quarta-feira, 13 de novembro de 2024

Sobre a (in) tolerância

Um texto do Pai Paulo de Oxalá.

Citando:

Sim, nós das religiões de matriz africana cuidamos da natureza. Orixá é vida, Orixá é natureza. E, ao respeitarmos a natureza, respeitamos a força de nossos Orixás. Nos últimos tempos, adaptamos nossos rituais para proteger ainda mais o meio ambiente. Muitas oferendas, que antes eram feitas em espaços externos, hoje são cuidadas em espaços dentro dos Terreiros, destinados aos Orixás. Quando o jogo de búzios — porta-voz dos nossos Orixás — nos orienta sobre uma oferenda ao ar livre, ajustamos nossa prática, buscando um equilíbrio entre a tradição e o compromisso com a preservação.

Nas celebrações a Yemanjá, por exemplo, deixamos de lado os presentes que poderiam prejudicar o mar. Hoje, usamos apenas produtos biodegradáveis e oferecemos nossas comidas sagradas em folhas naturais. O uso de plásticos foi totalmente abolido, e se por orientação do jogo, precisarmos de algum preceito nas ruas, essas oferendas também são feitas com elementos que não agridem o meio ambiente. Esse cuidado não é apenas com o planeta, mas é, também, uma forma de manter viva a força dos nossos Orixás e a essência da mãe-terra.

Entretanto, sabemos que nem todos ainda possuem essa consciência, e, por vezes, alguém, por descuido ou falta de informação, utiliza recipientes como alguidares ou outros materiais não degradáveis. Embora não mais aceitemos esses elementos, seguimos em um esforço constante para educar e conscientizar. Afinal, preservar a natureza é preservar a vida e a força do Orixá.

Outro dia, atendendo a uma sugestão, fiz um vídeo nas redes sociais, orientando sobre a importância de respeitar as oferendas encontradas nas encruzilhadas, sugerindo que as pessoas passem por esses locais com respeito, pedindo licença. Meu vídeo não foi sobre fazer oferendas nas ruas, mas sim sobre respeitar algo que carrega pedidos e energia espiritual. Como Babalorixá, entendo o valor e a força de uma oferenda. É algo que merece respeito, independentemente de nossas crenças pessoais.

Infelizmente, recebi mensagens de intolerância religiosa após publicar esse vídeo, com comentários agressivos, muitos deles vindos de pessoas que se identificavam como evangélicas, que deveriam pregar a paz e o amor entre irmãos. No entanto, frases de ódio e ameaças como “chutaria” ou “destruiria” foram comuns. Isso me entristece profundamente, pois a paz que pregamos em nossas religiões deveria ser uma ponte entre as pessoas, e não um muro de ódio e violência.

Mantenho minha fé e minha convicção religiosa. Sei que não estou incentivando ninguém a mexer no que não lhe pertence e muito menos degradar o meio ambiente. O meu papel como sacerdote é orientar e esclarecer, mas o doloroso é ver que, em nome de uma suposta paz, alguns ainda se entregam ao ódio. Tomarei as providências cabíveis, porque intolerância é crime. A nossa constituição nos garante a liberdade de credo, conforme relata esse trecho do artigo 5º, inciso VI: "É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida na forma da lei”.

Seguirei, acima de tudo, propagando axé e amor, e reforçando a minha fé nos Orixás.

Que a garantia da liberdade religiosa de todos seja, verdadeiramente, o grande passo para a paz!

Axé para todos!

Fonte: https://extra.globo.com/blogs/pai-paulo-de-oxala/post/2024/11/intolerancia-religiosa-e-crime-todos-tem-direito-a-fe.ghtml

Retomando.

A liberdade religiosa não é sinônimo de isenção. Recentemente foi matéria de justiça o "direito" de uma pessoa que pertença à religião das Testemunhas de Jeová de recusar transfusão de sangue. A liberdade religiosa não é sinônimo de autorização de proferir discurso de ódio. A liberdade religiosa não exime as crenças de questionamento, crítica e sanção da lei/justiça quando cabível.

Nenhum comentário:

Postar um comentário