Agradou-me sobremaneira a conclusão do caso jurídico que esvoaçou pelo STF quanto ao reconhecimento da união civil entre homossexuais:
Em sessão histórica, o Supremo Tribunal Federal decidiu ontem, por unanimidade, que têm valor legal as uniões estáveis entre homossexuais. A maioria dos ministros votou com o relator do caso, Carlos Ayres Britto, para quem os homossexuais têm os mesmos direitos que os casais heterossexuais.
Pode haver limites a essa igualdade de direitos, porém. O ministro Ricardo Lewandowski disse ser favorável à união homoafetiva "naquilo que não for típico da relação homem e mulher". Ele não quis entrar em detalhes porque o tema pode voltar a ser discutido no STF. Segundo ele, ficou em aberto "se cabe casamento, se cabe fertilização in vitro, se cabe adoção".
Especialistas entendem que a maioria dos direitos tidos pelos casais heterossexuais foi estendida aos homossexuais, como adotar o sobrenome do parceiro, assumir a guarda do filho do cônjuge, receber herança ou pensão, somar renda para aprovar financiamento e alugar imóveis.
O ministro Celso de Mello afirmou que o Estado deve dar às uniões homoafetivas o mesmo tratamento dado às uniões estáveis heterossexuais. "Toda pessoa tem o direito de constituir família, independentemente de orientação sexual ou identidade de gênero", disse.
O ministro Luiz Fux disse que a homossexualidade é um traço da personalidade, caracteriza a humanidade de determinadas pessoas. "Homossexualidade não é crime. Então, por que o homossexual não pode constituir uma família?", questionou Fux. A ministra Cármen Lúcia destacou que a Constituição Federal não tolera qualquer discriminação.[Destak]
Evidente, seguiu-se o esperado protesto, da Igreja e seus acólitos:
Pouco depois de o Supremo Tribunal Federal retomar, no início da tarde desta quinta-feira (5), o julgamento de ações sobre o reconhecimento da união entre casais do mesmo sexo, alguns bispos em São Paulo se manifestaram contra a proposta. Para os religiosos, que estão reunidos na 49ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), no interior do estado, a Igreja defende a família como uma instituição formada por homem e mulher, capaz de gerar filhos.
Dom Anuar Battisti, gaúcho e arcebispo de Maringá (PR), chegou a dizer que chamar de casamento a união entre homossexuais representa uma “agressão frontal” à família. Para ele, se o projeto for aprovado no STF, as pessoas estarão “institucionalizando a destruição da família”. O encontro anual do episcopado ocorre em Aparecida, no Vale do Paraíba. A pauta principal dos religiosos neste ano é eleger a nova direção da CNBB. Eles também discutirão diretrizes da ação evangelizadora.
“O ser humano de fato se realizará na sua profundidade de sua relação na constituição da família a partir de um casal formado por homem e mulher”, afirmou dom Joaquim Giovani Mol Guimarães, bispo auxiliar de Belo Horizonte. Questionado sobre o que pensava sobre a adoção de crianças por pais do mesmo sexo, respondeu: “A adoção é um serviço da mais alta nobreza. Só não aceitamos fazer a equiparação com a família. Não é família. É uma comunidade de pessoas”, disse ele, ao se referir aos casais homossexuais que vivem juntos.
Para dom Edney, se a proposta for aprovada no STF, “nada vai mudar” no posicionamento da Igreja Católica. “Ela vai continuar defendendo os direitos da família e a nossa fé. Isso também é liberdade.”
O bispo auxiliar de Belo Horizonte, dom Joaquim Guimarães, afirmou que, se os ministros votarem a favor da união estável entre os casais homossexuais, a Igreja vai precisar reforçar suas posições. “Esse assunto já foi discutido em outros países. No Brasil, devemos dar o exemplo para reforçar nossa ação na criação de convicção nas pessoas. Ainda que a lei permita isso ou aquilo, a minha convicção é essa.”[G1]
E ainda acham que podem enganar o público brasileiro:
Os bispos que estão reunidos na 49ª Assembleia Geral Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), no interior de São Paulo, voltaram a comentar a decisão dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceram a união estável entre casais do mesmo sexo. O bispo diocesano de Camaçari (BA), dom João Carlos Petrini, criticou a posição do Supremo ao dizer que os representantes da Igreja Católica “não vão fazer nenhuma cruzada” contra a proposta, mas continuarão a defender o conceito deles de família.
"Não vamos fazer nenhuma cruzada, mas vamos procurar defender aquilo que até hoje, desde Adão e Eva, foi sempre uma característica típica da vida na nossa sociedade, que é uma instituição chamada família. E, repito, heterossexual e aberta para a procriação”, afirmou dom João, durante a coletiva de imprensa do evento, que acontece até o dia 13 em Aparecida, no Vale do Paraíba.
“Nós somos a favor da vida, somos contra qualquer discriminação. Somos contra as pessoas viverem, assim, umas contra as outras”, disse o arcebispo do Rio. “E lembramos que não basta apenas o direito positivo, achar o que é melhor pelo maior número de votos. Mas, sim, o direito natural que vem da própria natureza humana, que é o 'ser família'”, afirmou dom Orani, que pediu respeito ao posicionamento da Igreja Católica sobre o tema.[G1]
O que se aguarda é que o Legislativo acorde de seu estado letárgico e faça a emenda necessária à Constituição e o Senado se empenhe em criminalizar a homofobia:
Ao mesmo tempo que comemoraram efusivamente o reconhecimento legal da união entre pessoas do mesmo sexo , representantes da comunidade gay avaliaram que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) pode ainda acelerar a tramitação, no Congresso, do Projeto de Lei Complementar 122, que criminaliza a homofobia. Para especialistas, os parlamentares precisam entender a sinalização do Judiciário e criar leis para pôr na cadeia quem ofender gays, lésbicas, transexuais e outros integrantes da comunidade.
- A decisão do STF vai ser amplamente comemorada na Marcha Nacional contra a Homofobia, que acontece no Rio daqui a duas semanas. O Congresso precisa aprovar a PLC urgentemente, o que protegeria os gays, assim como a Lei Afonso Arinos protege os negros, a Lei Maria da Penha protege as mulheres e aí por diante - disse o presidente da Parada do Orgulho Gay de São Paulo, Iberaldo Luiz Beltrane, para quem os votos favoráveis dos ministros se transformaram em um "divisor de águas" para a comunidade.
- O julgamento deu dois sinais claros: tirou a pauta da discussão moral e religiosa e também mostrou que o Congresso precisa mudar sua postura em relação a diversos temas da sociedade - disse ele.
O ativista Beto de Jesus, presidente do Instituto Edson Neris, também não poupou críticas à atuação do Congresso na discussão do tema:
- Essa decisão jurídica parece que foi a única saída contra um Legislativo conservador e preconceituoso, que parece querer criar expectativas fundamentalistas religiosas contra um Estado laico.
Para Jesus, o fato de homossexuais não terem os mesmos direitos civis que os heterossexuais "é uma vergonha". Para ele, a ideia de que família deve ser aceita apenas se criada por homens e mulheres é um equívoco:
- Quer dizer que, se o homem casa com uma mulher, perde essa mulher e passa a viver apenas com o filho, então significa que os dois não formam uma família porque são dois homens? - indagou.
Diretor da Faculdade de Direito da FGV, Oscar Vilhena atuou como advogado de um dos grupos que propuseram a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), o Conectas. Ele festejou ontem a decisão do Supremo e afirmou que os ministros garantiram um direito que "é cristalino" na Constituição.
- Todos são iguais perante a lei, e o Código Civil tratava apenas da união entre homem e mulher. Agora, isso será equiparado. Essa decisão é universal, estende-se a todos os que queiram manter uma união homoafetiva.
Vilhena disse que o STF seguiu as decisões que têm se espalhado pelo "mundo democrático, onde essa questão tem sido solucionada em diversos países". Ele negou que a medida do Judiciário se sobreponha a uma iniciativa que deveria partir do Legislativo.
- No caso das células-tronco e do desarmamento, o Judiciário tem defendido o avanço dos legisladores. Mas, nessa questão das relações homoafetivas, os legisladores não haviam avançado porque os homossexuais são um grupo minoritário, e essa não é uma causa simpática. Mas o STF não está inventando nenhum direito. Ele está fazendo valer a Constituição.[ClickPB]
Para esta casa, publico o comentário que eu fiz no blog do Jorge Ferraz [acena]:
[...]nossa lei não é literalista, mas sim interpretativa.
A lei reconhece a união entre homem e mulher, o que não significa que proíbe a união [civil] entre homem e homem ou mulher e mulher.
Aliás a lei descreve que a ninguém será negado seus direitos com base em suas opções, opiniões ou preferências. A resistência católica é apenas uma reedição da mesma resistência que aconteceu quando a lei regulamentou o divórcio e foi permitido a fertilização “in vitro”. Fizeram o mesmo escândalo, disseram que seria o fim da humanidade. Bobagem. O que a Igreja quer garantir é o seu poder e influência sobre a nossa sociedade.
Ganhou o Brasil. Apenas a Igreja quem perde, por continuar a se segurar em seus dogmas e doutrinas absurdas, anacrônicas, obsoletas e ditatoriais.
Texto resgatado com Wayback Machine.
Originais perdidos.