Ao menos, essa era a intenção do Universo, criou Leviathan e Iahravel para ajudá-lo a comandar o Cosmo em toda sua extensão, mas não imaginou que isso iniciaria uma luta entre os irmãos, pela conquista de mais galáxias para suas possessões.
Isso o deixou irritado, tanto com seus filhos como consigo mesmo. Entretanto ele não era capaz de tomar atitudes drásticas. Se fosse para punir seus filhos, deveria punir-se primeiro. Mas o conflito tomava dimensões assustadoras e isso o angustiava.
Suas partículas, prestativas, puseram-se a trabalhar para tranqüilizá-lo, tirando dele o fluxo irado até este assumir uma forma de vida independente e pronta para agir pelo Universo, já que este não queria.
Foi com satisfação que o Universo viu surgir um quase meio irmão, pronto para ser a força da justiça, pelo bem da harmonia no Cosmo, mais a sua própria, antes que ficasse conturbado e tudo acabasse. Melhor que isso era então dar boas vindas a este e deixá-lo trabalhar. Assim surgiu Sahasetaum, que partiu em missão para advertir Leviathan e Iahravel de que este conflito estava tomando proporções perigosas.
Como a reclamação de inúmeras criaturas imoladas era em maior número contra o Império das Luzes, para lá se dirigiu Sahasetaum.
No castelo de Iahravel, a corte estremeceu ao perceber algo estranho acontecendo no firmamento. Foram perguntar ao Imperador o que ele estava fazendo, pois o julgavam responsável, já que dizia sempre ser o Deus único e todo poderoso. Talvez o fosse, mas entre os seus, mas não muito diante de seu irmão e nem um pouco diante de seu Pai. Como sabia que seu Pai não o atacaria, achou que só poderia ser coisa de seu irmão.
-Meus filhos! Eis que vejo que as forças infernais têm a ousadia de vir até nossa presença e nos atacar! Preparemo-nos e vamos enfrentá-las!
Assim se equiparam com todas as armas, o exército inteiro, paramentado e pronto para enfrentar todo tipo de força. Quando Sahasetaum saiu dentre os redemoinhos de estrelas e energias cósmicas, o exército inteiro entrou em comoção, o próprio Iahravel se assombrou com semelhante aparição. Mas logo deu o comando de ataque, sendo seguido por inúmeros disparos das armas mais pesadas.
Os fachos luminosos ricocheteavam pelo corpo de Sahasetaum, como pipocas na panela, mas o ataque o enfureceu. Simplesmente com uma de suas patas, golpeou toda a tropa, jogando-a de volta ao castelo de Iahravel, que quase não vem abaixo com o impacto.
Embora desacordado, Iahravel pode escutar bem a advertência de Sahasetaum que, se me permitirem, irei omitir, pois é terrível demais para que se escreva e pior ainda de se ler. Avisado o primeiro filho, Sahasetaum dirigiu-se ao outro. Esperemos que Leviathan receba melhor Sahasetaum, que já está irritado. Que o faça ainda ter confiança ao menos em um filho e o tranqüilize, senão, toda luta terá sido em vão!
Do mesmo jeito que se aproximou do centro do Império das Luzes, Sahasetaum aproximou-se do centro do Reino das Trevas, com as mesmas consequências disso.
O Conselho das Trevas, receoso de que isso fosse um plano de Iahravel para derrotá-los, estava para ordenar a prontidão,quando Leviathan acordou e ergueu-se.
-Soberano Leviathan! Melhor se esconder e vestir tua armadura! Sentimos que teu inimigo está tramando tua morte!
-Não sabem o que dizem, amigos. Este não é meu irmão, senão já o sentiria. E? algo maior, que me toca o coração. Devo recebê-lo em minha casa e tratá-lo bem, seja lá qual for o motivo de vir me visitar.
Apesar dos pedidos, Leviathan sai, dispensando sua guarda e até seus ministros de acompanhá-lo, sai sem uma arma sequer. Não contendo sua euforia, deixa ser visto em seu poder, como o Dragão de Sete Cabeças e Dez Chifres. Diante da tempestade cósmica faz uma saudação reverente.
-Pai, o que queres de mim? Diz o Soberano das trevas. No que surge Sahasetaum e lhe explica:
-Não sou seu Pai, mas vim por causa dele, para advertir a ambos os filhos de que o conflito deve ter fim.
-Se não é meu Pai, quem és, criatura, capaz de trazer ternura ao meu negro coração?
-Eu sou Sahasetaum, o que foi designado pelo Universo, para controlar as atividades das Luzes e das Trevas. Se necessário, julgá-las!
-Então entre e seja bem vindo. Nada tenho a esconder ou me envergonhar. Antes de dominar, prefiro mais a livre associação dos seres à minha causa. Se eu luto, é para manter a salvo tantos planetas e vidas que existem pelo Cosmo, sem esperar destes, gratidão ou reconhecimento. Como criaturas racionais e feitas da mesma matéria que a minha, embora mortais e frágeis, devem ser livres para terem seu destino e sua crença, seja nos princípios das Luzes ou das Trevas.
Tendo escutado e visto tanta sinceridade, sabedoria e nobreza, Sahasetaum acalmou-se, até esquecendo-se do incidente com Iahravel. Aceitou o convite e entrou na casa de Leviathan.
Foi então apresentado à rainha das Trevas, Nahema, esposa de Leviathan. Apresentou-o à princesa das Trevas e sua filha, Lilith, mais seu companheiro, Samael.
Lilith saudou o imponente guerreiro, com o mesmo beijo carinhoso que uma neta daria a seu avô. Tanta força e poder lhe provocavam, mas apesar deste amor súbito, sua paixão verdadeira era por Samael.
Sahasetaum até poderia tirar partido disso, mas para ele, Lilith era quase menos que uma criança. Nahema era tão bela, senão mais que Lilith, mas sentia-a como sua própria filha. Então preferiu continuar só.
Leviathan levou-o então ao Conselho das Trevas, que o recebeu atordoados, tamanha era a potência. Era o mesmo que um ancião ter entrado numa brincadeira de roda.
Preparou-se então uma festa de boas vindas, para apresentarem-se todos ante Sahasetaum. Satan e Moloch pediram-lhe para que abençoasse a união deles, mas Sahasetaum era mais juiz que sacerdote. Belphégor fez uma bela explicação dos princípios das Trevas, mas Sahasetaum a escutava, como um professor que tentava prestar atenção à apresentação de uma aluna. Lucifuge apresentou sua tese de acusação contra o Império das Luzes, mas Sahasetaum como juiz sabia perfeitamente os prós e os contras dos dois filhos do Universo. Belzebu e Baal Chanan fizeram um verdadeiro espetáculo aéreo, mas Sahasetaum, que já tinha visto a dança das estrelas, planetas e galáxias, nem se entusiasmou. Enfadonho, para Sahasetaum, foi ouvir as abordagens alquímicas sobre fenômenos naturais e sobrenaturais de Astaroth, já que Sahasetaum era a própria essência do que existe de mais sobrenatural. Uma última tentativa por Asmodéia, em sua dança de fogo com serpentes inflamadas, apresentação aparentemente inútil, já que Sahasetaum poderia facilmente brincar com o maior e mais poderoso dos sóis. Mas não poderia deixar de admirar, com que determinação defendiam seu Reino. Os acompanhava com os olhos quando estes, exaustos, voltavam aos seus lugares.
Foi ao observar Asmodéia que notou uma criatura sem igual em toda a extensão do Cosmo. Estava a cobrir com uma manta a Asmodéia e a servi-la com vinho para relaxar, refrescar e acabar com a sede dela. No meio daquele carnaval, era a única que, calma e dedicadamente cuidava do seu trabalho, sem nunca desviar a atenção a ele, o convidado e o festejado. Quis conhecê-la melhor, mas naquela folia era impossível. Então se retirou junto com ela, para outro espaço, a fim de conversar.
Assustada com a repentina desaparição de todas as coisas em torno dela, olhou para o único lugar onde havia mais alguém, que era Sahasetaum.
-Quem é, adorável criatura? Perguntou o gigante.
-Que quer de mim, senhor? Não sou mais que a governanta de Asmodéia.
-Não serás mais, se assim quiseres. Peço-te que me acompanhes.
-Onde irás levar-me, senhor?
-Quero levar-te até onde criatura alguma jamais foi.
-Mas por que eu, que te sou completamente desconhecida?
-Pois então, apresente-se. Eu sou Sahasetaum, incumbido de julgar as Luzes e as Trevas. Agora é tua vez.
-Eu sou Vrtra, venho da mesma tribo de Moloch e fui incumbida de cuidar de Asmodéia, enquanto ela não alcança a idade da responsabilidade.
-Criaturas como tu foram feitas para comandar. Como eles puderam relegar-te tão degradante serviço, a tão pueril criatura como Asmodéia? Agora vejo porque tentam enganar-me. Tentaram esconder-me essa injustiça!
-Oh, não, senhor! Não foi por injustiça! Na verdade, Asmodéia cuida de sua parte, mas eu a administro, sugerindo-lhe indiretamente, por conselhos.
-Pois então, deixe-a agora, deve ter tido aulas suficientes, ela já está bastante crescidinha para precisar de uma governanta. O que me diz, queres ir ou não?
Vrtra aceitou, pois temia o que poderia lhe acontecer se recusasse. Sahasetaum a fez voar consigo pela imensidão do Cosmos através de todas as regiões, tanto das Trevas quanto das Luzes. Levou-a então, por através da região que o Universo regia, o lar de Sahasetaum e ela maravilhou-se.
Pousaram em um lugar que superaria qualquer definição de beleza ou feiúra, porque simplesmente ali tais conceitos não tem utilidade, já que na região mantida pelo Universo estão os planetas, galáxias e seres que superaram todos os medíocres referenciais de valor.
-Seja bem vinda Vrtra, ao coração do Universo e ao meu lar. Onde coração e mente são coisas únicas, existindo por todos os princípios negativos.
Sahasetaum pousou suave, delicadamente e ternamente uma de suas mãos no ombro de Vrtra que estremeceu.
-Compreendo teu temor, criatura. Eis porque te trouxe para cá. Somente aqui poderia fazer-te tocar no nervo do universo e torná-la como uma galáxia ou algo de uma existência tão complexa como Leviathan, Iahravel e quase tão poderosa quanto eu.
-Senhor! Mas eu?!
-E mais ninguém conheço que pudesse ser assim. Só assim perderá o medo por mim, terá tua liberdade. Se algum dia tu vieres a nutrir apreço por mim, terá capacidade de me falar por igual, como igual será recebida e viverá comigo. Acha que é possível? Por mérito e esforço, uma criatura evoluir tanto?
Das garras de Sahasetaum surgiu uma esfera que mais parecia a própria vontade do Universo, a mesma vontade que criou tantas coisas
-Sim, é possível! Eu mesma vi inúmeras vezes, criaturas menos evoluídas que nós, chegarem ao extremo. Faço parte de um reino, cuja característica e formação está em criaturas que conquistaram formas de existência mais dignas. Então...eu também...
Vrtra tocou,ainda receosa a esfera, na expectativa de que fosse sentir dor ou de que seria destruída. Mas a esfera desvaneceu ao seu toque, como uma bolha de sabão. Tão simplesmente como a chuva cai de nuvens carregadas, Vrtra agora irradiava essa força, que antes era a esfera.
-Agora retornaremos. Dar-te-ei o tempo que quiser para decidir teu destino, pois agora tempo é o que não lhe faltará.
No instante seguinte, já estavam de volta no mesmo lugar de onde partiram. Sahasetaum deu a entender que já partia, logo todos se puseram a fazer as despedidas.
Ao desaparecer Sahasetaum, Leviathan ainda parecia senti-lo presente. Notou Vrtra, que estava diferente. Esta lhe contou tudo, pois ainda o considerava o seu soberano.
-Então agora eu é que te devo respeito, Vrtra. Disse Leviathan, inclinando-se em reverência.
-Não, meu soberano. Ainda não decidi. Seria muito fácil tirar proveito de minha condição, para forçar Sahasetaum a ter preferência pelo nosso Reino.
-Tenho certeza que ele o faria por ti. Mas desconfio que, antes mesmo de a ter visto, ele já tenha nos julgado, nos considerando dignos de sua piedade e confiança. Caso contrário, não teria feito o que fez contigo. Antes, já o nosso Reino escolheu por viver, de forma a orgulhar o Universo. Agora, estamos praticamente morando no coração do Universo, graças a ti.
Eis talvez o porquê, leitores, no final, as Trevas venham a vencer as Luzes. Primeiro porque as Luzes perderam completamente o contato com o Universo, vivendo em seu estúpido fanatismo. Em segundo, porque as Luzes não souberam receber, nem reconhecer Sahasetaum, como enviado do Universo ou como um dos seus. Por outro lado, as Trevas, em primeiro, viveram sempre em acordo às regras básicas do Universo, sabendo viver seu destino. Em segundo, por ter Sahasetaum encontrado alguém com quem poderia deixar seu coração repousar.
Vrtra ainda não sabe se aceita a oferta, pois estará muito preocupada por vários milênios, com a ameaça constante que se tornou o Império das Luzes ao seu Reino. Talvez, quando tiverem paz em si, possa levar um pouco a Sahasetaum, ao simplesmente aceitar a oferta. Mas o mais irônico nisso é que só será possível, quando finalmente a prepotência do Império das Luzes for detido pelo reino das Trevas. Ou seja, o conflito que Sahasetaum queria deter, continuará. Só que, a partir deste momento, será ele que ficará angustiado e irritado, sem saber ao certo o momento exato de agir, já que foi criado com esse propósito. Mas isso não demorará, assim espero! Sahasetaum deseja dar fim a este conflito, viver o quanto mais cedo possível com Vrtra e ter um pouco de paz!
Consultem minha pequena versão sobre a criação, sobre o surgimento de Leviathan e de Iahravel, do reino das Trevas e do Império das Luzes. Tem um capítulo, onde faço uma pequena tentativa de antever como será tal conflito final entre os dois irmãos.
Pode lhes parecer um pouco pretensioso. Praticamente me delego a posição de escritor do profano e que serei para as Luzes, o falso profeta que anuncia a Besta, o que fará com que tenham de me eliminar.
Irão rir da minha fantasia, de que justamente um ser tão medíocre quanto eu, possa vir a tumultuar o Império das Luzes, após sua vitória provisória, ao plantar a árvore do Fogo Negro em plena Nova Jerusalém.
Bom, meus amigos, hão de convir que meu intenso trabalho já deve ter surtido algum efeito em minha Deusa, Lilith. Sem dúvida, ela comentou minha predisposição com Vrtra. Se esta me julgar merecedor de tal apreço, certamente irá pedir por minha proteção a Sahasetaum, para que minha missão seja bem sucedida. Porque não seria muito ético, da parte de ambos, tomarem nitidamente parte do conflito, então se servem de peças mais sutis, que possam trazer, enfim, o resultado almejado por ambos.
Afinal, por uma paixão a Vrtra, Sahasetaum se diminuiria a ponto de proteger uma vida mortal e tão medíocre quanto a minha. Sensacional vai ser testemunha-los consumando esse amor, ao fim do conflito. Podem ter certeza de que estarei observando como Sahasetaum ficará feliz com a recompensa desse esforço.
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