quinta-feira, 31 de março de 2022

Por um Brasil sem histeria

Encontrei em minhas andanças pela internet o texto do "bispo" Dom Robinson Cavalcanti entitulado "Por um Brasil não-heterofóbico".
Segue os destaques e a critica:

"Vale recordar que Documentos Sociais emanados das Igrejas Cristãs, na Idade Contemporânea – consentâneos com as Sagradas Escrituras e a Tradição Apostólica – têm afirmado a dignidade de toda pessoa humana, criada à imagem e semelhança de Deus, detentora de iguais direitos e deveres".

Não obstante, a Igreja tem negado aos homossexuais tais direitos e dignidade.

"A presença do Cristianismo, e de outras expressões religiosas, é um fato histórico no Brasil, e a religião uma variável social que não se pode negar, desprezar ou agredir".

Não obstante, existem diversas formas de Cristianismo, existem diversas opiniões e visões cristãs sobre a homossexualidade.

"São apenas alguns exemplos, dentre tantos, de uma Pós-Modernidade, que torna relativo os absolutos e torna absoluto o relativo (Relativismo), de um Multiculturalismo extremado, que não respeita a cultura das maiorias, e de um Secularismo ideológico, que tem como um dos seus alvos o ataque às religiões, em particular as monoteístas de revelação, em virtude dos seus ensinos normativos sobre Ética, Moral e padrões de comportamento".

Não obstante, vemos diariamente notícias com padres e pastores em atividades e comportamentos nem um pouco morais ou éticos.

"As religiões monoteístas semíticas de revelação escrita – o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo – têm estabelecido conceitos multisseculares, desde cinco mil anos, que consideram como valores a serem livre e publicamente expressados em sua vida social, cultural e política, e que são preceitos para os seus seguidores".

Exatamente - preceitos para SEUS seguidores, não para a sociedade como um todo. E temos os casos que demonstram que os seguidores destas crenças são igualmente falhos, portanto não lhes cabe exigir da sociedade a observância destes preceitos.
Os padrões morais e éticos não são monopólio nem privilégio da Igreja ou do Cristianismo. Séculos antes de Cristo existir, haviam filósofos Gregos e Romanos [pagãos] que preconizavam a Moral e a Ética.

"A Comunhão Anglicana, e outras igrejas e religiões, afirmam a dignidade da pessoa humana, mas afirmam, também, a realidade do pecado (ao contrário da “bondade natural” defendida pelas ideologias seculares modernas) como um distanciamento físico, intelectual, emocional e moral dos seres humanos dos ideais do seu Criador".

Nem todas as religiões tem essa obsessão, paranóia e histeria com a doutrina do "pecado".

"A tentação ou a prática homoerótica é apenas uma manifestação dentre tantas – nem maior, nem menor – do estado pecaminoso da humanidade, e essa prática, para os cristãos, é incompatível com os ensinos das Sagradas Escrituras. É dever dos cristãos amar os pecadores e rejeitar o pecado".

A doutrina do pecado é uma verdade apenas para o Cristianismo, não é uma verdade axiomática.
As sagradas escrituras são sagradas apenas para quem as crê assim - e não são as únicas "escrituras sagradas" existentes.
As sagradas escrituras não sobrevivem nem a uma análise textual consigo mesmas.

Repostado. Texto originalmente publicado em 30/05/2010, resgatado com o Wayback Machine.

quarta-feira, 30 de março de 2022

Visões sobre os Addams

O canal "Quadrinhos na Sarjeta" entrega uma visão sobre a família Addams que me surpreendeu.
Segundo o narrador do canal, os quadrinhos (e as demais obras que originaram deles) fala sobre uma família católica latina aos olhos de uma família protestante americana.
Por muitos anos, eu achei que a família Addams era baseada no livro "Quando os Addams Saíram de Férias".
Eu gostava de assistir porque os Addams são autênticos e originais. O visual gótico certamente antecipou a subcultura homônima. Os personagens parecem ter saído de um filme de terror B. A despeito dessa imagem mórbida, todos parecem ser inocentes e ingênuos.
A ideia de que os Addams são uma família católica latina (segundo o "Quadrinhos na Sarjeta") é evidenciada pelo nome do patriarca: Gomez.
Como eu nunca pensei/percebi? Mas a "latinidade" dos Addams resume-se só nisso. Mortícia demonstra um gosto peculiar de falar em francês. Wanda (Wednesday) não demostra qualquer característica latina. Feioso (Pugsley) é idêntico ao valentão da escola que se delicia em perturbar os mais fracos. Tio Chico (Fester) é tão inexpressivo (sem expressões faciais) quanto Kristen Stewart.
Nada, no cenário ou nos hábitos dos Addams nos remete a um lar de uma família católica latina.
Não é novidade alguma que o americano médio não é muito diferente do brasileiro médio: provinciano e preconceituoso. Nós dias de hoje, os Addams seriam imaginados como uma família muçulmana. Com sorte, pagã ou wiccana. Em um sociedade machista, patriarcal e heteronormativa, famílias monoparentais ou homossexuais também seriam vistos com estranheza.
Paradoxalmente, a cultura popular é quem está desafiando o sistema que a criou e alimenta. Eu espero que, em breve, conforme as pessoas recebem educação e informação, comportamentos como o de Maurício Souza se tornem anedotas históricas.

terça-feira, 29 de março de 2022

Desmascarando Rozângela Justino

Bent é o título de uma peça de teatro escrita por Martin Sherman em 1979. Através da vida de dois personagens, é retratada a perseguição nazista aos homossexuais na Alemanha de Hitler. Em 1997 Sean Mathias adaptou a peça para o cinema e o filme (foto) alcançou grande sucesso de crítica e público por onde passou. Foi Bent que impulsionou pesquisas históricas nos anos 80 e 90 sobre a perseguição e extermínio promovidos pelo regime nazista aos homossexuais. Pela primeira vez, o público em geral tomou conhecimento que o mesmo regime totalitário que marcou judeus com estrelas amarelas e os matou, marcou homossexuais com triângulos rosa e os matou também.

Antes, porém, de Bent, foi Hannah Arendt que nos anos 50 publicou "Origens do Totalitarismo", que denunciou veementemente ao mundo a perversidade e "lógica" de sistemas totalitários como o de Hitler. No Prefácio de uma nova edição de sua obra, escrito em 1967, Hannah conceitua o ato de compreender. Diz ela que "compreender significa, em suma, encarar a realidade, espontânea e atentamente, e 'resistir' a ela - qualquer que seja, venha a ser ou possa ter sido". 

É a partir do conceito de Hannah sobre o compreender que eu escrevo este artigo. Tento compreender a recente declaração da "psicóloga" Rozângela Justino nas "Páginas Amarelas" da atual edição da revista Veja, onde ela, desvairadamente, diz que a militância gay está ligada ao nazismo.

Certamente muitos de nós pensávamos que a incompetência desta senhora estava restrita à sua prática enquanto "psicóloga", aliás, é exatamente isso que o Conselho Federal de Psicologia reconhece na censura pública que impôs à Rozângela, confirmando a punição dada pelo Conselho Regional de Psicologia do RJ: que ela é uma incompetente. Contudo, ela foi além, mostrando com a tal declaração desvairada, que além de ser incompetente na sua profissão, é também enquanto "historiadora amadora", pois mostrou num importante periódico nacional sua burrice histórica. Mal intencionada e incompetente, é isso que a Rozângela Justino é!

É mal intencionada, pois tenta inverter os fatos ao dizer que o movimento gay se apropria da ideologia e do modus operandi do nazismo, assim, ela não só justifica ao público em geral a sua pervertida e adoecida visão da homossexualidade como também ganha junto ao público simpatia pela sua causa, pois o senso comum sabe, ainda que superficialmente, que o nazismo foi um mal e ainda é identificado com o Mal Absoluto. Mal intencionada, pois disseminando uma mentira, quer se colocar no papel de vítima e perseguida, enquanto na verdade, ela e seus pares cristãos fundamentalistas como Júlio Severo e toda essa laia fundamentalista são os algozes de homossexuais tanto quanto o regime nazista foi.

Quem são, na verdade, os nazistas dessa história? Jean Wyllys respondeu em seu blog a Rozângela: "nazista é a senhora!". Rozângela é tão incompetente, tão desvairada que não percebe que o que ela e seus pares tentam fazer é exatamente aquilo que eles nos acusam de fazermos: enquanto nós afirmamos a diversidade humana, eles querem plastificá-la, torná-la monocromática, e para isso, eles precisam eliminar os homossexuais "transformando-os" em heterossexuais, como se isso fosse possível.

Ao identificar homossexuais como doentes e pervertidos, sofredores de patologias, os "judeus" da vez, tentam, como Hitler, eliminá-los, não em campos de concentração nem com banhos em câmaras de gás, mas com terapias de reversão. Quem é cara pálida, o nazista nisto tudo? Quem trabalha para eliminar pessoas e suas características constitutivas - a orientação sexual - visando o estabelecimento de uma "raça" de heterossexuais? Quem usa de leituras pervertidas (sabemos que Hitler pervertia tudo o que lia e até o que via e ouvia a fim de corroborar sua loucura antissemita) das teorias da psicologia e até mesmo da Bíblia para corroborar sua nefasta prática?

Não vejo nenhum homossexual trabalhando pela destruição da família como tanto gostam de acusar os fundamentalistas religiosos! Ao contrário, vejo homossexuais lutando pelo direito de se unirem diante da lei, pela adoção de crianças abandonadas por heterossexuais a fim de lhes proporcionarem uma vida saudável, familiar, digna e honesta. Vejo homossexuais lutando por constituírem suas famílias e lutando pelo direito à igualdade diante da lei que lhes é negada pelo trabalho perverso de legisladores que professam uma fé tão pervertida quanto à de Rozângela Justino. Vejo homossexuais lutando pelo direito de existir, tendo sempre que fazer frente ao desejo sombrio, este sim nazista, de eliminá-los, de silenciá-los. Não vejo homossexuais tentando reverter a sexualidade de nenhum outro ser humano, mas lutando legitimamente pelo pleno direito de ser quem é.

Hitler, no seu desvario em "criar" uma nova raça, marcou homossexuais com triângulos rosa, os confinou em campos de concentração, os despojou de sua dignidade humana ao tratar como bicho o que é gente. Nesta vida, mata-se de muitas maneiras e uma delas é a negação do direito ao outro de existir como ele é. Mata-se, matando no outro o que lhe constitui e o identifica socialmente. Mata-se usurpando do outro sua cidadania, o marginalizando, tirando deste, sua igualdade em relação aos outros seres humanos. Mata-se, tentando, a partir de uma prática perversa, charlatã, "curandeira", reverter, reorientar a sexualidade do diferente, como faz Rozângela Justino e seus pares psicólogos "cristãos". Deveriam lavar a boca antes de se identificarem como cristãos ou se converterem, de fato, ao amor, porque é isso que Deus é, amor.

Rozângela diz em vários textos e declarações à imprensa que está sendo silenciada, amordaçada, impedida de praticar sua profissão. Diz que "ajuda" homossexuais que voluntariamente desejam reorientação de sua sexualidade, mas não enxerga que essa gente legitimamente sofrida, vítimas de uma sociedade homofóbica, de uma religião homofóbica, de uma família homofóbica, buscam, na verdade, auto-aceitação, autocompreensão; precisam de reafirmação e de tratamento digno que lhes garanta a plena aceitação de si mesmos para terem vida feliz. E o que Rozângela faz? "Mata" a verdade dessas pessoas, adoecendo-as ainda mais, o que realmente pode levar-lhes à morte. Quem não conhece ou jamais ouviu falar de homossexuais que se mataram por não se aceitarem como tais, não-aceitação esta agravada pela religião, família e sociedade?

Rozângela, a desvairada, declarou a Veja: "Essas pessoas que estão homossexuais estão ligadas a todo um poder nazista de controle mundial". Mas pergunte a ela quem é o Exodus Internacional ou pesquise sobre essa famigerada organização de evangélicos fundamentalistas que fazem o mesmo trabalho que esta senhora faz e verão que quem se alinha a um "poder mundial" que visa eliminar homossexuais é ela mesma! O Exodus Internacional promove o que chamam de "seminários" e "workshops" em todo o mundo, sempre usando a estrutura de uma igreja local. "Eliminar" homossexuais "transformando-os" em heterossexuais é a especialidade da organização internacional.

Não sou profeta como Ezequiel, mas escrevam o que eu digo: Rozângela Justino, se continuar insistindo nessas falácias, trazendo a público suas pervertidas e equivocadas opiniões quanto à homossexualidade e recebendo o que tem recebido de seus pares, da Justiça, e do público esclarecido, ou seja, o atestado de sua incompetência e desvario, acabará marginalizada pelos que hoje a apoiam: a igreja evangélica fundamentalista.

Autor: Márcio Retamero, 35 anos, é teólogo e historiador, mestre em História Moderna pela UFF/Niterói, RJ. É pastor da Comunidade Betel do Rio de Janeiro - uma Igreja Protestante Reformada e Inclusiva -, desde o ano de 2006. É, também, militante pela inclusão LGBT na Igreja Cristã e pelos Direitos Humanos. Conferencista sobre Teologia, Reforma Protestante, Inquisição, Igreja Inclusiva e Homofobia Cristã.

Original [A Capa] perdido. Repostado. Texto originalmente publicado em 11/09/2009, resgatado pelo Wayback Machine.

segunda-feira, 28 de março de 2022

Hipocrisia e homofobia

Certamente se fosse uma página, como de muitas outras, ligada ao fundamentalismo cristão que apregoasse o preconceito, a discriminação e a calúnia contra os homossexuais, teria a sorte de ser defendida pelos falsos paladinos.
O que se tenta ocultar do público nessa pretensa "defesa dos direitos" é que esta visão é religiosa e doutrinária, ofendendo e não reconhecendo aos homossexuais os mesmos direitos que dizem defender. O discurso contra a homossexualidade e os homossexuais dos cristãos fundamentalistas sequer pode ser entitulado de "opinião", mas sim de sentença arbitrária, baseada em uma doutrina religiosa arrogante e prepotente, que se arroga uma verdade sagrada e/ou divina. Nem se trata de "garantir os direitos de expressão/opinião/crença", mas de garantir e resguardar o totalitarismo arbitrário dessa visão religiosa e doutrinária, tentando censurar ou denegrir as opiniões contrárias que contestem ou desafiem esse totalitarismo.
Um bom texto coloca bem o caso:

A fé dos homofóbicos.
Por André Petry.
Copiado do blog Bodega. [blog morto/original perdido]

Dizem eles que a criminalização da homofobia levará à prisão em massa de pastores e padres, e viveremos todos sob o domínio gay. A história ensina que essa lei será aprovada, e a vida seguirá seu curso regular, sem nada de extraordinário.
Em 1946, quando os negros reivindicaram a inclusão de alguns direitos na Constituição, foi um salseiro. Foram acusados de antidemocráticos e racistas por congressistas e estudantes da UNE. Em 1988, a Constituição promoveu o racismo de contravenção a crime. Ninguém chiou. Na década de 50, quando se discutia o divórcio, teve cardeal dizendo que se devia pegar em armas para combater a proposta. Em 1977, o Congresso aprovou o divórcio. Não houve tiroteio, e a igreja do cardeal nunca mais tocou no assunto. Recordar é viver.
Agora, os evangélicos estão anunciando o apocalipse caso o Senado faça o que a Câmara já fez: aprovar lei punindo a homofobia com prisão. A lei em vigor pune a discriminação por raça, cor, etnia, religião e procedência nacional. A nova acrescenta a punição por discriminação contra homossexuais. Cerca de 1 000 evangélicos tentaram invadir o Senado em protesto. Dizem que a criminalização da homofobia levará à prisão em massa de pastores e padres, e viveremos todos sob o domínio gay. A história ensina que, cedo ou tarde, a lei, ou outra qualquer com objetivo similar, será aprovada, e a vida seguirá seu curso regular sem nada de extraordinário.
Os evangélicos e aliados dizem que proibir a discriminação contra gays fere a liberdade de expressão e religião. Dizem que padres e pastores, na prática de sua crença, não poderão mais criticar a homossexualidade como pecado infecto e, se o fizerem, vão parar no xadrez. É uma interpretação tão grosseira da lei que é difícil crer que seja de boa-fé.
Tal como está, a lei não proíbe a crítica. Proíbe a discriminação. Não pune a opinião. Pune a manifestação do preconceito. Uma coisa é ser contra o casamento gay, por razões de qualquer natureza. Outra coisa é humilhar os gays, apontá-los como filhos do demônio, doentes ou tarados.
Alegam que a liberdade religiosa fica limitada porque combater o pecado vira crime. É um duplo equívoco. O primeiro é achar que uma doutrina de crença em forças sobrenaturais autoriza o fiel a discriminar o herege. O segundo é atribuir à lei valor moral. O direito penal não é instrumento para infundir virtudes. É um meio para garantir o convívio minimamente pacífico em sociedade. Matar é crime não porque seja imoral, mas porque a sociedade entendeu que a vida deve ser preservada.
O que essa proposta pretende dar aos gays, e sabe-se lá se terá alguma eficácia, é aquilo a que todo ser humano tem direito: respeito à sua integridade física e moral. Os evangélicos, pelo menos os que foram a Brasília, dão prova de desconhecer que seres humanos não diferem de coisas só porque são um fim em si mesmos. Os seres humanos diferem das coisas porque, além de tudo, têm dignidade.

E, para o cristão fundamentalista que ainda insiste na bravata do "direito da liberdade de expressão", eu irei citar mais um excelente texto:

Caso Ellwanger.
Copiado de Verdes Trigos. [original perdido]

[...]A segunda questão discutida pelo STF versou sobre o tema do eventual conflito entre princípios constitucionais, tendo sido ponderada, no caso concreto, a existência ou não de uma antinomia entre a liberdade de manifestação do pensamento e a condenação de Ellwanger pelo crime da prática do racismo.
Esse tema foi amplamente discutido pelo STF, cabendo destacar os votos dos ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes. A orientação fixada no acórdão foi a de que a garantia constitucional da liberdade de expressão não é absoluta, tem limites jurídicos e não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações que implicam ilicitude penal. No caso concreto, explicita o acórdão: "O preceito fundamental da liberdade de expressão não consagra o "direito à incitação ao racismo", dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica".


Nota posterior: Para que cristãos fundamentalistas ofendidos não tentem (como é de praxe) distorcer meu texto, sublinhei o trecho principal do acórdão do STF. A questão aqui não é o racismo, mas a condenação ao desrespeito ao direito constitucionalmente previstos para todos, incluindo os homossexuais. Discriminação é discriminação, continua sendo crime, mesmo disfarçada ou dissimulada como "exercício do direito da liberdade de expressão e opinião".
Repostado. Texto originalmente publicado em 27/08/2009, recuperado com o Wayback Machine.

Ilegal e inconstitucional

Governo Bolsonaro tem oferecido um curso gratuito sobre criação de igrejas nas plataformas digitais da Escola Nacional de Administração Pública (Enap), ligada ao Ministério da Economia. Intitulado "Formalização de Organizações Religiosas no Brasil", o conteúdo foi elaborado pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, chefiado por Damares Alves.  

A ministra é evangélica. A iniciativa aborda, dentre outras coisas, a questão da imunidade tributária da igreja, assunto que já deu dores de cabeça a Bolsonaro recentemente, segundo a revista Veja. Em 2021, a pedido do presidente, o Congresso perdoou uma dívida bilionária de igrejas em tributos com a União.

O curso, que é gratuito e aberto a todas as pessoas, e não apenas a servidores públicos, foi dividido em 5 módulos: o "panorama das relações entre Estado, Direito e Religião"; "o tratamento jurídico da religião"; "a organização religiosa"; "ministros de confissão religiosa" e "a imunidade tributária das organizações religiosas".

"Você quer saber como ocorre o processo de formalização de uma organização religiosa? Quer conhecer quais são as garantias do Estado para o exercício das religiões no Brasil? Este curso apresenta instruções e esclarece os principais aspectos do ordenamento jurídico sobre o assunto", diz o anúncio que já atraiu mais de 2.240 adesões em mais de 690 cidades do Brasil.

Original: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/governo-bolsonaro-promove-curso-igrejas/

domingo, 27 de março de 2022

Danças circulares e sagradas

A primeira formação que o ser humano adotou no desenvolvimento da vida grupal e social foi a roda. Culturas antigas e culturas ligadas à terra perceberam a especialidade da forma circular para o estar e fazer junto.
Nela passaram a representar os ciclos da natureza: o ritmo das estações, o tempo dos cultivos (semeadura, crescimento, maturação e colheita); o pulsar dos movimentos do sol; da lua; das estrelas e dos planetas no céu; o ritmo da respiração e dos batimentos cardíacos; a vida e a morte.

Adotaram-na em seus rituais de passagem (nascimento, iniciação à maioridade, união matrimonial, morte), em celebrações, ocasiões de reverência, temor, louvor, gratidão e oração à terra e à(s) divindades(s).
O círculo é uma forma geométrica especial, por simbolizar a perfeição e a plenitude que o ser humano busca atingir. Na circunferência há “n” pontos que distam igualmente do ponto central. Todos os pontos – ou todas as pessoas que neles se encontram voltadas para o centro – têm a visão de todos os demais da roda e todos são igualmente importantes na composição final que é o círculo. Este contém o vazio, que ao mesmo tempo em que garante a distância entre as pessoas, é o vazio através do qual elas estão unidas e de onde pode emergir a criação feita por todos. Apenas compor a circunferência da roda já constitui uma criação, num espaço diferenciado e, possivelmente, sagrado.
A palavra hebraica “shalom”, que significa paz, contém a mesma raiz que compõe a palavra “shalem” e “shelmut”, que significam estar completo, inteiro, em unidade e em paz.
O círculo representa a aspiração humana a essa paz completa. Estar em unidade, ser um e inteiro consigo e com o criador, estar no divino, em Deus.
Religião e ciência nos falam da separação do homem do seu estado de unidade, seja através da queda do paraíso, seja ao nascer, por ocasião da saída do aconchegante útero materno nutridor e todo poderoso.

O homem trilha sua vida aspirando retornar ao estado de plenitude total. Uns se apóiam na religião para se re-ligar, outros esperam que o parceiro lhes traga este aconchego e suprimento através do amor, do ato sexual, ou de ambos; há os que se utilizam das drogas, outros que ficam em ação e trabalho compulsivo para nunca sentir o estado de falta. Muitos vivem a combinação de vários recursos para acreditar que são plenos, ou chegar o mais próximo deste estado. Deseja-se estar num tempo/espaço/vivência com a unidade permanente.
Por sua vez as Danças Circulares também brotam dessa aspiração humana de sair da separatividade e da falta e unir Céu ( inspirador, mágico, espiritual, divino) e Terra ( humano, material, terreno) em seu ser, no seu centro, em seu coração, de forma prática e palpável, dançando.
As Danças Circulares resgatam a inspiração do homem primitivo em sentir a energia criadora da vida dentro de si, deixando brotar o movimento, rítmo, som, música, dança, e fazê-lo em círculo, em interação com os outros membros da tribo; ao mesmo tempo dão continuidade a um fio que jamais cessou de existir na história da humanidade: dançar e interagir grupalmente.
Uma forma de resgate, continuidade e criação desse tipo de vivência teve início por volta da década de 60, por via de duas iniciativas em continentes distintos, dando origem, por um lado, ao que se passou a chamar Danças Circulares Sagradas e, por outro, Danças da Paz Universal.

O movimento denominado Danças Circulares Sagradas nasceu a partir de um bailarino e coreógrafo que viveu na Alemanha, Bernhard Wosien, que na década de 50 se propôs a pesquisar e vivenciar antigas rodas da Europa Oriental. Encontrou ali raízes antigas da arte de re-ligar o ser humano, a “meditação através da dança, como um caminho para dentro do silêncio”.

Em meados da década de 70 ele foi convidado pela então jovem comunidade escocesa de Findhorn, para compartilhar as danças de roda que vivenciou e as danças que coreografou voltadas para o mesmo fim: re-ligar, meditar e transformar, em ação grupal.
Findhorn, uma comunidade alternativa conhecida na década de 60 pelos “repolhos gigantes” hoje é uma Fundação, em forma de vilarejo, localizada nas proximidades do Mar do Norte – Escócia, com extenso programa de cursos voltados para o desenvolvimento humano. Ali vivem pessoas de todos os continentes, reunidas em uma experiência ímpar de amorosa convivência e de interesse comum pelo estabelecimento de valores mais humanos na vida pessoal e coletiva.
Atualmente, as Danças Circulares Sagradas constituem parte integrante da vida comunitária do lugar, praticamente sendo incluídas em todos os programas de cursos oferecidos ao longo do ano.
Tendo como forma base o círculo e o fazer em conjunto, as danças foram rapidamente abraçadas pela meta comunitária voltada para “One Earht” Dali se difundiram pelo mundo, num processo que envolve resgate e criação contínua do espaço sagrado, espaço/tempo diferenciado, que proporciona ao ser humano condições para recordar o estado de unidade, vivenciando-o em seu próprio corpo, em movimento, com música, com arte, na sintonia grupal.
Um espectro de danças derivou a partir daí, disponíveis para quem quiser entrar na roda: danças tradicionais reavivadas em sua forma original, danças que captam a essência de movimentos típicos de determinada cultura e os trazem de forma simplificada e acessível a quem quiser se juntar, danças de caráter meditativo ou lúdico coreografadas para músicas diversas - eruditas ou folclóricas; danças-oração que associam gestos simples a cantos religiosos; danças cujas coreografias têm como fonte de inspiração as árvores e flores e que propiciam a vivência corporal das qualidades associadas às plantas
(incluem aqui danças que fazem referência às essências florais).
Esse tipo de dança é geralmente acompanhada de música gravada e para tanto a disponibilidade de um aparelho de som se faz necessária. Mas, ocasionalmente, podemos contar com uma pequena banda para tocar ao vivo, o que faz uma diferença muito positiva.

Na mesma época em que se desenvolvia esse trabalho com as Danças Circulares Sagradas na Europa, na América do Norte, um mestre sufi - Murshid Samuel Lewis - plantava as bases para o que mais tarde se denominaria “Danças da Paz Universal”. Ele acreditava que “a verdadeira religião deve ser prática e expressar a profunda unidade que se encontra por trás de todas as tradições”.
Com o mestre sufi Azrat Inayat Khan, que trouxe o movimento sufi para o Ocidente, Lewis (ou sufi Sam, como era conhecido) aprendeu que a mensagem espiritual podia ser difundida não apenas pelas palavras, mas também através da música e do som.

De Ruth Saint Denis, sua professora de dança sagrada e precursora da Dança Moderna (com quem estudaram Martha Graham e Doris Humphrey), Lewis captou o impulso para criar uma forma de dança sagrada que pudesse ser compartilhada em grupos e que não fosse performática. A respeito de Ruth Saint Denis, Lewis dizia: “ela possui a faculdade de trazer música e dança diretamente do cosmos, do coração de Deus”.
Unindo práticas de diversas ordens sufis; os ensinamentos de Azrat Inayat Khan com o ideal de fraternidade entre os homens e aproximação das tradições religiosas, e a dança espiritual de Ruth Saint Denis, Lewis criou os fundamentos das Danças da Paz Universal.
O contexto era de um mundo que vivia as tensões da Guerra Fria, em que a juventude expressava sua rebeldia às formas de comportamento e ao sistema político, enquanto começava a projetar suas esperanças e idéias para a virada do milênio.
Foi entre os jovens hippies que sufi Sam agregou os primeiros seguidores de suas práticas, mas sempre deixou claro que a prática espiritual - dançar, caminhar, meditar e cantar - não deveriam ser usadas como mais uma forma de droga que brecasse o crescimento espiritual.
Acreditava, porém, no poder transformador da alegria e da devoção num contexto universal, salientando a necessidade de se estar bem enraizado na terra para se fazer das danças algo mais do que um “estado elevado temporário”.
As Danças da Paz Universal consistem em movimentos e gestos feitos em conjunto por todos os participantes, aliados a cantos de frases expressivas de diferentes tradições espirituais do mundo.
São frases mântricas, ou frases que captam a essência de determinada tradição, ou frases que evocam o ideal universal de paz e fraternidade entre os homens.
Os movimentos e gestos são bem simples e sintetizam uma linguagem corporal/grupal universal que se encontra em vários locais da Terra. Por exemplo, elevar mãos e braços ao céu invoca abertura para a divindade, com respeito e louvor; palmas em direção ao solo indicam reverência e contato com a terra, mãos dadas na roda indicam o estar juntos e o potencial de amizade; braços nos ombros das pessoas ao lado simbolizam a fraternidade entre os homens.
A roda se move para o centro do círculo, ou para fora, no sentido dos ponteiros do relógio, ou no outro, ora as pessoas estão de mãos dadas na roda, ora encontram-se com parceiros dispostos na circunferência da roda para se trocar cumprimentos, bênçãos e depois seguir adiante com um novo parceiro.

A prática das Danças da Paz Universal é dirigida por Saadi (Neil Douglas Klotz) que procura recontatar a essência das tradições do Oriente Médio (tradição crosta, judaica, islâmica, persa, egípcia, babilônica, etc), para levar a mensagem e prática da paz e respeito pela unidade dentro da diversidade.
Faz parte deste trabalho um resgate profundo das palavras de Jesus em aramaico – língua original em que ele proferiu suas mensagens – em especial a retomada profunda do significado da oração do Pai/Mãe Nosso(a), através das palavras, canto e dança inspirados e coletados a partir das formas de oração existentes no Oriente Médio.

As Danças da Paz Universal são sempre cantadas pelo grupo todo produzindo o som/vibração que acompanha os passos e movimentos simples. É comum essas danças serem acompanhadas por instrumentos que auxiliam na marcação do ritmo, sendo frequente o uso do tambor, violão ou chocalho.

No Brasil ambos os movimentos encontraram eco e são conhecidos como Danças Circulares ou Danças Circulares Sagradas.
Em nosso país vem se somando a este movimento uma parcela bem brasileira, formada pelas danças folclóricas feitas em roda e também pelas danças e brincadeiras de roda. Estas estão sendo reavivadas por educadores, folcloristas e/ou integrantes do movimento, com o intuito de intensificar a dança de roda no universo infantil, introduzindo, inclusive, músicas do nosso repertório popular, tanto antigo como atual.
De modo geral, as Danças Circulares têm sido praticadas com diferentes fins, e em ocasiões diversas como forma de crescimento individual; como caminho espiritual; uma forma de vivenciar o lúdico; na celebração de algum evento; como meio de harmonização grupal em apoio a alguma atividade que se deseja realizar; como instrumento terapêutico e de cura; no trabalho com idosos; com pessoas diferenciadas; como instrumento educativo para a vivência de princípios éticos nos âmbitos pessoal, grupal, social e planetário e, por fim, vêm contribuindo também no meio empresarial como instrumento de integração, sociabilização, centramento, ludicidade para o grupo, em sintonia com o propósito da empresa.
As Danças Circulares vêm se espalhando pelas principais capitais (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Porto Alegre, Curitiba, Florianópolis, Belém) e também pelo interior.
Para dançar não são necessárias habilidades especiais. Basta querer compartilhar da alegria de se dar as mãos na roda, com disponibilidade para ser mais um elo que dá, recebe e contribui para a criação grupal, com seu modo único e original de ser.

Fonte: https://www.semeiadanca.com.br/historico_dancas.html

sábado, 26 de março de 2022

Notas sobre os desafios

Desde sua introdução - ou reintrodução, se preferir - na sociedade moderna algumas décadas atrás, o Neopaganismo em suas múltiplas formas se tornou um fenômeno global florescente e se tornou uma alternativa espiritual bem vinda para centenas de milhares de pessoas pelo mundo inteiro. Nós assistimos com alegria enquanto nossas crenças gradualmente se movem do tolerável para algo pertencente ao sistema e nós aplaudimos enquanto governos reconheceram e aceitaram nossas práticas. Novos livros são publicados todo ano sobre as muitas formas de Neopaganismo e praticantes de todo lugar estão contribuindo para seu desenvolvimento com novas visões.
Entretanto, nem tudo vai bem. Nós chegamos bem longe nas ultimas décadas, mas nós não podemos descansar sobre os louros. Existem muitos desafios que devemos enfrentar para preparar o caminho à frente. O propósito deste artigo é oferecer algumas sugestões quanto à natureza destes desafios e uma forma de começar a resolvê-los.
Resista ao fascínio das teorias de conspiração.
Queira ou não alguém se importar em ser levado a sério pelo publico em geral, o cultivo das teorias de conspiração como parte fundamental da narrativa coletiva eventualmente irá levar um grupo a autodestruição, isolado e incapaz de ser parte de qualquer realidade conjuntural. A atitude de "nós contra todos" não conduz a qualquer tipo de crescimento produtivo. Nós estamos todos sabendo dos milhares que foram torturados e queimados, enforcados ou esmagados pelas autoridades cristãs no passado, mas é de mal gosto ao extremo tentar se apropriar da miséria de outros povos para reprimir as crenças de outras pessoas.

Nós sabemos também que existem diversas facções na sociedade atual que vêem o Neopaganismo é uma forma de conspiração satânica mundial, mas como podemos combater essas teorias de conspiração com mais teorias de conspiração? O que precisamos é distribuir informação realista.
As teorias de conspiração podem agir como um fator de unificação quando elas são usadas para conjurar imagens de um poderoso inimigo, irresistível e enganador, contra quem o grupo deve se proteger. Os Cristãos tem usado esse tipo de imagem e esse é o método que devemos emprestar deles? Existem diversas formas de Neopaganismo, mas nós não podemos achar uma forma mais construtiva e sóbria de estabelecer o tipo de unidade que nós gostaríamos de ver?
O que é comumente esquecido é que o uso das teorias de conspiração não está limitada a pessoas de bom coração que genuinamente sente forças malignas agindo nos bastidores. O Terceiro Reich foi igualmente fundado em teorias de conspiração. As teorias de conspiração são brinquedos perigosos quando caem nas mãos erradas. Não devemos nunca colocar teorias de conspiração acima de nossa compaixão pela humanidade.
Não torne-se aquilo que condena.
Claro como um dia que há muitas pessoas que gostariam de ver o Neopaganismo ter um fim explosivo. Também tem muitos que tomam como sua missão especial na vida interferir com as vidas religiosas dos outros e tentam converter todo mundo para sua visão particular. Se os Neopagãos atraem a atenção da imprensa, nós somos muito frequentemente descritos como peões iludidos ou como capangas de Satan. Cristãos fundamentalistas de direita parecem ser os oponentes mais estridentes ao Neopaganismo.
Nós devemos resistir à tentação em combater a estes ataques com os mesmos métodos usados por estas pessoas. Nós não precisamos levantar barricadas e nos colocar como representantes do divino. Nós não precisamos cultivar nossos próprios dogmas de ferro para reprimir os heréticos e infiéis de nossas fileiras e mostrar uma fachada sólida. Quando falarmos contra os ataques deles, o façamos de uma forma sóbria e bem informada.
Conheça sua história.
Neopaganismo é isso mesmo: novo. Nos sentimos em casa em praticas antigas e visões mundiais e queremos ressuscitá-las como genuínas, caminhos religiosos praticáveis para o mundo atual.

Entretanto, nós sabemos que não podemos reviver tudo que nossos ancestrais faziam e nós temos que preencher as lacunas por nós mesmos. Ao fazê-lo torna nossa crença parecer falsa na visão de alguns, este é um sentimento razoável. Nós vivemos em uma sociedade que valoriza a autenticidade acima de tudo. No pensamento moderno, a autenticidade é igual à realidade em si mesma e qualquer coisa que não é autêntica não pode ser real e portanto deve ser uma mentira.
Tudo tem um começo, inclusive a religião. Nossos ancestrais experimentaram a mudança e a inovação em suas práticas religiosas. Este é um processo natural e desejável e é bem melhor incentivar novas idéias brilhantes do que estagnarem algo velho simplesmente por ser velho. Mesmo o velho e o tradicional provavelmente começou como uma brilhante nova idéia.
A forma mais destrutiva de tentar ganhar autenticidade é inventar uma história. Nós podemos inventar novas práticas religiosas para a atualidade, baseadas em velhos valores, mas nós nunca devemos torcer ou reinventar a história para esta se ajustar às nossas necessidades.

Com esse conhecimento, nós podemos claramente ver aonde precisamos fazer esforços para preencher as lacunas em nossas crenças. Algumas práticas ancestrais precisarão ser descartadas.
Encare o presente.
Mesmo que sejamos capazes de saber tudo sobre antigas práticas religiosas e levarmos nossa crença exatamente igual como nossos ancestrais, tal tipo de crença não faz muito sentido nos dias atuais.

Nós não entenderemos as dificuldades e as ameaças que nossos antepassados enfrentaram. Pelo fato que nos tornamos Neopagãos é algo que devemos a ancestrais mais recentes e nossos próprios esforços, estes esforços são algo que devemos guardar e celebrar.
Nascimento, envelhecimento, amor romântico e sensual, paternidade, morte e luto permanecem constantes e provavelmente ainda evocam as mesmas emoções que provocaram em nossos ancestrais.
Ao traduzir antigas divindades na linguagem moderna da crença, nós devemos pensar como os antigos atributos se relacionam com a nossa realidade. Reduzir uma Deusa ou um Deus em um símbolo que sejam aceitáveis em um contexto moderno nos separam dos poderes da vida ou da morte que os Deuses parecem ter ou representar no mundo antigo.
Em essência, a experiência humana permanece intocável, mas circunstancias e valores não. Nós devemos encontrar uma forma prática para celebrar e expressar esta experiência básica humana em nossa vida religiosa.
A reintrodução do paganismo no palco mundial é um trabalho em progresso, não algo gravado em pedra. Nós queremos deixar um exemplo de pensamento critico, criativo e original diante das adversidades para nossas crianças e gerações futuras, que irão eventualmente olhar nosso esforços e aproveitá-los de acordo com suas próprias necessidades e padrões.

Autor: N.V. Andersen
Fonte: Mos Maiorum. [link morto]
Repostado. texto originalmente publicado em 08/02/2009, resgatado com o Wayback Machine.

sexta-feira, 25 de março de 2022

A praga do politicamente correto

Hoje temos uma produção cultural da violência que faz com que aprendamos a justificá-la, a aceitá-la e a entendê-la como um componente natural da sociedade. E isso é demonstrado em vários níveis. Por exemplo, nas cantigas de roda infantis “Atirei o pau no gato” e “Marcha soldado”. [Dom Marcelo Resende, Prior do Mosteiro da Anunciação do Senhor na cidade de Goiás, em entrevista ao Comunidade Segura][original perdido].
Uma tese de doutorado, defendida no início do mês na Faculdade de Educação da USP, analisou a presença do politicamente correto nos livros e cantigas infantis e concluiu que a presença destas expressões não contribui para uma melhora na educação das crianças.
Ilan Brenman, responsável pela pesquisa intitulada “A condenação de Emília: uma reflexão sobre a produção de livros politicamente corretos destinados às crianças”, é escritor de livros infantis e contador de histórias. Ele se interessou pelo tema porque é afetado no seu cotidiano profissional, por professores e leitores que reclamam de histórias com temáticas consideradas violentas ou inadequadas à infância: morte, guerra, ciúme, raiva etc.
Em visitas a escolas da Grande São Paulo, Brenman notou que os livros tradicionais infantis estão sendo substituídos por publicações que chama de livros de "boas maneiras" e sobre "preconceitos". Nessas cartilhas, ele conta que as histórias giram em torno de narrativas sobre bons modos e ausência de preconceito.
Nas histórias de livros politicamente corretos, Brenman vê outros problemas. "Esses novos livros escondem o conflito, não têm nenhuma incorreção, e impõem uma moral de fora para dentro. Nós observamos cada vez menos bruxas, lobos-maus, menos monstros".
Ele avalia que isso é ruim para a educação, pois "não adianta subestimarmos as crianças. Todas elas tem uma parte sádica, mas de alguma forma a criança se projeta na bruxa da história, e assim trabalha com seu lado agressivo". Ainda segundo o escritor, a família acabou passando seu papel na educação da criança e a escola, por sua vez, delegou seu papel aos livros.
A condenação de Emília
Brenman avalia que as últimas conseqüências dessa vigilância sobre os contos infantis, seria condenar personagens como a Emília, de Monteiro Lobato: "a Emília é famosa por sua rebeldia e por suas incorreções, e a graça dela está nisso". Tomando as últimas conseqüências do politicamente correto na literatura, o conto "'Negrinho do pastoreio' teria que passar a se chamar 'Afrodescendentezinho do pastoreio'".
"Nunca se publicou tantos livros e nunca houve tanta violência nas escolas", ressalta o pesquisador. Segundo ele, isso prova que não é possível estabelecer relação entre os dois fenômenos. Alguns livros infantis, cantigas e os videogames se transformaram nos "bodes expiatórios" da violência nas escolas, mas ela vem de múltiplos fatores como: a desestruturação das famílias, a falta de preparo dos professores, o excesso de alunos nas salas de aulas, etc. De acordo com Ilan, os educadores que fazem essa relação dizem prezar pela "paz nos contos infantis, mas essa é a paz dos cemitérios".
[Luiza Lafuente, em artigo no Jornale][original perdido]

Nota da casa: Não é de hoje que a Igreja (e, às vezes, o Estado) tem essa mania de querer censurar ou de determinar o que é próprio ou não para ler. Se temos que censurar textos que são considerados os causadores da "cultura da violência", que seja censurada a Bíblia. As verdadeiras causas dessa cultura da violência estão na estrutura da sociedade e do Estado atuais.

Repostado. Texto originalmente publicado em 04/09/2009, resgatado com o Wayback Machine. Recentemente, emissoras de televisão locais, comandadas por uma vertente neopentecostal, tem fomentado a neurose em cima de desenhos animados. A televisão tem coisas muito piores sendo transmitidas, inclusive nessa emissora. Eu considero isso uma tentativa de cultivar pânico moral, com o intuito de arrebanhar mais gente.

Senado senil

O Senado da Florida aprovou esta semana o projecto de lei chamado por movimentos críticos como "Don't Say Gay". O projecto de lei proíbe a "discussão sobre orientação sexual ou identidade de género nas salas de aula" dos infantários e até ao terceiro ano — "ou numa forma que não seja apropriada para a idade ou para o desenvolvimento dos estudantes". Além disso, a legislação permite às famílias processar as escolas e o seu corpo docente, caso abordem essas temáticas sem autorização das mesmas.

O projecto de lei foi aprovado pela Câmara dos Representantes da Florida a 24 e pelo Senado do estado, tendo agora o governador republicano Ron DeSantis a responsabilidade de decidir sobre a sua aprovação. DeSantis já demonstrou o seu apoio ao projecto de lei, afirmando que este vai permitir que "as famílias sejam capazes de mandar as crianças para o infantário sem haver algumas destas coisas [conversas sobre orientação sexual e identidade de género] injectadas no seu currículo escolar". A legislação anti-LGBTQ+ poderá entrar em vigor já a partir de 1 de julho na Florida.

A senadora democrata Annette Taddeo alertou que o projecto de lei – descrito como "terrível" – "atinge directamente a comunidade LGBTQ+" e que vai "causar mais ansiedade, medo, isolamento e depressão" em "estudantes que já não recebem apoio nas escolas".

O presidente Joe Biden denunciou no mês passado o projeto de lei agora aprovado no Senado como sendo anti-LGBTQI+: "Quero que todos os membros da comunidade LGBTQI+ – especialmente as crianças que serão impactadas por esta lei odiosa – saibam que são amados e aceites como são."

Não deixa de ser irónico como esta lei pode aproximar politicamente o conservadorismo dos EUA da Rússia e da sua proibição de "propaganda gay" que, desde 2013, proíbe qualquer "propaganda a relações sexuais não-tradicionais" a menores de idade.

A lei da "propaganda gay" é também utilizada para impedir as Marchas do Orgulho LGBT e deter ativistas dos direitos da população LGBTI russa e é vista como uma posição do presidente Vladimir Putin de forma a reprimir a dissidência e aproximar-se da Igreja Ortodoxa.

Recordamos que a Rússia atingiu apenas o 46ª entre os 49 países analisados no relatório anual da ILGA Europe referente a 2021. É este o caminho que a Florida pretende traçar para jovens LGBTI e às suas famílias, assim postas em causa?

Original: https://esqrever.com/2022/03/12/dont-say-gay-senado-da-florida-aprovou-lei-contra-jovens-lgbti/

Nota: Como é de se esperar, grupos de direita, conservadores e fundamentalistas cristãos (geralmente associados) estão reagindo diante do protesto feito contra essa lei ilegal, ilegítima e inconstitucional. Tudo o que a comunidade LGBT quer é o reconhecimento e respeito dos direitos (humanos) que são de tod@s. Eu aproveito para registrar meu repúdio ao Gazeta do Povo e Gospel Prime que, escorados na "liberdade de expressão" e "liberdade de religião", estampam o preconceito, ignorância e intolerância. Homofobia é crime.

quinta-feira, 24 de março de 2022

Anjos e Demônios

Eu gostaria de comentar sobre o porquê de muitos "wiccanos tradicionais" (?) definirem que não existe Anjos ou demônios na Wicca. Eu peço para que cada pessoa que estiver lendo esqueça, nesse momento, a doutrina que faz parte ou a idéia que possui sobre anjos e demônios e analise um pouco da história das terminologias e também dos seres elementais/espirituais que os anjos e os demônios representaram e representam para a história das civilizações.
Nem todo mundo sabe mais os seres mensageiros, hoje conhecidos como anjos, existem a muitos e muitos anos, inclusive, são anteriores ao Cristianismo, melhor, são anteriores também ao judaísmo. Os Angeolos (grego) ou Ângelus (Latim), eram seres elementais que possuíam a capacidade de vagar entre os planos, e eram tão “puros” em sua estrutura, que compreendiam qualquer linguagem, inclusive a dos Deuses, sendo muitas vezes considerados Deuses “menores” ou Gênios, entre alguns povos os Angeolos assim como os Manes (Daimon), existiam não somente no meio externo, mas também dentro de nós seres humanos. Para Sócrates; “Daimon é a parte incorruptível do homem, o verdadeiro homem interno, a alma espiritual”. Por isso os homens eram capazes de se comunicar com os Deuses e também com seres caóticos. Mas é interessante mostrar que para esses povos, os Angelos e os Manes (Daimon) não eram seres distintos, eram, na verdade, os mesmos seres, apenas com nomes diferentes. Isso se deve porque para os pagãos a idéia de Bem e Mal não existia, os Angeolos/Daimons eram seres “puros”, ou seja, não se ligavam nem ao bem nem ao mal, faziam o que precisavam fazer e pronto, não importava como os homens aceitavam tais ações, o importante era que fizessem o que tinham que fazer, pois isso para eles é o “certo”.
Esses seres eram normalmente “vistos” com asas, pois como sabemos as mensagens eram passadas pelo Ar, através de corujas, águias, pombos...Vemos também que o Deus mensageiro Hermes era sempre caracterizado com um capacete com asas, e calçando uma sandália alada. Por essa razão os Angelos e os Manes (plural de Daimon) eram sempre caracterizados como seres alados. Segundo Hermes os Manes eram espíritos guardiões da raça humana; “aqueles que moram na proximidade dos imortais, e daí velam pelos assuntos humanos”.
Agora saindo dos povos gregos, vamos aos povos do oriente, de onde os Hebreus roubaram a termologia Elohim, que atualmente muitos pagãos usam como referência aos Angelos. O termo “El” para designar Deus, vem dos Cananeus, povos semitas da Fenícia e da Palestina, cuja civilização foi marcada pela unidade da religião e da linguagem. Em toda a sua região eram adoradas as divindades conhecidas pelos textos de Ugarit (referência abaixo) como El, Baal, Adu, Anat, e vários outros (sim eles eram pagãos). O culto dos Cananeus ocorria em lugares altos onde se encontravam os bosques sagrados, sacrifícios e ritos sexuais assinalavam as celebrações dos festivais em honra aos Deuses. Atingidos pelas invasões Aramaicas (sendo um dos povos invasores, os Hebreus) no fim do II milênio AC o “mundo” cananeu reduziu-se, a apenas, as cidades Fenícias e Púnicas.
El era o Deus do Céu entre os Cananeus (Singular a Zeus entre os Gregos). Divindade suprema que foi eclipsado (Ofuscado) por Baal. Apropriado pelos hebreus, o nome do Deus e dos seus seres mensageiros, passou a ser um termo para designar os outros nomes de Javé: Elohim e El-Shaddai.
Encontramos referência dessas palavras na Bíblia, e também nos textos Babilônicos de Tell Al Amarna, sendo esses últimos textos, pagãos e anteriores a formação da Bíblia Hebréia (Antigo testamento). Baal é a palavra semítica que significa “Senhor”, e que era aplicada a várias divindades padroeiras de cidades, em especial a Hadad, deus da tempestade. Percebam que a Igreja Católica, para não perder o costume, transformou o termo Baal no nome de um dos “grandes demônios”, e em alguns casos é até o nome dado ao Diabo.
O termo Elohim é o plural de Eloha que significa: “mensageiros de El”. Como El era o Deus do Céu - veja Céu como apenas a atmosfera compreendia entre a terra e as estrelas – ele também era considerado o Deus Mensageiro dos Cananeus, e seus “braços direito” eram os Elohim (na hierarquia dos elementais, são os mais “evoluídos”).
Eu sei que um texto muito longo é cansativo, mas já que estou disponibilizando algumas informações históricas acredito que é interessante comentar sobre os sítios Arqueológicos de Ugarit e Tell Al Amarna, já que eles foram citados como referência. Ugarit era uma antiga cidade da costa da Síria, ao norte de Latáquia, atual Ras Shamra, a chegada dos Amorreus no III milênio AC fez a prosperidade da cidade, que se tornou, no II milênio, um rico centro comercial em que predominavam as influências Egípcias e Hitita. O sítio arqueológico de Ugarit foi descoberto em 1928 e escavado por C. Schaeffer e sua equipe. Em dois imensos palácios foram descobertos em câmaras subterrâneas, depósitos de arquivos e de textos literários, os quais, possuíam 5 sistemas de escrita entre elas a Ugarítica, língua semítica utilizada na fenícia dos séc. XV ao XIII AC.
Amarna, sítio do Médio Egito, na margem oriental do Nilo, ao norte de Assiut, presente no local das ruínas de Aquetatão, a efêmera capital de Amenófis IV Aquenaton (1372 – 1354 AC). Os arquivos reais lá encontrados forneceram um grande volume de informações sobre as relações do Egito com outras regiões do Oriente Próximo. Foram descobertos templos do culto solar, palácios, residências particulares, bairros operários e necrópoles, assim como diversas oficinas e lojas.
Considerações finais
Depois disso tudo vamos ao resumo: No passado os seres elementais/espirituais responsáveis por transmitir mensagens, energias, e sensações entre os planos, além de serem os guardiões dos “portais” eram chamados pelos gregos de Angeolos ou Daimon, sendo que sua força e personalidade também habitavam o mundo interno de cada ser humano. Esses seres não eram bons nem maus, eles agiam de acordo com o que precisavam fazer, pois na mente dos antigos (e dos atuais) pagãos nada é bom ou mal, tudo depende do ângulo que você encara, normalmente consideramos tudo um aprendizado e uma forma de arrecadar sabedoria. Esses mesmos seres aparecem na crença dos Sumérios, Babilônicos, Cananeus e vários outros, e o termo que alguns deles usavam para representar esses seres era Elohim, ou mensageiros de El. Atualmente a Igreja Católica absorveu e transformou o termo Angeolos em Anjos, e Daimon em Demônios, mas inseriu neles características inexistentes no passado, primeiro porque transformou-os em seres distintos, segundo porque colocou os Anjos como seres Bons e os Demônios como seres maus, ligando-os inclusive a uma entidade unicamente cristã/judaica denominada de Diabo/Satã (que na mitologia judaica, era um anjo). Ou seja, fizeram uma “mistureba” danada, um anjo virou um ser quase divino, que passou a controlar os Daimon que deixaram de ser a mesma coisa que os angeolos. Os Anjos, por sua vez, foram divididos em 9 camadas hierárquicas: Serafins, querubins, tronos, dominações, virtudes, postestades, principados, arcanjos, anjos. E agora a termologia Anjos significa: "ser celeste intermediário entre Deus (cristão monoteísta) e os homens". Assim sendo, as religiões pagãs como a Wicca, não podem mais usar o termo Anjos, pois isso causaria uma grande confusão, principalmente na mente dos mais novos que desconhecem os traços históricos dos termos, e além de causar um choque de Egrégoras, pois seriam 2 contextos (Pagãos e Cristãos) utilizando um mesmo "termo invocativo" para invocar e evocar entidades diferentes.
Enfim, o que podemos fazer? Como trabalhar com esses elementais/entidades? Simples, atualmente boa parte das tradições da Wicca e de Clãs da Bruxaria tradicional trabalham com a terminologia Elohim, já que esta, apesar de aparecer como um dos muitos nomes de Jeová (Deus dos hebreus), não possui nenhum vínculo ou culto religioso fortemente estruturado e propagado como ocorreu com os Anjos, e possui uma egrégora unicamente pagã. O conselho que eu dou é: Use o termo Elohim, qndo for trabalhar com os seres mais altos da categoria elemental, ou crie nomes para eles (como muitos na BT fazem), mas não use o termo Anjos, pois esse nome já deixou de ser (ou nunca foi) pagão e está enraizado na cultura cristã. Se vc usar o termo Anjos, vai acabar confundindo as pessoas e ainda vai cair em um grande choque de egrégoras. E essa confusão não é boa para a imagem da religião Wicca, e muito menos para o paganismo.
Por fim, respondendo a pergunta do tópico: Existem Anjos e Demônios na Wicca? Não, não existem. Angeolos, Daimon, Manes e Elohim, existem, mas Anjos e Demônios não. Alguém agora pode bater o pé e dizer Angeolos e Anjos é a mesma coisa, só escreve diferente. Minha resposta é a seguinte: Para os Judeus o nome Shabbat (com SH) é o sábado, o sétimo dia da Criação, o Dia do Repouso do Senhor e a mais importante comemoração dos Judeus. Todo tipo de trabalho é proibido, homens, mulheres, crianças, animais, nada pode trabalhar no dia de Shabbat, pois é um dia de meditação, introspecção e estudo, dedicado à lembrança da escravidão do Egito. Já na Wicca os Sabbaths (apenas com S e com h no fim) são as comemorações celtas (maiores) e os equinócios e Solstícios (menores). Os termos são parecidíssimos e no passado eram utilizados para designar as celebrações não cristãs, mas hoje, já fortalecidos são termos parecidos, mas que significam coisas completamente diferentes, e é assim com os Angelos e os Anjos.
Autora: Dayne Anglius.
Fonte: comunidade do orkut "Sociedade Wicca".
Original perdido. Repostado. Texto originalmente publicado em 17/09/2008, resgatado com o Wayback Machine.

Censo da sexualidade

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) vai realizar uma divulgação inédita sobre os dados referentes a oriental sexual da população brasileira. 

A decisão foi tomada após o IBGE ser acionado na Justiça e questionado pelo Ministério Público Federal (MPF) sobre o porquê perguntas referentes à população LGBTQIA+ terem sido excluídas do Censo Demográfico de 2022. 

Os dados referentes à orientação sexual que serão divulgados no dia 25 de maio foram coletados na Pesquisa Nacional de Saúde, realizada em 2019 e cujo dados sobre as pessoas LGBTQIA+ não seriam, inicialmente, divulgados. 

Ao ser questionado, o IBGE voltou a declarar que o Censo Democrático não é a pesquisa adequada para se realizar levantamento sobre a população LGBTQIA+, pois, permite que um morador do domicílio responda pelos demais. 

Por sua vez, a Pesquisa Nacional de Saúde trata da saúde da população e impactos nos serviços de saúde do país. Esta é a segunda edição do levantamento que inclui perguntas sobre a população LGBTQIA+, entre elas, a orientação sexual.   

Original: https://revistaforum.com.br/lgbt/2022/3/24/ibge-vai-divulgar-pela-primeira-vez-dados-sobre-orientao-sexual-112003.html

quarta-feira, 23 de março de 2022

La garantia soy jo

O mundo das finanças passou por uma semana tensa e incerta depois de encarar uma possível crise econômica mundial igual ou semelhante à acontecida em 1929.
Como, onde e por que aconteceu essa crise e quais serão as medidas dos governos para evitar novas catástrofes econômicas no futuro é um assunto para economistas e políticos.
Para os objetivos deste blog, eu irei explorar os dois pontos humanos desta crise: a confiança e o crédito.
A quebra de crédito e de confiança na área econômica causou tanto rebuliço, mas perdas financeiras ou patrimoniais podem ser superadas, ainda existe esperança e vida. Mas uma quebra de crédito e de confiança na área espiritual produziria um estrago muito maior, pois teria se perdido toda a esperança e o motivo de viver.
Nos dias de hoje não é fácil confiar em um sacerdote, quanto mais em um templo e raramente em uma religião. Oh, sim, as histórias das religiões são cheias de conflitos, mas conflitos continuarão a existir, mesmo se as religiões fossem abolidas, simplesmente porque é parte de nossa natureza. Nós somos instintivamente belicosos e sempre encontraremos justificativas e desculpas intelectualizadas para querer agredir, perseguir, prender e matar outro ser humano unicamente por ser diferente.
A opção por crer ou descrer parte dessa confiança em alguma coisa. Cremos ao confiar na filosofia de uma religião. Descremos ao confiar na percepção de uma ciência. Em ambos os casos, o problema começa quando se dá importância demais a apenas este aspecto de nossa humanidade a ponto disso se tornar uma obsessão. A obsessão nos conduz ao fanatismo, ao fundamentalismo, à enfermidade, à ignorância. Coisas que contradizem os princípios mais anelados, tanto da religião quanto da ciência.
Nisso entra o crédito, nós também escolhemos em quem ou no que daremos crédito para que possamos responder às questões que, como humanos, nos fazemos e passamos a vida tentando desvendar, que é o mistério tanto de nossa existência quanto o do porvir. Os que creem se preocupam - até demais - com o próximo passo da vida, os que descreem se preocupam - até demais - com o próximo passo da tecnologia.
Uma vez, em uma palestra, um cristão perguntou a Richard Dawkins de como ele se sentiria se estivesse enganado. Ele respondeu invertendo a questão ao cristão de como ele se sentiria se ele estivesse enganado. O cristão evidente não cogita a possibilidade de estar enganado, mas eu conheci um ateu que igualmente não cogitava a possibilidade de estar enganado e sinceramente tanto cristãos quanto ateus não deram uma resposta convincente, apenas tegiversaram.
Para o cristão, é inimaginável entender a razão de nossa existência sem a crença no Deus Cristão, sem a crença na bíblia cristã, sem a crença no pecado e na salvação, sem a crença no Inferno e no Paraíso. Para o ateu, é inimaginável entender a razão de nossa existência sem a crença na lógica científica, sem a crença na teoria científica, sem a crença na evidência e na experiência, sem a crença na Ciência e na Academia. Para o cristão, quem está fora do padrão cristão está condenado ao Inferno. Para o ateu, quem está fora do padrão científico está condenado à superstição. Para o cristão, a bíblia contem toda a verdade e coisa alguma nela foi manipulada, forjada ou censurada. Para o ateu, a teoria científica contem toda a verdade e coisa alguma nela foi manipulada, forjada ou censurada. Ambos negam ou refutam qualquer pensamento ou perspectiva diferente que indique as falhas, lacunas, contradições, corporativismo ou policiamento dentro de suas instituições.
E a humanidade vai ficando dividida entre Jeová e Apolo. E quem está ganhando é a obsessão, a enfermidade e a ignorância.
Repostado. Texto originalmente publicado em 13/10/2008, resgatado com o Wayback Machine.

terça-feira, 22 de março de 2022

Estelionato cristão

A Igreja Universal foi condenada pela Justiça de São Paulo a devolver cerca de R$ 200 mil doados por uma fiel que diz ter sido coagida a fazer a contribuição para conseguir um lugar no céu. A professora F.S., de 53 anos, afirmou que procurou a agremiação religiosa em 1999 para ajudar com seus problemas pessoais.

De acordo com a coluna de Rogério Gentile, no UOL, entre dezembro de 2017 e junho de 2018, foram feitas as maiores doações, repassando R$ 204.500 para a igreja. A docente informou que atualmente recebe um salário líquido de R$ 1.500 por mês e que os valores doados, segundo ela, eram suas economias de 30 anos de trabalho.

“F.S. realizou as doações porque tinha convicção de que apenas se sacrificando agradaria a Deus e teria a sua bênção”, disse a defensora pública Yasmin Pestana, que representa a professora.

A Universal negou que coagiu a docente. “A autora [do processo] é maior [de idade] e, portanto, absolutamente capaz de entender e refletir sobre a consequência dos atos praticados, não podendo agora alegar ter sido vítima de coação psicológica, decorrente do discurso litúrgico dos pastores”, afirmou.

A igreja destacou que a professora frequentou a igreja por 18 anos, “sendo profunda conhecedora dos preceitos litúrgicos pregados” pela instituição, e que sempre teve liberdade para escolher outra igreja. Afirmou ainda que o dízimo bíblico, “necessário para o sustento do trabalho religioso”, é uma prática que “remonta milênios”.

O juiz Carlos Bottcher afirmou na sentença que ela foi, sim, vítima de coação, “considerando as pressões psicológicas empreendidas pelos membros da organização religiosa para realização das ofertas”. A Universal foi condenada a devolver os R$ 204,5 mil, valor que deverá ser acrescido de correção monetária e juros desde as datas em que as doações foram feitas. A igreja ainda pode recorrer da decisão.

Original: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/universal-e-condenada-lugar-ceu/

O caminho do peregrino

Assim como o coração cresce e se encolhe para continuar batendo, o caminho muitas vezes nega-se a si mesmo para estimular o viajante a descobrir o que existe além da próxima curva. [Sufi Hafik]
Todos nós nascemos 'ateus' ou, melhor dizendo, profanos. Não escolhemos nossa família, mas a base de todo homem vem dela e vivemos nossa infância, conforme o contexto familiar e social. Quando damos conta, nos pegamos em busca de algo, mas sem saber bem o que (ou quem). Nem sempre escolhemos de forma consciente essa busca, boa parte dessa luta nos é dada por outro. Nesses casos, a nossa realização se torna a realização de mais alguém: de nossos pais, de nossos professores, de nossos chefes, de nossos governantes e nos sentimos com alguma razão que nossa vida parece ser dirigida para propósitos alheios.
Entretanto nós fazemos algumas opções, tomamos algumas decisões que, apesar de serem pessoais, ainda assim são feitas sem saber bem o que (ou quem) se busca e o que se pretende realizar com essa busca. Costumeiramente essa busca começa por uma pergunta que nos acossa, mas nunca nos dispomos a entender por que nos perguntamos, por que nos sentimos responsáveis em encontrar uma resposta, nem por que essa resposta é tão crucial em nossa existência. Simplesmente buscamos, muitas vezes a busca se torna uma obcessão e os indícios não são vistos como objetos, mas como a verdade tão almejada. Nisso consiste a base de todo o fundamentalismo e fanatismo.
Contudo, ainda que consigamos conquistar o alvo de nossa busca, parece que nunca será o suficiente. Nos movemos, de conquistas em conquistas, de objetivos em objetivos, de buscas em buscas e acabamos como o rei Clóvis: queimamos o que adorávamos e adoramos o que havíamos queimado. Seguimos adiante, sem saber para onde, sem saber o por quê, sem saber como. De tempos em tempos, nos pegamos no meio de lugar nenhum, sem entender como fomos parar lá ou o que estamos fazendo ali. Nós somos insaciáveis, não sabemos do que temos fome, não sabemos como nos satisfazer e geralmente em nossa busca ansiamos em conquistar as mesmas coisas que os mais afortunados têm, desprezando ou negligenciando aquilo que nós temos que é desejado pelos menos afortunados.
Nós complicamos tanto essas buscas banais, complicamos ainda mais quando lidamos com buscas espirituais. De início, nós temos um grande complexo quanto à nossa condição e existência natural, não sabemos como encarar nossa espécie: o ápice da evolução cujo comportamento deixa a desejar ou uma criação rejeitada (caída) cuja virtude é omitida. No primeiro caso, buscamos por um desenvolvimento sustentável; no segundo, buscamos pela redenção (purificação) de nossas almas. Em ambos os casos, perdemos tempo com discursos e desperdiçamos oportunidade com elucubrações.
O foco excessivo no sistema acaba gerando ou aumentando mais a nossa obsessão, a nossa enfermidade, a resposta se torna um problema cuja solução nos lança a mais uma busca.
No que tange a este peregrino que está no caminho entre o Bosque Sagrado, eu estou cansado de ver os Mistérios Antigos serem deturpados, eu estou cansado de ouvir queixas de neopagãos (que são muitas), eu estou cansado de ser perseguido e apedrejado por quem diz ser meu irmão, eu estou cansado de ver bruxos e bruxas com recalques sexuais, eu estou cansado de ver a Bruxaria e a Wica ser caiada. Eu devo parar de olhar para as pedras que estão no caminho por um propósito e olhar mais para a magnífica beleza no imenso horizonte. Eu devo me concentrar na minha busca que é encontrar a Deusa e entrar em seus mistérios, para a mim mesmo encontrar e renascer na primavera.
Repostado. Texto originalmente publicado em 19/09/2008, resgatado com o Wayback Machine.

segunda-feira, 21 de março de 2022

A sexualidade oculta das freiras

Introdução
Houve um tempo em que o desejo sexual transpôs os limites da espiritualidade reclusa. Os homens procuraram profanar os conceitos de virtude que os oprimia e aos quais se submetiam num próprio ato irreverente de maculação. Como poucas vezes, a interdição sexual teve a função de afrodisíaco. Era preciso degradar o fascínio do mal; espiritualizar o corpo e erotizar a alma. Para isso, nada como buscar o prazer na escuridão das celas dos conventos.
O demônio, que é um espírito e espírito soberbo, sem reverência pelos lugares sagrados, entrava nos claustros religiosos, passeava nos corredores e dormitórios e, por mais fechadas que estivessem as celas, se metia e morava nelas.
Antes de Cristo e um pouco depois, na Igreja primitiva, o sacerdócio feminino tinha assegurado o seu direito de oficiar. Mais tarde, a Igreja realizou suas inclinações patriarcais na criação do dogma e da hierarquia eclesiástica. Numa tentativa de transcender os instintos do ser humano, adotou a repressão, realizada através das promessas de condenação da alma. O inferno era inevitável para aqueles que se entregassem aos prazeres sexuais. A mulher, encarnação da volúpia, foi lançada a uma posição irrelevante e oculta na sociedade, ela mesma objeto de imprecação para afastar o mal. Ela viu usurpada a legitimidade de suas funções naturais de sedução, de sua força mágica de amar; foram envilecidos os prazeres que dela irradiam. Então, a ambivalência erótica surgiu de maneira surpreendente: a execração da mulher e a sua redenção.
Os tormentos do corpo
Em resposta à demonização do sexo, os instintos de Eros se manifestavam dentro dos mosteiros através de alucinações e extravasamentos, como o refinamento cruel da autoflagelação do corpo, os desfalecimentos ambíguos, as convulsões eróticas do êxtase, a homossexualidade e a heterossexualidade, com o testemunho do nascimento de bastardos.
A vocação religiosa não era um dos motivos mais importantes para se mandar uma mulher para o convento. A rebeldia, a sensualidade, o interesse intelectual, uma personalidade excessivamente romântica e apaixonada, um corpo demasiadamente atraente faziam com que se encerrassem moças nas celas úmidas dos mosteiros. Os homens mandavam para lá suas bastardas, suas amantes, as filhas que perdiam a virgindade, as estupradas, as que se apaixonavam por um homem de condição inferior ou de má reputação.
Ali reuniam-se virginais predestinadas e as arrebatadas jovens de família. Distanciadas da companhia dos pais opressores, desfrutavam de liberdade intelectual. Privadas da presença de homens, floresciam em sonhos românticos e fantasias sexuais. Nos conventos surgiram as escritoras, as amantes e as cortesãs.
A contemplação da mulher amada
Não era necessário grande beleza para se tornar uma preferida conventual nas artes do amor. Bastava uma certa doçura, malícia, sensualidade e as roupas religiosas, detrás de portas de ferro e janelas gradeadas, para arrebatar o coração de um homem.
Os verdadeiros adoradores de freiras eram platônicos. Esses devotos arriscavam-se aos severos castigos pelo prazer de tocar olhares amorosos com a desejada. Numa voluptuosa tortura, ansiavam pelo mistério e respeito, pela beleza oculta e inatingível, pelos sorrisos insuspeitos, pelos beijos incertos que o amor por uma monja poderia proporcionar.
A sedução era longamente desfrutada; a aproximação se dava num clima de excitação. Quase sempre homens e natureza sonhadora, eles flertavam, lançavam olhares suplicantes; enamorados, suspiravam, entregavam-se ao sofrimento. E seguida, iniciavam uma correspondência amorosa.
Frenesi de hordas e solitários
As freiras, no começo, não respondiam às cartas e apenas os mais persistentes prosseguiam até receber uma resposta. Ela o convidava, então, a assistir ao sermão. Quando abriam-se as cortinas do coro, os olhos não se desprendiam. Elas fruíam a volúpia de serem desejadas e admiradas; eles, a da violação do pudor feminino e do dogma religioso.
Os primeiros encontros se davam no ralo, quando podiam falar-se sem se ver. O freirático entregava-se à luxúria do amor impossível; com as mãos estendidas nas folhas de metal, colava os lábios nas cruzes douradas. Depois se viam na escuridão do locutório, recinto dividido por grades, onde as religiosas recebiam visitas. Ele tremia coma visão escura de um vulto feminino atrás das barras de ferro, murmurava, num jogo de amor lírico, sem resultados garantidos.
A musa libertina
Mas nem sempre os freiráticos ficavam do lado de fora dos conventos. Mandavam presentes, imagens de santos, presépios, capelas, aos que tinham as chaves das celas; subornavam abadessas, abriam suas bolsas aos padres, para desimpedirem o caminho em direção ao objeto desejado. Havia padres residentes que usavam seu trânsito nos conventos a fim de levar e trazer a correspondência dos freiráticos, com os tratos ilícitos. De noite, portões se abriam para que os amantes entrassem furtivamente; muros eram escalados, fugas eram empreendidas com escândalo, abadessas que criassem obstáculos eram ameaçadas com faca. Alguns se disfarçavam em hábito feminino para se insinuar nos corredores em busca da eleita.
As religiosas do convento tinham nas proximidades várias casinhas aonde iam, fora da clausura, com pretexto de estarem ocupadas a cozinhar e recebiam ali homens que entravam e saíam de noite. Nas celas, os catres rangiam, os corpos alvos das freiras suavam sob o calor dos nobres, estudantes, desembargadores, provinciais, infantes. Os gemidos eram abafados com beijos.
A doçura do amor e seus abismos
Muitos conventos tomavam por modelo o de Odivelas, onde as freiras tinham um ou vários amantes. Moravam em celas luxuosas, levavam uma vida ociosa em que se entretinham em ler, namorar e fazer doces.
Em certas manhãs, elas armavam do lado de fora do convento, um buffet de doces e pratos especiais. Naquele dia as ruas ficavam intransitáveis. Os portões se abriam e entravam os freiráticos. Descerravam-se as cortinas da grade de proteção e perante os homens apaixonados surgiam as religiosas. Aos poucos, elas iam abandonando o ar grave, cruzavam as pernas, tocavam violas e harpas, recitavam versos provocantes, riam, divertiam-se.
Depois da grade de doces, os freiráticos podiam encontrar-se com suas musas nos locutórios, mas não a sós, tinham que admitir a presença de uma gradeira. Antes do encontro, vinha uma monja confidenciar ao freirático que sua amada morria de paixão por ele. Depois entrava a desejada, tocavam-se as pontas dos dedos; ele segurava-lhe o braço; ela mostrava-lhe o pé, o tornozelo ou desnudava o seio, que ele acariciava, sob o olhar descuidado da sentinela.
Os freiráticos partiram em mil pedaços a divisão do corpo da mulher entre o céu e o inferno, abrindo caminho para que se iluminasse as trevas pecaminosas com que o platonismo cristão assombrava o paraíso dos amantes. A mulher pôde, assim, tratar de recuperar sua natureza feminina, atingir a plenitude de seu poder sagrado.
Fonte: “Que Seja em Segredo”, de Ana Miranda, pg. 5-14, ed. Dantes [com permissão].
Repostado. Texto originalmente publicado em 18/08/2008, resgatado com o Wayback Machine.

domingo, 20 de março de 2022

O papel da mulher

Embora perdido no tempo e pouco conhecido, o período do matriarcado é caracterizado, em linhas gerais, pela liberdade (promiscuidade?) sexual – haja vista a figura do filho amante – e pelo politeísmo, em que deuses e deusas conviviam harmoniosamente. Como não se conheciam os mecanismos da fecundação, a mulher dominava a cena, ficando o homem em segundo plano.
O monoteísmo e o patriarcado são caracterizados por uma generalizada repressão sexual e exclusão da mulher. As religiões controlam o comportamento das pessoas e provocam uma repulsa sexual que se transforma em sintomas neuróticos. A psicanálise revolucionou o objetivo da sexualidade, introduzindo o princípio do prazer, em substituição ao primado da reprodução, favorecendo a liberação feminina e sua visibilidade na sociedade.[pulsional][link morto]
Como é facilmente (ou não) observável, esse monoteísmo é uma limitação, uma restrição à vida e ao progresso, uma degeneração espiritual.
Um tal monoteísmo, de obstrução, de coerção e de exclusão, que desde seu surgimento prega a submissão da mulher, jamais poderia ser aceito pelo sexo feminino. Os maiores e mais conhecidos seguidores desse monoteísmo absurdo sempre depreciaram a imagem feminina, sempre inferiorizaram a mulher. Todos sabemos das atrocidades monoteístas ao longo da História e sua nefasta influência nos dias de hoje, por meio de seus dogmas espúrios aceitáveis pelas mentes fracas e temerárias. E a fraqueza podemos ver em seu Deus moribundo, agonizante, deprimente, em seu culto de dor e sofrimento desnecessários, um culto escravagista, um culto de pseudo-vítimas do mundo e do destino e de menosprezo às forças femininas da vida.
Pelo que precede, podemos ver que a mulher, por muito tempo, foi considerada pela religião monoteísta como um ser inferior e, até mesmo como o próprio mal. É fácil constatar isso quando estudamos o passado dessa religião e suas barbaridades para conquistar poder, domínio sobre as massas e riqueza. Se não bastasse sua forçada condição inferior, a mulher também era vista como a consorte do Diabo.
Mas, nos dias de hoje, não há mais o porquê de ser cristita. As mulheres, que tanto querem igualdade (e com razão), não precisam ser cristãs, não precisam se submeter ao patriarcalismo hipócrita que se infiltra em todos os aspectos da sociedade. Elas podem ser livres, seguir uma religião ou filosofia mais condizente com a liberdade de expressão, com o respeito ao feminino, com o respeito à natureza e com o sagrado dentro de cada uma delas. Podem, sem medo de repressão, adotarem uma vida psicomentalmente mais saudável, prazerosa, alegre, sem as idéias de pecado, impureza, condenação e sofrimento, sem os recalques causados pelo monoteísmo patriarcal e seus dogmas perniciosos disfarçados de santos.
Contudo, apenas as mulheres fortes e obstinadas conseguem mudar seus paradigmas psicomentais e se emancipar. Senso comum, comportamento de rebanho, debilidade e a moral de escravo são coisas para as massas, como tem sido há milênios.[Adriano Camargo Monteiro]
A mulher está em um dilema e uma encruzilhada. mais do que nunca, ela tem em suas mãos a oportunidade de definir sua identidade, conforme seus próprios termos, com ou sem religião. Ela pode adotar uma postura feminista, porém sem abrir mão de sua feminilidade; ela pode adotar o ateísmo, sem deixar de lado sua intuição; ela pode adotar o Dianismo, sem deixar de lado o Deus. Mas, sobretudo, ela pode escrever seu papel, ela pode escolher ser a ingênua romântica Julieta ou dar um pé na bunda de Romeu; ela pode escolher ser a carente Gioconda ou dar o troco no Don Juan; ela pode escolher ser a reprimida Jeanette ou dar cartão vermelho no Casanova; ela pode ser a fútil Patricinha ou dar um basta na ditadura modista do Mauricinho; ela pode ser a pecadora perseguida pelas religiões monoteístas ou assumir sua identidade como reflexo da Deusa.
Ousem! Escrevam! Sejam!
Repostado. Texto originalmente publicado em 08/06/2008, resgatado com o Wayback Machine.