sexta-feira, 8 de julho de 2022

Cenário de cristofascismo

Reportagem de Lu Sudré.
Publicada em 25/06/2019 no Brasil de Fato.

Exilada há cerca de dois meses, Camila Mantovani, evangélica que atua em defesa dos direitos das mulheres, foi obrigada a deixar o Brasil para salvar sua vida. Fundadora da Frente Evangélica pela Legalização do Aborto, a jovem constantemente recebia mensagens de ódio e ameaças de morte. 

A situação se agravou com a intensificação das intimidações contra a sua vida e de sua família, em retaliação à sua atividade religiosa, no segundo semestre do ano passado. Após notar que pessoas armadas a seguiam, a jovem deixou o local em que morava e passou a não ter endereço fixo. Ainda assim, as ameaças não cessaram. 

Com o perigo iminente, uma rede de apoio foi formada com o objetivo de viabilizar a mudança de Camila do país para mantê-la em segurança. “Perdi o direito de viver minha vida como a vivo hoje. Perdi esse direito porque o fundamentalismo que governa o Brasil hoje assassina qualquer profeta que denuncie o pecado das grandes lideranças. Estou indo embora do país em exílio depois de esgotar todas as minhas possibilidades de ficar aqui e permanecer viva”, escreveu Mantovani, em carta de despedida publicada à época em sua rede social. 

Hoje a ativista religiosa reconstrói sua vida em outro país da América Latina, continente que, na sua opinião, também é alvo do fundamentalismo religioso. 

“O fundamentalismo não tolera a pluralidade, não tolera a diversidade. Ele se pretende único, e, para ser único, precisa eliminar todos os outros. Ao trabalhar com essa eliminação do outro, o fundamentalismo elimina quem pensa diferente dentro da própria religião, dentro do próprio cristianismo. Esse é o meu caso e o caso de várias outras pessoas, irmãs e irmãos de fé”, afirma Camila em entrevista ao Brasil de Fato. 

Ela conta que, apesar de difícil e dolorosa, deixar o país foi uma estratégia acertada. “Ter saído do país diminuiu bastante a intensidade das ameaças. Elas ainda existem, vez ou outra chega alguma coisa. Mas aquilo que de fato me colocava em risco cessou, até porque era concreto, era físico. As pessoas me perseguiam armadas na rua, ficavam de tocaia na porta da minha casa. Esse é o tipo de coisa que eu não tenho que lidar aqui, graças a Deus. Estou bem, estou em paz. Uma paz que eu já não tinha há muito tempo para caminhar na rua tranquila”, relata. 

Segundo a ativista, o termo “cristofascismo”, desenvolvido pela teóloga alemã Dorothee Sölle, tem sido usado por religiosos progressistas para definir o avanço do fundamentalismo religioso que acontece no Brasil. 

"Ela [Dorothee Sölle] percebe que a base social que legitimou o nazismo na Alemanha era cristã e cunha esse termo, ‘cristofascismo’. Um fascismo associado ao cristianismo. É exatamente o que temos vivido hoje: um cenário catastrófico de ‘cristofascismo’”, lamenta. 

Fonte: https://www.brasildefato.com.br/2019/06/25/brasil-vive-cenario-de-cristofascismo-diz-evangelica-exilada-apos-ameacas-de-morte

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