sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Erotismo e sexualidade sagrados

Um dos princípios mais difíceis de serem entendidos pelas pessoas comuns na Arte, na Wica, na Bruxaria e no Neopaganismo é a noção de que o corpo é sagrado e o prazer é uma via de iluminação.
A base do princípio está sustentado no conceito de que os Deuses são imanentes, ou seja, toda a natureza, incluindo nossa espécie e nosso corpo, são extensões dos Deuses. O que não exclui as noções científicas como a teoria da evolução, mas são explicações racionalizadas das funções naturais.
A natureza passou de seres simples, unicelulares e indistintas para seres complexos, sexualizados e específicos, porque este mundo material reflete a realidade divina. Nosso domínio sobre outras espécies não foi igualmente acidental, nós fomos gerados, evoluídos, de espécies mais brutas para espécies mais sofisticadas, nossa capacidade racional é um reflexo da capacidade dos Deuses.
Quando nossos ancestrais começaram a retratar os Deuses, os elementos naturais foram usados, estes mesmos foram inclusive confundidos como sendo os Deuses. Figurações de árvores, dos animais e do corpo humano tiveram lugar na representação dos Deuses, como as famosas Vênus de Willendorf. Portanto não é estranho que existam estátuas votivas em forma de falo ou vagina; o primeiro chamado de Lingam, o segundo chamado de Yoni.
O Lingam é o símbolo da energia criadora masculina, viril, e sua definição é a de ser "fixo", "imóvel", "forma fundamental". É o pênis enrijecido, pleno de vida, desejoso de penetração. Este símbolo, na forma de um Falo de pedra, pode ser encontrado já no período Neolítico da civilização do Indo. O Lingam está associado ao fogo, e sua natureza é a mesma do ÁXIS MUNDI, assim com pode ser considerado o Raio.
A Yoni é a Terra, abriga a energia potencial e a vivifica numa união não apenas divina, mas supra - divina. É o receptáculo, o Altar - Mor da Criação, do Ovo do Mundo, onde ele é gestado e ao mesmo tempo honrado. Desse modo, o Lingam - Raio penetra e fertiliza Yoni - Altar. A Yoni é a vagina molhada e sedenta por ser penetrada, é o Yantra ou Pitha da Deusa.

O mesmo simbolismo do Lingam apareceu na Grécia Antiga como Priapo e Yoni apareceu na Europa como Sheila na Gig, evidenciando ainda mais que as nossas funções erótica, sexual e reprodutora eram sagradas. Tanto que originalmente se dizia que depois de Beltane (1° de Maio - Maypole) não existiam mais donzelas, pois isso e a cópula com o solo de plantio eram necessários para estimular a fertilidade e garantir a colheita.
Eu comentei em outros tópicos a relação entre monoteísmo e repressão sexual, então eu apenas vou reforçar o simples fato de que a sociedade cristã é sexualmente doente pelas consequências visíveis, como as diversas formas de violência e desvios sexuais. No caso desse blog, será explorado o conhecimento histórico-antropológico. Todas as formas de sexualidade humana eram consideradas normais nas sociedades politeístas, haviam relações homossexuais nos exércitos e existiam os prostíbulos sagrados.
Depois de muitos anos sofrendo com a opressão, tanto da Igreja quanto do Estado, na década de 1960 (século XX) aconteceu a Contracultura e o mundo conheceu a Revolução Sexual que produziu o Amor Livre, a Amizade Colorida e ajudou a formar condições sociais para a manifestação do feminismo e da homossexualidade. A opção sexual se tornou uma bandeira para a contestação social e política. Essa tendência acabou sendo misturada e enfatizada nos muitos grupos de neopaganismo, bruxaria moderna e wicca eclética que surgiram, muitos disassociados dos princípios da Wica ou de qualquer sentido de tradição. A Antiga Religião resgatada/renovada, depois de tantos golpes sofridos, é esfaqueada por aqueles que alegam segui-la, ao ser distorcida para atender a agendas e vaidades pessoais.
Na cerimônia wiccana nós dizemos: "todos os atos de amor e prazer são meus rituais", uma afirmação e um estatuto, recebidos e celebrados de diversas formas, em diversas tradições, cujo conceito não é bem compreendido e faz com que pareçamos promíscuos às pessoas comuns e aos cristãos fundamentalistas. Tanto para estes quanto para os puritanos infiltrados na Arte é mister dizer que, para cada caso, para cada cerimônia, existem intenções diferentes. Ou seja, na ótica dos Deuses, nossa opção sexual é um assunto que interessa apenas a nós, mas a intenção que será realizada pela cerimônia tem consequências diferentes. O Grande Rito real, executado na cerimônia wiccana tradicional, com um ato sexual entre o Alto Sacerdote e a Alta Sacerdotisa tem por intenção religar o corpo ao seu sentido sagrado e recriar o mundo. Em outros grupos neopagãos e wiccanos, o Grande Rito é executado de forma simbólica por causas evidentes (traumas, tabus, recalques), mas a intenção é a mesma. Em outras formas de neopaganismo e bruxaria moderna, existem cerimônias homossexuais cuja intenção é o de alcançar o caráter extático e produzir vínculos, mas mesmo nesses casos há um contexto sagrado, ou seja, não se usa a opção sexual como desculpa para violência, abusos ou para "se dar bem".
Qualquer forma de preconceito à essas formas de cerimônias ou à outras formas de sexualidade sagrada, seja contra a homossexualidade, seja contra a heterossexualidade, são resquícios do mesmo puritanismo e opressão que muitos que vêm à Arte trazem de suas crenças anteriores. Pior que isso são os pseudo-sacerdotes que misturam suas vaidades e agendas pessoais, distorcem os princípios da Wica, impingem uma hegemonia contra a diversidade, apenas para dar à sua opção sexual um embasamento sagrado, mas cometem de forma contrária o mesmo tipo de "sexismo" que criticam na Wica.

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