segunda-feira, 30 de maio de 2016

Heterogênese I

No princípio era o sujeito e dele veio o verbo, pois verbo algum faz sentido se não há quem o profira.

Havia o Universo que, como único, habitavam nele milhares de partículas. Destas, nasceram o Espírito das Luzes e o Espírito das Trevas. Do choque entre eles, explodiu a vida no Universo que, para que continuasse o equilíbrio, separou-os em dimensões diferentes, que não aquela onde nasciam as galáxias.

Das partículas que originaram as galáxias, vieram os seres, cada qual ao seu planeta, todos formados por este planeta de sua essência particular. Todos, ao seu tempo, tiveram seu momento de glória.

Ora, ocorreu ao Universo que a extensão de planetas e de seres era tão grande que muitos lhe escapavam ao equilíbrio e se extinguiram, sendo portanto, necessário pedir ajuda aos seus filhos, o Espírito das Luzes e o Espírito das Trevas. Mas, por causa de que cada ser, fora formado pelas partículas do Universo, era-lhes dado uma consciência, cabia então, a cada Espírito, conquistar de pleno acordo o apoio dos seres

Das conquistas que cada um fez, merece o destaque a conquista do terceiro planeta, de um sistema solar, da galáxia que se chama Via Láctea, por ser como leite ao Universo: cheio de vitalidade e energia. Por menor que fosse das outras galáxias, se distinguia pelas riquezas e pelos seres que até então existiram. Dentre os planetas que havia em torno de seus sóis, este era como uma pérola encontrada entre dunas marítimas.Então, não foi sem mérito que lhe foi reservado a importância de ser a fronteira final entre as Luzes e as Trevas: dele partiria e a ele retornaria o domínio de cada um dos Espíritos, visto que o duplo círculo é o símbolo do Universo.

No entanto, os seres mais evoluídos resistiam ante a compreensão. Ocorreu ao Espírito das Luzes que deveria então formar um igual a estes, só que formado de uma parte de sua essência. Usou o barro, misturando a água e a terra do planeta, deu-lhe forma, secou-o no fogo do planeta, mas o sopro a dar vida à criatura veio do Espírito.

Isso era satisfatório, pois o domínio do Espírito das Luzes neste planeta estava vivo e encarnado, melhor marca de território não há do que a vida e a palavra dita por esta vida, sobre sua origem. Foi-lhe dado o nome de Adão e foi considerado como sendo o primeiro homem, embora já houvessem tantos semelhantes a ele, que eram considerados pelo Espírito das Luzes como simples animais inferiores. Havendo esquecido de sua origem e da origem igual, tanto de Adão quanto dos outros animais semelhantes, o Espírito das Luzes pôs esta criatura acima das outras, gerando a desigualdade. Como Adão não podia deixar de ser diferente de seu pai, gerou discórdia entre os animais semelhantes. O Espírito das Luzes, para mantê-lo longe deles e não acabassem fazendo ruir o marco vivo do Espírito das Luzes, este utilizava seus poderes, criando a repressão.

Isso era completamente inaceitável para as partículas, que ficaram agitadas, vendo seus seres criados igualmente, disputarem a realeza da superioridade sobre seus iguais. Quando as partículas ficam agitadas, o Universo fica atormentado, como um lago ondula pela simples queda de uma gota na superfície. Sentindo a insatisfação do Universo, o Espírito das Trevas pôs-se então a criar algo, que seria mais perfeito que o homem, porém feito da essência das Trevas e das essências antagônicas do homem. Enquanto este foi formado pelo sopro das Luzes, cuja sabedoria não vai além do obstáculo, esta viria das Trevas, cuja sabedoria vai além das Luzes, ultrapassa o obstáculo e trespassa, chegando ao mais profundo. Enquanto o homem foi modelado do barro, esta foi esculpida em pedra, talhada pelo relâmpago, enquanto foi do fogo que o homem se formou. Porque a pedra é superior ao barro, tanto que está acima e ao redor para contê-lo, porque o relâmpago é superior à água e ao fogo, pois não pode ser apagado nem detido, a não ser com esforço tremendo. Foi-lhe dado o nome de Lilith, pois seu primeiro passo em vida foi numa noite de lua nova, durante o sono mais longo dos seres incautos e do tolo homem, Adão. Como mulher, ficou conhecida sua essência, por reconhecer de antemão, que não era a única, tão pouco superior às demais fêmeas dos demais seres. Na verdade, seu Pai, o Espírito das Trevas, avisou-a logo que o brilho de seus olhos flamejou:

-Tu és melhor que o homem, mas mesmo assim igual a ele, com talentos e falhas. Teu dever é deter o homem em sua loucura, como a pedra detém o barro, repreender as paixões e fraquezas do homem, como o relâmpago diante do fogo e da água. Sobretudo, como filha das Trevas, deve lançar a dúvida e a crítica contra a sabedoria superficial do homem e das Luzes, enquanto tiverem a ousadia, a petulância e a pretensão de se porem acima de tudo e todos os seus iguais.

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