segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Declaração sobre os Frost

Gavin e Yvonne Frost são os fundadores da Church and School of Wicca (1968) e autores do livro The Witch’s Bible (1972).
 
A polêmica e controvérsia sobre os Frost apareceu em 2007 quando A.J. Drew anunciou seu ritual no qual ele sacrificou "em efígie" os Frost. Esse ato provocou, mais tarde (2009), o problema no Florida Pagan Gathering, levantado por T. Thorn Coyle, que republicou seu protesto (2014) quando os Frost voltaram a participar do FPG.
 
A “preocupação” em relação a certas pessoas interessadas em um caminho espiritual pode ser visto no Satanismo de LaVey:
“Do not make sexual advances unless you are given the mating signal”. [Eleven Satanic Rules of Earth]
Mas o que significa “sinal de acasalamento”?
“The “Mating Signal” is shorthand for the normal adult responses showing that a person might have an interest in you sexually. Most sexually active adults can tell when another adult is attracted to them with erotic intent [snip]”. [FAQ Sexuality & Gender]
Curiosamente existe esta declaração na CoS:
“Satanism advocates that young people should spend time in self-exploration—discovering talents and developing them, as well as in exploring the world around you—the many philosophies and cultures that exist, so that you can use your freedom of choice wisely, and come to understand yourself”. [FAQ Young People and Satanism]
Quão "jovem" um jovem pode ser, nós podemos perguntar.

Em 15 de setembro de 2016, Yvonne Aburrow escreveu no blogue “Dowsing From Divinity” um texto sobre os Frost, no qual cita um “Código de Conduta” de pagãos ao falar de cultura de consentimento e eu cito o trecho que importa:

“Inappropriate or unwanted physical contact - this includes hugging and kissing if a person has indicated they are uncomfortable with it – we advise that you always seek consent when offering hugs or kisses.
Unwelcome sexual or other personal attention”.
Nenhuma citação sobre idade.
 
Por precaução, eu não irei citar o trecho do livro de autoria dos Frost, o/a interessado/a pode encontrar na internet da mesma forma como eu encontrei. O que eu posso fazer é expor a minha interpretação do texto.
Ao que tudo indica, a primeira parte do rito se trata de um procedimento de proteção e “batismo”. A segunda parte, de onde deve ter suscitado a controvérsia e polêmica, parece ser um ritual de passagem, onde a pessoa interessada, orientada e treinada, passa por um ritual após o qual ele ou ela é completamente reconhecido/a como adulto e parte integrante do coven.
 
Desde que se tornou uma religião popular [comercializada] a Wicca tem, aos poucos, mudado alguns de seus preceitos mais controversos e polêmicos para a mente ocidental dominada pela repressão/opressão sexual da cultura judaico-cristã.
Quando eu estudei a religião, através do Fórum Amber and Jett, havia uma distinta preocupação em esclarecer que a Wicca não é homofóbica, nem transfóbica, eu conheço diversos altos sacerdotes e altas sacerdotisas que são homossexuais e transgênero, eu não vejo meus Deuses, nem meus Ancestrais tendo qualquer problema com isso. Existe o ditado: “não subtraia, mas adicione”. Então a Wicca tornou-se desde a década de 70 [século XX] mais inclusiva, o que eu acho excelente, mas nós estamos nos deixando levar pela neurose e paranoia moderna no que tange ao corpo, ao desejo, ao prazer e ao sexo.
 
Toda religião organizada tem seus ritos de iniciação e passagem e faz parte, conforme estudo antropológico, de diversas culturas [antigas e atuais] no mundo inteiro.

“As mudanças mais significativas pelas quais passamos na vida são o nascimento, a entrada na vida adulta, o casamento e a morte. Esses acontecimentos fundamentais demandam, da mesma forma, ser culturalmente representados nos chamados ritos de passagem, estudados especialmente pelos autores franceses. O primeiro pesquisador a se ocupar do tema, ainda no início do século XX, foi Van Gennep, que em 1906 publicou o clássico Os Ritos de Passagem. Neste livro, ele dividiu os ritos de passagem em três grandes grupos: ritos de separação, como a festa de formatura ou um sepultamento; ritos de margem, como o período da gravidez ou o do noivado; e os ritos de agregação, como batismo, casamento, primeiro dia de aula na escola ou na universidade.
Considerado um dos mais importantes pensadores contemporâneos, Lévi-Strauss concluiu que a estrutura psíquica e linguística dos grupos humanos, vivendo em diversas épocas e lugares, seria idêntica: todos pensam da mesma forma, mas sobre coisas diferentes. Os rituais – sejam eles festivos, militares ou religiosos – têm como marca comum a repetição e oferecem uma sensação de segurança, não apenas por sua familiaridade, mas porque promovem um sentimento de coesão social. Eles demonstram a ordem e a promessa de continuidade desses grupos. Individualmente, a necessidade de se reinventar também é cíclica.
Em Os Ritos Profanos, Claude Rivière analisa os ritos de passagem embutidos no cotidiano, dos quais muitas vezes não nos damos conta. Como os ritos escolares, subdivididos em ritos de chegada (cumprimento da professora e despedida dos pais), ritos de ordem (horários sinalizados por avisos sonoros, filas e a organização por turmas), ritos de atividades (ir ao quadro-negro, a hora do recreio e falar em público). A própria alfabetização pode ser considerada, também, como um rito de passagem, por atribuir uma nova identidade à criança e, com ela, novos papéis a serem desempenhados no coletivo”.[http://www.multirio.rj.gov.br/index.php/leia/reportagens-artigos/reportagens/8585-a-importancia-dos-ritos-de-passagem]

No mundo ocidental, existe o bar-mitzvah [cerimônia que insere o jovem judeu como um membro maduro na comunidade judaica. Iniciado como uma cerimônia folclórica, agora é parte universal do judaísmo oficial, tendo acabado como parte da lei escrita. Quando um judeu atinge a sua maturidade (aos 12 anos de idade para as meninas, 13 anos de idade para os meninos), passa a se tornar responsável pelos seus atos, de acordo com a lei judaica. Nessa altura, diz-se que o menino passa a ser Bar Mitzvah; e a menina passa a ser Bat Mitzvá - wikipédia] e a “festa de debutante” [baile de debutante é um rito de passagem feminino que marca a passagem simbólica da condição de menina à de mulher quando se atinge os quinze ou dezesseis anos de idade. O costume é advindo da Europa e a palavra tem origem no francês débutante, de début ("início") - wikipédia]

Vamos a alguns fatos históricos:

“Nas sociedades tradicionais, a idade de consentimento para uma união sexual era uma questão para a família decidir ou um costume tribal. Na maioria dos casos, isso coincidiu com sinais de puberdade, menstruação para indivíduos femininos e pelos pubianos para indivíduos masculinos. O antigo poeta grego Hesíodo na sua obra Os Trabalhos e os Dias (700 a.C.) sugere que um homem deve casar em torno de trinta anos e que ele deve tomar uma esposa que estiver na idade de cinco anos depois da puberdade”. [wikipédia]

“Nas sociedades antigas e medievais, as meninas poderiam ser noivas antes ou durante a puberdade. Na Grécia, o casamento e a maternidade precoces para as meninas eram incentivados. Mesmo os meninos eram esperados para se casar antes de chegarem à idade de 18 anos. Com uma expectativa média de vida para os seres humanos em todo o mundo entre 40 e 45 anos, os casamentos e a maternidade ainda no início da adolescência eram típicos. Na Roma antiga, as meninas se casavam antes dos 12 anos e os meninos a partir dos 14 anos. Na Idade Média, sob as leis civis inglesas que eram derivadas das leis romanas, era comum o casamento antes dos 16 anos e na China Imperial, o casamento infantil era norma.
Friedman afirma que "organizar e contrair casamento de uma jovem eram as prerrogativas indiscutíveis de seu pai no antigo Israel". A maioria das meninas se casavam antes da idade de 15 anos, geralmente no início de sua puberdade.
A maioria das religiões, ao longo da história influenciou a idade de casar. Por exemplo, a lei eclesiástica cristã proibia o casamento de uma menina antes da idade da puberdade. As escrituras hindus védicas determinaram a idade de casamento para meninas para a "idade adulta" que definiram como três anos após o início da puberdade. Estudiosos e rabinos judeus fortemente desencorajam casamentos antes do início da puberdade.
Alguns estudiosos islâmicos têm sugerido que não é um número que importa, a idade de casar pelas leis religiosas do Islã é a idade em que os guardiões da menina sentem que ela chegou à maturidade sexual. A determinação da maturidade sexual é uma questão de julgamento subjetivo e há uma forte crença entre a maioria dos muçulmanos e acadêmicos, com base na Sharia, que se casar com uma menina de menos de 13 anos de idade é uma prática aceitável para os muçulmanos”. [wikipédia]

“A infância como objeto historiográfico pode ser considerada uma área de estudos recente, tendo como marco o trabalho de Philippe Ariès, a História Social da Criança e da Família, publicado em 1960 e traduzido mais tarde para o português. O livro aborda a trajetória de uma consciência social sobre a criança e a família, na percepção e construção de um sentimento de infância. É um texto introdutório importante para as pesquisas da infância como objeto historiográfico utilizando uma vasta gama de fontes iconográficas e testemunhos escritos. O autor traz que será sobretudo nos séculos XVI e XVII que ocorre uma evolução dos temas da primeira infância, com um sentimento de família, a paparicação e os retratos numerosos de crianças sozinhas. A obra inaugura um novo campo de pesquisas históricas: a história da infância”. [wikipédia]

O conceito de uma infância e adolescência como uma época de inocência, ingenuidade e assexualidade vem da filosofia de Jean Jacques Rousseau. Isso somente foi desmistificado [em parte] por Sigmund Freud e confirmado [com enorme alarde] por Alfred Kinsey.
 
Voltemos ao assunto. Essa é uma questão pertinente, considerando a forma como a Wicca se expandiu e, certamente, seus praticantes devem se preocupar de que forma seus descendentes podem participar dos encontros e das cerimônias. Sobretudo quando falamos de conceitos como “idade”, não há consenso absoluto quando uma pessoa alcança a maturidade em sua formação mental, física, psicológica ou sexual.

O critério e conceito sobre faixa etária e consentimento são uma construção cultural e social. Um ser humano, que nasce e possui uma sexualidade, não vai deixar de ter curiosidade a respeito disso. A falta de educação sexual somente irá atingir as pessoas que estão fora do espectro binomial heteronormativo e não irá impedir pessoa alguma em ter suas primeiras experiências sexuais. Considerando que é nosso dever cuidar e ensinar nossos descendentes [e isso inclui educação sexual], considerando que nós consideramos o sexo algo sagrado, nós que somos “adultos”, nós temos que resolver o que é melhor. Grupos de Paganismo Moderno e Covens Wicanos devem ter regras claras e cautela quanto ao ingresso de interessados, regas estendidas no tocante às cerimônias, quando são públicas ou quando tem a presença de familiares, parentes, crianças e adolescentes.

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