sábado, 18 de julho de 2009

Formando iniciadores e iniciados

As preocupações daqueles que buscam trilhar o Caminho dos Sábios, em princípio, são centradas na obtenção da Iniciação. A Iniciação parece, aos olhos do leigo, um ato mágico que, por si só, fará com que uma pessoa comum se torne especial e acesse poderes que não estão à disposição de qualquer um. “-Plim, ao toque desta varinha vc está iniciado!”. Ilusões.
Quando a pessoa realmente chega ao Caminho e começa a se preparar para trilhá-lo de verdade essas idéia infantis dão lugar a uma compreensão maior: a Iniciação não é um fim em si mesma. O rito chamado Iniciação nada mais é que um rito de passagem, o marco de reconhecimento de uma mudança de estado da pessoa para quem ele será celebrado. A Iniciação é , pois, o marco de uma mudança de vida. Quem já compreende isso sabe que o rito em si – embora realmente vá investir o Iniciado de certas chaves de poder ancestral – não é o que concede poderes, apenas reconhece que a pessoa em questão já acessa esses poderes.
O acesso aos poderes dos Antigos é, pois, a marca d@ Brux@, ou seja, a certeza de que a pessoa conseguiu estabelecer uma relação pessoal, especial e contínua com a Deusa Tríplice e o Senhor Hastado [Deus Cornífero-NB].
Mas, afinal, como se distingue um Iniciado de uma pessoa comum? Dentre as muitas respostas cabíveis, eu gosto de usar uma fórmula bem simples: “Um Iniciado é um Desperto, enquanto outras pessoas estão adormecidas.” Esse aforismo contém uma referência muito específica a uma faceta do caminho Wiccaniano. Wicca é um caminho de poder pessoal, e portanto, é um caminho de auto-conhecimento e auto-equilíbrio.
A justificativa para essas afirmações é simples: se alguém não conhecer a si mesmo, jamais conhecerá os Deuses. A obrigação contínua de auto-observação, avaliação crítica e busca de maior equilíbrio é o que carateriza um Iniciado.
Durante o tempo em que ocorre o processo iniciático (entendido este como o período em que alguém deixa operar em si as transformações que o tornarão um Desperto, comumente designado como período de Dedicação) a pessoa contará, muitas vezes com um Iniciador, que acompanhará seu processo e avaliará o que ocorre com ele, aconselhando-o, corrigindo-o e instruindo-o, ou algumas vezes silenciando para que ele aprenda por si só.
O auto iniciado encontra justamente nisso sua maior dificuldade: sem um Iniciador não tem parâmetros para julgar seus progressos e dificuldades e seu caminho é muito mais árido, embora não impossível, se ele se abrir a escutar os Deuses.
Ao final do tempo da Dedicação, quando alguém se inicia, é mister que já esteja ciente de todos os processos de seu despertar, ou seja, que possa observar-se, criticar-se e determinar-se sozinho. Mas, na experiência das Tradições, não é isso que ocorre. Um recém iniciado não é alguém que atingiu um alto grau de sabedoria e vivência, é , como o nome diz, alguém que apenas começou...
Podemos dizer que o estado de recém iniciado implica o mínimo. O mínimo necessário de auto-conhecimento, relação com os Antigos, habilidades mágicas, dons desenvolvidos.
Os anos que se seguem à Iniciação serão destinados a obter a maximização desses mínimos. O Iniciado deve aprender mais, compreender mais, aprofundar mais seu conhecimento dos Deuses e de si mesmo. Deve dar mostras cabais de que se tornou mais equilibrado, vive melhor, anda pelo mundo em maior harmonia.
Nesse tempo, o papel do Iniciador consiste em ensinar ao Iniciado diversas técnicas, modelos, atividades, que permitirão que ele seja capaz de auto-determinar-se, criticar-se e equilibrar-se sozinho em algum momento do caminho.
Assim, se a iniciação implica em tornar alguém Desperto, o período pós-iniciático destina-se a tornar essa pessoa cada vez mais independente do Iniciador, fazendo por si mesmo o papel que desde o começo da dedicação coube ao Iniciador. Agora, caberá a ele ser guardião de seu próprio estado de despertar. Nesse processo de aprender o que seu Iniciador fazia por ele, e que agora cabe a ele mesmo fazer, um Iniciado pode ter despertada sua vocação para tornar-se, ele mesmo, um Iniciador.
Cabe aqui um alerta: é muito comum que pessoas recém iniciadas, muitas vezes movidas por um entusiasmo legítimo e uma ânsia de servir aos Deuses, creiam que já estão prontos para dedicar outras pessoas. Isso é sempre uma ilusão grave e potencialmente perigosa: um potro recém nascido imediatamente após o parto já anda. Mas se alguém tentar colocar nele uma cela e uma carga, quebrará suas patas e sua vida se perderá, morrerá por ter tentado assumir uma carga maior do que a que tinha capacidade de levar. Um recém iniciado é como o potro recém nascido: não deve querer carregar o fardo pesado de ter dedicados, deve se concentrar em seu próprio crescimento e fortalecimento antes de ter a pretensão de carregar mais peso, ajudar outros. Quando chega o tempo certo, porém, cabe ao Iniciador originário a tarefa hercúlea de formar outro Iniciador. Como isso acontece?
É preciso que além do que o Iniciador ensina aos Iniciados comuns, àquele que tem o destino de ser um Iniciador devem ser repassadas as formas pelas quais o seu Iniciador é capaz de acompanhar os processos iniciáticos. Há todo um universo de experiências que devem ser compartilhadas, explicações dadas pelo Iniciador. Também é muitíssimo importante que esse Iniciado mais antigo comece a acompanhar as Dedicações feitas pelo seu Iniciador, e junto com ele observe, julgue e aprenda o que ocorre com as pessoas para torná-las Despertas.
Não existe uma receita de bolo para isto, como não existe para nada no processo iniciático. Cada experiência é única, mas a observação de pontos comuns a diversos processos ajuda o novo Iniciado a criar sua própria capacidade de observação e julgamento, dando a ele um Olhar de Iniciador.
Quando isso ocorre, e somente quando isso ocorre – sem nos preocuparmos em falar em tempo cronológico, porque o calendário não importa, importam as mudanças internas- é que o Iniciado pode se considerar apto a ser um iniciador. E somente nessa hora é que ele deve aceitar pedidos de Dedicação.
Conheço bem a comunidade wiccaniana em geral, compreendo a ânsia dos novatos e também compreendo a vontade dos que já aprenderam em compartilhar aquilo que descobriram. Mas a importância desse ato – aceitar um pedido de dedicação – é enorme, e somente deve ser realizada por pessoas que realmente saibam de suas gravíssimas implicações. Se você lidera um grupo, um circulo, um coven, fora de tradições e está aceitando pedidos de dedicação, pense nisso: você realmente está apto a forjar um novo instrumento para os Deuses? Você já é um Desperto? Você pode ensinar alguém a Despertar? Você já pode ensinar alguém a tornar-se aquele que Desperta os outros? Se a resposta for não, talvez seja um tempo de, ao invés de você ensinar, aumentar seus conhecimentos buscando uma Tradição ou algum outro tipo de aprendizado que supra suas deficiências. Dê tempo a si mesmo para crescer e tornar-se capaz. Ser responsável por si mesmo na Arte já é muito. Ser responsável por outros é muito mais, e muito será exigido daquele que se arvora conhecedor dos Mistérios.
Formar Iniciados já é bem difícil. Formar Iniciadores é muito mais. É preciso que haja muita sintonia, muito amor, muita entrega, tolerância, perseverança e compaixão de parte a parte. É preciso se irmanar no dia claro dos Deuses, e na noite escura da alma. E é preciso, acima de tudo, ser completamente apaixonado pelo ser humano e pelos Deuses que o amam.
Por: Mavesper Ceridwen, em tópico da Sociedade Wicca.
Nota: Curiosamente/coincidentemente [ou não], esta foi praticamente a minha postura diante da autoiniciação e eu fui banido não por infração às regras e diretrizes da comunidade, mas porque eu estava contestando e desafiando a suposta autoridade do proprietário. Como disse em "Caixa de Pandora", essas pessoas estão mudando aos poucos seu discurso, tentando mostrar uma seriedade, mas de fachada, para aumentar a clientela.

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