quinta-feira, 9 de janeiro de 2025

Idade não é doença


Uma reflexão necessária sobre a forma como a idade é colocada como doença ou deficiência, em uma sociedade capitalista que lucra até com a lacração.

Mas antes, um texto da Nathali Macedo:

Assim como Regina Duarte, a atriz Cássia Kis tem jogado a própria carreira no lixo da história da teledramaturgia brasileira.

A atriz, que há apenas dois anos começou a reproduzir discursos opressores disfarçados de conservadorismo cristão, chegou a dizer que “não existe mais o homem e a mulher, mas a mulher com mulher e homem com homem, essa ideologia de gênero que já está nas escolas”.

A ignorância transborda em cada palavra, tornando notório que a atriz não foi leal sequer aos próprios ideais. Dessa vez ela armou um barraco ao ver meninas de biquíni e saída de praia em um mercado em pleno Rio de Janeiro.

“Não pode andar assim no mercado, é uma falta de respeito”, disse, pra lá de alterada.

A pessoa precisa ser muito ridícula e ortodoxa pra fazer barraco por um tipo estranhíssimo, ainda que corriqueiro, de moralismo.

Há quem chame de senilidade, e pode até ser, em alguma medida, mas é mais do que óbvio que há aí também uma falha gravíssima de caráter, além de uma cognição limitada.

Muito se fala, aliás, da manipulação e idiotização ocasionadas pelo bolsonarismo, e eu não duvido disso, mas o fato é que, a uma altura dessas, nenhum bolsonarista é inocente.

O que mantém gente como Cássia Kis ao lado do bolsonarismo e todas as desgraças que vêm com ele é o ódio. Ódio de classe, ódio às minorias, ódio à liberdade.

Embora, portanto, a retórica do ódio exerça sobre os bolsonaristas uma manipulação pré-consciente (que poderia ser chamada de lavagem cerebral) é quase impossível acreditar que todo ódio já não estava lá.

E foi por esse ódio, sem sombra de dúvidas, que Cássia Kis renegou a própria trajetória. Em outros tempos, a atriz foi vanguarda ao quebrar tabus como aborto e maternidade tardia.

Toda a história de Cássia Kis, aliás, é permeada por discursos e ações altamente progressivas: admitiu à revista Veja já ter praticado aborto e defendeu o direito de escolha das mulheres. Aos 37, engravidou e enfrentou todo um discurso segundo o qual há mulheres “velhas demais para serem mães”.

Como é possível alguém outrora tão progressista se tornar um poço de preconceitos, moralismo, hipocrisia e ódio? A verdade é que, às vezes, pessoas notadamente progressistas no discurso, mas não nas ações, também estão sujeitas a uma personalidade violenta e bélica.

E o resultado é óbvio: juntar-se aos seus pares, que compartilham de todo seu ódio.

Hoje, assim como Regina, Cássia tem perdido seus admiradores e os entusiastas de sua arte, provando que, assim como a colega, envelheceu muito mal.

Não se pode, é claro, esquecer do legado artístico Cássia Kis, mas esta é uma tarefa extremamente difícil, e, sobretudo, triste: nada mais triste para um ser humano do que virar uma Cássia Kis.

Fonte: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/deus-te-livre-de-envelhecer-como-cassia-kiss-por-nathali/

Nota: Regina e Cássia fazem coro ao Roger e Lobão. Mas não podemos reduzir esses casos ao fator etário ou étnico. Essa doença pode ser explicada pela psicanálise e pela filosofia.
Mas essa tendência radical no espectro da extrema direita na população é resultado de algo que foi inculcado e cultivado pela elite dominante por anos.
Isso é um incômodo, mas o brasileiro é conservador e tem uma mentalidade medieval. O bolsonarismo é um fenômeno e um sintoma desta doença.
Natali escorrega no etarismo sistêmico. Idade não é doença nem deficiência.

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