas e comentários na internet. No entanto deslocamos o problema ao projetar nossas taras e tabus naqueles que servem de bode expiatório. Isso não resolve o problema, apenas piora e tornamos doente nossa sociedade, nossa humanidade, nossa espiritualidade. Enquanto o mundo ocidental não resgatar suas origens carnais e espirituais como sendo um único fenômeno e aos compreender, continuaremos sendo feras humanas.
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