quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Crucificando o feminismo

Que o Cristianismo, em especial o Catolicismo moribundo, não sabe como enfrentar a inevitável mudança da humanidade que luta para sair da opressão tirânica da Igreja em direção de um mundo mais humano, não é novidade para os livres-pensadores. Quem superou o cabresto imposto pela Igreja através de séculos apenas tem pena das reações dos que ainda vivem presos.Senão, como de entender uma declaração desse nível:

Tenho uma opinião polêmica! Nessa opinião, o feminismo que surgiu nos anos 60 é um dos grandes responsáveis pela degradação dos dias atuais, pela violência e aumento no uso das drogas, em fim pelas mazelas que presenciamos e/ou somos vítimas.Quando a mulher deixou de ocupar a nobre função de ser mãe e educadora, passou a ser uma simples paridora. Os lares deixaram de ter amor! Nós homens somos inferiores às mulheres e justamente por sermos inferiores é que precisamos nos autoafirmar perante elas adotando posições dominantes e machistas.

Parece ser o velho caso de jogar a culpa na vítima. Ignora-se ou joga-se fora todas as causas políticas, econômicas e culturais. Ignora-se ou joga-se fora o fato de que o mundo ainda é dominado pelo patriarcado e pelo sistema financeiro instituído por ele. A culpa, de tudo, como é de se esperar dessa gente, é das mulheres e da ousadia delas lutarem pelo seu legítimo direito como seres humanos. A concepção dessa gente, embora disfarçados com falsos paladinos, é a visão bíblica de que a mulher deve ser submissa ao homem:

A bíblia como instrumento de legitimação
Neste contexto histórico de globalização neoliberal, a contradição nos salta à vista, e suasconseqüências para a humanidade são muito imprevisíveis.
Para Zigmunt Bauman, ao mesmo tempo em que a globalização une toda a Terra por meio da compressão do tempo/ espaço, através da extraordinária velocidade de movimento, provinda principalmente da revolução informacional, ela separa e segrega um número desmesurado de seres humanos que não conseguem e nunca conseguirão, devido à lógica deste sistema, ter acesso aos seus benefícios. A globalização aumenta ainda mais o fosso que separa as classes possuidoras das classes despossuídas.
Segundo a teóloga feminista Mary Hunt, a globalização é mais uma forma de colonialismo. O deslocamento forçado de populações, a migração da mão-de-obra para acompanhar o capital e a hierarquização das pessoas de acordo com a cor da pele e a origem étnica, lembra as formas primitivas de colonialismo nas quais o cristianismo desempenhou um papel tão sinistro.
Como foi na utilização da Bíblia e de diversas interpretações fundamentalistas para justificar a escravidão.
Essas normas, valores, códigos domésticos, foram construídos para defender e legitimarinteresses e poder de algumas pessoas, em detrimento do racismo, das guerras, do imperialismo, do sexismo, dentre outros, como fato dado e uma experiência de "sentido comum".
Genero e Religião. Felix, Isabel Aparecida.

Religião e Feminismo
O feminismo propunha uma transformação radical das relações de gênero em todos os domínios da vida social, tanto o público, como o privado. Importante lembrar que este feminismo teve como substrato material, a emergência da sociedade urbano-industrial moderna, que foi marcada pela entrada das mulheres no mercado de trabalho, a qual se ampliou progressivamente no decorrer do século XX. Aos poucos, as mulheres passaram a ter uma dupla jornada de trabalho (doméstica e extra-doméstica) e, com isto, a nova responsabilidade de conciliar vida profissional com vida familiar. Neste contexto social em que as mulheres começaram a ocupar cada vez mais o espaço público por meio da inserção no trabalho assalariado e na educação formal, as contradições do espaço privado vinham à tona e tornava-se premente politizá-las.
Ao politizar as relações pessoais, o feminismo combatia um dos pilares da dominação masculina: a dependência da sexualidade com a reprodução, com todos seus desdobramentos familiares, sociais e políticos. Romper com esta subordinação implicava não só do ponto de vista legal tornar acessível o uso de contraceptivos seguros e a prática do aborto; mas também, do ponto de vista social tornar possível a escolha da maternidade, em última instância, desligá-la do determinismo biológico. Por conseqüência, o papel social da maternidade na família não poderia mais ser considerado como natural, com isto ficavaabalado outro pilar da dominação masculina, a divisão sexual do trabalho na esfera privada.
O catolicismo tradicional sustentava a posição reinante: separação das duas esferas (por gêneros) e mantinha-se irredutível em relação às questões da reprodução e da sexualidade.
Na crítica feminista laica e religiosa havia, então, embate explícito contra a hierarquia católica masculina, que ditava regras para a vida das mulheres, perpetuando a desigualdade de gênero. Na crítica feminista católica se contestava os lugares que as mulheres ocupavam na Igreja - tal qual a impossibilidade da ordenação feminina - que apontavam para as questões de poder e de gênero em luta no campo religioso.
Dos anos 70 para os anos 2000, muitas coisas mudaram e outras tantas continuaram estagnadas, principalmente, as que dizem respeito a perpetuação dos valores simbólicos, com mais força nos países do sul. A busca pela profissionalização e a escolha da maternidade ampliou as possibilidades das mulheres alcançarem uma realização pessoal e social mais abrangente. Mas, nem por isto abandonaram as práticas religiosas, algumas mulheres começaram a contestá-las por dentro; outras, submetiam-se aos seus limites. Em relação ao catolicismo, cabe dizer que na maioria das vezes, as regras restritivas em relaçãoà contracepção, por exemplo, não eram seguidas por suas fiéis.
As feministas continuaram suas lutas, algumas históricas, pois ainda nãoconquistadas, como as do direito ao aborto na maioria dos países da América Latina, que se confronta com os princípios de praticamente todas as religiões. Neste sentido, o trabalho político das Católicas pelo Direito de Decidir (CDD) tem um papel fundamental dentro do catolicismo, neste continente, por defender os interesses das mulheres no próprio campo religioso que, como todos os campos sociais, é um campo de lutas.
Cada vez mais as transformações nas relações de gênero abalam os padrões tradicionais de comportamento. Entretanto, junto com estas mudanças há as permanências e, portanto, a persistência social da dominação masculina.
Em um campo há sempre um elemento principal em jogo - no caso do campo religioso, a manutenção do monopólio de seus princípios doutrinários, ou seja, o capital simbólico, cultural e econômico de cada religião - e as diferentes posições dos grupos que se disputam no campo. As mulheres neste campo são assujeitadas aos preceitos produzidos pela hierarquia masculina. Estas estruturas rompem-se quando dentro do campo há uma luta contra esta posição. Ou, ainda quando, as mulheres buscam outras formas de expressão de suas sensibilidades e/ou espiritualidades.
Em conclusão é possível afirmar, que todas as transformações sociais, econômicas da modernidade e a difusão das idéias feministas, nestes últimos 40 anos, incidiram sobre as relações de gênero. Estas idéias abriram caminhos para que em todos os campos do social, as questões de gênero fossem colocadas. Observa-se pelos dados acima que, mesmo o campo religioso, em seu aspecto institucional, tradicionalmente antifeminista, não ficou imune aos efeitos sociais e culturais das idéias feministas contemporâneas.
Religiões, Gênero e Feminsmo. Scavone, Lucila.

A Igreja se coloca como defensora do casamento, da família, da vida e dos valores sociais, não porque esta é bondosa, mas por razões corporativas. Seja pela história ou por notícias recentes, a Igreja tem demonstrado que não observa os próprios conselhos que emite aos seus devotos. Com uma enorme falsa modéstia, seus acólitos alegam que foi ela que ajudou a construir a civilização. Ora, como a decadência humana é o resultado do processo histórico, a mesma Igreja que critica tem sua quota de culpa nessa decadência, sem dúvida estimulada pela manutenção dos seus dogmas e de sua influência na sociedade e na política.
Felizmente a humanidade está mudando. As mães estão deixando de ser uma pálida cópia da repressão imposta pela Igreja e reproduzida pelo sistema social patriarcal. As famílias estão sendo mais flexíveis e abrangentes. As mulheres estão conquistando seu devido espaço em todas as áreas, tanto na política quanto na religião. As mulheres estão aumentando sua influência nas relações sociais, afetivo-eróticas e comunitárias, modificando as relações de poder velhas, arcaicas e obsoletas, incomodando as instituições que vem se mantendo no poder, desde a ascenção do Cristianismo. Não é por acaso que o Cristianismo, em particular o Catolicismo, tem visto uma diminuição em seus quadros de devotas. Não é por acaso que as mulheres tem procurado caminhos espirituais alternativos. O mundo e a humanidade está a caminho de reinstaurar a mulher e o feminino no devido lugar. O Paganismo, o mundo, a humanidade esperam ansiosamente por isso. A tentativa de resistência da Igreja é simplesmente o estertor de um moribundo. O sol há de brilhar por sobre suas ruínas e a humanidade irá recuperar a alegria de viver, graças aos Deuses Antigos.

Um comentário:

Adília disse...

Beto
Gostei muito da maneira como refutou o argumento daqueles que mais uma vez querem jogar nas mulheres as culpas pelos males do mundo. Esses mesmos, por estupidez ou má fé, não se lembram de que a teoria do bode expiatório remonta à lenda bíblica de Adão e Eva e que resultou da necessidade de explicar os infortunios da humanidade jogando a culpa na mulher. É tal a sem vergonhice que mesmo em relação ao tão propalado pecado da luxuria atribuem-no ás tentações da mulher, quer dizer o homem é um pobre coitado e a bruxa é a mulher tentadora. O que custa ver é que estas histórias e toda esta pulhice, passados tantos séculos ainda rendem dividendos.