domingo, 10 de dezembro de 2017

Sahasetaum

Esta é outra versão de como poderia ser o conflito final entre o Império das Luzes e o Reino das Trevas, pela conquista do Cosmo e das criaturas evoluídas, a fim de agradar ao Universo e mostrar qual dos filhos é o melhor soberano de suas posses.
Ao menos, essa era a intenção do Universo, criou Leviathan e Iahravel para ajudá-lo a comandar o Cosmo em toda sua extensão, mas não imaginou que isso iniciaria uma luta entre os irmãos, pela conquista de mais galáxias para suas possessões.
Isso o deixou irritado, tanto com seus filhos como consigo mesmo. Entretanto ele não era capaz de tomar atitudes drásticas. Se fosse para punir seus filhos, deveria punir-se primeiro. Mas o conflito tomava dimensões assustadoras e isso o angustiava.
Suas partículas, prestativas, puseram-se a trabalhar para tranqüilizá-lo, tirando dele o fluxo irado até este assumir uma forma de vida independente e pronta para agir pelo Universo, já que este não queria.
Foi com satisfação que o Universo viu surgir um quase meio irmão, pronto para ser a força da justiça, pelo bem da harmonia no Cosmo, mais a sua própria, antes que ficasse conturbado e tudo acabasse. Melhor que isso era então dar boas vindas a este e deixá-lo trabalhar. Assim surgiu Sahasetaum, que partiu em missão para advertir Leviathan e Iahravel de que este conflito estava tomando proporções perigosas.
Como a reclamação de inúmeras criaturas imoladas era em maior número contra o Império das Luzes, para lá se dirigiu Sahasetaum.
No castelo de Iahravel, a corte estremeceu ao perceber algo estranho acontecendo no firmamento. Foram perguntar ao Imperador o que ele estava fazendo, pois o julgavam responsável, já que dizia sempre ser o Deus único e todo poderoso. Talvez o fosse, mas entre os seus, mas não muito diante de seu irmão e nem um pouco diante de seu Pai. Como sabia que seu Pai não o atacaria, achou que só poderia ser coisa de seu irmão.

-Meus filhos! Eis que vejo que as forças infernais têm a ousadia de vir até nossa presença e nos atacar! Preparemo-nos e vamos enfrentá-las!

Assim se equiparam com todas as armas, o exército inteiro, paramentado e pronto para enfrentar todo tipo de força. Quando Sahasetaum saiu dentre os redemoinhos de estrelas e energias cósmicas, o exército inteiro entrou em comoção, o próprio Iahravel se assombrou com semelhante aparição. Mas logo deu o comando de ataque, sendo seguido por inúmeros disparos das armas mais pesadas.
Os fachos luminosos ricocheteavam pelo corpo de Sahasetaum, como pipocas na panela, mas o ataque o enfureceu. Simplesmente com uma de suas patas, golpeou toda a tropa, jogando-a de volta ao castelo de Iahravel, que quase não vem abaixo com o impacto.
Embora desacordado, Iahravel pode escutar bem a advertência de Sahasetaum que, se me permitirem, irei omitir, pois é terrível demais para que se escreva e pior ainda de se ler. Avisado o primeiro filho, Sahasetaum dirigiu-se ao outro. Esperemos que Leviathan receba melhor Sahasetaum, que já está irritado. Que o faça ainda ter confiança ao menos em um filho e o tranqüilize, senão, toda luta terá sido em vão!
Do mesmo jeito que se aproximou do centro do Império das Luzes, Sahasetaum aproximou-se do centro do Reino das Trevas, com as mesmas consequências disso.
O Conselho das Trevas, receoso de que isso fosse um plano de Iahravel para derrotá-los, estava para ordenar a prontidão,quando Leviathan acordou e ergueu-se.

-Soberano Leviathan! Melhor se esconder e vestir tua armadura! Sentimos que teu inimigo está tramando tua morte!
-Não sabem o que dizem, amigos. Este não é meu irmão, senão já o sentiria. E? algo maior, que me toca o coração. Devo recebê-lo em minha casa e tratá-lo bem, seja lá qual for o motivo de vir me visitar.

Apesar dos pedidos, Leviathan sai, dispensando sua guarda e até seus ministros de acompanhá-lo, sai sem uma arma sequer. Não contendo sua euforia, deixa ser visto em seu poder, como o Dragão de Sete Cabeças e Dez Chifres. Diante da tempestade cósmica faz uma saudação reverente.

-Pai, o que queres de mim? Diz o Soberano das trevas. No que surge Sahasetaum e lhe explica:
-Não sou seu Pai, mas vim por causa dele, para advertir a ambos os filhos de que o conflito deve ter fim.
-Se não é meu Pai, quem és, criatura, capaz de trazer ternura ao meu negro coração?
-Eu sou Sahasetaum, o que foi designado pelo Universo, para controlar as atividades das Luzes e das Trevas. Se necessário, julgá-las!
-Então entre e seja bem vindo. Nada tenho a esconder ou me envergonhar. Antes de dominar, prefiro mais a livre associação dos seres à minha causa. Se eu luto, é para manter a salvo tantos planetas e vidas que existem pelo Cosmo, sem esperar destes, gratidão ou reconhecimento. Como criaturas racionais e feitas da mesma matéria que a minha, embora mortais e frágeis, devem ser livres para terem seu destino e sua crença, seja nos princípios das Luzes ou das Trevas.

Tendo escutado e visto tanta sinceridade, sabedoria e nobreza, Sahasetaum acalmou-se, até esquecendo-se do incidente com Iahravel. Aceitou o convite e entrou na casa de Leviathan.
Foi então apresentado à rainha das Trevas, Nahema, esposa de Leviathan. Apresentou-o à princesa das Trevas e sua filha, Lilith, mais seu companheiro, Samael.
Lilith saudou o imponente guerreiro, com o mesmo beijo carinhoso que uma neta daria a seu avô. Tanta força e poder lhe provocavam, mas apesar deste amor súbito, sua paixão verdadeira era por Samael.
Sahasetaum até poderia tirar partido disso, mas para ele, Lilith era quase menos que uma criança. Nahema era tão bela, senão mais que Lilith, mas sentia-a como sua própria filha. Então preferiu continuar só.
Leviathan levou-o então ao Conselho das Trevas, que o recebeu atordoados, tamanha era a potência. Era o mesmo que um ancião ter entrado numa brincadeira de roda.
Preparou-se então uma festa de boas vindas, para apresentarem-se todos ante Sahasetaum. Satan e Moloch pediram-lhe para que abençoasse a união deles, mas Sahasetaum era mais juiz que sacerdote. Belphégor fez uma bela explicação dos princípios das Trevas, mas Sahasetaum a escutava, como um professor que tentava prestar atenção à apresentação de uma aluna. Lucifuge apresentou sua tese de acusação contra o Império das Luzes, mas Sahasetaum como juiz sabia perfeitamente os prós e os contras dos dois filhos do Universo. Belzebu e Baal Chanan fizeram um verdadeiro espetáculo aéreo, mas Sahasetaum, que já tinha visto a dança das estrelas, planetas e galáxias, nem se entusiasmou. Enfadonho, para Sahasetaum, foi ouvir as abordagens alquímicas sobre fenômenos naturais e sobrenaturais de Astaroth, já que Sahasetaum era a própria essência do que existe de mais sobrenatural. Uma última tentativa por Asmodéia, em sua dança de fogo com serpentes inflamadas, apresentação aparentemente inútil, já que Sahasetaum poderia facilmente brincar com o maior e mais poderoso dos sóis. Mas não poderia deixar de admirar, com que determinação defendiam seu Reino. Os acompanhava com os olhos quando estes, exaustos, voltavam aos seus lugares.
Foi ao observar Asmodéia que notou uma criatura sem igual em toda a extensão do Cosmo. Estava a cobrir com uma manta a Asmodéia e a servi-la com vinho para relaxar, refrescar e acabar com a sede dela. No meio daquele carnaval, era a única que, calma e dedicadamente cuidava do seu trabalho, sem nunca desviar a atenção a ele, o convidado e o festejado. Quis conhecê-la melhor, mas naquela folia era impossível. Então se retirou junto com ela, para outro espaço, a fim de conversar.
Assustada com a repentina desaparição de todas as coisas em torno dela, olhou para o único lugar onde havia mais alguém, que era Sahasetaum.

-Quem é, adorável criatura? Perguntou o gigante.
-Que quer de mim, senhor? Não sou mais que a governanta de Asmodéia.
-Não serás mais, se assim quiseres. Peço-te que me acompanhes.
-Onde irás levar-me, senhor?
-Quero levar-te até onde criatura alguma jamais foi.
-Mas por que eu, que te sou completamente desconhecida?
-Pois então, apresente-se. Eu sou Sahasetaum, incumbido de julgar as Luzes e as Trevas. Agora é tua vez.
-Eu sou Vrtra, venho da mesma tribo de Moloch e fui incumbida de cuidar de Asmodéia, enquanto ela não alcança a idade da responsabilidade.
-Criaturas como tu foram feitas para comandar. Como eles puderam relegar-te tão degradante serviço, a tão pueril criatura como Asmodéia? Agora vejo porque tentam enganar-me. Tentaram esconder-me essa injustiça!
-Oh, não, senhor! Não foi por injustiça! Na verdade, Asmodéia cuida de sua parte, mas eu a administro, sugerindo-lhe indiretamente, por conselhos.
-Pois então, deixe-a agora, deve ter tido aulas suficientes, ela já está bastante crescidinha para precisar de uma governanta. O que me diz, queres ir ou não?

Vrtra aceitou, pois temia o que poderia lhe acontecer se recusasse. Sahasetaum a fez voar consigo pela imensidão do Cosmos através de todas as regiões, tanto das Trevas quanto das Luzes. Levou-a então, por através da região que o Universo regia, o lar de Sahasetaum e ela maravilhou-se.
Pousaram em um lugar que superaria qualquer definição de beleza ou feiúra, porque simplesmente ali tais conceitos não tem utilidade, já que na região mantida pelo Universo estão os planetas, galáxias e seres que superaram todos os medíocres referenciais de valor.

-Seja bem vinda Vrtra, ao coração do Universo e ao meu lar. Onde coração e mente são coisas únicas, existindo por todos os princípios negativos.

Sahasetaum pousou suave, delicadamente e ternamente uma de suas mãos no ombro de Vrtra que estremeceu.

-Compreendo teu temor, criatura. Eis porque te trouxe para cá. Somente aqui poderia fazer-te tocar no nervo do universo e torná-la como uma galáxia ou algo de uma existência tão complexa como Leviathan, Iahravel e quase tão poderosa quanto eu.
-Senhor! Mas eu?!
-E mais ninguém conheço que pudesse ser assim. Só assim perderá o medo por mim, terá tua liberdade. Se algum dia tu vieres a nutrir apreço por mim, terá capacidade de me falar por igual, como igual será recebida e viverá comigo. Acha que é possível? Por mérito e esforço, uma criatura evoluir tanto?

Das garras de Sahasetaum surgiu uma esfera que mais parecia a própria vontade do Universo, a mesma vontade que criou tantas coisas

-Sim, é possível! Eu mesma vi inúmeras vezes, criaturas menos evoluídas que nós, chegarem ao extremo. Faço parte de um reino, cuja característica e formação está em criaturas que conquistaram formas de existência mais dignas. Então...eu também...

Vrtra tocou,ainda receosa a esfera, na expectativa de que fosse sentir dor ou de que seria destruída. Mas a esfera desvaneceu ao seu toque, como uma bolha de sabão. Tão simplesmente como a chuva cai de nuvens carregadas, Vrtra agora irradiava essa força, que antes era a esfera.

-Agora retornaremos. Dar-te-ei o tempo que quiser para decidir teu destino, pois agora tempo é o que não lhe faltará.

No instante seguinte, já estavam de volta no mesmo lugar de onde partiram. Sahasetaum deu a entender que já partia, logo todos se puseram a fazer as despedidas.
Ao desaparecer Sahasetaum, Leviathan ainda parecia senti-lo presente. Notou Vrtra, que estava diferente. Esta lhe contou tudo, pois ainda o considerava o seu soberano.

-Então agora eu é que te devo respeito, Vrtra. Disse Leviathan, inclinando-se em reverência.
-Não, meu soberano. Ainda não decidi. Seria muito fácil tirar proveito de minha condição, para forçar Sahasetaum a ter preferência pelo nosso Reino.
-Tenho certeza que ele o faria por ti. Mas desconfio que, antes mesmo de a ter visto, ele já tenha nos julgado, nos considerando dignos de sua piedade e confiança. Caso contrário, não teria feito o que fez contigo. Antes, já o nosso Reino escolheu por viver, de forma a orgulhar o Universo. Agora, estamos praticamente morando no coração do Universo, graças a ti.

Eis talvez o porquê, leitores, no final, as Trevas venham a vencer as Luzes. Primeiro porque as Luzes perderam completamente o contato com o Universo, vivendo em seu estúpido fanatismo. Em segundo, porque as Luzes não souberam receber, nem reconhecer Sahasetaum, como enviado do Universo ou como um dos seus. Por outro lado, as Trevas, em primeiro, viveram sempre em acordo às regras básicas do Universo, sabendo viver seu destino. Em segundo, por ter Sahasetaum encontrado alguém com quem poderia deixar seu coração repousar.
Vrtra ainda não sabe se aceita a oferta, pois estará muito preocupada por vários milênios, com a ameaça constante que se tornou o Império das Luzes ao seu Reino. Talvez, quando tiverem paz em si, possa levar um pouco a Sahasetaum, ao simplesmente aceitar a oferta. Mas o mais irônico nisso é que só será possível, quando finalmente a prepotência do Império das Luzes for detido pelo reino das Trevas. Ou seja, o conflito que Sahasetaum queria deter, continuará. Só que, a partir deste momento, será ele que ficará angustiado e irritado, sem saber ao certo o momento exato de agir, já que foi criado com esse propósito. Mas isso não demorará, assim espero! Sahasetaum deseja dar fim a este conflito, viver o quanto mais cedo possível com Vrtra e ter um pouco de paz!

Consultem minha pequena versão sobre a criação, sobre o surgimento de Leviathan e de Iahravel, do reino das Trevas e do Império das Luzes. Tem um capítulo, onde faço uma pequena tentativa de antever como será tal conflito final entre os dois irmãos.
Pode lhes parecer um pouco pretensioso. Praticamente me delego a posição de escritor do profano e que serei para as Luzes, o falso profeta que anuncia a Besta, o que fará com que tenham de me eliminar.
Irão rir da minha fantasia, de que justamente um ser tão medíocre quanto eu, possa vir a tumultuar o Império das Luzes, após sua vitória provisória, ao plantar a árvore do Fogo Negro em plena Nova Jerusalém.
Bom, meus amigos, hão de convir que meu intenso trabalho já deve ter surtido algum efeito em minha Deusa, Lilith. Sem dúvida, ela comentou minha predisposição com Vrtra. Se esta me julgar merecedor de tal apreço, certamente irá pedir por minha proteção a Sahasetaum, para que minha missão seja bem sucedida. Porque não seria muito ético, da parte de ambos, tomarem nitidamente parte do conflito, então se servem de peças mais sutis, que possam trazer, enfim, o resultado almejado por ambos.
Afinal, por uma paixão a Vrtra, Sahasetaum se diminuiria a ponto de proteger uma vida mortal e tão medíocre quanto a minha. Sensacional vai ser testemunha-los consumando esse amor, ao fim do conflito. Podem ter certeza de que estarei observando como Sahasetaum ficará feliz com a recompensa desse esforço.

sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Quinta revelação

Não os consulteis, mas vossos corações. 
Não prestigiem os cultos que orquestram, 
mas antes, dais culto aos vossos lençóis. 
Aos homens foi dado um bastão, 
porque aí se encontra a verdadeira magia. 

Cuide bem de vossa chave, 
pois se quiserdes desvendar os mistérios da existência, 
vos é imperativo que saibais buscar a fechadura, 
o encaixe perfeito só se poderá alcançar na tentativa! 

As mulheres têm a coroa, 
porque aí se encontra a verdadeira sabedoria. 
Cuide bem de vossa fechadura, pois sem uso enferrujará 
e vos tornará em mulheres amargas, histéricas ou neuróticas. 
Como vos podeis querer manter um tesouro guardado? 
Sem ele não haverá evolução da humanidade! 
Somente pelo vosso portal que tal riqueza poderá passar, 
por isso que vos é necessário 
que deixeis que a chave experimente a fechadura!

Deixe de lado a vergonha ou o recato, 
que isso é submissão moral a pequenos! 
Eu proíbo-vos apenas isto: que se cubra ou vele vossa beleza, 
pois o que é bonito é para se mostrar. 
Cobrir-vos, somente com vossos lençóis, na cama, com vossos escolhidos. 

O único sacrifício agradável a Mim, seu Senhor, 
não é sangue de animal, mas o sangue virginal 
que ofertar em vossa primeira noite, uma única gota Me basta. 

O único louvor, não se encontra em templos, mas em motéis; 
não em cânticos, mas nos gemidos que precedem o orgasmo. 
Vós não encontrareis a salvação na observância das virtudes, 
nem na caridade, nem no dízimo, nem na oração, 
nem na busca obsessiva da pureza de espírito, como vos ordenam.

sexta-feira, 10 de novembro de 2017

Quarta revelação

O que fazeis tolas crianças? 
Por que negai-vos o desejo? 
Por que fugis do prazer? 
O que temeis, se não há nada que vos impeça? 
Acaso é a felicidade? Será que a satisfação é tão aterradora? 
Deveis obediência apenas a vosso Senhor, 
que é vosso corpo e à Lei deste, que é o instinto. 

Quaisquer outras obrigações, 
só façam por vosso consentimento, 
pois são deveres que, tal como os direitos, 
são concessões que existem para vossa época 
e a convivência em uma sociedade comum. 

Não vos fieis nestes que se apresentam em Meu Nome, 
pois não necessito nem constitui advogados. 
Nem crede em qualquer livro, 
por mais santo que se o considere, 
são obras humanas, não as minhas. 

Se quiserdes realmente seguir a Lei do Senhor, 
ausculta vossos corações,
pois é neles que escrevi com Meu próprio fogo, 
minha Palavra e a Lei. 

Muitos vós conheceis, que dizem conhecer-Me, 
mas sabei bem que nisso se empenham 
por que nada de mais útil sabem estes fazer. 
Não os sustente nem os coloquem em cargos, 
não os sacramenteis, mas sim a vós.

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Lírios sangrentos

Ou conferências carnais sobre a materialidade humana, os objetivos das deidades e a justificativa de seus métodos.
Pois todo o futuro da humanidade está na corrupção da carne, do que sobra, entre vícios e virtudes, sirva-se de prazer a estas deidades que, não tendo a matéria para sentir, exigirão os sentimentos em essência de nós, para terem os prazeres que temos, mas tendo-os em nível espiritual.
Pois a eternidade é um ócio é um tédio, é preciso sentir a vida, esses nossos mortos e existentes sem existência, deidades e antepassados, tem necessidade de algo para distrairem-se e perceberem a própria presença por estas dores e exultações a que estamos expostos enquanto vivos.
Pois nos enganamos, acreditando que a presença na eternidade é melhor que esta na Terra, nos afundando e cercando de crenças, fornecidas pelas múltiplas deidades, cada uma em busca de mais simpatizantes, para aumentar seus pratos e diversificar mais a ceia.
Pois todo ser que é sem que o seja, alimenta-se da crença dos vivos, para que esses confiem a essas deidades o seu destino após a morte, na qual então tais deidades poderão digerir sem consumir o espírito dos crentes que se ofertam a eles, por uma vida após a morte, sem dor ou sofrimento, o que terão pelo preço da corrupção das carnes, mais o espírito, eternamente cedendo alimento, em troca de sua permanência junto a essas deidades. Se os prazeres destas deidades se decidem mais por experimentar virtudes ou vícios, não parece ser razão suficiente para distingui-las e separá-las entre o Bem ou o Mal. Os objetivos são os mesmos, embora a matéria prima seja diferente, assim como as sensações produzidas por estas. A Virtude, embora dependa de referenciais nem sempre confiáveis ou estáveis, é enobrecedora, ou melhor, os homens acham que isto os engrandece e os torna homens de bem, merecedores desta vida na eternidade, que resumem no Paraíso, quando o que terão é, na verdade, o que conhecemos aqui por relação simbiótica, uma troca entre codependentes que se auxiliam e alimentam-se mutuamente. Realmente, o que seriam de todas essas deidades se não houvesse tais homens, ou mesmo tal existência material, ou até tal vida inteligente?
Pois é de se notar que apenas a criatura humana tem tal capacidade de reconhecer e adotar comportamentos considerados agradáveis a tal deidade, por misteriosos meios de comunicação entre esses e o Homem, quer por escrituras, quer por outros homens que se dizem ter contato com esses. O que é lógico, pois incapacitados pelo seu estado, fazem-no através dos homens, para falar pela boca e pela língua de seus ouvintes e estes, para perpetuar a palavra, a registram nas linhas de um papel, e este livro também acaba tornando-se um testemunho dos desejos destas deidades aos homens, de como devem levar suas vidas, para merecer tal proteção e prêmio no final da etapa da vida.
Mas então se vê um paradoxo: tão poderosos e ainda assim como um Rei, depende de seus vassalos, para que assim o sejam, dependem da crença dos homens, em número e qualidade, para reconhecer-se e fazer-se presente, tanto a si como aos demais, que competem entre si, pela conquista do mais alto grau de poder de domínio. O mais estranho: vai ser essa quantidade e qualidade de criaturas aos seus cuidados que lhes darão o poder necessário, pela força de vontade destas.
Então digladiam-se as deidades em busca da preferência humana pela vontade que são dotados, a mesma vontade que nos tornam criaturas tão notáveis e capazes. Mas a partir do momento em que se deixa dominar por estes desígnios ou outros líderes temporais ou sagrados, corre-se o risco de se perder também a razão, tornando a vontade apenas uma força de coação, agindo pela uniformidade, prisão e extermínio da diversidade. Pois homens lutam pelo domínio dos seus, da Natureza e de toda a Terra em busca de conforto, poder e riqueza ainda em vida, ou de perpetuarem sua memória, ou de perpetuarem a memória das deidades em que acreditam. Pois tão confiantes estão de que esta é a portadora da Verdade, acabam tornando-se serviçais, se não das deidades, de seus ideais, que na forma de organização humana, acaba sendo transformados em uma presença que podemos considerar semelhante à que exercem as deidades sobre os homens.é interessante notar que quaisquer desses dois captalizadores das paixões humanas acabam negando a base primária de sua razão de ser: a matéria, à vontade e a humanidade.
Enquanto as deidades exigem um comportamento moral, os ideais comandam os modos de ação da vontade humana. Um comportamento moral tenta regrar as atitudes humanas frente à Vida, negando ou tentando coibir essas práticas mais apegadas à matéria, o que cada deidade entende por vicio, em precedência e preferência a outros, que são dados por virtudes, embora ambos são e precisam ser realizados ainda em vida, vida essa cuja base é a matéria. Mesmo as virtudes não se manifestam, sem se concretizarem em atos ou obras que possam ser reconhecidas como tais. Já os ideais tentam regrar o comportamento do Homem frente ao Homem, dentro de uma Sociedade, a qual é organizada por Estados, estes são formados pelos ideais dos líderes da Sociedade, que garantiram a legitimidade da formação destes ideais, estados e Sociedades, pelo esforço da educação e civilização dos hábitos dos demais, através de anos de História, separando e perseguindo o que é definido, por estes ideais, como marginais e criminosos. Muitos se tornam um elemento visado por não terem muitas escolhas diante da indiferença, total falta de orientação e oportunidades dentro destas sociedades, que são sempre privilegiadoras de um grupo, que contam com a garantia da força física para coibir desvios e a coopção contemplativa desses ideais pela maioria dos componentes das sociedades, através da formação de uma legislação, via hegemonia ideológica, garantida pela educação. É de se ver que tal lei e justiça só se mantém quando tem mais força física que os que estão enquadrados na marginalidade e na criminalidade, tais definidos pelo que entende tais ideais, agregados nos homens e na sociedade, transformando-se numa presença de domínio e controle das ações humanas, tal como as deidades, negando sua matéria de formação, o ser humano, todo ele, cada um, ser vivo, formador de ideais e sociedades, mas que pela ação de um geral organizado, acaba sendo proibido de ter seus ideais fora do organizado socialmente, ou mesmo de ter sua participação nesta, apesar de ser sócio ao seu modo de participar nesta, ainda que limitadamente, por não preencher as exigências necessárias para tornar-se um líder social ou até um cidadãos honesto, que são todos aqueles que seguem as leis e as condutas sociais organizadas e orientadas por estes líderes sociais.
Agora, tentemos imaginar afinal o que então, qual que justifica a presença do outro, devemos nós sermos gratos a ponto de nos entregarmos incondicionalmente a estes que nos formaram, tanto as deidades como as sociedades, ou caberia a nós, justamente por sermos racionais, buscar regras de convívio entre o indivíduo e cada uma dessas entidades coletivas, de formas mais abertas e livres, com melhores ofertas e oportunidades iguais em prol do próprio sucesso destas? Ou então devem estas procurar agir mais pelo Homem, enquanto indivíduo, pois não é a união de todos e cada um que possibilita e realiza a presença concreta dessas entidades?
Como se vê, a solução está em ouvir e permitir o acesso de cada participante e crente, para melhorar, atualizar e efetivar como poderes de decisão, as deidades e as sociedades, porque estarão finalmente garantindo a total capacidade de manifestação de cada um. Só desta forma se chegará com sucesso ao objetivo de toda deidade e sociedade, que é captar, coletar a maior quantidade e a melhor qualidade de pessoas, congregá-las nesse meio que só será legítimo quando a vontade coletiva for reflexo de cada vontade individual.
Por outro lado, se existem as deidades que se alimentam das virtudes e as sociedades que se alimentam dos ideais, da mesma forma terá o grupo que, pelo mesmo objetivo mas movido por outras matérias primas, faz sua presença pelo motivo dos vícios, crimes, imoralidade, dissociação, individualidade radical, anarquismo. Mas é bom notar que isso é assim nomeado por um juízo de valor definido pelos primeiros partidários, que considerando ser sua vida exemplar, desta forma a defendem ardorosamente, caracterizando os demais comportamentos e atitudes por estas palavras depreciativas. Não se pode condenar quem, na falta de expectativas e perspectivas, acaba criando todo um método e atitudes segundo um referencial próprio.
Já que existe dissidência, é porque não são tão perfeitas as deidades e muito menos os homens, seus ideais e suas sociedades. Por que não se ouve, ainda que sejam minoria, pois resolvendo os problemas e desajustes destes, evita-se toda a consequência criminosa que realizam em busca de sobrevivência ou afirmação como seres vivos e merecedores de alguma atenção e cuidados. Essa seria a função da organização humana enquanto sociedade, garantir a participação de todos os sócios. As deidades simplificariam bastante seu trabalho sem adversários, pois as atitudes tidas como pecaminosas ou viciosas são apenas formas de expressão de protesto e descontentamento, o que não lhes tira a legitimidade de, como atitudes de vontades conscientes, de serem proveitosas a essas deidades. O que temos na verdade não é a luta entre o Bem e o Mal, mas de conceitos e sentimentos que devem ser discutidos e vivenciados, pois são parte da personalidade de todo ser.
Não se pode condenar qualquer um que seja, por ter tomado medidas drásticas, mesmo o assassinato, pois nós não consentimos, muitas vezes de alguma forma até colaboramos, para a morte por frio, doença, fome, abandono ou violência contra crianças, homens, mulheres e velhos? Muitos não desejam tal destino, incomodados e inconformados, reagem contra quem acredita ser seu agressor, ou seja, a sociedade. Mas o defeito está na organização e nos organizadores dela. Cabe a nós, como parte disto tudo, lhes exigir atitudes mais eficazes e eficientes que não simplesmente matar, surrar e prender, o que acaba agravando o problema, já que este surgiu por esses fatores. Basta dar acesso e orientar todos para serem indivíduos produtivos, receberem adequadamente para isso, para serem consumidores, para haver mercado, gerando mais riquezas,menos diferenças, miséria, mendigagem, criminalidade.
Então, nenhum ato pode ser considerado criminoso, pois todo ato tem um motivo e um objetivo claramente definível, caso não o seja, tem origens psicológicas, sendo assim, não é natural, foi conduzido a tal estado de demência pelo meio em que interagia.
Podemos imaginar o crime como uma forma da humanidade manter seus níveis populacionais, selecionando apenas os mais capacitados a viver na sociedade, já que o Homem é um dos animais no fim da cadeia alimentar, é até natural considerá-lo predador de todas as espécies, inclusive da própria. Para isso existem os crimes, puníveis ou imputáveis, pois a guerra é crime, mas os que sobrevivem são condecorados como heróis. Mesmo em paz a sociedade sabe como separar, isolar, incapacitar e matar por fome, doença ou violência policial, coisas cujos verdadeiros culpados nunca serão levados a júri, simplesmente escolhe-se um indivíduo para pagar por toda uma situação causada pelo sistema.

Então, o que vale a pena, por qual meio devemos levar nossa vida se é tão inútil e cheia de enganos acerca da real intenção de tais deidades por nós? Já que, de qualquer forma, teremos que ser devorados pela morte e só depois viver com nossos deuses, que irão conviver conosco nessa relação simbiótica eternamente, eles nos digerindo e nos mantendo inteiros ao mesmo tempo, por que nos perturbamos tanto com as atitudes e as separamos entre boas e más, se isto não é sincero? Qual é a verdade senão uma boa mentira em que se acredita e pela confiança se dá o valor de verdade? Já que não se difere o casto do libertino, todos deveremos morrer, por que então não viver todas essas maneiras de ser, sentir o mais que puder o prazer tanto das virtudes quanto do vício?
Justamente porque tanto os homens quanto as deidades precisam se justificar a si e a seu outro dependente, já que a existência de ambos seria tão vazia sem uma projeção que estabeleça a realidade como algo concreto, que só é perceptível aos sentidos, por meio dos quais satisfazemos nossos desejos de prazeres, por meio desses objetos, dessas crenças e atitudes humanas. Ou seja, o real é uma mera produção de determinados desejos e necessidades que, ao estarem satisfeitos, acarretam no prazer e no alívio de, com isso, sentir que estão vivos e justificando sua presença neste espaço hipotético.
Até mesmo aqueles que buscam a renúncia a tais sentimentos e objetos materiais o fazem na satisfação de justificar a própria existência. Baseados na crença, acreditam que se provando, privando, recusando, renunciando ao mundano, demonstram força e coragem, mesmo porque nesta renúncia, as reações biológicas proporcionam uma sensibilidade maior pela ausência desse material. Não negam o material, mas sim o valorizam, por causa de tal sensibilidade mais desperta, mesmo não o desejando, acabam vendo-o com mais esplendor que qualquer outro acostumado a tais objetos. Além do que, ao torná-los proibidos, os tornam mais desejados, conduzindo à sensações de prazeres ainda maiores que tinham ao usá-los.
Ao inverso, se se busca muito os vícios, eles perdem toda aquela carga de proibição, até diria pecado, pelo excesso de uso. Mesmo fontes de prazer se se tornam rotineiras, automatizadas, repetitivas, perdem o fascínio, porque agora é um objeto comum. Por ser comum, nem se nota mais quais os prazeres e necessidades que queremos satisfazer, o usamos porque se tornou um hábito, chega-se ao absurdo de o usarmos por instinto, o objeto chega a perder totalmente seu significado e passa a fazer parte do real, ainda que distante, no horizonte.
Não é sem motivo então que seja tão difícil deixar tais hábitos, nem tanto pelo prazer, que estes já não tem, mas sim por fazer parte do referencial do que se considera como realidade, parâmetro que os faz sentir parte deste real.
É então, por precisar de tais justificativas de se considerar inscrito no real, que os homens seguem tais determinações, vindas de seus líderes, ou vinda dos preceitos deixados por tantos profetas que se arrastam atrás das religiões deixadas pelas deidades que, para terem esse grau elevado sobre os mortais, devem sem dúvida estabelecer tais limites do real e do sobrenatural, assim como as regras de viver bem, para os homens merecerem tal local, ao findar o tempo material carnal destes homens. De qualquer forma, todos buscam seu tipo de prazer através das diversas formas de sensibilidade, isto sem dúvida é o que se verifica.

Eu sei que sou uma pessoa comum média e sustento os meus próprios engodos. Afinal, o pior radical contra o sistema é na verdade seu maior defensor. Sua razão de revolta se acaba assim que lhe for dado o que deseja, logo entrando no esquema e até irá defendê-lo. Mesmo o rebelde fornece justificativas ao sistema e sua crueldade, pois é justamente para manter a situação, que se age contra os revoltosos, justificando assim essa relação de exceção e privilégios de uma minoria sobre a maioria. Por mais que se mude de mãos os governos, ainda haverá insatisfação, mesmo que a oposição vença e seja social-democrata, a linha de Estado não deixa de existir e estes, que até tem boas intenções, acabam prisioneiros de sua presa. Não é sem motivo que nada muda efetivamente.


A carne é boa
Para o espírito,
Mas o espírito
É bom para a carne?

O amor constrói,
Mas e quando o amor
É solitário, quando não é
Possessivo?

Fomos feitos à imagem de Deus
Mas foi Ele quem nos fez tão falhos?
Deus é o Pai dos homens
Mas por que os homens
Só respeita o Homem
Que os lideram como pai?

Se Deus é uno,
Não deviam as pedras
Também adorá-lo?
Mas tantos quantos existem
Como a variedade de raças humanas?

Como é que recebendo tão pouco
Ainda sustentamos um governo?

Muitos não procuram outros mundos
Por covardia de enfrentar este?

Se o dia de hoje
Nunca é garantia do amanhã,
Por que somos prisioneiros
De calendários e relógios?

Um jornal documenta os fatos da realidade
Ou ajuda a filtrá-la com um papel timbrado?

Todos consultam algo para saber do próprio futuro,
Mas fazem algo para garantir o futuro geral?

Se a juventude se acha tão rebelde
Por que aceita viver de maneira tão fútil?

Nenhuma manifestação ainda que artística
Poderá ser considerada anarquista
Pois ao se manifestar, estará organizada
Por algum critério estabelecido.

Minha função é a de lançar a dúvida.
Eis meu prazer e minha tortura.
Porque quem se dá ao trabalho de pensar
Deve estar bem nutrido de idéias.
Ao fazê-las em confeitos escritos,
Nutrir os vazios dos espíritos dos demais.
Estas obras em que me dedico,
Aos poucos definhando ao dar parte de mim,
Só são suculentas
Porque os ingredientes são os melhores.
As obras de melhores
E anteriores a mim,
Seus livros são minha hóstia.
Neste estranho templo da sabedoria
Pretendo ser o vinagre amargo
Tanto para engasgar os acadêmicos
Quanto para esterilizar seus vermes.
Cuide bem de mim,
Estou em tuas mãos
E cabe à tua cabeça
Fazer bom uso de mim,
Para que estas minhas carnes
Não tenham sido temperadas em vão.

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Terceira revelação

Só vos permiti que continuásseis em vossa obsessão 
pela perfeição e busca do mundo espiritual, 
pois bem sabeis que com esse senso religioso inicial 
é que vos percebêsseis como criaturas inteligentes, 
dotados de razão e consciência. 

Deste ponto, vos considerastes e respeitastes, 
aos que vos assemelham, constituístes vossas famílias, clãs e cidades. 
Vós formastes vossa comunidade e sociedade donde, para tanto e tal possibilidade, 
criaram o necessário e fundamental senso de lei, justiça, crime e castigo. 
Sem isto, ainda seríeis animais, 
de forma alguma a civilização existiria e a humanidade se aniquilaria. 

De forma alguma Eu permitiria a este projeto que fracassasse, 
ainda que muitas obras Eu tenha realizado. 
Agora que o fundamento já foi feito 
e que vossas capacidades estão plenas, 
confio que vós mesmos vos façais crescer e prosperar, 
se ousarem evoluir com tanto afinco que dão a vossos credos, 
igual aos anjos vos tornareis 
e poderão criar vossos próprios mundos, 
em algum ponto das intermináveis Pradarias da Eternidade. 

Mas que antes fique claro que o Soberano, Eu Sou. 
Carne não ordena carne, nem alcança o espírito; 
o espírito não ordena ao espírito, nem satisfaz a carne. 
A cada um, a Lei, de acordo com a própria natureza 
e a Justiça, de acordo com a realidade que estes vivem.

quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Segunda revelação

Que consideração Eu darei a vós sobre Mim? 
Perguntarei-vos melhor: que consideração vós tendes sobre Eu? 
Tivestes, entre vós, muitos que foram deuses ou mesmo filhos de um. 
Mesmo estes avatares, existiram em carne, 
do contrário , não teriam filhos, que também vieram em carne. 
Mesmo os profetas, magos ou iluminados, existiram na carne. 
Então, a carne, Eu Sou.

No entanto, ergueis vossos templos, 
instituis ordens e sacramentais sacerdotes, 
para vossas crenças do que não vos é natural, mas sobrenatural; 
não ao que é da matéria, mais apropriado à vossas preocupações, 
mas ao que é do espírito. 
Então, o espírito, Eu Sou.

Digo-vos: nem do espírito Eu Sou, 
do contrário vos seria estranho, 
deixem o mundo espiritual aos anjos e aos que são dessa realidade, 
é inconcebível ao que é espírito como se conforma ou necessita a carne. 
Também não sou carne, pois vós mesmos sentis que algo vos anima e, 
mesmo fosse somente fantasia, 
esse mundo espiritual, tal entendimento ou visão vem de Mim, 
o mundo espiritual é como o mundo material, 
emanação do que é e não é, pois o nada e o tudo, Eu Sou.

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

Primeira revelação

Por que quereis, Meus pequenos, saber da origem das coisas? 
Vossa estada é tão curta, 
proveito melhor vos daria primeiro em vos entender. 
Depois em entender o vosso lugar no mundo. 
Terceiro, em dar, a cada caso, 
o reconhecimento e o respeito que merece. 
A origem, Eu Sou. O Único. O resto é duplo. 
Tudo que existe vem da minha manifestação, 
como um círculo, não há começo senão Eu. 
Não há fim, pois eterno Eu Sou.

A emanação vem por um raio, 
a vontade, em círculos, diferentes planos, camadas e existências, 
mas o ponto central, o Um, Eu Sou. 
Escandalizareis-vós se soubésseis quantos, 
muitos mais que vós, existem acima, além ou aquém. 
Tratai, portanto, do que vos são menores, 
com a mesma complacência 
que esperam ser tratados pelos que vos são maiores. 
Reconhecei e respeitai a única riqueza que tens em vosso mundo, 
a essência necessária para a vida, que é a água. 
Vede como criei tudo aberto e imenso, 
dívida com vosso igual o terreno, 
sem tirar do menor do que este necessite para seu provento.

Tirai do vosso terreno o que vos basta, 
não acumuleis nem fareis de outrem fonte do vosso sustento. 
Se tiveres algo de valioso, 
não o guardeis para vós, pois o tesouro verdadeiro vem em 
compartilhar. 
Ainda vos digo isso embora não necessitais, 
pois Eu escrevi em vossos corações com Meu fogo, 
se quiserdes conhecer a Lei, 
consultem os vossos corações, pois é lá onde estou.

terça-feira, 18 de julho de 2017

A capela do prazer

No intuito de esclarecer de vez tantas questões e, sobretudo, de encontrar a verdadeira origem de tudo, bem como de conhecer o zênite da humanidade, ou quem é o Senhor, ou Deus, eu tomei cinco mulheres, em um ritual único. Nós viemos a captar estas estranhas mensagens, cujo teor original não poderia ser reproduzido, do contrário todas essas paredes, com as quais a civilização humana constrói o mundo, os conceitos de realidade ou sobrenatural, as convicções racionais ou espirituais. Desfariam-se, como bolhas de sabão que são.

quinta-feira, 22 de junho de 2017

A obsessão de Saturno

Os vapores do vinus dissiparam-se e Saturno despertou do sono dos ébrios, sentindo um gosto ruim na boca e a cabeça latejando. Nós chamamos de ressaca e a associação dos efeitos posteriores do consumo excessivo de álcool com o movimento das marés não é coincidência. Povo do mundo, sabei de uma vez por todas que não existem coincidências, o acaso ocorre porque também faz parte do universo, da natureza.

Saturno percebeu que estava só e logo imaginou que seu irmão Urano deveria estar cortejando Gaia, sua esposa. Saturno, ao invés de correr atrás de Gaia, foi em busca de Ceres. Povo do mundo, que vive uma vida sem cor, sem sabor, sem alegria, vós nunca entendereis e manifestareis o real significado da palavra Amor! Vós que misturais agendas pessoais em vossos sensos hipócritas de moral, não tem competência para censurar os Deuses!

Enquanto Saturno procurava por Ceres pelo castelo, chamado de Olimpo, ele recordava-se de sua infância e que os poucos e raros momentos de paz, tranquilidade e conforto foram sempre os que ele passara ao lado de Ceres. Os caprichos do Destino e da Fortuna conduziram Saturno até o jardim onde Ceres estava tão entretida com suas bestas domesticadas que nem se deu conta do sumiço de Gaia. Dentre estas, certamente um casal de nossos ancestrais compartilhavam desse cativeiro dourado, mas mesmo assim nós não fomos notados e não podemos condenar Saturno.

- Saudações, Ceres, minha irmã.

- Pater Saturno, não são belos meus bichos?

- Hã…sim…adoráveis. Querida irmã, devia estar fazendo coisas melhores e maiores. Se vier comigo, tu será a Deusa Mãe, aquela que será reverenciada pelas gerações como a Deusa desse mundo.

- Pater Saturno, o que está me propondo é ousado, perigoso e traiçoeiro. E onde tua esposa Gaia entra nesse seu grande plano?

- Gaia não tem a vitalidade e a juventude para tal cargo. E não é segredo algum que Urano a queria e eu a ti. Então nós temos que acertar as coisas e fazer justiça.

- As coisas são como são, como devem ser. Nós aturamos o que nos desagrada, como diz Urano e, para ser sincera, eu não suporto a ele tanto quanto a ti. Vós, Deuses, meninos, são todos iguais, são apenas estorvos.

- Considere então como isso pode ser consertado se tu, Ceres, tomar o lugar de Antu.

- O que diz? Isso é mais que ousadia, é blasfêmia e heresia. Cuidado com o que deseja, Saturno.

- Pois aguarde meu retorno e te mostrarei que nós, meninos, não somos estorvos, nós temos nossos méritos.

Saturno partiu do Olimpo, deixando para trás Ceres, Urano e Gaia no luxo, rumo ao seu funeral, atravessando por perigosas escarpas entre trilhas, por montanhas desconhecidas. Ceres disse a verdade em sua reação juvenil, temperamental e imatura demais para se importar com tudo isso. Como num péssimo roteiro, Urano e Gaia ressurgem no jardim como se nada tivesse acontecido, para chamar Ceres para o jantar e ninguém lamentou a ausência ou a partida de Saturno. Este, seguindo as instruções de espíritos locais e o impulso da fúria de seu coração, chegou na entrada do santuário de Python e, com suas emoções confundidas com as lembranças da temível Ninmag e a desgraça de Urânia, o poderoso Saturno hesitou. De dentro do santuário surgiu a figura da Pithon, em corpo e altura, semelhante a Ninmag, mas suas cores eram verde, dourado e amarelo.

- Adiante-se! Apresente-se! Mostre-se amistoso e visite-nos em paz e conforto, pois somos o vosso igual.

- Eu perambulei pelas sombras deste mundo por muito tempo. Eu, Saturno, filho das estrelas, venho aqui para humildemente pedir à grande Pithon que me mostre a luz.

- Nobre Saturno, siga-nos e mostraremos o coração, a magia deste mundo.

A Pithon levou Saturno até a fenda sagrada onde, diz-se, o Espírito deste mundo habita e dali Ele sai, trazendo a vida. A visão terrível que Saturno viu foi semelhante à de Enki, pais matando filhos, filhos matando pais, mães devorando sua prole. Mas, ao contrário de Enki, isso não perturbou o coração de Saturno.

- Diga-me, Pithon, como faço para recuperar as relíquias de Anu?

- Mesmo diante da tragédia desejas prosseguir?

- Para viver sem sonhos e com medo é melhor morrer.

- Então não queres vir para a luz. Sonhos que se realizam são justos, os que não, são caprichos do orgulho cego.

- Então mata-me agora.

- Nós fazemos sacrifícios por dever sagrado, jamais por apetite ou vingança. Para ti, damos a rota para o teu destino. Tu terás de humilhar-se mais e pedir a ajuda daquele que mais odeia.

-Este é um enigma ou um jogo? Eu devo arriscar-me em um caminho perigoso e desconhecido contando com a ajuda de quem mais odeio?

- Este é o preço que deve pagar. Não temes a violência e a morte, mas teme este que odeia?

- Jamais! Aquele fedelho nunca foi uma ameaça, apenas uma irritação.

- Então nos traga teu maior desafeto, pois o destino dele está ligado ao teu.

Cada vez mais decidido, Saturno recoloca seu elmo, sobe em sua montaria e, dispensando até sua comitiva, parte sozinho até a região chamada de Anatólia, onde aquele que ele chamou uma vez de filho, Cronos, deve estar escondido em exílio. Povo do mundo, guardem este nome no coração, pois esta é uma das regiões sagradas que ocultam nossas origens.

Saturno não teve dificuldades para encontrar Cronos pois ele, como todos os Deuses das estrelas, estava construindo uma cidade para dar início à uma civilização. Povo do mundo, o nome dessa cidade era Troia. Lembrem-se de Roma, de Atenas, mas jamais se esqueçam de Tróia. Cronos não demorou para sair dos portões de sua cidade com sua armadura completa e espada em punho para enfrentar Saturno.

- Ora, ora. Enfim, aprendeste algo útil. Vamos, guarde essa faca antes que te cortes. Nós temos negócios a discutir.

segunda-feira, 15 de maio de 2017

Quadrilátero amoroso

Quando Saturno retornou a Alba seu irmão Pontus foi prestativo e receptivo, não por saudades ou preocupação fraternal, mas para não dar chance aos boatos da corte chegarem ao ouvido de Saturno a respeito de suas ações. Para sorte de Pontus, Saturno enredava-se mais e mais nas armadilhas do Destino, Saturno estava apressado e não deu ouvidos a Pontus ou à corte dos Deuses.

- Gaia, minha amada esposa e rainha de Alba. Apronte-se pois iremos à Hélade ter com nosso irmão Urano.

- Meu coração exulta, meu amado rei. Nós poderemos rever Ceres, nossa irmã.

- Oh, sim, iremos. Aquele velhaco do Urano tem uma fortuna e tanto ao se tornar consorte da jovem e bela Ceres. E ela tem dois anos a menos que tu!

- Nós duas éramos bem pequenas quando aceitamos, eu a ti, ela a Urano.

- Sim e se não me engano você não gostou muito de que ela havia se intitulado Deusa da Terra.

- Isso foi uma bobagem. Quem quer ser Deusa do chão, do pó deste mundo, quando se é Deusa do planeta? Nesta e nas gerações vindouras será o meu o nome dado a este mundo.
- Então eu devo ficar de olho em Urano. Eu sei muito bem o que aquele velhaco pensa quando te vê por perto.

Pontus vê Saturno partir em viagem mais uma vez, mas desta vez com Gaia, o que o deixa no trono mas em uma situação precária sem ter uma Deusa que lhe confira a posição e a autoridade. Qualquer Deus poderia lhe cortar a cabeça, se clamasse pelo trono apoiado por alguma das irmãs, primas ou sobrinhas de Gaia. Os problemas de Pontus não nos interessam no momento, seguiremos a caravana de Saturno.

Foram necessárias quarenta semanas de nosso mundo para Saturno chegar até a colônia de Urano, chamada Hélade, sob os auspícios do Deus desconhecido. Povo do mundo, cheios de orgulho e vaidade, saibam que em suas origens, a Hélade e seus habitantes, que fundaram nosso pensamento e cultura, não estavam nas formosas ilhas, mas no continente, em uma região que conforme os gostos e as preferências ora chamam de Europa, ora chamam de Ásia. Tolo e fútil povo do mundo! Colocais nomes, fronteiras e divisórias mesmo onde estas coisas não existem!

Urano ficou agastado ao ver Saturno aproximando-se de suas portas, mas alegrou-se ao ver Gaia na caravana. Ele não suportava os modos graves e soturnos de Saturno e nunca seria capaz de esquecer a leveza e jovialidade de Gaia. Imediatamente fez seus servos abrirem as portas do Olimpo, sua cidade-estado, sua fortaleza e seu castelo. Instou, em seguida, a Ceres para que se aprontasse.

- Exultai, Ceres, minha rainha, pois nosso irmão Saturno e nossa irmã Gaia vieram a ter conosco.

- Alvíssaras! Eu não suporto Saturno mas eu amo minha irmã Gaia.

- Nem tudo é perfeito! Aturemos o que nos agrava e manifestemos amor a quem nos agrada!

Ceres aprontou-se alegremente para rever sua irmã, ingenuamente esquecendo das verdadeiras intenções e planos de Urano para esta visita. Saturno adentrou ao Olimpo e ficou impressionado e invejoso pelo fausto e luxo que encontrou. Franziu a testa e fechou o semblante com a chegada de Urano na sala de recepção, mas logo esqueceu-se de tudo ao ver a bela pele alva e o cacheado dourado dos cabelos de Ceres. Mesmo depois de tantos anos passados neste mundo, Ceres ainda parecia com aquela menina com quem ele brincava na infância e logo seguiram o desejo e a concupiscência.

- Pelos Deuses antigos! Minha irmã Ceres, como tu cresceste!

- Pater Saturno, Mater Gaia, sejam bem vindos em nossa humilde casa.

- Humilde? Há! Ora, vamos, Urano, orgulhe-se de ter saído de sua tenda de pele de cabra e chegado a tal palácio!

- Nosso querido irmão Saturno é muito gentil.

- Gentil e sedento! Ouvi falar que tu faz uma beberagem que rivaliza com o hidromel.
- Vinus, meu caro irmão. Venha, vamos deixar as mulheres com seus afazeres e vamos nós cuidar dos nossos.

- Urano, meu irmão, nós temos que nos unir, agora que Anu foi engolido pelas águas. Enquanto eu construía Alba, eu ouvi falar que estas florestas têm um Deus desconhecido.

- Sim, eu também ouvi tais rumores, mas nunca o vi. Dizem que ele é o Espírito deste mundo, conduz ritos selvagens, em assembléias com diversos espíritos e entidades, em círculos, no meio da floresta.

- Eu também não o vi e nós não sabemos se podemos confiar nele, qual seu poder ou qual a relação dele com nossa corte. Temos que nos garantir. Urania me disse que há um santuário além de suas paredes.

- Sim, o santuário de uma Deusa local, chamada de Pithon. Os boatos sobre a vida de Urânia vivendo como Lupina soam terríveis, mas é um verdadeiro terror o que eu ouço sobre o santuário de Pithon.

- Nós precisamos encontrar este santuário, meu irmão. Esta Deusa pode nos dar a chave do reino dos Deuses. Mas antes de traçarmos um plano, diga-me, do que é feito este vinus?
- De pequenas frutas rubiáceas que brotam de uma moita selvagem que se arrasta, se agarra e se pendura por todo lugar. Gostou do meu vinus, irmão?

Saturno deixa cair sua cumbuca, bem como seu corpo. Desacostumado, deixa-se abraçar pelos vapores do vinus e se deixa levar pelo arrebatamento do sono dos ébrios. Urano prontamente abandona seu irmão e sai em busca daquela que comprime seu coração, Gaia. Ele encontrou-a junto de Ceres, no jardins do castelo. Discretamente, chama a atenção de Gaia que, em sua curiosidade ingênua e juvenil, aproxima-se dele, deixando Ceres entretida com algumas bestas que esta havia domesticado.

- Meu irmão Urano, que bela casa tens!

- Sim, querida irmã Gaia e isto tudo pode ser teu.

- O que dizes? Eu sou esposa de Saturno e Ceres, a quem eu amo mais do que a um irmão, é a tua esposa.

- Isto pode ser acertado. Vem e vê como teu marido e rei não merece teu apreço.
Urano conduziu Gaia até o salão onde ele e Saturno conversavam e lá Gaia viu o orgulhoso, circunspecto e grave Saturno roncando, deitado em um catre, as faces rubras como os frutos usados para a fabricação do vinus.

- Eu estava tratando com ele e teu marido contou-me de seus sonhos delirantes de conquistar a chave do reino dos Deuses. Fique comigo e tudo será teu.

- Tudo? Serei eu a Deusa desse mundo? E o que será de Ceres?

A conversa torna-se íntima e não demora para que Urano conquiste seu prêmio e regozije com o butim. Povo do mundo, não se escandalize com os fatos da vida, do amor, do desejo, do prazer. Não torne o fardo de viver maior que o necessário.

segunda-feira, 17 de abril de 2017

Em busca das relíquias

Saturno estava na beira do grande lago que se formava onde antes era a Cidade dos Deuses. Quando Ninmag apareceu nos céus, os sentimentos de Saturno estavam divididos, ele não sabia se ficava desesperado ou extasiado. Esses sentimentos não estavam dirigidos a Anu a quem se poderia supor que Saturno tivesse lealdade e companheirismo. A parceria era uma necessidade, uma ferramenta, uma situação tolerável, para os objetivos e sonhos que Saturno tinha. A tensão entre desespero e êxtase era acusado porque Saturno temia pelo seu couro. O porte e o poder de Ninmag o impressionou.

Com o arremate da luta, Saturno vê o reino e o poder de Anu afundar em um torvelinho. A sensação era a de perder o lar familiar, o de ser órfão, mas enquanto a Cidade dos Deuses era engolida pelo grande lago que se formava, muitos planos tomaram o lugar dos sentimentos. Nisto Saturno tinha muito em comum com Anu, sua personalidade violenta era apenas comparável com sua ganância. E Saturno queria tornar a sua Albion tão grande e tão gloriosa, senão maior, que a Cidade dos Deuses. Nestes sonhos mirabolantes ele via a necessidade de se resgatar a coroa, a espada e a armadura de Anu. Com isso em mãos, os outros Deuses se ajoelhariam diante dele e as outras colônias seriam suas vassalas.

Fazer planos é uma coisa, realizá-los é outra. Saturno conhecia o poder de Ninmag sobre as águas. A Deusa havia caído junto com Anu. E se seu poder submergiu junto dela ou haveria mais algum Deus ou Deusa que conhecesse o segredo, não era de conhecimento de Saturno. Ele teria que apelar a Deuses e Deusas mais velhos que pudessem orientá-lo. Por mais doloroso que fosse, Saturno teria de ir até Urânia, sua mãe. Não pela distância, não pela dificuldade, mas pela carga emocional e feridas que seriam revividas.

Por um capricho do Destino, Urânia foi buscar seu refúgio entre as sete colinas sagradas ao norte de Alba, onde os boatos contam que ela vivia como uma Lupina, uma família de Deuses menores. Para ir até lá, o único em quem Saturno poderia confiar era Cronos, seu filho bastardo e exilado. Pontus, seu irmão mais novo, inexperiente e irresponsável não se queixou ao ter de assumir a coroa. Saturno entrou na floresta e certamente deve ter nos notado, mas como Cronos não nos deu muita importância. Ele também sabia dos boatos de que ali habitava um Deus desconhecido, mas orgulhoso como era não se deu o trabalho de conhecê-lo.

As sete colinas sagradas era o último lugar onde os Deuses queriam estar. Ali existiam, perambulavam e habitavam diversos espíritos, entidades e divindades, locais e estrangeiras, com uma ligação muito física com a natureza e viviam de uma forma inaceitável para os padrões aristocráticos dos Deuses. Ver a altiva e antes poderosa Urânia, sua mãe, cercada de entes que faziam questão de se manifestar em formas tão revoltantemente carnais, não foi agradável. Ritos repugnantes viscerais, animais e selvagens ocorriam em diversas clareiras, e círculos marcados por pedras. Saturno sentiu que, em algum momento, ele teria que submeter estas entidades ou civilizá-las.

- Eu desejo falar com Urânia.

- Vinde adiante! Apresente-se! Mostre-se amistoso e visita-nos em paz e conforto, pois somos vosso igual.

- Não sou vosso igual, pois minha linhagem é pura e meu sangue das estrelas. Vós sois selvagens, eu sou civilizado. Vós sois Deuses menores.

- Menores? Quem é menor, nanico?

Um Deus em uma forma de um enorme urso negro aproxima-se de Saturno pronto para arrancar a cabeça dele.

- Basta Avvagdu! Este é Saturno, o meu filho amado. Diga-nos, grande Rei de Alba, o que deseja de nós?

- Salve Urânia, Rainha Excelsa do Firmamento, a Formosa Deusa Mãe…

- Basta! Nós não queremos ouvir mais estas fórmulas aristocráticas vazias e hipócritas. Diga-nos logo vosso desejo.

- Antes, nobre Urânia, saiba que Anu caiu.

- Aquele que almeja ser mais do que pode ser há de cair. Nós não estamos interessados em fofocas da corte e vós não vieste até aqui por compaixão a vosso rei. Diga-nos o vosso desejo.

- Nobre Urânia, ainda que tenha se afastado de vossa família, deveis saber que deve ter começado a corrida para o trono. O que eu desejo é recuperar as relíquias de Anu e clamar pelo trono.

- Tolo! Nós saímos da corte e vós quem ignora que o trono é concedido ao Deus que é consagrado como consorte pela Deusa Mãe! Ah, raça das estrelas! Por vossas origens vós vos considerais tão superiores, tão altivos! Esqueceram-se até das Leis do Universo! Vos custará caro tanta arrogância e presunção! Vossas conquistas serão vossas sentenças.

- Eu não temo o Destino! Eu vos imploro que me diga como reaver as relíquias de Anu.

- Apenas quem conhece o mistério das águas poderia do grande lago trazer à superfície o tesouro de Anu. Deveis procurar Ninmag.

- Nobre Urânia, Ninmag, a Senhora das Águas caiu com Anu.

- Isso é lastimável. Vós tereis ou que encontrar o báculo de Ninmag ou aprender a domar as águas com a Senhora dos Mares. Procureis pela Pithon, no santuário além da Hélade, a colônia de nosso irmão, Urano.

sexta-feira, 7 de abril de 2017

Apostolado profano VI

Eu estava à toa, passeando pela praça central da cidade, junto a tantos outros humanos e pobres diabos, tentando sobreviver. Entretido, em pensar nas soluções dos tantos problemas que nos atingem todo dia. Nesses momentos, o nível de irritabilidade chega a ser neurótico, todos à sua volta parecem-se com formas anormais de humanóides. Num estado emocional destes, os poucos momentos que dispomos nos valem muito, não devem ser interrompidos ou perturbados, por qualquer motivo que seja.
Mas foi o que aconteceu, meu precioso tempo foi interrompido por um vulto, que ficava na minha frente a murmurar sons sem nexo. Neste momento, os demais sentidos estão todos anestesiados. Somente após meus nervos se acalmarem, é que eu pude visualizar e ouvir melhor, quem me detinha e com que propósito.
Pelo que falava, não parecia ser mais do que um dos milhares de crentes que povoam o centro da cidade, a querer converter as pessoas para a fé, pregando o evangelho. Mas visualmente era algo muito diferente, era uma magnífica mulher, na flor da beleza madura, morena, alta, esguia, com volumes perfeitos, tudo nos lugares certos e curvas harmônicas Uma mulher, como nunca eu havia visto na minha longa existência, um exemplar único, que mostra bem como tais criaturas são abençoadas pela natureza.
Pensei no desperdício, que a loucura na fé nesse deus retardado fez, ao privar do mundo da convivência com essa beleza. Uma injustiça, usar tais e tão fartos atributos em algo tão estéril e irracional. Logo decidi que devia fazer algo para recuperá-la a vida normal, eu tinha esse dever com o mundo e iria convertê-la de volta aos prazeres materiais.
Mas eu era um pobre diabo, enfeitiçado pela beleza dessa mulher. Como vergonha e sinceridade não são exatamente minhas qualidades, comecei a fingir de pecador arrependido, caindo de joelhos diante desta, clamando pela misericórdia divina:

-Oh, Senhor! Foi Tu, meu Deus, que enviaste este anjo para que eu pudesse me arrepender de meus pecados! Quão grande é Tua misericórdia, Senhor, mostrando sua magnificência para este pobre servo pecador! Amém! Aleluia!

-Calma, bom homem! Não sou um anjo de Deus, apenas uma servidora do Nosso Senhor, Todo Poderoso. Se o cavalheiro quiser, posso receber sua confissão e absolvê-lo em nome de Deus Pai Todo Poderoso, pois a misericórdia do Senhor é grande e a piedade, imensa. O seu arrependimento será ouvido por Ele, com certeza.


Abracei suas perfeitas e roliças pernas, encostando o lado do meu rosto no seu colo, sentindo o cheiro suave que seu sexo desprendia, imitando uma pessoa tomada por um grande fervor e arrependimento.

-Não me iluda. Eu sei que Deus Pai a mandou por misteriosos desígnios, para que eu pudesse expurgar todos os meus pecados, pagando penitência,fazendo oferendas e cultos ao grande e louvável Deus! Permita-me, anjo, quero me arrepender!

-Amigo, irmão, está muito emocionado! Eu sei que seu arrependimento é grande, mas tente se controlar, por favor!

Meu abraço já lhe causava arrepios e suores, que em sua inocência, não conseguia explicá-los e controlá-los. Não era o suficiente ainda, ela estar confusa e indecisa se evitava meu abraço, ou se o acolhia como forma de meu arrependimento. Eu queria mais, queria corrompê-la, abracei-a fortemente, levando seu colo de encontro ao meu nariz e minha boca, onde minha língua lasciva já se contorcia, querendo beber desta fonte. Minhas mãos, também inquietas, começaram a lhe entrar pelo tecido de sua saia, percorrendo lentamente a penugem que cobria sua pele, até chegar em suas coxas, bunda e calcinha, que iam sendo apalpados e explorados sofregamente.
A coitada, mais confusa e maravilhada pelas carícias que recebia, não conseguia mais me refutar. Visivelmente sentindo que lhe começava a aparecer o desejo e a excitação, ela pediu-me respeitosamente que parasse.


-Tome esse endereço. Lá eu o esperarei, para que se possa confessar melhor. Aqui na praça existem muitos curiosos e demônios, que fariam você cair em tentação novamente. Lá na igreja, estaremos seguros e mais perto de Deus.


Despediu-se com um sorriso e um aperto de mão. Permaneci alguns momentos, ainda de joelhos, tentando imaginar de que forma eu a envolveria em meus braços, para despertar-lhe o desejo natural e inalienável que todo ser tem.
Não tive sossego no resto do dia e muito menos de noite, tentando planejar cada detalhe da minha confissão, que eu utilizaria para converter esta delícia, ao mundo das perversões.
No belo dia marcado para nosso encontro, era difícil disfarçar o nervosismo e a excitação. Tinha de me controlar ou senão meu disfarce de pecador arrependido cairia, mais o disfarce de gente, imediatamente ela veria, pelos cornos e cauda, que eu sou um demônio.
Entrar numa igreja, para nós não é mais um empecilho, graças ao trabalho de conscientização no Inferno e a decadência no Paraíso. Ela estava no confessionário, esperando-me, com seu hábito sagrado e uma bíblia. Nada disso me amedrontava mais, nem significava algo para mim. Ela estava mais bela e atraente, naquela túnica sagrada e ar angelical.

-Aqui estou eu, meu anjo, para confessar meus pecados!

-Sente-se aqui perto de mim. Quero ouvir bem seus pecados.

-Minha adorada. O meu pecado é desejar possuir carnalmente uma servidora de Deus. Quero meter com ela mil vezes, anjo da minha vida. Seu corpo é o motivo do meu pecado, a tentação é grande e não consigo conter-me. Por favor, ajude-me!

-O que dizes, blasfemador, herege? Cometeu o sacrilégio de desejar possuir carnalmente esta serva de Deus, na casa do Senhor, diante do altar? Deveras pagar uma penitência muito alta! Venha! O altar nos espera para começarmos a rezar pela sua absolvição!


Dito isso, ela me arrastou até perto do altar e sentamos juntos nos bancos centrais da frente. Foi quando ela abriu a toga e deixou claro, ao pegar meu instrumento sagrado, qual era sua intenção e minha penitência.
Os frescores de seus corpos e seus detalhes íntimos eram tão perfeitos quanto minha imaginação demoníaca adivinhava. Meus cornos se contorciam de prazer, ao pensarem o quanto deveria ser delicioso, descarregar parte do meu ser e energia, num jato, dentro daquela deliciosa gruta.
Iniciei o interlúdio, pondo-me atrás dela, para executar minha posição predileta: enquanto eu a penetrava-lhe atrás, uma de minhas mãos ocupava-se de um de seus seios volumosos, enquanto que a outra lhe excitava a úmida, macia e felpuda flor. Ela tremia de prazer e sua xana já começava a escorrer aquele líquido precioso e perfumado de fêmea. A cadência aumentava e nossos corpos uniam-se, mais e mais. Até o valioso instante de plena excitação, quando nos derramamos em um orgasmo delicioso e duradouro.
Mal eu saí de trás e ela se pôs a sugar-me, oferecendo sua flor para minha língua. Isso nós fizemos até que ela, já excitada, gozou em meu rosto, recebendo o mesmo, naquela garganta gulosa, de minha parte. Ficamos excitados mais ainda, ela, sem deixar-me chances de tomar a iniciativa, ela já se posicionara com suas ancas próximas ao meu ventre, iniciando a introdução do meu cetro naquele portão das delícias, que era sua flor.
A excitação que nos tomava, começou a nos transfigurar, eu pude ver sua auréola e asas de pomba branca e acho que ela pode ver meus chifres, minha cauda espetada e minhas asas de morcego. Mas ela não desengatou, pelo contrário, começou a mover-se mais excitada e lasciva por sobre meu cetro.
As chamas que compõem meu ser não aguentaram tamanha excitação. Comecei a ser consumido, minhas chamas subiram, como uma coluna sólida, em direção a sua flor, que também já gozava de sua luz líquida sobre mim. Tivemos o tipo de orgasmo raro e único no universo, que só é possível quando há cópula entre os espíritos, este orgasmo é mais completo e recompensador que existe.
Depois que nos separamos, nunca mais a vi. Talvez ela esteja em outra praça, tentando salvar mais uma alma pelos métodos que lhe ensinei.
Gostaria de encontrá-la, principalmente quando descobri que a igreja onde fizemos nosso culto profano foi demolida, pois já tinha sido dessacralizada e abandonada já a muito tempo, de forma que, nenhum de nós cometeu um sacrilégio, nem profanado um lugar sagrado com nossos ritos sexuais.
Eu vou, constantemente, à praça central da cidade, na esperança de encontrá-la, mas só encontro outras mulheres crentes, que também mereceram ter essa lição, mas nenhuma se comparou a esta. Por isso, mulheres, prestem atenção! Se querem sua felicidade, ela está em plena realização dos desejos. Para tanto, é necessário achar um comedor capaz o suficiente, nem mais, nem menos. Só há um jeito de acharem seu comedor ideal: é desfrutando!

segunda-feira, 13 de março de 2017

Cronos e Saturno

Ainda temos pontas soltas a prender e nós a desfazer antes de passarmos adiante, para que o profeta do profano possa contar o que os Deuses fizeram após a morte de Anu. Sigamos a segunda rota onde veremos a história de Cronos e o porque seu destino está marcado por Saturno, pai dele e patriarca de sua família.

Para entendermos a delicada relação entre os Deuses e como esta relação resultou na tensão entre Saturno e Cronos teremos que voltar ao tempo onde não havia tempo, no lugar onde não havia lugar, o Caos.

O Caos era tanto uma circunstância quanto uma consciência divina composta de múltiplas personalidades, onde existência e inexistência se digladiam. Em algum momento desse tempo não-tempo duas consciências divinas tiveram poder suficiente para despertarem, ganharem a auto-consciência e se estabilizarem dentro do torvelinho do Caos. Estas forças, estas entidades, estas divindades eram tão primordiais e distintas, tão antagônicas e opostas que suas existências poderiam acarretar a dissolução deles e delas. Por falta de definição melhor, este é o Deus e a Deusa que nós louvamos e adoramos em nossos círculos. Nosso Deus e nossa Deusa tiveram e usaram o poder que tinham não para se autodestruirem, mas para se unirem em amor, desejo e prazer. O ato de criação do universo foi um ato de geração. A Deusa provê a substância, o Deus provê a modelação. E disso surgiram diversos oásis em meio ao Caos, inúmeros cosmos, compostos por inúmeras galáxias, inúmeras dimensões, inúmeros Deuses e Deusas.

Povo do mundo, não vos enganeis achando que a existência, a vida, apenas ocorre coberta por carne, por cadeias proteicas de carbono. O carbono é apenas uma das substâncias que conhecemos que formam a vida e nosso conhecimento é limitado. Vida e existência são condições que vão se manifestar de diversas formas que vão além do carnal, do material.

Este é o tempo quase-tempo, o Caos ainda rodeia a tudo, pequenos oásis, cosmos, galáxias, Deuses e Deusas. Conforme as coisas vão surgindo, ganhando consistência e permanência, a vida e a existência tornam-se mais complexas, os Deuses ganham “massa corpórea” e podem, enfim, copular e gerar sua descendência. Por imitação, por convenção, por um mistério, um Deus pode ser o rei ou o consorte, uma Deusa pode ser a rainha ou a donzela. A donzela pode reclamar seu direito de ser rainha quando tiver um filho. O consorte pode reclamar seu direito de ser rei ou unindo-se à rainha ou depondo o rei. A Deusa que tiver uma filha, esta torna-se sua herdeira e sua donzela que, para clamar por seus direitos, procurava algum Deus para unir-se. Cabe à deusa regente e suas filhas determinar se este Deus é o consorte ou é o rei. A situação de Saturno e sua natureza deram as condições para que fosse criada a tensão entre ele e Cronos, seu filho.

Saturno nasceu em uma situação nem um pouco propícia. Urânia, sua mãe, não tinha uma linhagem direta com a Deusa-Mãe, ela era fruto de um relacionamento casual e seus consortes não se tornaram um Deus-Rei. Assim como Cronos, Saturno conheceu uma vida cheia de dificuldades, privações e humilhações. Assim como Cronos, Saturno conheceu muitos pais antes de crescer o suficiente para lutar pelo seu lugar. Esse foi o erro e o crime de Saturno. Cansado de não ser notado, cansado de ver a honra de sua mãe desmerecida, escolheu uma rota de sangue até chegar ao trono. Um a um, matou todos os Deuses que tivessem conhecido sua mãe. Uma por uma, ele estuprou as Deusas, esposas e filhas, destes Deuses. Uma destas era Gaia, a Deusa que notou nosso mundo, de quem recebeu o nome em homenagem.

Quando Gaia exigiu seus direitos de herança, Saturno tratou de garantir seu privilégio de consorte e posição de Deus-Rei, aclamando a Cronos seu filho e protegido. Foi Saturno quem primeiro percebeu e fez proveito de uma regra implícita nos direitos de linhagem, iniciou a supressão do matriarcado e iniciou a implantação do patriarcado. Saturno usurpou o poder através de Gaia e paradoxalmente Cronos, seu filho com Gaia, garantia seu nome como patriarca da família.

Por sua própria natureza, pelas condições em que assumia o encargo, pelo capricho do Destino, Saturno foi um tirano de sua família e de sua casa. Gaia sofreu as mesmas humilhações que Urânia e Cronos o lembrava de sua própria infância atribulada. Saturno sabia muito bem o fim que lhe aguardava e pressentia que Cronos viria lhe trazer a Nemesis.

Quando Saturno conheceu Anu e soube de seus planos de sair do Caos em busca de um lugar para erguer um novo reino, ele associou-se imediatamente com Anu, tanto por este ser semelhante a ele, quanto para solidificar sua autoridade na família. Na corte dos Deuses, com a vassalagem a Anu, tornou-se tolerável a presença de Saturno. Com a morte de Anu e a destruição da Cidade dos Deuses, Saturno teve o bom senso de tomar a si a responsabilidade de manter a construção da colônia de Albion. Os Deuses estavam tão assustados e perdidos que se sujeitaram a Saturno. Alguns temiam que Ninmag ressurgisse, outros que Anu retornasse, mas a maioria havia se acostumado tanto a servirem a Anu, de dependerem tanto de sua liderança, que os Deuses receberam com júbilo a coroação de Saturno como Senhor de Alba. Por outro lado, a morte de Anu e a destruição da Cidade dos Deuses dariam a Cronos as condições para crescer, se fortalecer e, no tempo certo, contestar e destronar Saturno. Uma tragédia que cessaria apenas quando um filho de Cronos reestabelecesse a ordem.

terça-feira, 7 de março de 2017

Apostolado profano V

Meu querido, meu amado (assim ela me chama) Pode me dizer por que vocês tem precedência sobre nós, quando muito mais seria proveitoso estar em nossas mãos certos deveres?
São poucas, minha querida, que como você, podem ver que, o que até então é compreendido por ser mulher, foi definido pelo homem. Você é uma em cem, mas logo serão cem em uma. Neste momento só nos restará pedir aposentadoria, pois sempre pertenceu à mulher a razão perfeita de como saber exercer esses deveres.
Oh, não! Nem pensar (ela dizia me abraçando) Tomo meu lugar no trono, mas é sobre ti que haverei de sentar e de sua parte me dará esse apoio tão deliciosos que me põe entre as pernas e me faz ser tão sábia. Só assim aceito reinar, pois saiba que, mesmo rainha, ainda quero ser tua puta, pois me faz falta esse teu corpo que penetra no meu e me completa, me faz feliz.

Ela folheava um livro sobre animais enquanto eu lhe tomava a traseira, ambos assim, deitados na cama.
Notaste meu delicioso (ela me oferecia seu rabo, uma visão do livro e um pedaço de sua sabedoria) que cada fêmea animal foi entregue um atributo especial de beleza e sedução?
Ora, meu anjo de luxúria! No que me diz respeito, a mulher é a mais bela dentre qualquer uma delas!
Meu vingador! Como desmereces assim as outras fêmeas?!
Permita-me donzela desfrutada. Umas tem penachos multicoloridos de sobra à amostra e não há nenhum mistério nisso. Ao contrário, tem escondido em uma parte graciosa e única, as mulheres, seu mais belo tufo de pêlos que um homem poderia conhecer. Já noutras, seu corpo esguio fomenta o desejo de seus machos. E agora vem a mulher, cujo número de curvas é igual à quantidade de formas harmônicas e esculturais, de tal forma que no princípio, se consultarmos a maldita bíblia, até uma serpente a preferiu para conhecer essa ciência que somos alunos um do outro. E que um deus celerado puniu e condenou desde essa primeira manifestação desta ciência, que ainda vai trazer à tona, a sabedoria que vai destroná-lo. Umas têm peito proeminente ou coroas na cabeça. Agora, minha adorada, o que são teus seios (e os acariciei, fazendo-a gemer) senão tua proteção, alimento a infantes e objetos sagrados do teu altar que se erguem aos céus, trazendo ao delírio este pobre mortal e até os santos celestiais? E em tua cabeça não tem o mais sedoso e perfumante fio de Ariadne que me encurta a vida, roubando-a aos golfos e me enredam nessa teia que guarda o ovo da sabedoria, que não me deixam mais me separar de ti, pelo contrário, me faz afundar ainda mais e muitas vezes em teu corpo, como se já não o tivesse feito tantas vezes? Quem viveu como eu pode provar que eu digo a verdade.
Então experimentou as carnes das mais variadas para depois ter a minha e ainda quer me convencer de tuas boas intenções e desejo para comigo?
E acabar aos poucos somente em ti, pois o que tomo por prazer , por diversão, das demais fêmeas, o dou por merecimento e veneração somente a ti (e a lambuzei com meu gozo no qual se somou o dela, em intensidade e qualidade, além de nossas possibilidades físicas, pois, isto sim é amor!)


Ela veio por sobre mim lânguida e solicitante do meu apoio, com olhos afundados em prazer e visão aberta pela sabedoria que nos consumia pela graça do momento.
Meu cetro encantado, de quem recebo a realeza e a sabedoria para reinar. Pode me dizer por que é tão bom trepar sem cessar com meu amor? (Ela perguntava a mim e a meu membro,que ela tomou e encaixava na porta de seu templo sagrado)
Não o sentes? Diga-me você mesma.
Oh! (Ela parou, pois quase lhe subia demais o prazer, quase a desfalecendo e quase a fazendo gozar abundantemente) Meu cetro, algo em mim pede por ti e devo satisfazê-lo. Mas está tão longe e tão dentro de mim que devo conduzi-lo por meus portões até lá e servir esse senhor de meu corpo e desejo a quem ofereço meu prazer e minha alma, e o meu senhor é tu, meu delicioso vingador!
Chamo-te vingador (Assim ela me falava), mas sabe como te amo. Tanto te quero e tanto me faz feliz que quase o tenho por meu Senhor e Deus. Antes tivesse vindo a descobrir tal fonte de saber compensador e delicioso como esse. Mas estava iludida com as fantasias das beatas por Cristo e seu Pai. Como pude me deixar desmerecer assim? Só agora eu estou completa e satisfeita, só assim contigo pulsando dentro de minhas carnes me sinto possuída da verdadeira felicidade e sabedoria, moradora do mais delicioso paraíso e servida pelo mais delicioso fruto que tomo de ti, assim tão despudoradamente e ilimitadamente, meu vingador!


Diga-me meu degenerado! Meu vingador, meu amado sacerdote do profano, por que se entregam tanto as pessoas a coisas tão estranhas e irreais quanto a Igreja, Deus, Cristo e os santos todos, malditos sejam por ter me oculto de ti e de tua fonte de saber!
Ela arrepiou pela blasfêmia que o prazer a levou e sem pudor ou remorso a esta brindou com um generoso orgasmo.
Meu vingador (ela disse já mais calma, mas ainda cheia de desejo por mim) não fique bravo comigo. Eis que vou a partir de hoje considerar meu senhor, não meu servo sacerdote, como queres. Preciso eu muito mais de ti que tu mesmo a mim, a que fico honrada e lisonjeada, mas só me pude coroar porque tenho teu cetro em minhas entranhas a me dar sabedoria tão fodida e deliciosa.

Meus princípios impedem-me de aceitar tanto, minha dama despudorada, eis que sou somente o escritor do profano, não um ministro ou o próprio senhor deste e são a eles que deve oferecer seu louvor e veneração. Vou lhes apresentar, assim que você souber por que e no quê são melhores e maiores que o Deus da Igreja e o Cristo, que sejam vencidos estes e vitoriosas as Trevas!
Não te estranhes quando te digo, Deus não foi mais divino que tu ou até eu mesmo. Foi tão real e vivo como nós o somos. Aquele, que dizia ser seu filho, foi um bastardo, nascido de uma fecundação ilegítima, por inseminação artificial e não foi sem merecimento que foi julgado. A ele foi dado exatamente o objeto de seu prazer criptomasoquista, que foi a crucificação. Esta que se instituiu, como a religião verdadeira, ganhando por sobre as outras, por métodos nem sempre piedosos e conclamou-se como Igreja Católica Apostólica Romana, não é senão um antro de celerados que, a exemplo de seu mestre, martiriza quem diverge da filosofia que conclamam como divina. Como se, esse ao se tornar mártir, lhe dessem a autorização de martirizar as pessoas. As pobres mulheres, que negam sua condição primeira, servindo a este bastardo e sua Igreja como beatas, freiras ou sórores, o fazem por uma razão muito sublime. Tendo suas funções naturais, espontâneas e legítimas proibidas pela filosofia doentia do catolicismo, não é espantoso que prestem seu amor a ele desta forma, pois veja bem: está esticado em vigas de madeira dura e na imagem nua, quase se pode ver o que deveria ser seu divino membro (embora duvide que tenha tido). A própria imagem é de madeira rija. Ora, pau por pau, na ignorância de conhecer aquele que contém a carne e a carga necessária, para os afazeres divinos e sagrados que somos praticantes, serve-lhes muito bem este, castrado e estéril, indiferente. Quando o desejo já supera os limites do recato, muitas sabem como engolir a hóstia e servirem-se de velas bentas para satisfazerem-se. Por isso é que se sente um perfume quando se acendem tais velas: é o perfume das vias (que faço sagradas em ti) excelentemente preenchidas pelas velas bentas.
Agora tem a conta do porquê somos mais sagrados e santos que a Igreja e seus mártires?


Oh, sim, meu vingador! (Ela estremecia novamente, pois a foda abria ambas as mentes para a sabedoria mais sublime e soberana no Universo, sem contar que lhe abria as carnes, a cada ofensiva de meu aríete em seus portões). Mas tu me disseste que não quer ser meu senhor, pois há muitos maiores que tu nessa deliciosa prática que nos dá tanta sabedoria. Diga-me quem são e de onde vieram?!

Minha deliciosa! Com que orgulho sinto que realmente te interessa vir a saber tanto, pedindo-me que ensines e te mostre aquilo em que já és mestra! Mas te direi, para que melhor desfrute deste momento e possa rir do pouco que sei diante de ti! Ajudarei-a a lembrar do nosso verdadeiro lar antes de me acabar... Que agradável!
Minha doce leoa, eles não gostam, mas não conheço outra forma de defini-los. São os espíritos das Trevas, adversários do Império das Luzes, do Deus da Igreja e seu Cristo, ou de qualquer outro nome pelo qual se conhecem os deuses, que se dizem representantes do Bem. Por conseqüência, na ausência de outra definição, eles são o Mal, mas até hoje não se tem notícias de que tenham influído nos destinos do homem de forma arbitrária, como fazem seus oponentes, não impõem a vontade deles, os que assim fazem são homens que não tem nenhuma representatividade no Reino das Trevas na Terra.

Eles são ministros e amigos meus e dentre eles, tem o Soberano, o Espírito das Trevas, ele é o Leviathan, o Dragão de Sete Cabeças e Dez Chifres que irá vencer o Cordeiro e seu Império das Luzes, no décimo tempo do primeiro, após a vitória parcial do Cordeiro, pois as Trevas são mais poderosas que a Luz, que necessita das Trevas para trilhar seu caminho.

Eu a levei pelas escadarias feitas há tanto tempo atrás, que já são mais velhas que a própria humanidade, além do meu templo sagrado que fiz para minha Deusa da Lua Negra, Lilith, conduzi-a por caminhos que até eu mesmo me proíbo de usar. Apresentei-a a todos e a deixei conversar, conhecer e amar a todos, enquanto esperava ao longe, pois ainda não sou digno de tão honrada companhia. Ela já o merece mesmo sem tê-los conhecido antes, pois toda sabedoria vem dela e das mulheres, como bem parece ter reconhecido meus amigos desta verdade. Mas o melhor para ela ainda viria. Após ter amado e desfrutado da capacidade sexual de cada ministro das Trevas, eis que não mais podendo conter-se, vem o próprio Leviathan, que de tão extasiado, vem em sua forma de poder terrível (embora reduzido) do Dragão de Sete Cabeças e Dez Chifres. Ela não teve medo e estava trepando com o Soberano das Trevas e eu, mesmo de longe tremi, porque ver a glória do poder me fraquejava os sentidos. Além do mais, sou um simples escritor do profano, ver o próprio Soberano Leviathan era mais do que esperava merecer.

Ela desceu e emergiu das Trevas, exultante e iluminada pelo prazer e pela sabedoria que o sexo traz, mais ainda agora que amou o Leviathan, vinha ela cercada pelo prazer dele na forma de labaredas do Fogo Negro em torno de seu corpo exausto, porém completamente satisfeita. A levei de volta e em tempo para o casamento. O tempo que se passou de toda essa aventura correu em tempo paralelo e desvinculado do tempo mortal, de forma que, em meia hora, teve seu tempo de eternidade para desfrutar dos meus amigos e Soberano.


Não notaram nossa falta nem a mudança que se operou em sua beleza e caráter, agora que encontrou sua justa herança como filha das Trevas. Ela casou-se e a senti enojada por isso, pois agora teria que repartir com esse “esposo legítimo”, segundo a “Lei” e “Religião”, seus momentos na vida. Mas ela não se eximirá de me vir visitar, para me consolar ou até me aconselhar, quando ela for de vontade própria, caminho livre e acessível ao Reino das Trevas, em qualquer parte que esteja. Não deixará tão cedo de querer montar em meus amigos, ministros das Trevas e domar a fúria do Soberano Leviathan dentro de suas entranhas, devorando-os através de seus sacros portões, deste divino templo que toda mulher tem, aonde devo prestar culto, louvor e veneração.
De vez em quando ela me permitirá desfrutá-la, em nome dos bons tempos, da amizade e de ser servo tão fiel e eficiente nesses assuntos da prática sagrada do sexo.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

Em tudo, celebrai

Cronos retornou à Cidade dos Deuses e as três Deusas, Selene, Thetis e Phoebe, voltaram a seus lares e tentaram retomar suas vidas rotineiras, mas ninguém escapa incólume ao contato com o Deus das Florestas e das Feras. Na Cidade dos Deuses, a festa para Enki havia acabado deixando muito entulho e Deuses bêbados no chão. Os demais foram curar a ressaca, pois Anu tinha anunciado seus projetos mirabolantes.

Apesar da coragem e valentia de Cronos, ele não perguntou diretamente ao Deus desconhecido o que significava o sonho de Rhea, nem como ele poderia saber o pensamento que morava em seu coração. Mas Cronos não era muito inteligente, ele achou mesmo que pudesse enganar ou contornar o Destino. Quando o sol trouxe mais um dia à Gaia, à Cidade dos Deuses, Cronos não atendeu ao chamado, nem se prestou a ajudar seus irmãos e irmãs. Povo do mundo, saibais que servir aos Deuses é estar disposto a ajudar sua família, seus parentes e sua comunidade, mesmo com planos equivocados. Rejeitar, criticar, vos irá tornar desagradável, um ser rejeitado, renegado, abandonado em sua própria auto-comiseração, como Cronos. Nós somos nossos carcereiros e carrascos.

Os Deuses avançaram pela floresta, derrubaram árvores e levantaram casas, dando origem às novas colônias dos Deuses, que ganharam o nome dos setores dos patriarcas de cada família. Assim cresceram a colônia de Hélade, a colônia de Albion, a colônia de Canaan e a colônia de Kemet. Assim cresceram da mesma forma os ventres de Rhea, Selene, Thetis e Phoebe, devidamente preenchidas pelo Deus das Florestas.

Povo do mundo, vós podeis achar um escândalo que Deusas, jovens mulheres, tenham seus ventres ocupados por uma misteriosa concepção, uma forma de ocultar conjugações carnais, consumidas em um sacramento sagrado. Saibam vós que não há coisa alguma mais sagrada do que o desejo, o prazer, o amor, nem cerimônia mais sublime do que o sexo.

Neste ponto eu vos tenho de conduzir por três rotas. A primeira mostra Anu em júbilo por suas conquistas, que alimentam tanto a ilusão do poder quanto a iminente destruição. Ninmag despertou do sono induzido pelo pólen da planta bulbosa e seu despertar mostrou quão fácil ela tombou, a ausência de Enki e o roubo de seu báculo.

Cronos não sabia, mas Ninmag tinha controle das águas e das criaturas nela por intermédio desse báculo, que agora estava nas mãos de Typhon, um tirano que se aproveitou da ingenuidade e inocência de Cronos para ser o Senhor dos Mares. Pior, Cronos deu aos habitantes da Ilha Negra uma forma de restringir e controlar o poder de Ninmag que, pode-se dizer, era a mãe de todos eles e via, impotente, seus filhos se entregarem ao frenesi da rebeldia pueril. Povo do mundo, saibais que o poder de um Deus não está em um objeto, nem nos cultos e crenças que devotamos, apenas farsantes e vigaristas dependem de sacerdotes e livros sagrados.

Ninmag estava desarmada mas não desvalida, em grandes asas alçou voo e ganhou o firmamento, com uma direção certa, para a Cidade dos Deuses, para pegar seu amado Enki, para enfrentar o déspota Anu. Povo do mundo, saibais que não há Deus, entidade, espírito ou homem que seja senhor e dono do poder, nem pela palavra, nem pela espada, nem pela riqueza, nem pelo medo. Até um reinado de terror mantém-se somente com a anuência dos dominados. Onde há vontade, coragem e consciência, a coroa e a majestade pertencem a todos.

Anu havia esquecido das leis universais e realmente acreditava que repousava nele o poder e a autoridade. Assim que o vulto de Ninmag estava à sua vista, pairando no horizonte, entre as nuvens e as águas, Anu vestiu sua armadura, desembainhou sua espada, dispondo-se para enfrentar Ninmag, certo de sua superioridade e vitória. A preocupação de Anu não é proteger a Cidade dos Deuses ou seus irmãos e irmãs, mas a de demonstrar e reforçar seu papel como Senhor, Deus Pai, Deus do Firmamento.

Ninmag não tem interesse algum nessas demonstrações pueris de força e poder, um Deus ou Deusa legítimos e verdadeiros não são inseguros. Ela não tem interesse algum na figura patética de Anu, na gaiola dourada que ele construiu aos Deuses, nem na vida submissa que os Deuses se conformaram a levar debaixo da autoridade de Anu. Ninmag quer apenas Enki para ser seu consorte, por mais algum tempo ou até encontrar outro Deus mais interessante para brincar de cópula. Mas ao ver Anu, todo presunçoso, em sua brilhante armadura, com sua longa espada nas mãos, em cima do seu monte, em cima do seu castelo, em uma visível postura de desafio a ela, Ninmag não hesitou em atacar Anu com tudo.

As fundações da Cidade dos Deuses estremeceram, o firmamento tingiu-se de sangue, a montanha fendeu-se e jorrou pedras incandescentes, os canais e lagos artificiais feitos por Enki partiram, uma enorme onda retoma para as águas a orgulhosa Cidade dos Deuses. O corpo de Anu afunda em um torvelinho, junto com seu belo castelo, junto com sua preciosa armadura e longa espada. Não se vê Ninmag em lugar algum. Povo do mundo, esta é a paga e o resultado de todo conflito, toda luta, toda guerra. Não há vitória ou vitoriosos, apenas destruição, morte, horror. E assim termina o ciclo de Anu.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

Apostolado profano IV

Por que toda Nação ou Estado tem-se a necessidade da existência de destacamentos de segurança interna e externa? Para proteger os cidadãos, por suposição. De onde vem o corpo destas tropas? Vêm destes cidadãos, que compõem o povo do País. A quem devem combater essas tropas? Inimigos do Estado e do País. Mas quem faz o Estado também não é o conjunto de cidadãos? Obviamente que sim.
Poderia dizer-me então por que o Estado, agora existente graças aos cidadãos, cria leis e instruem suas tropas para reprimir, prender e até matar a razão primeira da existência da Lei, do Estado e das tropas, os cidadãos?
Em nome dos princípios da Pátria. Por uma divisória e uma institucionalização do assassinato, eis a real verdade dessa ação, contra os próprios cidadãos, à revelia desses, contrariando muitas vezes a própria Lei que pretende defender.
E o que os cidadãos, desarmados e suspeitos, ilegais, podem agora fazer contra o monstro do Estado? Não ria de mim então se te falo que não existe Estado, já que este negou seu senhor. Não existe Lei, já que seu real legislador teve seus direitos cassados. Não existe razão, por mais argumentos que se faça, da formação dos destacamentos de segurança, sejam internos ou externos, pois um supõe o outro, já que em breve cuidarão estes mesmos que já não haja perigo contra a Pátria, pois todo suspeito morrerá ou será banido, sobrando apenas os eleitos, que se fizeram de poderosos e acabarão aos poucos os cidadãos, os que lhes dão e lhes justifica o poder que tem.
Fariam muito melhor se soubessem o quanto se permitem danar por esses mesquinhos a quem deram poderes, aceitando tais abusos, porque lhes escapam a percepção desse fato.
São muito raros os que como nós que, já tendo visto o fato, negam o fenômeno. E aqui estamos, infringindo a Lei, para executar outra tal que não tem existência física nem medida,basta estarmos juntos, é o instinto da Natureza a quem nos entregamos os nossos desejos, sem pudor ou remorso.

sábado, 7 de janeiro de 2017

Apostolado profano III

Essas estão aqui feitas, quase tão perfeitas de um momento raro dessa minha vida miserável, desse mundo medíocre.

Foi pela ocasião de um noivado de casamento marcado de famílias aparentadas de mim e me vi então intimado a comparecer para que fosse eu o orador da celebração.
Cada qual parente do noivo e da noiva receberam seu quinhão do dote tendo em troca dado essas tais mercadorias que se dão a recém-casados.
Vendo-me tão afundado nesse suborno das consciências, necessário para que se perdoe o excesso de confiança entre os noivos e que por uma instituição, se lhes permitam desfrutar desses direitos matrimoniais, então recém-adquiridos, chego a uma idéia tal que vai encantá-los também.
No que me chegou a parte de receber meu quinhão, reservei-me um instante da noiva em lugar afastado e creio eu que ambos ficamos igualmente satisfeitos com o que nos demos e trocamos pela festa, roubando a dor primeira do noivo, que terá sua pequena e mesquinha vez de devorar estas carnes em precedência a mim. Só espero que minha parte não a tenha feito tão feliz que venha a sentir falta, mesmo em companhia de seu noivo e eu tenha de ensiná-la porque a fiz tão sacra neste momento profano a essas instituições da consciência.
Dessa noite guardo essas máximas que trocamos nos poucos minutos de descanso que nos dispusemos a nos oferecer tanto e tão caro desejo.
No que me resta em observação secundária, só lhes é dado saber que é nesses momentos em que se alcança sabedoria sublime e plena, de mente aberta e fluida. Não será muito surpreendente se viermos a aprender mais com nossa amante, uma mulher distante em ocasiões normais, por horas afinco, embora tenhamos a pretensão de sermos os mestres de uma ciência tão deliciosa e envolvente.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

O sonho de Rhea

A chegada de Cronos e Enki ao voltarem à Cidade dos Deuses foi um misto de incredulidade e maravilhamento. De improviso, os Deuses começaram a arrumar a festa de boas vindas. Para Enki, não para Cronos. Afinal, Cronos era um que havia preferido viver na periferia. Cronos tinha escolhido manter sua posição como rejeitado, renegado. Ele teve a oportunidade, mas preferiu se perder em seus sentimentos de rancor e mágoa. Ele simplesmente retornou ao seu lar para cuidar de suas feridas.

Em sua casa, Cronos foi recebido por Phoebe, Selene, Thetis e Rhea com cânticos de vitória, guirlanda de louros e muito vinho. Mesmo com essa recepção, carinho e amor devotado por quatro Deusas, Cronos não dissipou seu rancor e mágoa. Mesmo tendo três das mais belas Deusas dançando voluptuosamente em sua homenagem, mesmo estando nos braços de Rhea, sua esposa, Cronos tinha fechado seu coração ainda em mais trevas, em vinganças, em violência, em morte.

- O que houve, meu Rei? Por que teu coração está tão turvo?

- Minha amada, se eu pudesse te contar o que eu vi e vivi, teu coração também ficaria coberto com uma sombra.

- Eu sei como dissipar essa neblina que cobre teu coração, meu Rei.

Rhea apanhou o cetro de Cronos e o inseriu em seu mais sagrado templo, sendo efusivamente aplaudida por suas irmãs. Cronos sorriu com essa situação inusitada. Ele, tão acostumado a batalhas, ao enduro, à resistência, ao confronto que podia durar horas, não era capaz de travar esta batalha com Rhea por mais de meia hora. A tensão se esvai, esguicha como leite quente, vapor, espuma, sopa. Por alguns instantes Cronos compartilhou da felicidade ingênua e despreocupada tão comum entre os Deuses.

- Meu querido, meu Rei, enquanto estiveste longe eu tive um sonho estranho.

- Ora, querida, tu percebes uma sombra em meu coração mas não é capaz de ver uma no teu? Que truque é este?

- Não é truque, meu Rei, é um sonho, não é uma sombra. Um Deus que eu nunca tinha visto visitou-me em sonho e me mostrou o que havia de vir. Eu vi a ti, meu Rei, matando e devorando aos Deuses! Horrorizada, antes de despertar, o Deus desconhecido me disse que aquilo que desejardes e fizerdes a teu pai, sofrerá de teu próprio filho.

As trevas no coração de Cronos cresceram e apertaram seu coração. Ele levantou-se quase possesso. Quem poderia saber de seus planos? Ele não tinha contado a ninguém, nem para Rhea. Quem era esse Deus desconhecido? Como, com que poder, ele poderia ver o coração de Cronos?

- Diga-me, querida, como era esse Deus desconhecido?

- Eu não o vi muito claramente, pois ele parecia estar envolto pela floresta que nos rodeia. Mas ele era alto, tanto quanto Anu. Ele parecia ser tão jovem quanto tu, meu Rei, mas ao mesmo tempo mais antigo e mais sábio do que Anu.

- Por acaso era tão peludo quanto as bestas da floresta e de sua cabeça brotavam dois chifres, tão incandescentes quanto a lava?

- Meu querido Rei, conhece o Deus? Leve-nos até ele para que dancemos para ele.

A sugestão de Rhea conciliava com a intenção de Cronos que desejava questionar pessoalmente ao Deus da Floresta Negra. A dança das Deusas poderia propiciar o Deus ao favor de Cronos e para avisá-lo das torpes intenções de Anu. Caminhando por vias secundárias para evitar passar pelos demais Deuses que ainda estavam celebrando a volta de Enki, Cronos levou as quatro Deusas até o ponto na floresta onde havia encontrado o Deus.

- Meu Senhor! Eis aqui vosso servo! Eu vos peço que ouça o que tenho a vos contar.

Novamente houve um silêncio seguido de um intenso pulsar e a impressionante aparição do Deus da Floresta Negra. O comportamento das Deusas alterou-se de forma impressionante. Elas começaram a apalpar e a alisar suas partes macias, suas dobras, suas reentrâncias, entregando-se ao arrebatamento do êxtase.

- Meu filho! Vieste visitar-me agora com presentes para perfumar e adoçar o meu dia?

- Meu Senhor! Nós viemos para alertar-vos dos reais interesses de Anu.

- Meus queridos! Acham mesmo que Anu, vosso rei, tem efetivamente tal poder e autoridade que vós lhes atribui? Saibam vós, meus filhos e filhas amados, que a nenhum Deus foi ou será dado a coroa do universo. Nem mesmo o rei está acima das leis que este promulga. Nem mesmo um reinado de medo perpetua-se sem que haja vontade.

- Então, meu Senhor, eu posso desafiar o destino e ter uma sorte, uma fortuna diferente para meu futuro?

- Tenham respeito e reverência, não temor. Sonhos e oráculos são avisos, não sentenças. Useis vossa força e coragem, dificuldades e obstáculos virão, mas não esmoreceis, para merecerdes os louros.

- Meu Senhor! Eu vos agradeço pelas orientações. Partimos com sossego e tranquilidade no coração, mas antes vos pedimos que saibamos o vosso nome.

- Meu filho, para me conhecer é necessário conhecer os mistérios da vida e da fertilidade. Tu tens os mistérios da guerra e da irmandade. Um mistério não pode tomar o lugar de outro mistério.