Alice no Espelho, Lewis Carroll.
-As pessoas são casas.
Alice estava drogada como de costume. Nós nos conhecemos enquanto ela visitava o Mundo do Espelho.
O Sapo Meirinho, meu primo, a apresentou. Eu, Sapo Bardo, fiquei impressionado e preocupado. Ela era uma criança de quase oito anos e estava visivelmente drogada.
Só pode ser. Seu modelo, quem inspirou sua criação, estava constantemente às voltas com um homem de quarenta anos que a fotografava, amiúde, junto com outras meninas, em posições muito sugestivas. Algo que agora se tornou um problema e adubo para pânico moral na dita civilização ocidental.
Embora não exista, objetivamente, diferença. Seja na intenção da foto, seja na pessoa retratada.
Dizem que Goya fez um quadro, “Maia Desnuda”, que causou muito furor por causa da nudez. Ele então fez outra versão, com a mesma imagem e modelo, mas coberta por um vestido. O público achou o segundo quadro mais provocante.
Ah, mas é pornografia, alguns leitores podem protestar. A pornografia não existiria nem faria tanto sucesso se o ser humano não vivesse em uma sociedade tão repressora, se não vivesse uma vida tão frustrante. Uma vida cheia de recalque, sem poder expressar livremente as pulsões e as libidos.
Alice tem agora 18 anos e mesmo assim em muitos países ela é considerada uma criança.
-Interessante sua analogia, Alice. Poderia elaborar?
-Uma casa tem janelas. Por uma janela é possível ver o outro lado. Nós temos olhos, com os quais podemos ver o outro lado. Os olhos são nossas janelas.
-Observação sagaz. Mas é possível olhar para dentro de uma casa, por uma janela. Consegue ver dentro de uma pessoa através do olho dele ou dela?
Alice vira e fica me encarando. Ela trocou o vestido icônico da literatura e dos desenhos por um traje punk. Ela coloriu os cabelos, fez tatuagem, colocou piercing e ela parecia bem à vontade com um top justíssimo e uma micro saia.
-De vez em quando eu consigo ver o seu interior, Sapo Bardo. Mas não preciso olhar dentro de você para saber o que está pensando. (Ela aperta forte entre minhas pernas, no minha parte íntima e sensível)
-Deixe isso quieto. Continue sua filosofia.
-Uma casa tem chaminé, por onde sai fumaça. As pessoas também soltam fumaça.
-Uma casa solta fumaça porque tem lenha queimando na lareira. Uma pessoa tem uma lareira? Que tipo de lenha seria queimada nessa lareira?
Alice segura minha cabeça (a de cima) e balança.
-Nem sempre uma fumaça vem de algo queimando por dentro. As pessoas queimam algo por fora. Parece um tubo de papel. Tem uma brasa na ponta. Então elas fazem uma careta, como se elas estivessem sugando algo e então soltam fumaça.
-Ah, sim, um cigarro. (Ela sabe o que é um cigarro. Embora o que ela fuma é um produto clandestino)
-Isso mesmo. Também tem ocasiões em que eu vejo vapor saindo das orelhas dos homens. Principalmente quando eles olham para uma mulher linda e atraente. Eu sou atraente, Sapo Bardo?
Alice faz uma pose sensual e eu sinto meus ouvidos quentes.
-Aí está. Eu provei meu ponto de vista.
-Culpado. Mas tem mais comparações, Alice?
Pessoas andam, mas casas não.
Nós estávamos sentados, curtindo cogumelos. Ela me forçou a deitar de costas na grama e ficou inclinada em cima de mim.
-Eu vi casas andando. Venha que eu te mostro.
Ela me puxa pela mão até um estacionamento de carros. Triunfante, aponta para um veículo.
-Isso é uma casa e anda.
Alguns indivíduos nos olham entre curiosidade e desconfiança. Pessoas em situação de pobreza. O que Alice aponta é chamado de “motorhome”. Um carro adaptado para servir de moradia.
-Mais um ponto para você, Alice. (Eu lembro do que meu primo contou do diálogo entre ele e a Alice) Mas casas tem campainha. Pessoas não tem campainha.
Alice olha na minha direção, parece incomodada e zangada.
-Campainha é onde se toca para acionar um aviso ou alarme. As pessoas tem campainhas. Veja.
Alice ergue o top, mostrando seus seios e os mamilos.
-Bem aqui. Se tocar aqui, um sino soa dentro de mim.
Ela aponta para os mamilos, que estão eriçados.
-Duplamente culpado. Mais dois pontos para você. Mas as pessoas precisam comer. Casas não comem.
Alice franziu a testa e torceu a boca. Fez um esforço para pensar.
-Casas também comem. Venha que eu te mostro.
Alice cobriu-se e me puxou pela mão. Ela parecia frustrada e decepcionada. Ela queria que eu tocasse em seus mamilos? Ela pára diante de uma obra e aponta.
-Diversas coisas entram nessa casa e não saem. Só sai lixo e entulho. Portanto, a casa come e caga.
Ela conseguiu de novo.
-Ponto para você, Alice. Mas as pessoas entram e saem de dentro das casas. Pessoas podem entrar e sair de outras pessoas?
Alice desenha um enorme sorriso de satisfação e faz uma expressão muito safada. Ela levanta a micro saia e mostra suas partes íntimas completamente expostas.
-Vê isso, meu amor? Esta é a minha porta. Você pode entrar em mim por ela. No devido tempo, uma pessoa pode sair de dentro de mim através desta porta. Quer tentar?
Eu não consigo resistir. Eu avancei e derrubei a Alice. Ela mordisca o lábio enquanto observa, cheia de apetite, ansiando para ser preenchida por mim.
Vitória total. Pessoas são casas.
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