Eu sempre achei curioso como alguém define a realidade, geralmente dentro de um conceito arbitrário escolhido, um padrão, fora do qual todo aquilo que não se adequa é descartado. Quando eu fui católico eu percebi isto, quando fui ateu não fui diferente. Permanecer na mesma ideologia pós-renascentista anti-religião não nos conduzirá a lugar algum, toda repressão é exercida por um Estado e não sobram motivos, razões ou bandeiras pelas quais o Estado comete crimes em defesa da Lei. O poder não é dominado apenas por "religiosos", mas também por industriais, banqueiros, mercadores e até cientistas.
Ouvir de um ateu sobre uma Nova Era chega a ser irônico, uma vez que esta palavra causa um furor irado destes utópicos da auto-suficiência que estranhamente se esquecem nesse momento da tão propalada liberdade de expressão, pensamento e religião (incluindo a falta em uma).
Qual é a "realidade" dos ateus? - A inexistência de Deus.
Esta análise disseca a resposta do autor que, comodamente, escolhe de qual moeda e de qual lado dela quer falar, tudo em nome do Raciocínio, uma Instituição Etérea tão transcendente quando o "Deus" que eles negam em vão.
A pedra de prumo dos ateus sempre se situa a respeito do fanatismo, do radicalismo, do fundamentalismo e de ações desesperadas em países em que vigoram uma Teocracia, convenientemente se esquecendo que igual fanatismo, radicalismo e fundamentalismo pode ser encontrado em países - teoricamente ateus - que igualmente agem de forma desesperada quando o povo age contra o sistema. Cito o caso recente que aconteceu na China, na Praça da Paz Celestial.
A abertura do discurso do autor a respeito de uma libertação do leitor de amarras não soa diferente da pregação de um pastor evangélico pela salvação da alma do pecador. Usa do velho clichê pós-renascentista quando fala em dogmas, mas oculta do leitor que apenas irá trocar um padrão de dogmas por outros, os aceitos cientificamente.
Ao longo do livro, o autor não poupa críticas e ataques à religião, muitas vezes de forma pueril e generalizante. Chamar a obra de um convite ao raciocínio é o mesmo que o estuprador dizer que está fazendo a corte.
Preâmbulo
O autor começa se identificando como ateu, como se isso transferisse alguma aura de autoridade a ele ou de verdade ao que escreve. Que é bem claro que isto significa que ele não acredita em Deus, qualquer um que seja, isto é uma redundância desnecessária. Existem muitos tipos de ateus, mas a maior parte assume sempre Deus como aquele do conceito Cristão. Um ato falho da parte do autor: "você vai me conhecer melhor dentro do próprio livro, porque escrevo muito sobre mim mesmo". Eu, eu, eu. Ateu do tipo Narciso.
Depois ele repete a gentileza hipócrita que ele quer apenas "emitir a minha (dele) opinião e trocar uma idéia (impor a dele, na verdade) a respeito de religiosidade, explicar porque acreditava em Deus (que veremos se tratar do Deus Cristão) e cheguei hoje a essa posição".
Um ponto interessante de todo livro é que nunca uma obra escrita pode ser um diálogo, uma discussão dinâmica, todo livro é um discurso, um monólogo, onde o autor sempre se põe em um pedestal, nunca é desinteressado, uma vez que o autor se põe na missão sagrada de "abrir os olhos do ser humano... contra os prejuízos de uma crença ilusória".
Apontar dedos é o recurso mais fácil, mas nem sempre é racional, a Ciência e o Ateísmo possuem igualmente uma história obscura que é mantida oculta do público comum. Outro recurso simplista vem a ser a desgastada reclamação da exploração monetária que, diga-se de passagem, não é privilégio da Igreja e o igualmente discurso batido sobre as muitas vítimas inocentes feitas em nome de Deus, como se a Ciência e o Ateísmo não tivessem seus esqueletos também.
O autor a seguir demonstra seu lado prestidigitador, tentando hipnotizar a platéia com uma repetição do discurso de introdução, tentando hipnotizar o leitor incauto para que este realmente acredite nas boas intenções do autor e de sua obra e mais uma incontável seqüência de clichês. Numa tentativa irrisória de passar de uma forma mística a si e à sua obra esse atributo sobrenatural de ser a resposta mais racional, o autor começa a demonstrar que não está interessado em fatos ou em debater o alvo de sua fúria, mas em instalar no leitor o preconceito, ódio e raiva que o mesmo tem contra toda forma de religião.
A autoconfiança do autor é louvável, mas cabe a pergunta: ele é realmente livre?
Vejamos por que e como ele se considera livre. Ele se considera livre porque "hoje, eu tenho uma sensação de poder, de liberdade, de capacidade de discernimento e autocontrole, de uma força que vem de dentro de mim, um orgulho interior, uma sensação interna de crescimento, da descoberta de um enigma... uma satisfação de haver descoberto o mistério e se tornar um igual, uma sensação de que você deu um passo importante na direção do seu crescimento".
Quando se deixa de ser criança, nos tornamos primeiro adolescente antes de amadurecermos realmente e nos tornarmos adultos. O autor deixará evidente em seu ataque furioso nada racional contra qualquer tipo de religião que está nessa fase adolescente, em que é importante negar figuras paternais na tentativa desesperada de encontrar e afirmar sua própria identidade.
Aqui entrou um engano e uma ilusão pessoal do autor. Todo ser humano possui algum interesse e o autor não é diferente. Preparem-se, pois o autor irá se esmerar em seus truques literários para passar a impressão e a crença ao leitor que ele tem interesse altruístico e não tentará enganar o leitor. Sinta as garras da fera do sofisma: "jamais enganaria a um filho ou um amigo... posso até estar enganado, mas só ensino aquilo que creio ser o certo, senão diria: quem sabe, talvez, pode ser, é provável, é possível, acho que sim, acho que não".
Nenhum texto possui a Verdade Absoluta, todo texto é um discurso autoritário do escritor ao leitor, não pretendem explicar todos os fatos, apenas os que agradam ao seu autor, não quer promover a liberdade da mente, mas instaurar um outro padrão de dogmas, nenhum texto está isento disto que o autor chama de "conselhos sociais". O que cada um pode ter não são teorias, mas interpretações da realidade e opiniões sobre essas interpretações.
Final
Eu li tudo, Alfredo. Por graça dos Deuses da Internet e muita paciência minha. Eu sou pagão moderno, racional, lógico e inteligente. Mas não estou limitado a isto. Vociferar pela 'lógica', 'raciocínio' e 'inteligência' contra aquilo tudo que você, preconceituosamente, por causa de uma visão simplista e generalizante, define como o pior veneno da humanidade, não te torna melhor nem mais verdadeiro.
O que eu te proponho é ainda mais radical do que ficar continuando com suas bravatas. Perceba que o raciocínio pertence a todas as pessoas, independente de crer ou descrer. Se alguns escolhem não usar o raciocínio, não é sua missão sagrada livrá-los das garras da superstição.
O conhecimento e a informação estão disponíveis a todos. Como o senhor realmente crê que não há nada além desta vida, então que te importa se as pessoas desperdiçarem suas vidas com ilusões? A vida é deles.
Caso sua plataforma seja o de acabar com o poder político e econômico dos grupos religiosos, existem meios para fazê-lo, combata os grupos, mas não jogue por causa deles todas as religiões no mesmo saco.
Caso sua plataforma seja o de combater o proselitismo, o assédio religioso e o aliciamento de consciência, não se esqueça de sempre deixar bem claro a que pessoa física ou jurídica está combatendo, essas ações são perpetradas por seres humanos, não por seres espirituais ou divinos.
Também lembre que, se não vamos permitir aos grupos religiosos que catequizem os jovens, nós também não podemos fazê-lo, mas sim dispor a eles os meios e os instrumentos para que conheçam, comparem e escolham.
Eu li o livro e ele não acrescentou em nada ao que eu conhecia, nem passou de forma sobrenatural mais lucidez do que eu possuía antes. A opinião que você demonstrou não foi equilibrada, mas sim uma fúria iconoclasta irracional. Eu nasci livre, tanto que me livrei do Cristianismo, do Satanismo e do Ateísmo.
O seu livro não torna quem quer que seja mais ou menos livre, não se é segundo a sua idealização de 'liberdade'.
Crente ou descrente são racionais. Infelizmente em alguns casos o raciocínio é falho ou tendencioso.
O paraíso, para o ateu, é esta ilusão de ser mais racional, inteligente e lógico que outras pessoas simplesmente pelo fato de se dizer ateu.
Você acertou em cheio quando falou que a fonte de todos os problemas somos nós mesmos e isto não ocorre apenas na religião, mas também na política, na ideologia, na economia e na ciência.
Então nós devemos tentar buscar o diálogo com as pessoas, demonstrando por meio de informação e conhecimento o quanto estão enganadas, sem a pretensão de possuir a verdade. Cabe a cada indivíduo decidir refletir ou refratar, cabe a cada indivíduo escolher em continuar no mesmo mundinho ou ter uma perspectiva mais ampla. No fim de tudo, teremos vivido a nossa vida. O que vier depois, quando vier, se vier, é outra história.