sábado, 29 de março de 2008

A Deusa Ancestral Barbie


Nós estamos orgulhosos em anunciar uma grande descoberta arqueológica explicando as práticas religiosas do ano de 1990, há mais de dez mil anos atrás! Esta descoberta nos ajudará a entender os mitos e as tradições que tem sido preservadas através dos séculos e que ainda sobrevivem no culto popular da Deusa Ancestral Barbie. Esta tradição é uma das que mais crescem nos dias de hoje no culto à Deusa.

Os arqueologistas descobriram que o culto à Barbie remonta de milênios atrás. Figuras da Deusa Barbie foram desenterradas, preservadas em seu estado original. Parece que os antigos seguidores fizeram suas imagens da Barbie em um material conhecido como plástico. Era sabido que plástico não degradava ao ambiente e era praticamente inquebrável! Por causa disso, é óbvio para nós que itens feitos em plástico tinham alta estima nessa cultura antiga. Eles certamente queriam preservar esses itens eternamente!
As pesquisas mostram que as sacerdotisas da Barbie eram iniciadas em uma idade prematura. A cerimonia de iniciação envolvia uma litania complexa que durava várias semanas, geralmente antes do Solstício de Inverno. As filhas mais novas deviam cantar a seus parentes por muitos dias, repetindo várias e várias vezes as orações à Barbie, mostrando seu desejo para que a Deusa entrasse em suas vidas. Esses cânticos variavam de sacerdotisa para sacerdotisa, mas a palavra “eu quero” era comum entre as invocações. Mais tarde, após a iniciação, cânticos adicionais eram entoados para consagrar as ferramentas e assessórios mágicos usados pela Deusa Barbie em seu templo.
Imagens da Deusa Barbie mostram-na em Seus múltiplos aspectos. Por exemplo, Ela era esculpida como uma divindade solar na forma da Barbie Malibu. Isso explica os hábitos dos cultos da Barbie em usar óculos escuros e untar-se com loções especiais para celebrar o Solstício de Verão!
Sabemos que as religiões antigas as vezes disfarçavam suas divindades como santos do antigo catolicismo. As pesquisas dizem que isso explica o nome de uma antiga vila na costa oeste conhecida como Santa Bárbara, talvez uma Meca para os adoradores da Barbie.
Cada figurino da Barbie tinha a estranha marca numérica de $24.99. Isso explica o costume dos adoradores da Barbie se tatuarem com esse numero! Esse é obviamente um número sagrado para a Deusa. O símbolo $ era usado de várias formas na cultura antiga e era considerado uma distinção na sociedade religiosa.
Também foi descoberto que a Barbie Ancestral tinha um consorte conhecido como Ken. Análise minuciosa das figuras de plástico de Ken porque os adoradores da Barbie permitem apenas a eunucos participarem nos ritos religiosos, proibindo outros tipos de machos. Uma vez que poucas imagens de Ken foram encontradas, nós podemos supor que os antigos adoradores da Barbie eram uma tradição matriarcal.
Nossa equipe de pesquisadores linguísticos determinou pela análise da antiga linguagem que o nome Ken foi preservado em várias partes do mundo. Isso explica as origens de lugares antigos como Quênia, Kentucky e mesmo a variante do Canadá. Um estudo profundo do mito do Ken também o liga ao clan antigo dos Kennedy. Notem a similaridade facial! Estórias que envolvem o antigo culto ao Kennedy parece ser uma mistura singular das lendas do Deus Sacrificado (como Osíris) e do Deus Festivo (como Baco). Isso se encaixa com os três aspectos do mito de Kennedy.
Outras pesquisas mostram uma figura relacionada, um guerreiro ancestral conhecido como GI Joe. Uma vez que o GI Joe não possui uma consorte feminina e era igualmente eunuco, é obvio que tanto Joe quanto Ken competiram pela Deusa Barbie. Uma teoria equipara isso ao mito sobrevivente do Rei Carvalho e do Rei Azevinho de eras mais remotas.
Pesquisadores também analisaram outros personagens míticos como Shakespeare, Einstein e Ghandi. Mas uma vez que as culturas ancestrais os tinha em menos estima do que a Barbie, eles obviamente eram semideuses menores.
Nós estamos entusiasmados em ter descoberto estes Caminhos Antigos, pois eles lançam uma nova luz sobre os mistérios de nossas tradições. Nós podemos usar essa visão cristalina histórica para colocar nossos costumes em perspectiva!

segunda-feira, 24 de março de 2008

A dama na Câmara Ardente

Na época da Caça às Bruxas, na França os reis instituíram um tribunal exclusivo para julgar estes casos que foi gentilmente chamado de "Câmara Ardente". Quem efetivamente condenava eram os juízes nomeados pelo rei, mas os processos e julgamentos tinham uma grande influência da Igreja Católica Francesa, que certamente usou a Câmara Ardente para se livrar dos Calvinistas, dos Huguenotes ou de qualquer outro cujo patrimônio a Igreja ambicionava.
Paralelamente, os casos e denúncias de Bruxaria aumentavam ao invés de diminuir e não demorou para que se achassem entre os aristocratas quem procurasse por essa "heresia" ou "culto ao Diabo". Casos de envenenamento aconteciam e não eram cometidos apenas por nobres alucinados pela Bruxaria, bispos souberam envenenar com as bênçãos de Deus. Mas como a Câmara Ardente era uma extensão do poder do Estado - o Secular e o Religioso - a decisão final cabia às mãos de alguns privilegiados.
Naquele dia, durante o reinado de Luís XIV, os juizes e promotores haviam acabado de passar por todos os protocolos e preparativos, passando a ler a primeira pauta do dia, chamando a ré.
- Chamamos para diante desse ilustríssimo conselho a marquesa de Montespan.
- Cá estou eu, monsigneurs.
- Vossa mercê está aqui hoje para responder às acusações de feitiçaria, heresia, bruxaria, envenenamento, homicídio, conspiração e culto ao Diabo. Como vossa mercê se declara.
- Absolutamente inocente, clamando a Deus como testemunha.
- A senhora mega ter se ajuntado com madame La Voisin com a intenção de matar vosso finado marido?
- Certamente não quereis logo vós creres que meu marido, servo de Deus, cairia morto por feitiçaria?
- Marquesa, não somos nós que devemos responder, mas a senhora.
- Eu nego.
- A senhora nega ter procurado os serviços do padre excomungado Etienne Guibourg e encomendado uma Missa Negra?
- Eu nego.
- Eu apresento ao júri a carta e o recibo encontrado em mãos do padre. Aqui como os senhores podem ver, está o nome e a assinatura da marquesa.
- Sinceramente, senhores! Eu não sou um campônio e lembro muito bem que até a assinatura do Papa conseguiram falsificar.
- Eu apresento os testemunhos de Catherine La Voisin, Olympia e Mari Anne Mancini e do duque de Luxemburgo.
- Só isso? Senhores, eu estou me sentindo insultada. Eu sei que confissões são obtidas por meios tais que forçam ao inocente confessar o que não fez. Vós quereis acusar os que cultuam ao Diabo? Aqui eu vejo ao menos três que me convidaram a assistir tal Missa Negra. Eu bem que vi o santo Cardeal Mazarin naquela orgia diabólica.
- Cara senhora, não se esqueça de que é a senhora que está sendo julgada.
- De fato, eu estou, mas exijo ser julgada por pessoas justas e imparciais. Eu exijo que me permitam falar com o Rei e que ele saiba o que é realmente a Câmara Ardente!
- Senhora, nós a convidamos aqui para esclarecer um assunto, não convém envolver o Rei.
- Ah! eis que o caso muda! Eu fui convidada e não intimada! Os senhores podiam ter escolhido melhor o dia e o termo desse convite, monsigneurs! Os senhores podem acabar na forca antes que o padre por atentar contra a segurança do Estado!
- Senhora, vamos acalmar os ânimos! Nós estamos convencidos de que a senhora é uma nobre francesa e devota da Santa Igreja. Nós pedimos apenas à senhora que consinta apenas com um pequeno sacrifício em sinal de penitência por ter cedido à tentação e ter ido à Missa Negra.
- Enfim, um pouco de cortesia e educação! Senhores, se for a pedido da Santa Igreja, como boa católica estou disposta a fazer penitência, digam o que querem.
- Senhora, basta corroborar vosso testemunho contra madame La Voisin.
Então, no fim da audiência, o nome da marquesa sumiu do processo e no seu lugar ficou o nome de madame La Voisin, que foi atada a uma estaca e queimada em 22 de Fevereiro de 1680.

sábado, 22 de março de 2008

Sujestões para a Sexta Feira Santa

Repetir novamente que a páscoa é um feriado pagão está ficando monótono, até os cristãos fundamentalistas advertem isso. Ao invés de ficarmos fazendo birra, reclamando que não somos respeitados ou que é uma piada falar que o Brasil é um Estado laico - considerando que datas festivas ligadas às festas religiosas marcadas pela Igreja Católica são feriado nacional - que tal os pagãos, bruxos e wiccanos aproveitarem e procurarem alternativas culturais para passar estes dias de folga?
Considerando bem, estamos em vantagem, pois podia ser bem provável que nossos chefes nos obrigassem a trabalhar na Sexta Feira Santa, uma vez que nos declaramos pagãos, bruxos ou wiccanos. Mesmo a data do equinócio de Outono caiu em um sábado. Então aqui vão algumas sugestões.
Funcionários públicos, dependendo da autarquia, estão de folga desde a quinta feira. Aproveite para passear, fazer compras - que podem incluir chocolate, mas prefira caixas de bombons aos ovos de páscoa, a menos que você tenha algum fornecedor pagão. Se você estiver com recursos financeiros, vá ao cinema, mesmo se for os pulgueiros do centrão de Sampa.
Para os demais pagãos, resta apenas a sexta feira. O programa pode ser o mesmo - e até incluir um 'programa' com as 'primas' da Praça João Mendes. Almoce sem culpa em uma churrascaria, com direito a uma santa cerveja. Saia com os amigos, mas dê preferência às amigas, especialmente as liberais.
Pelo amor que tens aos Deuses Antigos, não fique pendurado na internet, não perca tempo em salas de chat - mesmo os de bruxaria são 'points' de aborrescentes - não perca tempo procurando pornografia. Alugue um filme na sua video locadora, assim você poderá curtir o vídeo por inteiro, sem as interrupções que acontecem no Cine Saci e sem ser 'abordado' por uma biba mais 'animada' com seu estado de 'ereção sagrada'. O que me lembra da parte física - ter uma colega, uma amiga pagã ou bruxa ajuda muito, se bem que não há garantias que você consiga uma parceira para os Ritos Ancestrais...as mulheres, mesmo as pagãs, bruxas e wiccanas ainda tem traumas e recalques quando o assunto é sexo. Eu estou sendo repetitivo...mas sexo é bom, natural e saudável...além de ser um exercício para o corpo, a mente e o espírito...então repita tantas vezes quantas puder.
Sábado...eu não esqueci...comer carne no sábado também! No prato e na cama...acompanhado de um bom vinho...enquanto os pobres extravasam malhando o Judas. Os nossos governantes aceitaram de bom gosto esse folclore popular, afinal, melhor serem malhados 'em efígie' do que pessoalmente, melhor essa catarse ingênua na rua do que na urna eleitoral.
Domingo...nada de televisão comercial...se na sexta feira os canais só passam 'filmes sacros', no domingo só falam das missas nas igrejas ou da malhação nas ruas. As amigas ainda estão disponíveis? Mais vinho, mais carne...ouça música, dance, vá passear no Parque Ibirapuera, tome um sorvete.
O mais importante é que você faça tudo isso intencionalmente, oferecendo seu tempo e prazer aos Deuses Antigos, agradecendo pelo Outono. Celebre tudo na vida de forma sagrada, pois tudo na vida do pagão é sagrada.

sexta-feira, 21 de março de 2008

Paraíso ou Inferno?

As idéias mais comuns entre os (neo) pagãos consiste nas crenças sobre reencarnação ou o chamado 'pós-vida', muitas vezes reproduzindo ou imitando, ainda que de forma refratária, as doutrinas Cristãs sobre o Paraíso e o Inferno.
Os (neo) pagãos tem uma relação bastante peculiar com o Cristianismo porque muitos foram batizados na igreja, foram catequizados e muito posteriormente, se tiverem sorte de terem uma boa escola, superam esse forte vínculo cultural. Não basta um (neo) pagão afirmar, de forma ingênua ou simplória, que não acredita no Paraíso ou Inferno, esses conceitos não pertencem apenas à doutrina Cristã, mas provém da cultura pagã Romana. Antes dos Romanos, os Gregos e Egípcios também tinham seu credo sobre o além, bem como seus conceitos sobre o Paraíso e o Inferno, mas com outros nomes e doutrinas.
Para explicar melhor, os (neo) pagãos deveriam avisar que não aceitam a doutrina cristã sobre 'pecado', 'salvação' ou 'juízo final'. Nossos ancestrais tinham, antes dos cristãos, idéias bem claras quanto aos méritos pessoais e individuais e que nossos atos refletem tanto na vida presente quanto na vida do além. A consciência da responsabilidade sobre os nossos atos se reflete no conceito de karma, no conceito da reencarnação e no conceito sobre o Paraíso ou Inferno pagão.
Eu particularmente creio que a cada um será dado o descanso conforme a natureza de seus atos. A energia das nossas ações são gravadas em nossa alma e concedem um determinado atributo ao nosso espírito que, por sua vez, será atraído ao Paraíso ou Inferno mais adequado.
Ou seja, não são os Deuses Antigos que nos julgarão, comodamente em seus tronos, as nossas ações, por um padrão moral absurdo e arbitrário. Nós somos nossos próprios carrascos, nisso consiste o verdadeiro 'livre-arbítrio'. No mundo dos Homens, os humanos tem leis e julgam os crimes conforme o contexto social, os Deuses cuidam dos assuntos divinos. No mundo dos Mortos, os espíritos julgam os espíritos, conforme o contexto social e os Deuses continuam cuidando dos assuntos divinos.
Resumindo, os (neo) pagãos tem a Terra da Juventude, a Terra do Verão como o Paraíso, onde poderemos encontrar nossos ancestrais e participar das cerimônias sagradas com os Deuses Antigos. Nós temos a crença de que encontraremos uma mesa farta, cheia de comida e bebida, música e mulheres, alegria e amor. Se algum (neo) pagão ainda se preocupa com o Inferno, que este lembre que para os Romanos o conceito original do Inferno é bem parecido com o da Terra do Verão.
Agradecemos então, aos Cristãos, que constantemente dizem que nós vamos para o Inferno!

sexta-feira, 14 de março de 2008

Eles são da família

Na antiga Roma, a família não consistia apenas de pessoas ligadas por laços de parentesco. Na família romana estavam incluídos os clientes e os servos. Em alguns casos, tanto os clientes como os servos acabavam incluindo em seus nomes o patrístico da família. Em famílias que moravam em áreas rurais, animais e espíritos faziam parte da família. Na Strega, preserva-se o hábito de ter um santuário aos lares, espíritos protetores das habitações da família.
Na Europa romanizada, onde as pessoas eram majoritariamente composta de camponeses, esse hábito foi facilmente assimilado, graças ao rico folclore local e suas muitas lendas sobre fadas, gnomos, duendes e outros gênios da natureza.
As bruxas adotaram como seus familiares vários tipos de espíritos que, usualmente, se manifestavam em uma forma física semelhante a algum objeto, animal, pessoa ou criatura mágica. Nos famigerados processos contra as bruxas, os familiares eram descritos como espíritos malignos que ficavam obedecendo as ordens da bruxa ou servindo como elo espiritual para suas práticas.
As formas mais visadas pelos Inquisidores acabou sendo exatamente os animais. Consta que na França houve um verdadeiro 'holocausto' de gatos. Na Alemanha, chegaram a queimar estábulos inteiros com os cavalos dentro. Na Espanha, sapos eram esmagados após uma missa de exorcismo. Na Inglaterra, o alvo foram as corujas.
Os rumores não perturbavam a senhora Carcharon, ela ria das pessoas que a procuravam em busca de proteção ao seus animais e ria mais ainda do medo que as pessoas tinham do Inquisidor. Ela dava os conselhos que podia e se ocupava com o casamento de sua sobrinha, a senhorita Beachon.
Quando o Inquisidor chegou na cidade, todos correram para dentro de suas casas e esconderam tantos animais quanto puderam. Mas o Inquisidor nem deu atenção ao porco premiado do senhor Bedran, nem ao garanhão do senhor Sevoir. Ele foi direto ao casebre da senhora Carcharon e tratou de fazer os soldados revistarem aquele lugar em busca de sinais de Bruxaria.
Na vila, os moradores respiraram aliviados, pensando que seus preciosos animais estavam salvos, enfim. Ficaram até, eu diria, alegres e esperando o desfecho inevitável da visita do Inquisidor, pois o condado inteiro sabia ou falava das estranhas atividades da senhora Carcharon. Dentro da casa da senhora, o Inquisidor despejava as perguntas de praxe, tal como constava no Malleus Malleficarum.
A senhora Carcharon não respondia coisa alguma, sequer dava atenção ao Inquisidor, eu diria até que ignorava a presença dele e dos soldados. Ela tinha toda a atenção fixada nos cabelos de sua sobrinha, penteando e enfeitando ela para o encontro em breve com seu noivo.
Como as horas passavam e os barulhos diminuíram, os vilões resolveram dar uma espiada no casebre da senhora Carcharon para ver o que estava acontecendo.
Encontraram a senhora olhando feliz para sua sobrinha, bem vestida e arrumada, mas nenhum sinal do Inquisidor e dos soldados, apenas de alguns animais, muitos dos quais lá estavam por insistência de seus donos. Tendo o perigo passado, cada qual foi reclamar o seu animal, incluindo o prefeito, o único que notou que havia um porco e quatro patos sobrando. Como ninguém havia reclamado por eles, o prefeito quis reclamar para si, para os animais serem mortos e assados em uma festa.
- Lamento, senhor prefeito, mas estes não são teus para que reclames, mas são da minha família. Aquele porco é o senhor Inquisidor, que na distração cortejou minha sobrinha e os patos são os soldados do rei, que igualmente cortejaram minha sobrinha. Eu lhes disse que minha sobrinha só pode ser cortejada por quem é da família... e... bem, eles aceitaram... e... bem, o resultado está bem à vista.

terça-feira, 11 de março de 2008

Somos o que lembramos

Antônio estava para comemorar 45 anos e se considerava um homem realizado. Ele era um diretor de uma multinacional, tinha três filhos que eram igualmente bem sucedidos e ele casara com a garota mais bonita da faculdade.
No dia de seu aniversário, ele acordou assustado. Ele estava em uma cama estranha, em uma casa estranha, no meio de gente estranha. Apavorado, correu para a rua, tentando achar o caminho para sua casa, mas não reconhecia a rua, nem a vizinhança e o pavor o deixou na certeza de que não estava mais em seu bairro. Seu primeiro pensamento foi: sequestro!
A explicação parecia bem racional e lógica. Aquela vizinhança parecia muito com o subúrbio, nas regiões mais carentes e afastadas da cidade. Aquela gente parecia ser pobre, vivendo de bicos ou com certeza de furtos, se não do tráfico de drogas. Ciente de sua situação, foi tentar negociar sua libertação com seus captores.
Ele não conseguia entender aquelas pessoas. Ele, que se orgulhava de falar fluentemente inglês, francês, alemão e italiano, não entendia aquela gente. Mas eles não pareciam violentos, ao menos não viu nas mãos deles arma alguma nem recorda ter acordado amarrado e vendado, como seria de costume, pelo que ele lembra dos noticiários.
Com muita dificuldade, ele entendeu que eles queriam que os seguisse a algum lugar. Ele então raciocinou: claro, eles querem que eu negocie com o chefe do bando. Assim, com algum esforço, ele voltou à casa onde ele havia acordado, tomou o café da manhã que lhe ofereceram, tomou banho e se vestiu com as roupas que lhe deram. O matinal oferecido estava horrível, não tinha gosto nem de café, nem de leite, não tinha os cereais que ele tanto gostava e certamente aquela roupa era ridícula e brega demais para seu bom gosto.
No momento de ir com eles, mais surpresas desagradáveis. Ele teve que entrar em um veículo de marca ignorada, em péssimo estado de conservação e completamente sujo. No caminho, tentava inutilmente reconhecer alguma coisa, alguma referência, ou esperava passar por algum policial.
O local em que ele foi levado estava quase caindo, mas ainda era possível ver uma cruz vermelha na parede parda imitando branco. Ali devia ser alguma clínica, mas não compreendia porque o chefe desse bando estaria ali. O jeito foi sentar-se em um sofá cuja aparência e limpeza conseguiam ser pior que o assento do carro.
Uma hora depois, veio um homem alto com um jaleco puído pedindo por várias lavagens com cândida, com uma prancheta na mão e um estetoscópio pendurado no pescoço. Antônio supôs então que seus algozes o haviam levado ao médico para se assegurarem primeiro de sua saúde para então pedir um vultoso resgate . O médico dizia algo enquanto olhava ora para a prancheta, ora para Antônio, mas igualmente o que dizia era incompreensível. O médico trocou algumas palavras com seus carcereiros e só então passou a falar de forma inteligível.
- Senhor Pedro, o senhor deve estar confuso e desorientado, mas creia-me, o senhor está seguro.
- Que? Oh, não, deve haver algum engano. Meu nome é Antônio, eu não moro aqui e não sei quem são essas pessoas.
- Não há engano algum, senhor Pedro. O senhor sofreu um sério acidente após o qual o senhor, de forma misteriosa para nós, manifestou uma certa fixação por essa personagem Antônio, do filme que o senhor viu na noite anterior ao acidente.
- Que? Eu sei quem eu sou! Como ousa! Eu sei meu endereço, meu telefone de cor! Ligue para meu serviço, ligue para o clube, ligue para meu advogado!
- Lamento, senhor Pedro, mas isso é uma ilusão. Veja, aqui estão os dados que o senhor nos deu e eis as plantas da cidade de onde o senhor disse morar. Não existe tal endereço, não existe tal número de telefone, não existe tal empresa.
- Mas... mas... mas... isso é impossível!
- Infelizmente é possível, senhor Pedro. O senhor se tornou uma personagem de filme porque esta era sua memória, sua lembrança mais vívida antes do acidente.
O médico pôs então, em um aparelho de DVD, um filme que mostrava em seus 120 minutos de projeção uma imagem que sintetizava boa parte do que Antônio, que havia se esquecido que era Pedro, tinha como sendo sua vida.
- Esse... esse... sou eu? Não sou eu? Quem sou eu?
- Senhor Pedro, com sua ajuda e a colaboração de seus familiares, nós cremos que podemos resgatar as suas memórias, as suas lembranças... as verdadeiras.

quarta-feira, 5 de março de 2008

Santuário, templo, igreja

Um santuário, no conceito religioso, é um local sagrado para onde, por devoção, acorrem peregrinos de diversas regiões. Geralmente possui objetos simbólicos usados no culto. Em algumas denominações religiosas, estes objetos são imagens ou relíquias. Entretanto algumas religiões não adotam o culto de imagens. O termo também pode ser usado em sentido figurado: significa o que há de mais sublime.[Wikipédia]

O santuário é sem dúvida um local considerado sagrado, mas na Europa pagã nem sempre estes locais recebiam peregrinos bem como nem sempre estava relacionada a algum culto. Os santuários pagãos tinham imagens, mas não relíquias e seu contexto religioso se aproximava muito do contexto religioso do Xintoísmo. Aquele local era considerado sagrado porque ali habitava uma entidade, um espírito, um gênio, um Deus local. O que acontece, geralmente, é que tais santuários realizam prodígios que são alardeados pelos seus beneficiados e então passaram a receber visitantes, o que leva à estrutura do santuário se expandir, exigir vigilância, administração, comércio, tornando o santuário uma estrutura arquitetônica como o templo.

O templo é uma estrutura arquitetônica dedicada ao serviço religioso. O termo também pode ser usado em sentido figurado. Neste sentido, é o reflexo do mundo divino, a habitação de Deus sobre a terra, o lugar da Presença Real. É o resumo do macrocosmo e também a imagem do microcosmo.[Wikipédia]

A função mais primordial do templo é o de cerimonializar e consagrar a necessidade humana de socialização, um momento em que o indivíduo estabelece laços com a coletividade e a coletividade recebe o indivíduo em seu meio. Sem essa função, um templo ou igreja torna-se um local vazio de sentido e função, tanto para a comunidade quanto para o indivíduo.
Na época em que as Escolas de Mistérios se espalharam pela Grécia e Roma, o templo igualmente representava em sua estrutura os Mistérios Antigos que o neófito deveria compreender para alcançar a Iluminação. Para isso, faraós, Césares, Imperadores e Reis tinham que recorrer aos pedreiros, trabalhadores persistentes que levaram a Arte de lavrar pedras ao nível esotérico. Esses pedreiros, para preservar os segredos da profissão, fundaram sindicatos que acabaram se tornando a base de muitas Ordens Iniciáticas, como o Hermetismo e suas formas modernas, a Maçonaria, a Rosacruz, a Teosofia.

A igreja vem da palavra ecclesia, que significa assembléia ou congregação de pessoas que se unem para o culto, no caso, o Cristão. Também pode ser usado para designar a estrutura física dos locais de culto e a instituição religiosa que administra tais cultos.

Para o pagão, o local de culto é o mundo todo e toda as espécies vivas. Para o bruxo, o local de culto são os santuários, os círculos de pedra ou os círculos lançados. Para o wiccano, o local de culto começa no nosso corpo.

domingo, 2 de março de 2008

O mito do Cristo

Quem ou o que seria Cristo para um pagão começa com o conceito da palavra que, em grego, significa Ungido ou Iluminado. Muito antes da possível existência da pessoa Yeshua bar Pandera ou do personagem Jesus existiram outros Iluminados como Pitágoras, Sidarta, Confúcio, Zoroaster.
Para entender como o conceito de Cristo foi identificado com o personagem que foi um ou vários rabinos líderes de um movimento messiânico que se encerrou com as Guerras Judaico-Romanas, precisamos entender as circunstâncias históricas e sociais da época.
O Império Romano havia conquistado a Judéia, que previamente se encontrava anexada ao Império Macedônio e antes estava dominada pelo Império Persa.
Após a libertação cedida por Ciro, rei persa, ressurge a Torah, a conhecida Septuaginta, a primeira versão em sua forma escrita da crença Judaica, até então passada oralmente. Os rabinos que se empenharam nessa transcrição dos mistérios tradicionais, da forma oral para a forma literária, acabaram inserindo muito do Zoroastrismo Persa, institucionalizando o monoteísmo. A influência Helênica durante o Império de Alexandre foi a influência da filosofia grega conhecida por estoicismo na crença dos Judeus. Na época do domínio romano começaram a aparecer alguns grupos de resistência aos editais de César, bem como de um crescente nacionalismo e busca por uma reafirmação religiosa.
Na época, o Judaísmo se dividia em quatro grupos distintos: os saduceus, os fariseus, os essênios e os zelotes. Cada qual clamava para seu grupo a verdadeira e sincera adoração ao Deus de Israel, até então um Deus étnico. Mas também haviam grupos menores, de marcante proselitismo entre os não-Judeus (chamados de gentios), com mensagens escatológicas e sectarismo social. Dentre estes grupos surgiram os Nazirenos, seguidores do Nazireu, que aceitavam os gentios, desde que seguissem os preceitos da vida comunitária e ascetismo defendidos pela seita.
Com o início da Guerra Judaica-Romana, esses grupos se tornaram proibidos, qualquer tipo de congregação ou reunião religiosa Judaica era vista como rebeldia contra Roma, uma vez que a Guerra surgiu da resistência dos Judeus contra a adoração exigida pelo Império Romano à César. Por uma questão de sobrevivência, os Nazirenos romperam suas raízes Judaicas e tomaram uma identidade mais helênica, mas para isso deveriam abrir mão do personagem crucial de sua pregações - o Ha-Massiah - e adotar o personagem Cristo. Para resguardar os ensinamentos místicos e iniciáticos dessa seita, escreveram na forma de evangelhos - a boa nova - as doutrinas necessárias para que os membros se tornassem iguais a Cristo. Graças a essa identidade mais helenizada é que a nova religião encontrou maior impacto e aceitação tanto entre gregos quanto com romanos.
Para os Nazirenos, a vinda do Ha-Massiah e da restauração do Reino de Judá era iminente, mas com a Guerra Judaico-Romana e a mudança para um núcleo mais helênico, o sentido da crença tornou-se um acontecimento presente, pois era a próprio corpo da congregação a presença de Cristo e do Reino de Deus nesse mundo. Com a presença cada vez maior de servos, os ensinamentos místicos e iniciáticos foram perdendo as referências metafóricas e os evangelhos tornaram-se registros de fatos que aconteceram. As raízes provindas das escolas de mistérios gregas foram perdidas, os grupos aceitavam cada vez mais e mais pessoas sem condições de empreender o longo caminho necessário para a compreensão dos mistérios, no lugar da iniciação se faziam batismos, Cristo se tornou Deus.
A mensagem do evangelho ganhou um enorme sucesso porque dava conforto e esperança exatamente aos pobres, aos escravos, aos miseráveis, aos ignorantes. Quando a humanidade abraça essa doutrina, crendo em um Deus sem raízes étnicas ou naturais, crendo por serem forçados a crer, crendo em uma doutrina que favorece o mais fraco, esta se torna debilitada, enferma, frustrada, rancorosa, violenta.
O mito de Cristo se tornou a Verdade Absoluta, tornou-se a adoração de um Deus externo, arbitrário e vingativo, tornou-se a justificativa perfeita para guerras, massacres e injustiças. A mensagem do evangelho deixou de ser uma metáfora de um mistério iniciático que conduziria à uma transformação interna do cristão e se tornou na maior tirania contra a humanidade.

sábado, 1 de março de 2008

O drama do Deus - morte

A nossa espécie desenvolveu o sentido de sagrado e divino a partir da natureza, incluindo nisso nós mesmos como parte dessa ópera maravilhosa. Nossa espécie cresceu, expandiu-se e começou a formar as civilizações e as cidades, o contato com a natureza foi minguando e os Deuses foram tomando formas mais intelectualizadas, até serem totalmente absorvidos pela Razão.
Os mitos se tornaram fábulas para crianças e lendas de um tempo selvagem, rompemos nossa ligação com a natureza, com o sagrado, com o divino, sobrando apenas a relação antropocêntrica e individualista, tornando as religiões meras relações políticas e ideológicas.
No debate atrasado sobre a importância da conservação do ambiente, eis que os mitos ressurgem ao nos mostrar que todas as coisas nascem, crescem e morrem. Civilizações foram apagadas, Impérios foram derrocados, Utopias foram exumadas, Deuses morreram.
O Deus coroado enfrenta o Destino, ele venceu o monstro, o Deus primordial, mas a luta teve consequências trágicas. Ele foi ferido ou envenenado, ele matou seu próprio pai ou irmão, uniu-se com sua própria mãe ou meia-irmã. Ele tornou-se o Rei dos Deuses, surge a sombra do monoteísmo dentro do politeísmo. Como se isso não fosse o suficiente para que o torne em um pálido reflexo de seu predecessor, ele sabe enfim que será igualmente desafiado e substituído por um Deus mais jovem.
Esse é o resumo das celebrações wiccanas nos ciclos das estações. O Deus nasce, cresce e morre; ele se torna o Doador da Vida para depois se tornar o Senhor dos Mortos, o outono segue o verão, o inverno se aproxima.
A perda das raízes, da identidade étnica e o esquecimento do significado universal dos mitos dá margem à chegada de um Deus, ou que deseja libertar os homens ou que foi criado pelos homens. Apolo nos entregou a Razão e nos tornamos soberbos. Cristo nos entregou a redenção e nos tornamos frustrados. No nosso mundo interno, nos tornamos inimigos de nosso corpo, de nossa natureza, do mundo, em troca de um puritanismo hipócrita moralista; no nosso mundo externo, nos tornamos adversários da coletividade, da comunidade, da sociedade. Acreditamos tanto na Razão e na individualidade que nos tornamos rebeldes e refratários à Sabedoria.
O Homem tomou o lugar do Deus, uniu-se com sua mãe ou meia-irmã que hoje é chamada de Razão e o Homem tornou-se o tirano de sua própria espécie. O Deus soube aceitar seu sacrifício para a continuidade da existência. Saberemos nós aceitarmos nosso sacrifício com o mesmo altruísmo que o Deus teve para que a existência continue? Nem nós podemos nos furtar ao Destino.