A sociedade brasileira está passando por uma interessante encruzilhada.
Passados 50 anos do golpe civil-militar, vê-se até professores defendendo a ditadura, desfilando o mesmo discurso reacionário, cheio de neuroses, paranóias e teorias de conspiração, retórica completamente obsoleta no século XXI.
Não deve ser mera coincidência ver discursos, por parte da Igreja, de grupos conservadores e da "nova direita" liberal, discursando contra a Revolução Sexual como a "culpada" pelos males do mundo contemporâneo, no tocante ao "relativismo moral", a "perda dos valores familiares" e na "libertinagem".
Ainda em pleno século XXI, falar em sexo e política, acaba em polêmica e discussão. Parece uma questão banal para preocupar tantas instituições, públicas, privadas e religiosas, mas o nosso corpo, o nosso desejo e prazer, são como um território que deve ser controlado, dominado, regulamentado, por terceiros. Quem controla nosso corpo pode controlar nossa mente. Existe uma conexão entre a política sexual, seja esta explítica ou velada, mantida pelo Estado, pela Sociedade, pela Igreja e o controle social do indivíduo. A isto eu defino como política sexual, o discurso oficial e oficioso é necessário e utilizado para manter certos grupos em sua posição de autoridade, privilégio e prestígio.
Quando vozes discordantes, dissonantes ou libertárias apontam para a existência dos grilhões, denunciando nosso estado de indigência erótico-afetiva e apresentando idéias alternativas que começaram a surgir no século XVIII, os donos do poder usam e abusam do terrorismo psicológico para manter o sistema. A homofobia, a misoginia e a violência sexual são sintomas dessa conjuntura de repressão e opressão sexual.
Discutir ou contestar conceitos arbitrários quanto a identidade sexual, de gênero, de opção sexual, de formas de relacionamento e da formatação da família parece abalar os alicerces de instutições monolíticas. Os donos do poder, desesperados, tentam evitar, contornar ou assimilar essas idéias revolucionárias e libertárias. A cooptação dos ideais da Revolução Sexual teve como resultado o surgimento da comercialização do sexismo e da Indústria Pornográfica nos meios de comunicação de massa.
Eu posso discordar da pornografia como esta é explorada pelos meios de comunicação de massa, não por esta existir, mas por razões de estética, ética e forma. Houve uma época em que a pornografia estava inserida na arte, na literatura, na poesia, no teatro. A pornografia era, na antiguidade, um discurso estético onde o ser humano representava, por meio da arte, suas fantasias, pulsões, medos e necessidades. Nese âmbito, a pornografia torna-se um discurso, não para estimular ou censurar, determinados comportamentos e tendências sexuais, mas para servir como veículo de catarse, diminuindo ou evitando desvios e violências sexuais. Na Renascença, a pornografia ressurgiu como um discurso de resistência e contestação aos dogmas da Igreja e, nesse discurso, ao questionar as normas, os limites e a falsa moralidade da Igreja, deu forma ao que convencionou chamar de Revolução Sexual, onde o indivíduo tenta retomar o senhorio de seu corpo, seu desejo, seu prazer.
Conforme as formas de totalitarismo, secular e clerical, foram perdendo seu poder e influência, amadureceram-se os ideais, a revolução, a contestação e o discurso contra os conceitos arbitrários impostos pelos donos do poder. Neste cenário apareceram os trabalhos de Wilhem Reich e Alfred Kinsley, dando um endosso acadêmico ao discurso da Revolução Sexual. Somente então, por uma questão científica, médica e de saúde, surgiu a pílula anticoncepcional. Alguns anos mais tarde, aconteceu a Contracultura e, pelas mãos de diversos artistas, as idéias da Revolução Sexual chegaram ao conhecimento do público, tornando-se um fenônemo de massa.
A Indústria Pornográfica, paradoxalmente, foi a resposta dos donos do poder, do sistema, para evitar, contornar ou assimilar a tendência do público em retomar o controle político de seu corpo, sua sexualidade, seu desejo e seu prazer. Ao massificar, vulgarizar, mercantilizar e comercializar a pornografia, o sistema reiterou, ressaltou e reforçou o discurso do sistema dominante, machista, sexista, classista, frustrado, recalcado e sexualmente oprimido/reprimido. As necessidades, tendências, pulsões e medos da humanidade diante do sexo são as mesmas, a pornografia nos meios de comunicação de massa agiram como estimulante dos problemas psicológicos humanos neste campo e criou espaço para o desenvolvimento de diversos desvios e violências sexuais. Por fornecer um simulacro da coisa real, não a satisfação real, a pornografia comercializada pelos veiculos de comunicação de massa tornam-se insuficientes e ineficazes, mas servem ao discurso reacionário em prol da escravização do cidadão nas mãos dos donos do poder.
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