sexta-feira, 18 de outubro de 2024

RN inconstitucional

O uso da bíblia em salas de aula tem gerado debates polêmicos na comunidade jurídica e educacional. Após a governadora do Rio Grande do Norte Fátima Bezerra (PT) sancionar a Lei Nº 11.935, que autoriza o uso da bíblia nas escolas da rede estadual de ensino, o jurista Pedro Serrano, em entrevista ao GGN, afirmou que a medida é inconstitucional por violar o princípio da laicidade do Estado.

“É inconstitucional porque, quando o serviço é prestado pelo Estado, deve ser laico”, segundo a nossa Constituição. “A Bíblia, dependendo da versão — católica, protestante ou neopentecostal — representa uma escolha religiosa específica”, o que “atenta contra o estado laico”.

Serrano ainda ressaltou que “boa parte das religiões não têm a Bíblia como livro sagrado”, mencionando as religiões de matriz africana, o islamismo, o judaísmo e ateus, “que têm o direito de professar sua crença na não existência de Deus”. Privilegiar algumas religiões em detrimento de outras, portanto, fere o respeito à diversidade religiosa, explica o jurista.

Para a jornalista e pesquisadora Magali Cunha, do Instituto de Estudos da Religião e editora-geral do Coletivo Bereia – Informação e Checagem de Notícias, o uso da Bíblia em escolas públicas tem se tornado um tema recorrente não por acaso, sobretudo em épocas de eleições municipais, nas quais as polêmicas criadas são usadas como ferramenta de engajamento em mídias digitais e de aceno de políticos às suas bases eleitorais.

“Especialmente quando Projetos de Lei e Leis sancionadas são declarados inconstitucionais em altas cortes por ferirem o princípio constitucional da laicidade do Estado, políticos e as mídias da direita cristã (católica e evangélica, de onde partem tais projetos) criam polêmica, ao acusarem a decisão judicial de “perseguição a cristãos” ou de “negação da Bíblia”, explica Magali Cunha.

As apurações do Coletivo Bereia, com o qual Magali trabalha, têm mostrado esses efeitos. “Estamos observando que este tema era esporádico até 2020, quando passou a ser um recurso de campanha eleitoral de candidatos católicos e evangélicos a pleitos municipais e estaduais”.

Magali ilustra com um caso ocorrido em Sorocaba (SP), em maio deste ano, quando o prefeito Rodrigo Manga (Republicanos) divulgou vídeos afirmando que o Tribunal de Justiça de São Paulo havia proibido a Bíblia nas bibliotecas por “perseguição aos cristãos”.

No entanto, o tribunal apenas declarou inconstitucional a obrigatoriedade do livro sagrado nas bibliotecas, com base no princípio da laicidade do Estado, que impede instituições públicas de promoverem uma religião específica, garantindo espaço para a diversidade religiosa.

“Ou seja, o Estado brasileiro não é confessional, por isso, instituições públicas no Brasil não podem professar e propagar preceitos ou símbolos de uma determinada religião, mas atuar para que todas tenham direito a suas práticas de fé”, explica a pesquisadora, que citou casos semelhantes que aconteceram, também em 2024, em São José do Rio Preto (SP) e, em 2021, no estado do Amazonas, este com decisão do STF.

O Coletivo Bereia identificou também desinformação na forma como portais religiosos repercutiram a utilização da Bíblia em projeto de lei para redução de pena no Maranhão. Em 2020, também, foi publicada por Bereia uma checagem sobre diversos casos de desinformação a respeito de leitura bíblica nas escolas, de forma semelhante ao caso de Cuiabá, proposto pelo vereador Rodrigo Arruda e Sá (PSDB).

“A estratégia traçada em comum”, sob orientação única a vereadores e deputados estaduais da direita cristã, foi detectada em pelo menos dez PLs semelhantes à proposição do vereador Rodrigo de Arruda e Sá, em municípios dos estados do Amazonas, Espírito Santo, Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul, além do Distrito Federal, nos quais todos visam incluir a leitura bíblica como “recurso paradidático” nas escolas, “um texto muito semelhante ao aprovado no Rio Grande do Norte”.

“Destes, sete foram propostos ou aprovados em 2024, ano de disputa eleitoral, como ocorre agora no Rio Grande do Norte. Possivelmente, os PLs e as Leis sancionadas terão o mesmo destino dos demais e serão declarados inconstitucionais”, exemplifica Magali.

Fonte, citado parcialmente: https://jornalggn.com.br/politicas-sociais/educacao-politicas-sociais/uso-da-biblia-nas-escolas-do-rn-e-inconstitucional-ensino-publico-deve-ser-laico-diz-pedro-serrano-ao-ggn/

Nota: sugestão. Quando um governador ou assembléia legislativa aprovar lei inconstitucional, decreta-se intervenção federal, cassa-se o governador ou o deputado que propôs ou promulgou tal lei.

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