terça-feira, 1 de junho de 2021

Azul é a cor mais careta

Dois filmes que não tem a ver um com o outro em diversos aspectos tem algo em comum: a cor azul.

Um deles é o filme de animação “Divertidamente”. O outro é o polêmico “Azul é a Cor Mais Quente”. Em ambos a cor azul está presente.

Em “Divertidamente” a cor azul é utilizada para praticamente caracterizar a personagem “Tristeza”, pois para países de língua estrangeira se diz que quando alguém está triste, essa pessoa está “blue”. O estilo musical chamado “Blues” explica bem esse sentimento e associação.

Em doses exageradas, a tristeza conduz à melancolia e à depressão. O personagem “Tristeza” é uma epítome desse comportamento. Por sua “atitude”, “Tristeza” praticamente configura como um coadjuvante, uma “escada” e um “antagonista” da personagem “Alegria”. A “Tristeza” quase causa um apagamento total das memórias de Riley, sua hospedeira.

Até que “Alegria” tem uma revelação e “Tristeza” é colocada como co-protagonista e, juntas, conseguem “salvar” as memórias de Riley. O interessante é notar a diferença entre antes e depois de Riley quase ter suas memórias apagadas. Antes suas memórias eram monocromáticas, depois suas memórias são compostos mistos de alegria, tristeza, raiva, nojo, medo. Depois dessa experiência, Riley passa por um “upgrade” que inclui também um novo “comando”, chamado “puberdade”. Algo que os estúdios de animação tem medo de explorar.

O que não foi o caso de “Azul é a Cor Mais Quente”, onde a cor azul está presente no cabelo da co-protagonista e no vestido da protagonista. A cor azul é algo artificial, uma tintura, exerce outra função nesse filme.

Em “Azul é a Cor Mais Quente”, Adele, uma garota comum que, aparentemente, é heterossexual, repentinamente se interessa por Emma, uma garota que é francamente homossexual. O romance e envolvimento delas não é tão interessante, salvo por este ser um “filme comercial”, não um pornô.

Tirando as cenas de pegação, o filme demonstra que, mesmo entre pessoas homossexuais, certos hábitos e comportamentos “socialmente aceitos” continuam válidos.

Aqui eu faço o elo entre a cor azul e sua artificialidade. Apesar de Adele e Emma serem um casal “fora das normas”, em diversos pontos seus comportamentos românticos são os mesmos do que preconiza a sociedade. Apesar de viverem uma relação homossexual, ambas “apresentam” sua “amiga” para seus pais. Os pais nem desconfiam de que há algo mais do que uma amizade e ambas parecem terem feito um pacto de silêncio sobre seu relacionamento.

Relacionamento este que desanda por que Adele se sente “negligenciada” por Emma, então sai com outra pessoa, um homem, para “fazer ciúme” em Emma para “se vingar” do que ela acha ser uma “traição” de Emma contra ela. Emma, evidentemente, mostra que os receios de Adele são infundados, mas o “estrago” estava feito, Emma não aceita que Adele se relacione com outra pessoa. Apesar de serem um casal “fora das normas”, ainda vigora a monogamia, o privilégio e exclusividade sobre o amor e o sexo da outra pessoa envolvida. Paradoxalmente, o relacionamento de Adele e Emma ainda mantém os mesmos padrões de amor e relacionamento ditos “normais”.

O filme não teve uma revelação e Adele e Emma, apesar de terem formas de relacionamento fora do socialmente aceito, não saíram do mundo das memórias monocromáticas de “Divertidamente”.

Tomando os dois filmes em retrospectiva, eu posso dizer que azul é a cor mais careta.

Texto resgatado do extinto Sociedade Zvezda.

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