quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Sejamos pagãos!

Definição
Muitos crêem que viver de forma pagã consiste em dar liberdade aos seus instintos, desfazer-se de toda a ideia de pecado ou exame de consciência, comer bem, beber bem e copular melhor, ou melhor dito, um paganismo de “boulevard” no qual se alude aos actos antigos do culto a Dionísio – bacanais, embriaguez – sem advertir que aquela era a época de decadência do império grego, como também a orgiástica oriental que já foge à norma.
O paganismo é todo o contrário e põe entre o homem e o universo uma relação fundamentalmente religiosa. O paganismo é uma fé que repousa sobre a ideia do sagrado, e sagrado quer dizer respeito incondicional por alguma coisa. O paganismo não é o retorno ao passado, à origem pura, pois o antiquado cai por si mesmo; trata-se de voltar a unir a história com o hoje, unir-nos ao eterno, fazê-lo refluir, voltar à escola do mythos e da vida (Hölderlin).
O paganismo está em conformidade com as leis gerais do que é vivo.
Concepção Pagã
São pagãos todos os que dizem “sim à vida”, por isso Deus é a palavra que expressa o grande sim a todas as coisas (F. Nietzsche, o Anticristo, p.102).
Não se pode discutir que o homem é um animal, um ser físico, porém há dentro dele uma parte metafísica.
No paganismo o mundo, não sendo outro que Deus, é também perfeito e vice-versa, Deus é também imperfeito tal como é o mundo; ademais disso há uma importante visão da criação, para o pagão ao começo foi a Acção (Goethe), enquanto que em outras religiões ao começo foi o Verbo.
Não há necessidade de acreditar em Júpiter ou em Wotan para ser pagão, não há que erigir altares a Apolo ou ressuscitar o culto a Thor; implica buscar por trás da religião a maquinaria mental onde se produz o universo interior que reflecte a forma de conceber o mundo que denota considerar o seguinte:
Deuses: Centros de Valores
Crenças: Sistemas de Valores
Os Deuses e as crenças passam, porém, os valores permanecem.
Valores
Pode-se citar uma lista enorme que justifica o papel decisivo dessa fé dentro dos grandes impérios que existiram na antiguidade, entre eles:
- Ética fundamentada sobre a Honra.
- Atitude heróica diante de inconvenientes da existência.
- Exaltação e sacralização do mundo.
- A Beleza.
- O Corpo.
- A Força e a Saúde.
- Recusa dos paraísos e infernos.
- Inseparabilidade entre estética e moral.
O paganismo não poderia separar o bom do belo e isto é bastante normal, posto que o bom é acima de tudo o conjunto de formas mais excelentes deste mundo. Para os gregos a arte era a forma mais elevada sob a qual o povo representava os Deuses.
O valor de um povo ou de um homem mede-se por seu poder de colocar sobre sua experiência o selo da eternidade (Nietzsche).
Quando Paulo entra em Atenas para tratar de retirar ao povo as suas convicções ancestrais, descreve a cidade como cheia de ídolos (Actos 17), no meio desses ídolos há estátuas de divindades (17-29), porém também de filósofos, epicuristas e estóicos. O que não impede Paulo de declarar: “Atenienses, em todos os conceitos, vós sois os mais religiosos dos homens.”
Paganismo – Religião
O paganismo tem familiaridade com as religiões indo-europeias antigas (história, teologia, simbolismo, mitos, etc.). Não se trata de acumular conhecimentos das diferentes províncias da Europa pré-cristã, trata-se de identificar estas crenças, suas projecções e transposições aos valores que nos concernem enquanto herdeiros de uma cultura.
A religiosidade cósmica “pagã” está vinculada à ideia de que a vida não nunca morre, que se renova sem cessar, que a história pode regenerar-se a si mesma, que há uma eterna solidariedade dialéctica entre a vida e a morte, entre o começo e o fim, entre o homem e os Deuses, daí os sacrifícios oferecidos pelos pagãos.
A religião é indissociável do costume pagão.
A religião pagã regula situações de interesse colectivo, dedica especial atenção à pessoa tendo em conta as suas raízes, logo, no paganismo a pessoa é inseparável de sua raça e de sua família.
Politeísmo vs. Monoteísmo
O politeísmo é a visão política do “mais além”, já que nele se recorre ao pluralismo, procurando a verdadeira identidade do homem com a natureza. Há continuidade entre os seres mais humildes da natureza e os Deuses mais elevados; isto não implica igualdade, ao contrário, formam-se grupos separados e hierarquizados.
No monoteísmo todos os homens são iguais na medida em que foram criados por um único deus e não por vários.
Para o monoteísta é fundamental o perdão das ofensas e o apelo da face esquerda que se estende depois de ter sido golpeada a direita.
O politeísta apela ao “adversário fraterno”, e ambos criam o “duelo”, no qual a guerra religiosa e a luta de classes fica excluída. Prova: David mata Golias à traição.
Para o monoteísta não crer no seu deus é servir o diabo, é o ápice da blasfémia.
Para o politeísta não existe definição objectiva do mal.
No monoteísmo Deus é o único criador e criou os homens.
No politeísmo o homem cria os seus Deuses à sua imagem, dos quais oferece uma representação sublimada. Os homens superando-se a si mesmos.
O deus cristão afirma “meu reino não é deste mundo” (João 18 – 36).
O pagão acredita que um Deus que não pertence a este mundo não é um Deus, já que Deus é o elemento único e distinto deste mundo.
No monoteísmo tem-se a ideia de um deus déspota, ciumento, soberbo, o qual se considera perfeito.
O judaico-cristianismo é uma religião sem mitos.
O odinismo, o celtismo, o hinduísmo, entre outras religiões, são ricas em mitos e são os mitos que reflectem o mundo e o sacralizam.
No politeísmo os Deuses combatem com os homens e também entre eles – a Ilíada. Zeus e Odin são soberanos, não déspotas. Cria-se também a figura do herói, que é um intermediário entre os dois níveis, quer dizer, um semideus.
Os Deuses são homens imortais e os homens são Deuses mortais. Nossa vida é a sua morte e a nossa morte é a sua vida.
Para os cristãos o mundo é “um vale de lágrimas”; para os judeus entre deus e a criação há um vazio.
Para os pagãos a consciência humana pertence ao mundo, pelo que não se encontra dissociada da substância de Deus.
Para o cristão não há curiosidade por nada após ter encontrado a Jesus Cristo.
O pagão não põe limites na sua espiritualidade.
Em resumo, o mártir monoteísta é o extremo oposto do herói pagão. O monoteísta não pode ser orgulhoso, deve ser humilde e rogar por um espaço no céu, enquanto que o pagão é orgulhoso e irrompe no mais além reclamando o seu pedaço de “céu”.
A ideia de que um ser humano possa converter-se após a morte em alguém semelhante a um Deus era corrente na antiguidade e assim demonstram-no grande número de inscrições sobre pedras sepulcrais das épocas helenística e romana. O paganismo de hoje propõe ao homem, no curso de sua vida, a superação sobre si mesmo e participar assim da substância divina. O homem, se foi criado, deverá ultrapassar seu criador da maneira que os filhos ultrapassam seus pais.
Caim foi um homem da revolução neolítica, agricultor enraizado à terra que Jeová amaldiçoou por causa de Adão. Como seu pai Adão, Caim faz prova de orgulho e é por essa razão que é condenado. A morte de Abel não é senão a recusa de Caim em humilhar-se e arrepender-se. Caim foi pois homem civilizador por excelência; dizer-se filho de Caim é dizer-se homem de cultura e civilização.
O paganismo não pode menos que reagir contra o tema cristão da depravação do homem pelo pecado original. Pelo contrário, o homem pode conferir um sentido à sua vida, que não tem que ser lavado de um pecado original hereditário pela mediação de um redentor. O homem, segundo o pensamento pagão, deve assim conhecer a possibilidade de uma união consubstancial com o divino.
Não se trata pois de pôr o homem no lugar de Deus. O homem não é Deus. O homem não deve ambicionar converter-se em Deus, senão, imitando os Deuses, tornar-se como os Deuses.
A intolerância dos povos semíticos é a consequência necessária de seu monoteísmo. Os povos indo-europeus, antes de sua conversão às ideias semíticas, não haviam tomado jamais sua religião como a verdade absoluta, senão como uma espécie de herança de família ou de casta, estranha ao proselitismo.
O paganismo, ao contrário do monoteísmo, é tolerante por natureza e sempre induz à comparação. Enquanto que na época antiga a luta do monoteísmo contra a idolatria autoriza o assassinato (Deut. 13, 7-10).
Conclusão
Na medida em que tudo que é grande e forte era concebido como sobre-humano, como estranho ao homem, o homem reduzia-se e repartia entre duas esferas seus aspectos: um detestável e débil, outro forte e surpreendente. À primeira esfera chama-se homem, e à segunda chama-se Deus (Nietzsche).
Sejamos livres!
Sejamos selvagens!
Sejamos pagãos!
Alain de Benoist (traduzido para português em Legio Victrix e com ligeiras adaptações minhas)
Notas: A idéia de uma origem indo-européia destaca que a tal "estirpe" é uma mistura, uma miscigenação. Sem nos esquecermos que aqui os povos indo-europeus encontraram povos aborígenes e com eles misturaram-se. Sem nos esquecermos que muito de nossas origens provém da Anatólia, região situada na Ásia Menor. Sem nos esquecermos que parte do Mediterrâneo e da Hispânia foi colonizada pelos Fenícios do Oriente Médio.

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